Trabalhei num sítio. Era um edifício que, por fora, quase parecia normal. Mas não era. A primeira vez que lá fui, foi para ir a uma entrevista. Tinha respondido a um anúncio. O meu pai, num fim de semana, tinha-me levado um recorte do Diário de Notícias. Foi a primeira vez que respondi a um anúncio. Escrevi uma carta à mão e nessa carta devo ter escrito que era professora e que estava a acabar a licenciatura. Devo ter escrito as minhas notas pois pouco mais tinha a dizer. Na volta recebi uma carta a convocar-me para a entrevista. Lá fui. Jeans, blusinha de verão, sandálias, sacola de palhinha, descontração.
Ao entrar no edifício, fiquei impressionada. Um átrio enorme, enorme, todo em pedra que reluzia, um pé de direito gigante, esculturas e grandes pinturas. Não imaginava que uma empresa pudesse ter uma entrada assim.
Fui seleccionada. No primeiro dia em que fui trabalhar, mandaram-me apresentar num outro sítio, no posto médico e depois no serviço de Pessoal. Aí coloquei todas as questões que, antes, na entrevista e quando me comunicaram que tinha sido seleccionada, nem me tinha ocorrido perguntar.
Mais tarde, contaram-me, a rir, que tinham ficado espantados com as perguntas daquela miúda que se tinha apresentado ao trabalho sem saber se ia como efectiva ou a prazo ou outras questões do género. Nem sei se sabia quanto ia ganhar. E perguntei-o nesse dia pois ia recomendada para não me esquecer pois, quando amigos ou família me faziam perguntas, não sabia nada desses 'pormenores'.
Na altura não fui trabalhar para esse grande edifício. Antes de lá chegar trabalhei em dois outros sítios, qualquer deles marcantes. De qualquer deles guardo gratas memórias. Um dia conto.
Se não estou em erro, foi ao fim de uns sete anos que me mudei para lá. E não fui logo para a ala onde viria a trabalhar durante mais anos, uma ala ampla, um largo corredor todo em mármore, primeiro num gabinete, depois num outro que teria uma área que era cerca do triplo do anterior. De qualquer deles via-se o largo rio. Uma maravilha. Tempos gloriosos. E saudosos.
Nesse edifício havia zonas restritas. Uma delas parecia ser composta por um conjunto de apartamentos, cada apartamento composto por gabinete, sala de reuniões, casa de banho completa, incluindo banheira e duche, sala de espera, gabinete da Secretária e antecâmara.
Outra zona, igualmente restrita mas não tanto, era composta por sala de reuniões with a beautiful view, restaurante, dizia-se que o melhor de Lisboa, biblioteca, sala de estar.
Nessa biblioteca, toda composta por obras de referência, algumas raras, todas preciosamente encadernadas em pele e letras douradas, havia uma estante, igual a todas as outras, que escondia uma porta secreta. Um dia, em segredo, mostraram-me. Passando por essa porta secreta ia dar-se a um compartimento que parecia apenas um compartimento. Mas não era. De lá havia uma outra porta secreta. E dali havia saída quer para o telhado quer para uma escada privativa que, por sua vez, ia dar a uma saída para a rua num sítio absolutamente insuspeito.
De vez em quando passo lá à porta. Tem agora outros donos e outra finalidade. Não faço ideia como estará o seu interior e se esses caminhos secretos se mantêm. Há lugares a que gostaria de um dia poder voltar, e esse seria seguramente um deles.
E lembrei-me disto ao ver o vídeo abaixo.
Acho um piadão a Cara Delevingne. Já aqui a tive várias vezes e, certamente, mais vezes cá voltará. Tem 28 anos, é modelo, actriz (e canta). Sexualmente fluida, já se lhe conheceram alguns amores de ambos os sexos. Cara não cabe em nenhuma caixa.
Fisicamente é também um ser em evolução. Os seus cabelos já foram louros, quase brancos, escuros, ruivos, castanhos, compridos, curtos. Já se mostrou sexy, desportiva, bad girl, clássica. Ela diverte-se e não conhece limites. Mas já passou pelo tormento da depressão e já publicamente, de forma aberta e descomplexada, falou disso.
A sua casa é obviamente a sua cara -- e isto não é um trocadilho. Irreverente, louca, sexy, provocante, romântica, divertida: assim é ela, assim é a sua casa.
Cara é inglesa mas a casa que aqui nos mostra não é propriamente british style. Pelo contrário, é ousada, teatral, cinéfila, bem L.A.
A passagem secreta de sua casa -- em que se entra por uma vagina e se sai por uma máquina de lavar -- é das coisas mais loucas e divertidas que já vi. Aliás, a sua extraordinária casa é toda ela um excesso, uma alegria, uma casa que é, ela própria, uma companhia para quem lá habita.
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Inside Cara Delevingne's Fantastical L.A. Home | Open Door | Architectural Digest
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