sexta-feira, julho 03, 2020

De que falar quando não tenho do que falar?
Da nacionalização da TAP e da Efacec?
Não sei, não... Acho que vou antes arrimar-me ao 'My friend' de Khalil Gibran.





Não sei se é só comigo mas tenho a sensação que esta situação da pandemia e do confina-desconfina nos atira mais facilmente para o vazio. É certo que, por uma qualquer conjugação astral, entre o que me caíu em cima e o que eu procurei, muito do que era a minha vida mudou. A todos os níveis, mudou. Mesmo nas pequenas coisas: não sei porquê mas parece que tudo o que pode mudar, muda.
Chego a um ponto em que parece que deveria parar durante uma semana, sem obrigações, nem afazeres. Nada. Só eu sem nada que fazer. Parece que preciso de me reorientar. Nunca fui boa na geografia nem na orientação geográfica. Nunca faço ideia do lado para onde virar, não faço ideia onde estou, perco-me em lugares impensáveis. No outro dia estava num sítio e perguntei para que lado era o mar. Disseram-me, como se fosse a coisa mais óbvia. Era onde eu juraria que nem pensar. Ainda agora, ao escrever isto, não consigo perceber. Também nunca me entendi com bússolas. Uma vez ofereceram-me uma. Não atinei. Acho que o meu campo magnético interfere com o da bússola, e isto já para não falar com o da própria terra. Desatino com o norte. Imagina agora numa fase destas. Parece que nem sei bem onde está a minha linha de água, a minha linha de terra, o meu norte. Provavelmente será porque me faz falta rumar a sul, procurar o sal, o azul. Ou porque o meu eixo de rotação se desgovernou, tal a quantidade e simultaniedade de mudanças que se têm operado.
E o que acontece é que, depois do dia e depois de me entreter, à noite, a pesquisar coisas relacionadas com aquilo que agora mais me polariza as ideias, chego aqui e parece que o que me apetece é começar a planear uma escapada, uma bela de uma escapulida, zarpar, ir para longe, de férias, alhear-me de tudo, recentrar-me. Como isso também não, sobrevém o vazio. E eu não gosto do vazio, temo o vazio, temo e odeio o tédio que tudo faz para ocupar o lugar do vazio.

Provavelmente haverá quem, ao ler isto, pense que estou a precisar é de terapia quântica, reiki, alinhar os chacras. Mas eu não sou disso. Zero. Levar massagens gosto, é bom. Mais do que isso soa-me a treta. Conheço (conheço... que é como quem diz) e gosto de física quântica. Como é que daí se desanda para terapia quântica é daqueles mistérios que não quero nem desvendar mas que intuo que seja para aí a enésima derivada da coisa, mas uma derivada que derivou para outro campo qualquer, tresmalhada, sem saber de que terra é.

Mas adiante que não quero ferir susceptibilidades. Na volta falta-me aquela dose de sensibilidade que torna as pessoas crentes. Assim, pelo contrário, sou esta increia que tão bem julgais conhecer.

Abri os onlines e vi que a TAP vai ser nacionalizada mas numa de rapidinha, para logo ser reprivatizada. Mixed feelings, uma vez mais. É uma daquelas too big para falir. Mas vamos voltar a precisar de voar tanto como voávamos? Vamos injectar dinheiro para a empresa ser saudável... mas para quê? Para sobreviver num mundo igual ao que era antes? Mas vamos voltar a ter um mundo igual? Não sei. Mas mais não digo porque, na realidade, não sei. Sobre a Efacec, acho bem. Uma empresa de engenharia, com produção de equipamentos relevantes, das poucas que o país tem, deve ser preservada. O capital humano e o capital de conhecimento são activos que qualquer país deve preservar. Claro que é uma empresa cheia de vícios, bairrismos e triquitriqui, uma empresa que tem queimado quem dela se aproxima. Mas, com pulso forte, mão férrea e cabeça fresca, há muito a fazer ali. Sobretudo, que se evite que vá parar à mão de chineses ou afins.

Mas também não tenho cabeça para, a esta hora, me pôr para aqui a ensaiar altas cavalarias e falar das coisas boas para o país. 

Sigo, pois, para o youtube que, nem mais, me apresentou um vídeo com um senhor de aspecto curioso. Quando o ia mandar bugiar, reparei que lia palavras de Khalil Gibran e, aí, tive curiosidade.
Lembrei-me de há uns anos. Quantos? Talvez quatro. Também era verão. Eu estava a acabar de conhecer uma pessoa e havia uma notória empatia entre nós. Quem antes me tinha falado dele tinha-me dito: 'Vai gostar dele. É um tipo culto, interessante. E bem apessoado'. Alguns dias depois de o ter conhecido, o tal veio conferir: 'Afinal, o que lhe parece? O que acha dele?'. Reconheci: 'Simpático. Invulgar.' E observei: 'Mas, olhe, há ali qualquer coisa...'. Ele, intrigado: 'Acha? Mas o quê?'. Não soube responder. Ainda hoje, que o conheço tão melhor, não sei dizer. Há ali uma qualquer coisa que não encaixa. É como a gente entrar numa sala bonita, tudo correcto, tudo em bom, boas mobílias, bons quadros, bons livros. E, de repente, a gente perceber que no sofá em que ele se senta há um naperon de renda no lugar da cabeça. Não bate certo, não é? Mas nesse dia, deve estar a fazer os tais quatro anos, estávamos sentados ao lado um do outro a assistir a uma apresentação e, não faço ideia a que propósito, ele falou-me, em voz baixa, de Khalil Gibran. Não conhecia e, como ele estava a falar quase em segredo, não percebi o nome. Pedi para ele escrever. Procurou um papel e escreveu. No dia seguinte tinha o cd para me emprestar. Durante uns dias andei a ouvi-lo no carro. Uma coisa quase hipnotisadora. Quando o devolvi quis que eu ficasse com ele. Mas não fiquei. Era um objecto certamente especial. Também não sei explicar porquê.

Ou seja, no estado de quase torpor em que escrevo, estive a ouvir o senhor do vídeo. E gostei da voz tal como gosto do que ele diz. Não sei porquê nem saberia resumir o que ouvi. Sei apenas que aquela toada me agrada. Poderia ele estar a falar grego que, provavelmente, gostaria na mesma. Sou pessoa cheia de inexplicações.


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Pinturas de John LaFarge na companhia de Michelle Gurevich que interpreta Show Me The Face (e cujo vídeo é coisa a não deixar de ver)

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A si que aí está desse lado desejo uma boa sexta-feira

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