Foi um dia tão cheio de limpezas e trabalhos esforçados que só almocei às três. Estou aqui capaz de ir para férias. Para agravar, o meu marido resolveu fazer um arranjo numa das casas de banho. Mas, com aquela habilidade que o caracteriza, em vez de arranjar uma coisa, desarranjou várias. Agora uma casa de banho está cheia de água e o lavatório da outra pinga. E se eu quiser perceber porque é que tal coisa aconteceu ainda subsiste a ideia de que eu é que não percebo nada de assuntos de tal complexidade.
Já avancei com uma solução: contratar um canalizador. Mas vamos quebrar o isolamento? Não sei.
Mas, a esta hora, também não quero estar a falar nisto.
Mas, a esta hora, também não quero estar a falar nisto.
Ao fim da tarde, sentei-me a descansar e a ler. Por pouco não adormeci. Aliás, só não adormeci porque estava com um bocado de frio. Mas como não me apeteceu ir buscar um casaco, fiquei ali meio desconfortável, sem dormir, a pesquisar, a tentar perceber o que tanto me preocupa. A minha mãe anda ensimesmada com o corona. O medo, nela, traduz-se, antes de mais, em descobrir o culpado para, a seguir, decretar que ele deveria assumir a culpa e ser obrigado a resolver o problema. Neste caso, diz que acha que o vírus foi fabricado em laboratório pelos chineses com o intuito de vergar as outras economias e que, portanto, eles é que, agora, deveriam ser obrigados a resolver este lindo serviço. Quando lhe digo que não, que nada indicia tal, que é vírus que dá na bicheza que está nos mercados porque é pitéu de eles não abdicam, aí diz que sim, que é o que dizem, que sabe disso, mas que não acredita. Se há tanto tempo gostam de comer bicheza dessa porque é que, desta vez, o vírus virou monstro e se escapou das mãos de toda a gente?, pergunta.
Pois, que nem de propósito, de tarde li: Is factory farming to blame for coronavirus?
Recomendo a leitura.
Recomendo a leitura.
E, tal como tinha pensado enquanto estava a falar com a minha mãe e a andar por entre as árvores, parece-me quase natural que se tenha atingido o ponto de saturação do mundo. O espirro de um inocente pangolim foi a gota de água.
Deslocalização de tudo, globalização, dependência de todos para tudo, os países afastados do que lhes é natural, esquecidos da natureza, a comermos ovos de galinhas criadas nem é bom saber como, carnes vindas de planuras lá bem longe, lá onde antes eram florestas, carne vinda de barco, de longe, em navios que sujam os oceanos. Tudo assim. Todos consumistas, todos querendo comprar muito mas muito barato, consumindo produtos cuja matéria prima vem de onde é quase dada, trabalhada lá onde a mão de obra é ao preço da uva mijona. Roupa, ténis, inúteis gadgets, brinquedos, tudo. E vivendo grande parte do tempo em torres de vidro, sem janelas que se possam abrir, a respirar ar condicionado -- que, como Graça Freitas explicou, transforma em aerossol as gotículas onde pairam os vírus --, e passando anos de vida a andar de carro, pendularmente, trabalho casa, casa trabalho, poluindo tudo à nossa passagem. E afastando para as periferias os habitantes, para, nas melhores zonas das cidades e vilas, alojar os que estão de passagem. Um mundo de gente a andar de um lado para o outro, gente que se autofotografa, gente que se esqueceu do que é a vida simples.E tão estúpida é esta forma de viver que um espirro de um pangolim no distante mercado de Wuhan bastou para matar muitos milhares de pessoas um pouco por todo o planeta, suficiente para destruir empresas, empregos, destruir a economia do mundo inteiro, para pôr em causa o rumo da civilização.
A propósito de tudo isto, ando com vontade de enviar um mail a um colega com algumas reflexões e algumas sugestões. O mundo vai mudar e temos que perceber isso, temos que respeitar a lição que nos está a ser dada. Temos que ser inteligentes para melhor percebermos o rumo que vamos querer ter na nova vida que se avizinha. No entanto, quando falo nisto a outras pessoas não me dão razão, acham que estou a exagerar. A semana passada disseram-me: Daqui por uns dias, estamos lá de novo. Depois de insistir e explicar que não vai ser bem assim, responderam-me, pronto, está bem, três ou quatro semanas e estamos lá. Lá. Lá, onde se estava antes do mundo mergulhar nesta espiral que está a acelerar não se sabe bem em direcção a quê.
Vou ter que pensar no que lhe vou escrever e vou dizer-lhe que acho que temos que suscitar esta reflexão de uma forma mais alargada, mais profunda.
Nós. Todos.
Está nas nossas mãos. Não nas mãos do corona.
Bem. Conversa mais cinzenta esta, ainda por cima para um sábado à noite, madrugada de domingo. Peço desculpa. Não gosto de contagiar ninguém, nem com covides nem com apreensões.
Vou antes ver como o Sergei voa quando acorda, quando se entrega à vida. É bom a gente levantar-se, abrir a porta e sair para a rua. Agora, pelo menos, posso fazer isso.
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Alguns painéis, nomeadamente o primeiro e o quarto, são da autoria de Nick Bayer and he worked with his co-artists James Clark and Sam Douglas. Não garanto que os restantes também sejam deles.
O Cinema Paradiso é trazido por Pat Metheny com Charlie Haden -- e eu agradeço a quem mo fez chegar
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A todos desejo um bom dia de domingo.
E que não nos cheguem notícias muito más.
Saúde.
E que não nos cheguem notícias muito más.
Saúde.
4 comentários:
Para explicar tudo â mamã: https://lishbuna.blogspot.com/2020/03/blog-post_29.html
Olá Ujm, os grandes solavancos na história da humanidade já serviram para tudo. Às vezes tudo de bom outras tudo de mau. Depende de quem, no fim disto, estiver com forças para empurrar os outros. Por isso não perca as suas forças, conserve-as e lute por uma oportunidade de mudar um pouco o seu mundo. Se todos fizermos o mesmo isto melhora. Bjs Ana
A parte mais tramada de estar tanto em casa é a nossa cabeça buscar algo com que se ocupar, por vezes com coisas boas (reflexões, melhorias), outras com a necessidade de arranjar (ou desarranjar) coisas na casa.
Tenta filtrar as coisas realmente importantes, ou as que só apareceram pelo confinamento =)
Igualmente espero que isto acabe depressa.
Já agora, isto https://lishbuna.blogspot.com/2020/03/blog-post_73.html é francamente de ver.
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