sexta-feira, fevereiro 14, 2020

Bebés acabados de nascer e meninas afegãs a andarem de skate





Esta semana já me levantei às cinco e picos da manhã para me meter a caminho para ter uma reunião à primeira da manhã a norte, já me constipei, já tive, por junto, uma mão cheia de reuniões, algumas com duração de uma meia dúzia de horas, já tive que ler relatórios com muitas páginas carregadas com coisas chatas. E agora dói-me a garganta.

Chego ao sofá para me distrair e, a seguir aos noticiários, ou falam de presos ou de minas abandonadas ou de incêndios transactos ou de culpados e, pelo meio e por cima de tudo, eutanásia. Ou, então, corona vírus (ou conan osiris como dizia, no outro dia, na Prova Oral, a avó de um), agora transmutado em  Covid-19. E é sempre isto, sempre, sempre, sempre: gente doente, gente incapacitada, gente que padece nos hospitais, velhos abandonados, tarados à solta, infectados, isolados, mortos -- desgraça, drama, tragédia. 

Não tenho paciência. Juro: não tenho paciência. É demais.

Se calhar, se esta minha semana não estivesse a ser assim ou se o meu corpo aguentasse um dia inteiro de pés gelados ou entrar e sair de ambientes aquecidos para o frio ou almoços de pé rodeada de simpáticos cavalheiros para, logo de seguida, retomar mais um reunião, e tudo tão non stop, talvez eu tivesse paciência para ver a Isabel Moreira em todos os canais ou para ver desgraças, reincidências, taras, abandonos all over. Assim, lamento, não tenho. Não tenho mesmo.

Acresce que esta sexta vai ser também de arrebimba e eu já estive a escolher o que vou vestir porque de manhã não tenho tempo mas também sei que mal vou ter tempo para almoçar e estou naquelas fases em que só me apetece vestir-me já com manga curta e andar leve, bem disposta e toda eu colorida, antecipando a primavera e os primeiros calores de verão e, à hora de almoço conseguir escapar-me para um jardim e veranear a ouvir passarinhos -- e, afinal, o tempo continua chuviscoso, friento e não consigo pôr-me à fresca nem ter tempo para arejar. A minha mãe arrelia-se: mas não hás-de andar constipada e mal da garganta se nunca andas agasalhada, se andas sempre esgargalada? Pois é. Mas acho que não tem a ver com isso, acho que tem a ver com a seca de vida que levo. A minha filha diz que anda meio mundo assim, que isto são viroses, cenas. Não sei.

O que sei é que, com isto, no estado em que estou e só droga a passar nos ecrãs, desisti da televisão. Qualquer dia desisto de vez. Que estupidez é esta de, em horário nobre, competirem para ver quem fala mais de desgraças? Gaita. Uma pessoa a precisar de peace and love, coisas boas, tranquilidade e afectos e... nada.

Portanto, com vossa licença, mudo-me para uma twilight zone onde não há nada de stresses. Ou há mas dão-lhes a volta. Não dá para ficar a pessoa a afogar-se em desgraças.

Passo para um vídeo que me comove. No meio da guerra, no meio da falta de tudo, em situações limites, alguém resolve ensinar as meninas a sentir o gostinho bom da liberdade e de como é bom brincar, em paz: skating. Um vídeo que, completo, deve ser uma maravilha. Para já, só dá para ver a apresentação. Mas é uma lufada de ar fresco.

E, para contrariar o cinzentismo das palavras, fotografias de bebés a nascer. Um milagre que nunca festejaremos o suficiente e de que nunca me cansarei de falar e de ver.


Só tenho pena de não ter o filme do nascimento dos meus filhos. Estava acordada, sem anestesia, mas estava com tantas dores e sem possibilidade de ver o que se passava lá em baixo que só me lembro deles já cá fora, pousados sobre o meu peito, cobertos ainda de restos do ninho de onde tinham vindo. Momentos mágicos. Duas pessoazinhas a saírem de dentro de mim, tão ligadas a mim, tão independente de mim. E a magia continuou: cresceram, ficaram grandes, maiores que eu, tão lindos, tão queridos. Pensar que se formaram no meu ventre parece-me um daqueles milagres que nunca conseguirei compreender e de que nunca me cansarei de me sentir agradecida.

E o vídeo das meninas afegãs a andarem de skate é este aqui abaixo. E a descrição do filme e do reconhecimento que tem reconhecido está aqui: Documentary Telling The Story Of Courageous Afghan Girls Learning To Skateboard In A War Zone Wins Oscar


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As maravilhosas fotografias de nascimentos provêm daqui, onde há mais.
As autoras são Daniela Justus, Jessica Vink, Rebecca Coursey-Rugh e Jana Brasil

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(E agora vou ali buscar uma pastilha para a garganta)

4 comentários:

Anónimo disse...

Mas o que nunca se compreende é por que motivo é que, estando sempre com tanto sono, não vai dormir e sossegar em vez de estar aqui com estes relambórios, fotografias e músicas e o diabo a quatro.

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Bem-haja UJM que mesmo com tanto sono vem aqui ao seu cantinho partilhar qualquer coisa.

E, sim, estou consigo, celebremos a vida!

Um belo fim-de-semana.

Um Jeito Manso disse...

Olá Anónimo/a

Compreendo que não compreenda porque não é para pessoas que não compreendem que eu escrevo.

Saúde!

Um Jeito Manso disse...

Olá Francisco,

E um bem haja para si, sempre tão presente e simpático.

Obrigada.

E um belo domingo, Francisco!