domingo, agosto 25, 2019

Crónica de um dia feliz in heaven, dia de casa cheia com um novo bebé que deixa o bebé pimentinha varado de ciúmes
[E, de bónus, um vídeo com imagens embaraçosas no desporto]




De manhã foi dia de check-up. Estava marcado há tempo e parecia boa ideia: sendo ao sábado de manhã, não haveria stresses nem risco de poder vir a colidir com reuniões ou com outros compromissos. E dali seguiríamos para o campo, nas calmas. Afinal, não foi bem assim pois soubémos há dias que os planos seriam outros. Temos cá, in heaven, família e amigos e, portanto, ontem, antes da festa da leoa quase virgem, fomos abastecer-nos já que hoje seria complicado e, de manhã, arrumámos geleiras e sacos para que, depois dos exames médicos, seguíssemos logo viagem, sem demora. Afinal, só já a caminho percebi que me tinha esquecido de uma coisa insubstituível e, portanto, tivemos que fazer um desvio para a irmos comprar. E aproveitámos para almoçar porque já passava mais do que da hora e estavámos com fome. 

Claro que, quando chegámos, já cá estava o pessoal todo. E um novo bebé. Um bebezão, comilão e bem disposto, que desestabiliza o bebé-pimentinha, despertando nele reacções violentas, sempre a querer agredir o mais novo, vendo aquele rival a querer os brinquedos cá de casa. E quando eu lhe pergunto: 'Mas, olha lá, afinal de quem são os brinquedos?' diz, convicto, 'São meus!´. Corrijo, digo que não, que são de todos, que deixe o bebé brincar à vontade -- mas não me liga. Tenho um enorme carinho por estes brinquedos transgeracionais que têm feito as delícias das crianças da família ao longo de décadas. 


Há bocado, quando fui ao estúdio para levar mais umas fronhas, estava ele a perseguir o outro, gatinhando. O bebé mais novo tentava fugir dele e ele, que nunca gatinhou, perseguia-o gatinhando também. O bebé olhava-o, intrigado. 

Uma alegria, tudo isto. Chega-se ao fim do dia e nem se dá por ele ter passado, tanta a ocupação, tanta a animação permanente que as crianças e a boa companhia proporcionam. Penso que é por tudo isto que nunca dou pelo tempo a passar. Faz, na verdade, tanto tempo que, noutros verões, primeiro nasceu a minha filha e depois o meu filho. E agora já eles têm os seus filhos. E os seus amigos que eu conheci jovenzinhos e, em alguns casos, com três anos, agora já é tudo gente crescida, também já com filhos.

Tenho a trabalhar comigo em equipas distintas e, na verdade, em empresas distintas, jovens de vinte e poucos anos. O mais velho deste grupo de jovens que injectei no meio das equipas existentes, tem trinta e poucos. Puxo por eles, dou-lhes responsabilidade e proporciono-lhes visibilidade. E eles ficam contentes. No outro dia, mais um veio querer saber o que achava eu dele. Lá lhe disse. E, enquanto falava com ele, pensava que são bens mais novos que os meus filhos. Penso que o tempo tem passado a toda a bisga, ainda me lembro tão bem de estar grávida, deles a saírem de dentro de mim, deles, ensanguentados sobre mim, deles pequeninos a maravilharem-me com as suas gracinhas, depois a ficarem grandes, depois adolescentes, a casa sempre cheia dos seus amigos, dos namorados e namoradas. E agora já aqui tenho os seus filhos e os filhos dos seus amigos e já tenho nas minhas equipas miudagem bem mais nova que os meus filhos. Não sei se a teoria da relatividade também explica isto, a aceleração do tempo quando a gente está entretida a ver crescer e multiplicar-se os outros.
A minha menina, já vos contei, é uma verdadeira mini-me. Ontem, na festa de aniversário, conseguiu que um dos convidados (que ela nunca tinha visto mais gordo) lhe emprestasse uma máquina e, então, andávamos as duas de máquina pendurada ao pescoço, a fazer a reportagem. E como a dela era de polaroids, toda a gente queria ser fotografada por ela para receber logo o output. O prazer dela, o à-vontade dela a fotografar pessoas, a forma como faz os enquadramentos, impressionou-me porque me revejo tanto nela.

Hoje, estava eu na cozinha onde gosto de reinar sozinha, aparece-me ela. Vinha para me ajudar. Se fosse outra pessoa eu teria dito que não precisava de ajuda. Com ela pareceu-me natural partilhar o meu reino. E ali estivemos as duas a dividir tarefas, ela que nem eu, a querer fazer tudo, a mexer em tachos e panelas. O pior é que se queimou um bocado pois, quando estava a moer o refogado de tomates, cebolas e coentros para fazer molho de tomate, levantou demais a varinha e o molho salpicou, atingindo-a numa mão. Claro que a pôs logo debaixo de água fria e pus creme mas ficou encarnado. Devia eu ter tido mais atenção mas quando se aproxima a hora de jantar é tanta a pressão, tudo cheio de fome, que tenho que me dividir entre as muitas tarefas e tenho que acelerar. Mas é uma valente e assim irá aprendendo a defender-se melhor. Fez há dias nove anos. Gosta muito de ler, de usar roupa bonita, de se maquilhar, gosta de liderar os outros, não liga a pormenores e é de uma franqueza assombrosa. Uma menina muito querida e muito linda que não me canso de fotografar. E de olhar com espanto.

Outro pimentinha quis ver o Benfica. Dissemos que aqui no campo não temos esses canais. Mas isso é o que nós dizemos  -- nós, duas pessoas de outra era. É que eles num ápice transformaram-me o computador na NOS TV.  Nem sei como.

Esse, com sete anos acabados de fazer, falando de um dos tios que vive agora noutro país e a quem os outros avós agora foram visitar, dizia-me: 'E, portanto, agora os avós também são emigrantes. Sabias?'. Pensei que não, que os avós não são emigrantes, são turistas, mas, por facilidade e simpatia, disse: 'Pois, tens razão'. E não é que ele soltou uma boa gargalhada, desatou numa risota: 'Acreditaste? A sério...?! Achas mesmo que são emigrantes...?! Mas tu não pensas...?' Tive que engolir o riso. Pensei: 'Não tarda são adolescentes e, então, é que vão dar-me a volta cá com uma pinta...'

Tirando isso e tirando tudo o que brincaram e que não foi pouco, foram lá abaixo, às figueiras, apanhar figos e, à noite, depois de jantar, fomos todos ao sítio, longe, onde costumo deitar os restos de comida. O bebé levava a janténa. Uma expedição nocturna. Mal saímos de casa, apareceu um dos caezinhos pequenos da quinta lá mais à frente, do outro lado da rua. Os caezinhos mais pequeninos aprenderam o caminho para a nossa casa. Saltam por entre o gradeamento e andam perto de nós. Os miúdos acham-lhes graça. Só o bebé se vira a eles, todo bravo: 'Xô!!! Vá-bora!' Xô!!!'. Mas os caezinhos percebem que aquela voz ainda não é propriamente de comando e continuam na deles. Mal acabei de despejar os restos, logo o pequeno cão se atirou ao banquete para agrado da miudagem.


Bem. E isto tudo para dizer que entre os que ontem viram ginástica e mais não sei o quê e os que hoje viram futebol e também mais não sei o quê, o que sei é que hoje, ao espreitar o YouTube só me aparecem bizarrias, vídeos malucos. Parece que todos aqueles vídeos com que costumo ser presenteada desapareceram. O algoritmo também deve estar a pensar que pifei, que os meus gostos agora são outros, que não penso, e tudo o que me mostra é na base das fails, dos jumps, nas jogadas impossíveis, dos momentos bizarros. E eu, pronto, fazer o quê?, rendo-me. E partilho convosco.



E agora acho que vou já descansar até porque, nestes dias, é certo e sabido que a alvorada é bem cedinho. Não tenho galos in heaven mas, em dias de casa cheia, não são precisos já que a chilreada é grande e madrugadora. E eu presumo que seja ao que se vive em dias assim que se chama felicidade.

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Andar no campo, de noite, por entre as árvores, deu-me vontade de aqui ter as fotografias de Peter Solness e o facto de ter, por cá, um querido pimentinha que canta a toda a hora deu-me vontade de trazer Claire Ryann, aqui ainda com quatro anos, com o seu pai.

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E a todos desejo um feliz dia de domingo

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