quarta-feira, outubro 17, 2018

Me too...?
[Sedução, assédio e outras cenas]




Quando se trabalha uma vida inteira em empresas grandes, vê-se de tudo. De tudo. Mas agora menos. Agora o pessoal está todo muito comportado, muito normalizado, não há gente a dizer inconveniências, quase não se vê pulada de cerca, tropelia de bradar aos céus, desafio real. Mas épocas houve em que sim e eu vivi-as. Directores e secretárias, doutores e engenheiros e jovens estagiárias. Tantos, tantos casos. Vi de perto. Acompanhei, aconselhei, partilhei confidências. Anos e anos de vida entre homens e mulheres, chefes e chefiados. 

E nunca, nunca, nunca soube de qualquer caso de assédio de chefe sobre chefiada, de homem sobre mulher. Sedução, sim, muitas vezes. Flirts, sim, muitas vezes. Casos, sim, muitos.

Não juro que não tenha havido: digo apenas a verdade, que nunca deles soube.

Nem sempre a sedução era recíproca e aí a coisa morria ali. Nem sempre a sedução escondia amor e, aí, os casos não duravam muito. Por vezes, a sedução transportava a semente do amor e, aí, depois de dúvidas e sofrimento, o casinho transformava-se em caso sério.

O meu melhor amigo teve um caso com a minha secretária e agora vive com ela. Não se divorciou da mulher e agora passam as festas em alegre comunhão pois nunca deixou de gostar dela e apenas se separou porque a mulher pôs os pés à parede: escolhe com quem queres viver, cm as duas ao mesmo tempo é que não.

Outro colega, teve um caso e depois casou-se com a secretária, uns trinta anos mais nova, uma vampe de voz grossa que morria de ciúmes dele. Depois morreu ele ela transformou-se numa improvável e aparatosa viúva.

Mil casos. Outro foi visto a sair do gabinete, atrás da secretária e ainda a fechar o fecho das calças. 


Outra, uma elegância de fazer parar o trânsito, que entrou para estagiar comigo e depois entrou para o quadro, teve casos com vários, levando-os para a casa onde já vivia com o namorado e, quando se casou, convidou-os a todos, a eles e às respectivas mulheres.

Elas derretiam-se. Ter um caso com um director era uma emoção. Atiravam-se a eles à descarada. Eu pasmava com o descaramento. E eles gostavam, claro. 

Havia um, uma força da natureza, teve casos com não se sabe quantas. Diziam: 'até com a timorense'. Era uma mulher muito baixa, muito gorda, muito feia. Afiançavam que sim, que até com ela. Quando morreu, prematuramente, a igreja estava repleta. Todas elas lá estavam. Junto à urna a mulher chorava inconsolavelmente. 

Ainda recentemente, uma jovem, muito bonita e muito casada, quando tinha reuniões com o chefe, um homem pouco mais velho e igualmente muito casado,  aparecia vestida de forma acentuadamente provocante. As colegas faziam reparo ao que ela descontraidamente dizia: 'Então, tenho que fazer pela vida'. 

Outra, vistosa a ponto de ser tratada por 'avião', quando tem reuniões com alguém que ela acha influente, aparece vestida como se fosse uma Bond Girl. Presumo que os homens nem saibam como desviar os olhos. Até eu, se a tenho por perto nesses dias, sem querer, dou por mim a reparar naquele avultado despropósito. 

Que há homens sabujos que tentam aproveitar-se de mulheres indefesas não duvido. Mas há mulheres que igualmente tentam aproveitar-se. Há homens que se insinuam tal com há mulheres que se insinuam. 

Lembro-me de uma colega que tive no início da minha vida profissional. Não era nem muito bonita nem especialmente simpática. Mas era desbragada, desinibida e divertida, por vezes até em excesso. Atirava-se de forma ostensiva ao chefe, um totó, tímido, menino da mamã apesar de ter quarentas e tais. Quanto mais o via atrapalhado mas ela se atirava. Uma vez, de manhã, apareceu com ar apreensivo, que não sabia como devia agir porque, agora que o tinha conseguido levar para a cama, achava que ficava esquisito ele ser chefe dela. E, de facto, a partir daí, discutia com ele, embirrava com o desgraçado. Ao fim de algum tempo, depois de muito atentar o juízo ao pobre coitado, foi-se embora, resolveu ir viajar.

E comigo?

Tenho trabalhado, ao longo de anos, no meio de homens. E posso aqui jurar a pés juntos que nunca nenhum tentou assediar-me. Zero. É que nem consigo imaginar que algum tentasse pisar o risco. Há linhas encarnadas que não podem ser pisadas -- e há que deixar bem claro onde é que elas estão. Piadas, brejeirices, graças, isso sim. Coisas para rir. Inocentes, bem humoradas. Nada mais que isso.

Sempre tive grandes amigos, homens, sempre os ouvi conversar com grande à vontade. Nunca lhes vi tiques de assediadores. Nem comigo nem com outras pessoas. E não tenho vivido em ghetos nem as empresas onde trabalhei eram melhores que outras.

Por isso, se me reportar à minha experiência pessoal e ao que testemunhei, o que posso dizer é que nem todos os homens são demónios nem todas as mulheres santas. Nem há ninguém completamente demónio ou completamente santo. Há de tudo, penso que em iguais proporções. 

O movimento #MeToo a mim pouco me diz. Tenho para mim que por cada influente-assediador há também alguém que tentou aproveitar-se da situação, muitas vezes tentando obter vantagem, outras vezes apenas porque o poder é afrodisíaco e dá vontade de provar.

Mas, a haver mesmo assédio -- algum tarado ou tarada, algum doente, insistente, incomodativo/a, mal educado/a, badalhoco/a, alguém que não perceba que não vai ser retribuído e insista nas investidas -- então, sim, há que denunciar. Sem medo. Ou dar um par de estalos.


PS: Não estou a falar de violadores. Violação é violação e, a ser mesmo violação (ie, relação sexual não consentida), é crime e, aí, o caso é sério, não sujeito a funfuns ou gaitinhas.

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E, aos que chegaram agora: aceitem o convite e desçam até ao post seguinte caso queiram espreitar a minha casa.

16 comentários:

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Estou a ver que qualquer dia os que rejubilavam com as maravilhas da libertação sexual, passam a ser acérrimos defensores do ascetismo sexual.

Parece-me que por estas andanças órbita muita gente com grande tendência de ataque ao vínculo e, claro, intoxicam as causas com esses problemas afetivo-identitários.

Anónimo disse...

(No telemóvel, de caminho de um trabalho para outro trabalho. Ultimamente, tem sido assim.)

O problema, UJM, é a fronteira. A fronteira nem sempre é tão marcada como parece entender. Violação para ali, brincadeirinha para acolá e está tudo resolvido. A própria ideia de "aproveitamento" pode significar muita coisa. Uma pretensa atriz "aproveita-se" da situação quando um produtor big-shot de Holywood lhe arranja um papel que muda uma vida por ela ter feito o "jeitinho"? É uma imoral, uma quase-prostituta, uma desavergonhada...? A mim não me interessa esses moralismos. Será normal, será aceitável, será moral, será justo que as mulheres saibam que esse produtor e, como ele, praticamente todos, só deem papéis a quem der o tal jeitinho e que, se não derem, adeuzinho? É muito bonito dizer que se recusa, que é não e acabou. Mas há uma forte chantagem, um enorme abuso de poder. E, claro, é fácil perceber que a situação pode descontrolar-se rapidamente e descambar em algo que, de facto, não se queria. No início, está-se só a dar conversa, a não querer ser desagradável, coisa normal, não é? Coisa básica. E o pobre tontinho (porque são todos tontinhos, incapazes sempre de ler sinais óbvios, não é?) já acha que tem de ir até ao fim, já não há volta a dar, era o que faltava! Isto, para mim, é tudo uma promiscuidade.

Outro contexto. Com certeza haverá casos de mulheres que importunaram, apalpando ou de outra forma, homens em espaços públicos. Mas nunca vi, nem ouvi falar. Já o inverso... Quem anda de autocarro (e, pior, muito pior, comboio) sabe o que lá acontece. Desde o piropo desagradável, ao enconstanço por trás, à mão pesada na perna... e fico por aqui. Não são o bem-sucedido CEO ou o eloquente advogado, esses homens? Não, não são. São homens da mesma classe social, rendimentos, habilitações literárias que muitas mulheres que vão no mesmo comboio. E, no entanto, elas não fazem aquilo. Será isto normal?

Aproveitamentos, então nos EUA, sempre os houve. Ou já se esqueceram da Monica Lewisnky? Não foi o MeToo que os inventou.

Abraço,
JV

Abraham Chevrolet disse...

Minha querida,que magnífico post,que clareza,que sinceridade...Que contente fico que também pense assim!
Quem diz que este Mundo está perdido, não anda nada bem.

Janita disse...

Boa noite, UJM.

Posso fazer minhas as palavras do 'velho' Chevrolet?

É que se fosse expressar as minhas,seriam exactamente iguais.

Um beijinho com o meu profundo apreço.

Anónimo disse...

Os assédios acontecem das mais variadas formas e nas mais diversas circunstâncias. Admito, sem rebuço, que, na esmagadora maioria das vezes vai no sentido homem mulher e menos de mulher para homem. E há situações em que as vítimas desse assédio acabam por aceitar, ou por receio de perda de emprego, por exemplo, ou por expectativa de recompensa profissional, e outras. Marilyn Monroe (citando parte de um Post do Blogue Politeia, a propósito desta matéria) disse que “para chegar onde cheguei tive muitas vezes de me pôr de joelhos” (isto a propósito dos “desavergonhados depoimentos do movimento MeToo”, fim de citação). Conheci alguns casos, ao longo da vida, mais, ou menos, semelhantes. De mulheres que eram assediadas por homens, nas suas vidas profissionais e com diferentes reacções…e resultados. Uma casou com quem a assediou (acabou por seduzi-lo, ou seja, de presa passou a predadora, tal como as coisas acabaram, mais tarde), outra foi promovida, outra pelo contrário e acabou por deixar aquele emprego, etc e tal. Ora, todos estes episódios e difusão de tantas “histórias pessoais de vítimas de assédio – no passado, claro” fizeram-me recordar que afinal eu também tinha sido, um dia (no tal passado), assediado (e nesse sentido porque não aderir ao famigerado MeToo!). Era ainda um jovem advogado e tinha em mãos um processo de divórcio. Eu ocupava-me do jovem marido. A mulher dele era bastante atraente, sexy, enfim uma bela estampa de mulher (de início nem compreendi porque raio o tipo se queria divorciar de semelhante beleza, mas “quem vê caras não vê corações”, lá diz o povo, na sua sabedoria popular). Aquilo não estava a correr bem para a mulher dele (ao que parece, entre outras “razões” haveria adultério, cometido por ela, que se iria provar em tribunal e jogaria contra ela). Em causa estava (ou ficaria) a futura situação financeira dela, visto ser ele quem tinha o dinheiro (e não era pouco). Um dia recebo um pedido dela para a receber no escritório. Anui. Errado (como constatei posteriormente), mas era ainda um jovem advogado. A dita esposa (não gosto do termo, mas era assim), apareceu-me vestida de uma forma ousada, to say the least, sexy e provocante. E, ao fim de algum tempo, mostrou ao que vinha. Eu deixava de patrocinar o marido, ficava com ela, ganhava a causa para ela e como recompensa ela entregava-se-me (durante um determinado período, visto que, alguns meses depois iria para a África do Sul, “por razões pessoais e profissionais”). Independentemente de pagar, naturalmente, as custas processuais (munida, por conseguinte, de bons sentimentos, no que respeitava aos gastos judiciais). Foi incrivelmente sedutora, tentadora, insinuante, provocadora, enfim, fez os impossíveis para que eu cedesse. Mas, não cedi – o que não me impediu, no meu íntimo, de a achar incrivelmente atraente. Amuou, pretendeu choramingar, suplicou, etc (outro tipo de sedução), tudo isto a par de se ir revelando – pernas, colo/decote, boquinha, até mesmo um toque nas (minhas) mãos, gemeu, eu sei lá que mais teatro fez. Mas, mantive-me firme. Honra de advogado é imune a este tipo de assédio. À saída ainda me disse, com um sorriso maroto e sedutor: “Dr. Não sabe o que perde!” Acredito que sim, mas “outros valores se levantavam” (pensei comigo). Pedi-lhe que nunca mais me procurasse, quer no escritório, quer onde fosse. Voltou a amuar e desapareceu de vista. No Tribunal comportou-se como vítima, compondo um ar sedutoramente triste, para influenciar uma decisão. Não foi suficiente, mas ajudou a amenizar a decisão final daquele processo de divórcio litigioso. Era uma mulher que não olhava a meios para conseguir o que queria. E tentou aliciar-me e seduzir-me – hoje, seria assédio, suponho. Mas, não vou a correr para o MeToo queixar-me. Prefiro recordar aquele episódio de forma divertida.
P.Rufino

Um Jeito Manso disse...

Olá Francisco,

Tenho para mim que casos sérios e verdadeiros de assédio não haverá tantos quantos se apregoam.

À frente, quando responder á JV, vou acrescentar um aspecto.

Aqui digo que receio bem que tenha razão, que, com tudo isto, parece que estamos a andar para trás, a atolar-nos em moralismos que, sabido é, nunca acabam bem.

PS: Fiquei contente que tivesse gostado das fotografias das minhas coisas cá de casa.

Uma 5ª feira feliz.

Um Jeito Manso disse...

Olá JV,

Então também já anda a aproveitar as deslocações de um lado para o outro para se pôr a par das novidades. Eu não perco um semáforo...

Quando ao que diz: o tema é polémico e não há verdades absolutas. Mas acho que está a meter no mesmo saco realidades distintas. Há os estafermos que se aproveitam da confusão no metro ou no comboio. Não são assediadores: são simplesmente badalhocos, cobardolas, trogloditas. As mulheres não são assim, ordinárias e parvas? Pois. As mulheres, em geral, não são tão animalescas nem tão cobardolas.

Produtores de cinema glutões, a meu ver, estão na proporção inversa das jovens atrizes que fazem de tudo para ascender. De joelhos ou deitadas. Apareciam nas fotografias à ilharga dele. Sorriam, dengosas. Depois de serem famosas, aparecem a contar o que ele lhes fez. E que elas aceitaram que ele fizesse. Se não fizessem não conseguiam o papel no filme? Não sei. Até admito que não. A JV aceitaria que um fulano daqueles enfiasse a língua gorda na sua boca? Se calhar não. Olhe, eu não. Tentaria a minha vida por outro lado e, antes de sair de perto dele, dar-lhe-ia uma joelhada nos testículos e, quando ele se baixasse de dor, dar-lhe-ia um puxão de cabelos ou atirar-lhe-ia água pela cabeça abaixo.

Ou seja, é mau as práticas de assédio sexual. Mas, para mim, é como aquilo que disse das praxes: em geral, basta não comparecer.

Pior mesmo -- e assédio a sério -- é nas pequenas empresas quando os patrões assediam empregadas que precisam do trabalho para viver. Claro está que podem sempre não aceitar mas, lá está, aí pode estar em causa o dinheiro para viver. Aí, sim, é preciso coragem para não aceitar e para denunciar.

Abraço, JV. E dê cabo deles (no tribunal ou onde eles lhe surjam!)

Um Jeito Manso disse...

Olá Chevry!

Bom revê-lo! Anda tanto ao largo que, quando o vejo, faço uma festa.

E acha mesmo que o mundo não está perdido? Não me diga que sou uma espécie de alavanquinha de arquimedes...? Olhe, tomara que esteja certo.

E a ver se passa por cá com mais frequência. Ontem até me pôs a ir saber quem era o Millan Astray. Já viu? Nunca eu tinha ouvido falar em tal figurão.

Abraço, Che.

Um Jeito Manso disse...

Olá bela Janita,

Gracias pelas palavras. O Abraham Chevrolet é velho demais para a gente lhe poder dar 100% de ouvidos. Mas deixe lá, não faz mal, palavras simpáticas caem sempre bem.

Obrigada, Janita, e uma 5ª feira feliz.

Um Jeito Manso disse...

Olá P. Rufino,

Lá está, a sua mão para a escrita. Lê-se e revê-se a cena. Um dia tem que escrever as suas memórias. Com o seu percurso de vida, com o que já fez, por onde andou, deve ter histórias suculentas, umas picantes, outras cheias de suspense, haveria de ser bom de ler.

E que bem lhe deve saber a chuvinha depois do susto do fogo...

Dias felizes, P. Rufino.

Maria disse...

Ora viva, Jeitinho
Não a sabia com os comentários novamente abertos.
Sobre o assunto que aborda tenho que dizer-lhe que está completamente desfasada do mundo real
Deixo-lhe um link de uma reportagem da visão que também está no meu post

http://visao.sapo.pt/actualidade/sociedade/toda-a-historia-de-lucio-feteira-agora-em-livro=f633841

Há mulheres que se aproveitam? há
Mas estatisticamente está mais do que comprovado que os abusos são maioritariamente da parte masculina

também eu nunca precisei e recusaria e recusei alguém que me dissesse "queres ver o teu projeto aprovado? então tens que ma fazer isto..."

Não, ujm, não basta dizer não. O problema está no não ter medo do que vem a seguir

Com muita tristeza tenh que dizer-lhe que tinha-a por pessoa com uma maior capacidade de empatia, que conseguia ver para além das banalidades que aqui nos relatou.
Mas deixe lá que está dentro da maioria das mulheres que sendo inteligentes e bem sucedidas vivem em redomas

Um abraço, GG

https://www.youtube.com/watch?feature=share&v=sASXGuhsliM&app=desktop&fbclid=IwAR0_4toS4MweGIBWpI8mnVA1g1U2tPEEoWlUCqZLlMMO7RWU3TYuQZ1Mw-w




Anónimo disse...

"O problema está no não ter medo do que vem a seguir". Infelizmente, tenho que concordar com a GG.

Confesso-me aqui, me too pecadora: por vezes tenho uma tendência orgulhosa para não ir em "ondas" só porque são "ondas". Coisas de redes sociais. Parolices. Quando li o texto da Catherine Deneuve, pareceu-me ir um longe demais, provavelmente fruto de uma necessidade de auto-reafirmação do que as subscritoras em tempos fizeram ou deixaram de fazer, mas ao menos não era a "choradeira" de que se andava tanto a falar. Achava o "novo" feminismo e o MeToo um exagero, um histerismo. Aziz Ansari? Uma coisa normal, não é por as coisas não correrem como nos contos de fadas que há violência, abuso, importunação sexual. E tantos outros. E depois, parei. Mas parei mesmo. Obriguei-me. Pensei: calma, mas eu só li notícias de jornal, este foi acusado disto, aquele foi acusado daquilo. Uns excertos. Ainda não li uma única história ou crónica do Método. Fui ler. https://babe.net/2018/01/13/aziz-ansari-28355. Este é só um caso. Não, não é um caso de violação. É um caso de gravíssimo desrespeito para com o outro (a outra). De egoísmo. Não podemos aceitar que as pessoas, na procura da satisfação das suas necessidades e impulsos, sejam animais egoístas que desconsideram os seres humanos com quem se estão a relacionar. Fingir que estes comportamentos não condicionam é não ter o mínimo de noção. Fingir que dizer 'não' é fácil, sobretudo quando já se disse 'não', ainda que não com a boca, mas com gestos, com o corpo, é não ter um mínimo de noção. Verbalizar o que já foi ignorado ainda pode dar chatice, não se vá o tonto ofender e fazer qualquer coisa... Como essa, diferentes dessa, há muito mais casos, muito mais histórias. Quase sempre escritos por gente articulada, que não é indiferente à perspetiva do outro, mesmo que esse outro tenha sido o seu assediador. Gente que questiona a sua contribuição para o que aconteceu. Gente que nem sequer cita nomes.

Abraço,
JV

Maria disse...

Olá, JV
O que vem a seguir pode implicar não conseguir sobreviver.
O #metoo é muito mais do que a denuncia no mundo do cinema; depois que ver para além disso.
Ele é uma alavanca para esta tomada de consciência do direito ao nosso corpo porque inclusivé. direito ao nosso corpo é muito mais do que isso é a submissão forçada, individual e coletiva de um ser humano por outro. Conhece o livro "Diário de uma serva" de Margaret Atwood?
#metoo dá voz às operárias fabris dos Féteira, dos lanificios da Covilhã, dos sapatos do Ave... e tantos mas tantos outros que a lista seria enorme mas não resisto a deixar aqui uma short list dos casos que conheço uns diretamente e outos por interposta pessoa
- um pediatra que aproveitando-se da fragilidade emocional das mães de crianças com problemas fossem trissomia xxi ou autismo não passava sem as convencer e elas na angustia de os seus filhos poderem não ser em tratados cederam;
- um ginecologista que sob a ameaça de contar aos pais que a menina já tinha perdido a virgindade lhes exigia sexo oral durante a consulta
- um diretor de uma grande superficie que para elas terem uma boa avaliação que implicaria passarem a contratos sem termo lhes exigia umas noites de trabalho extra;
- o dono de uma fotocopiadora que só admitia alguma empregada depois de...
- Um orientador de doutoramento que durante n anos exigiu...
Fico-me por aqui...

Abraço, GG

Maria disse...

Esqueci de pôr este link

https://www.publico.pt/2018/10/14/sociedade/noticia/se-contasse-ia-ser-outra-vez-a-violada-a-maluca-a-mentirosa-a-puta-1847324

Maria disse...

Ramalho Ortigão ou Raúl Brandão não sei se ambos ou só apenas um deles num dos seus romances fala sobre os feitores e os capatazes e dos seus abusos sexuais que diariamente praticavam sobre os e as trabalhadores braçais.

Há também descrições não sei se neles se noutros autores, (estou a fazer um apelo à minha memória apenas para escritores portugueses) que falam igualmente dos senhores da casa grande que faziam o mesmo e como a iniciação sexual dos seus rebentos machos era feito com essas mulheres/raparigas quer elas quisessem ou não.
Serão apenas histórias de outros tempos? Não acredito. Talvez tenha diminuído porque este tipo de trabalho também teve uma enorme redução mas os ventos não auguram nada de bom. Será só escravatura no trabalho? hummmm tenho as minhas dúvidas mas lá está "quem iria acreditar"
https://www.sabado.pt/portugal/detalhe/denuncia-ha-trabalho-escravo-na-alentejo

Há relatos impressionantes sobre os abusos das faxineiras/diaristas no Brasil mas cá será que há diferenças subatânciais?
Um dia elas falarão como já falam estas refugiadas graças ao #metoo de hollywood

https://doquekalhar.blogspot.com/2018/10/para-alem-do-metoo-de-hollywood-aquilo.html


Maria disse...

Se por acaso passar por aqui alguém que entenda enviar o seu testemunho à helena Ferro de Gouveia deixo o email dela

Hpdgouveia@aol.com