domingo, abril 29, 2018

Na verdade, nada de especial
(excepto um "The lucky ones" que valeu um Golden Buzzer e 9 conselhos para não morrer infeliz)





Enquanto escrevo, ouço a chuva a cair copiosamente. Choveu muito hoje. Por volta das sete da tarde houve uma aberta e fomos à nossa faena. Discordamos na abordagem. O meu marido aborrece-se um bocado comigo porque diz que quero tratar o mato como um jardim e que os meus critérios são de ordem estética e não prática. Eu acho que não, que é podando criteriosamente os ramos de árvores e arbustos que limparemos melhor o terreno, não cortando tudo a eito. Então ele desforra-se, fazendo à maneira dele quando me apanha ao largo. Como é madrugador, quando estamos aqui, geralmente quando acordo e vou abrir as portadas do quarto, ouço o barulho da máquina ao longe e já sei que é ele que anda a cortar mato lá para baixo. Quando estou ao pé dele, tento que ele se alinhe com a minha maneira de ver e que seja criterioso: os ramos junto ao chão e os oblíquos da aroeira, os rebentos ladrões e os ramos baixos das azinheiras. Por exemplo. Como sempre, eu corto os mais finos e levo o mato para o 'campo de futebol', ele serra os ramos mais grossos e mais altos.


Com isto, nem démos pelo tempo a passar. O prazer que sinto em andar no campo -- no meio das árvores, ouvindo o chilreio dos pássaros, sentindo o perfume intenso do alecrim, do rosmaninho, da terra molhada, da madeira cortada de fesco, da ramagem das árvores, sentindo a terra fofa e fértil sob os pés -- é difícil de descrever. Só sei que, nestas alturas, me sinto verdadeiramente feliz.

Quando regressámos a casa eram oito e meia e ainda não era bem de noite. Mas tinha estado a choviscar e já estávamos meio molhados e, sobretudo, o ombro e braço do meu marido já estavam a doer-lhe mais.


Tivemos que mudar de roupa. Pus a minha a secar no aquecedor e os ténis ainda estão ao pé da salamandra. 

A sala está quentinha, acolhedora. De tarde, para além de pôr a roupa a lavar e, depois, a secar e de me ocupar com outras pequenas tarefas domésticas, estive a ler e, como sempre nos últimos tempos, o mesmo delicioso livro que, ou porque adormeço ou porque me forço a consumir em doses homeopáticas, próprias para uma boa degustação, vai rendendo, rendendo. No outro dia comentei isso com quem mo ofereceu que, naturalmente, ficou contente por eu estar a apreciar o seu presente: é cheio de subtilezas, disse eu. Ele disse: cheio de observações, cheio de ironia. E é mesmo. Livro bom. Boa história, boa escrita, bons personagens, tudo de bom. Dá vontade de reler cada passo acabado de ler. Vou assinalando bocadinhos, penso que gostava de partilhar convosco. Mas, na hora de os transcrever, não o faço, temo menorizar o livro reduzindo-o a excertos desgarrados dos quais nem seria possível perceber a riqueza dos sub-entendidos ou das alusões, por terem sido extirpados do contexto.


E é isto. Na verdade, hoje e sempre, não tenho nada de especial para dizer. Sou dada a coisas simples, sem história, sem complexidades. Não quero saber sobre coisas que não interessam, não tenho ambições impossíveis, não guardo rancores, não peço nada, agradeço tudo. E quando estou aqui, in heaven, entregue às coisas simples da existência, sinto que estou no meu habitat natural.

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Curiosamente, quando fui à procura de uma música que fizesse pendant com o que tinha escrito, a minha alma gémea -- o algoritmo do YouTube -- tinha para me mostrar não apenas o duo pai e filho, Jack and Tim Goodacre, a quem Simon Cowell concedeu o Golden Buzzer no Britain Got Talent deste sábado com uma maravilhosa canção composta por eles, The lucky ones, mas também um outro vídeo que vi de gostei bastante, concordando com cada palavra. Não está legendado mas a boa fluência facilita a compreensão. Espero que também gostem.



Don't Die Unhappy - learn these 9 life lessons | Tim Minchin



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As fotografias foram feitas este sábado, in heaven

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