terça-feira, agosto 18, 2015

Os frutos maduros in heaven


No post abaixo já mostrei um vídeo que, só de vê-lo, me fez ficar com os pés numa ansiedade. Sofrendo de vertigens como sofro, só de ver aquele maluco fiquei como se estivesse eu própria em vias de me despenhar da minha cadeira abaixo (passe a redundância), como se a cadeira estivesse suspensa sobre um desfiladeiro. Só visto. Olhem, uma coisa vos direi eu: vocês homens aí desse lado, por muito que queiram impressionar alguém, não tentem reproduzir o feito, ouviram?

Adiante. Tempo de paz e harmonia.

Os meus dias não têm sido fáceis. Preocupações, trabalhos, afazeres, compromissos, solicitações de toda a espécie. Há já algum tempo que não consigo aquele tempo demorado de que tanto preciso, para estar comigo mesmo, no campo, sem nuvens no horizonte, sem pressas para estar a horas aqui ou ali.

Este sábado foram apenas umas quatro ou cinco horas, uma fugida apressada. Mas que bem me soube. Levei a comida para cozinhar lá - e tanto que eu gosto de sentir o cheirinho a evadir-se pela chaminé, e andar a passarinhar cá fora adivinhando o sabor dos tachos ou do forno.

E lá andei fotografando o sol, a terra quente, a humidade que se adivinhava no céu que se acinzentava. E a fruta toda a amadurecer, doce, o sumo a estalar.

Não podendo oferecer-vos uma cesta de fruta -- e tanto que eu gostaria de o fazer, tanto que tenho vontade de agradecer a vossa presença aí desse lado, mesmo em tempo de calores e férias -- mostro-vos algumas fotografias. Mas, para nos acompanhar, permitam que aqui coloque outra vez uma música que me encanta e, vá lá saber eu porquê, me emociona.


 "Gota de água" (música tradicional do Alentejo)
Ronda dos Quatro Caminhos com a Orquestra Sinfónica de Córdoba



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As pêras estão doces, pesadas. A muitas já os pássaros gulosos deitaram o bico, descarados, desafiam-me, querem antes de mim chegar ao açúcar que há no interior destes corpos macios e inocentes. Passarada indecente que não tem pudor nem respeito, atiram-se às carnes macias das pêras, deixam-nas mordidas, as provas do pecado bem à vista. 

Não esta aqui em baixo, que a esta escolhi por estar ainda intacta. Fotografei-a e, depois, comi-a. Boa, boa.




O calor faz as azinheiras desfazerem-se da folhagem e o chão e os bancos de estão cobertos de confetis castanhos dourados, estaladiços, que, com o tempo, vão amaciando. Se eu lá estivesse com tempo, entretinha-me a varrer porque gosto muito de varrer e gosto de encher o carrinho de mão e depois ir com ele até lá ao fundo e despejá-lo na terra junto aos pinheiros, grandes camadas de matéria orgânica que vai amolecer e transformar a terra em terra ainda mais fértil. Assim, vagueio por aqui, sinto o tapete sob os pés, e acho-o tão bonito.




Vim com os pés arranhados. Enfio-me pelo meio do mato em busca das silvas carregadas de amoras. Estão negras de tão doces, sumarentas, como-as todas - pudesse eu passar um dia só a comer amoras, tão boas. E têm uma cor tão linda, azeviche, azul ultramarino asa de corvo. Gosto de fotografar estas pequenas hastes que, segundos depois, estão nuas, as amoras já todas misturadas no meu corpo.




E os figos, rebentados, um pingo de mel escorrendo deles, lágrimas doces, doces, e eu vou para os apanhar para trazer mas, mal lhes deito a mão, carnudos, logo os como, às vezes com casca e tudo. Há uns que, por dentro, são cor de carne clara, gulosos, e outros, os que prefiro, que são tingidos, rubros, cor de sangue, um doce com um toque quase de picante. As minhas avós diziam que eram os pardinhos. Não sei porque lhes chamavam elas assim mas são os melhores.




Todo o campo é uma mistura vistosa de cores. Aos verdes das árvores juntam-se os ruivos das flores do campo, os espigados dos arbustos, os dourados das ervas que amarelecem. E tudo cheira intensamente, as figueiras, os pinheiros, os eucaliptos, o alecrim, o rosmaninho. O calor faz com que os perfumes se soltem dos corpos da natureza.

Para muitos de vós isto será mato e pensarão que é absurdo tanta conversa sobre mato. Mas para mim é mais do que isso, para mim é a perfeição da natureza, e, nestes momentos, todos os meus sentidos estão ao serviço do que a natureza me oferece. E é tanto.




Nasce erva por todo o lado. E flores campestres em todo o sítio. Precisa de manutenção este lugar, precisa que tenhamos tempo para aqui vir com cuidado aparar o que nasceu onde não devia. Mas, enquanto isso não acontece, entretenho-me a maravilhar-me com as flores verdadeiras que se juntam às dos azulejos que forram canteiros dentro dos quais crescem vigorosas árvores. Ando por aqui e parece-me este um mundo encantado, não um campo cheio de mato.




As uvas estão a ganhar cor. Nas videiras que se esgueiram junto a este pequeno muro coberto de azulejos, os cachos enormes, pesados, quase parecem pinturas que se misturam com as sombras que se reflectem na superfície espelhada.

Apetece-me comê-las mesmo assim para ver se os pássaros não me levam a melhor. Ou para ver se o sol não as queima antes de eu lá chegar a colhê-las. Doces, sumarentas, fotogénicas. Mas poupo-as, devem seguir o seu curso: amadurecer, ganhar açúcar, brilhar ao sol, tornarem-se sedutoras, fazerem com que alguém, bicho ou gente, junto delas caia em tentação.



As flores e os frutos in heaven. Amor e perdição.

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Relembro que, no post abaixo, há maluquice da grossa. Um maluco bateu um record e não sei como uma coisa daquelas foi possível. Só visto.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, boa sorte e um dia particularmente feliz, com tudo, tudo de bom.
Que os vossos dias se alegrem e que sintam que a vossa vida vai melhorar. 

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4 comentários:

Anónimo disse...

Oras meu querido, que ia bem as frutas em uma cesta isto é verdade, mas vos agradeço as palavras, as fotos e os mimos de todos os dias.

Amor e perdição, beijus amorosos.

Anonyma

Rosa Pinto disse...

Uma maravilha. Adoro figos e apanhar amoras. Uma delicia de um dia no campo. Bom dia.

Rosa Pinto disse...

Voltei cá. Hoje e faz de conta que estou no campo, muitos figos por aqui. Já me lambuzei com uma boa meia dúzia deles.

Anónimo disse...

Cá por casa é a minha mulher que apanha as amoras que depois comemos com umas natas, ou iogurte grego, ou até misturadas com mirtilos, ou morangos, ou framboesas, ou tudo junto, com as tais natas, ou iogurte. Nessas ocasiões junto-lhe um pouco de vinho da Madeira. Fica óptimo!
Jardim também é com ela, quem dele cuida carinhosamente, embora a mim me calhe cortar a relva, onde há e aparar sebes, ou, até, pintar portões, quando calha.
Isto fez-me recuar a um seu Post anterior, sobre livros, pois como ambos gostamos de ler (e agora é bom estar no jardim a ler), embora coisas diferentes, ali também há critérios, ou divisões, ou seja, nos meus mexo e arrumo eu, nos dela mexe e arruma ela. Jamais permitiria arrumos nos meus e o mesmo diz ela dos dela.
Voltando à jardinagem, sou pouco conhecedor de plantas (já não de árvores), mas lá acompanho quando quer ir comprar algumas e depois plantá-las por cá.
P.Rufino