No post abaixo mostro um vídeo sobre a situação desoladora de muitos trabalhadores precários japoneses, uns desgraçados, explorados até à medula, que têm que viver de forma ultrajante (talvez seja este o objectivo de Passos Coelho quando diz que, em Portugal, ainda é necessário reduzir mais os custos do trabalho).
Ainda mais abaixo tenho um outro vídeo interessante, onde, de uma forma abrangente, um jovem mostra a sua visão do que a espécie humana está a fazer a si própria e ao planeta. Interessante.
1.
(…) mais frequentemente do que imaginamos, nos deixamos tomar pela pura selvajaria, como indivíduos e como sociedades. A descida à barbárie persiste como alguma coisa que não aprendemos a controlar. Onde buscar, porém, nessas horas, a sabedoria? A sugestão que a escritora aponta vale bem que a tomemos a sério. Escreve ela:’ Contra tais instintos primitivos e poderosíssimos temos apenas isto, a capacidade de nos examinarmos de outros ângulos e de outros pontos de vista’. Isto é, temos a possibilidade de sair do isolacionismo do que sentimos ou espontaneamente decretamos, aceitando o confronto com olhares e afirmações que adensem (e, não raro, reconfigurem) a nossa precipitada perspectiva inicial. Como se a porção de conhecimento e verdade que o outro possui fosse o remédio para resgatar-nos do equívoco das nossas estreitas visões.
Ora, é aqui que o texto de Doris Lessing se assemelha a um murro no estômago. Porque, segundo ela, as gerações futuras espantar-se-ão connosco precisamente por termos alcançado um nível incrível de conhecimento (em tantos âmbitos humanos e científicos, por exemplo, nós sabemos mais do que todos os que nos precederam) e isso não nos ter tornado melhores pessoas.
Somos a sociedade da informação, fizemos do mundo uma aldeia onde tudo comunica, potenciamos ao máximo a actualidade e as técnicas para a sua difusão, mas permanecemos, em tantos aspectos, cegos e inflexíveis. Para recorrer a uma imagem de Lessing, 'a mão esquerda ainda não sabe - nem quer saber - aquilo que faz a nossa direita'.
2.
Sabe, ao longo da vida tenho feito umas coisas de que acho que as pessoas gostam... Escrevi uns livros, ensinei muita gente, ajudei alguns a começarem na profissão.... Mas nada disso vai ficar agarrado a mim. Isso são ideias, conceitos, malabarismos racionais que procurei que fossem sempre consistentes, mas não têm pele...'
Pele? Fiz um ar genuinamente espantado. Juro que não foi aquela técnica estafada dos terapeutas de repetir a última palavra do doente. 'Sim, pele. O que eu gostaria de deixar cá as minhas memórias dos meus abraços, das minhas mãos, do meu cheiro, do tom da minha voz, das minhas gargalhadas... Vou-lhe confessar uma coisa: estou-me nas tintas para que me citem em trabalhos científicos, tenho a perfeita noção de que desapareço intelectualmente em pouco tempo, mas sofro a pensar que as pessoas de quem gosto muito - e já lhe disse quem são - percam a memória da minha pele. (...) toda a vida achei que o silêncio tem cor, cheiro, temperatura, gosto, e, por isso, o que eu gostava mesmo era de ser o silêncio que fica'.
3.
Tenho andado com um poema na cabeça, mas a cabeça anda a rebentar de nada, tão falida que se encontra, que não o tenho conseguido resgatar para as folhas de nenhum caderno. Se uma história, se um poema, me pudesse salvar, se houvesse alguma verdade que me pudesse redimir (redimir de quê?), talvez me esforçasse mais, talvez juntasse as poucas forças que me restam, neste tempo de falência total, e talvez o tirasse de dentro de mim. Talvez ficasse um pouco aliviado; mas neste tempo que vivemos duvido daqueles que dizem que só a poesia nos salva, duvido de mim.
Se uma história nos pudesse salvar, escreveria uma daquelas histórias felizes, porque todas as histórias são felizes se soubermos onde as acabar; escreveria uma história que acabasse no momento em que ficássemos juntos para sempre. Porém, a vida não se compadece com as histórias que vamos reescrevendo dentro de nós, construindo a nossa maior ficção - talvez a única - para darmos sentido àquilo que não tem sentido nenhum, e segue o seu caminho, imparável. E eu vou a caminho do terceiro dia sem conseguir dormir.
...
- O primeiro texto é um excerto de 'Que a tua mão esquerda saiba o que faz a direita' de José Tolentino Mendonça da série 'Que coisa são as nuvens' do Expresso do sábado 11.abril.2015
- O segundo faz parte de 'O silêncio que fica' de José Gameiro da série 'Diário de um Psiquiatra' do mesmo Expresso
- O terceiro é um excerto de 'Tinha uma história para vos contar... Coisas várias, que talvez não tenham interesse para ninguém... Mas, enfim, isto é apenas um blog - apenas um diário público...' do André no blogue Ainda que os amantes se percam...
- A música é de Gabriel Fauré - Après un Reve, Cello and Piano
- A música é de Gabriel Fauré - Après un Reve, Cello and Piano
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