Ora bem. No post abaixo há uma história com uma moral muito útil e, de bónus, uma prova científica de que afinal os homens conseguem pensar em duas coisas ao mesmo tempo.
Mais abaixo ainda há uma 'cena' que é uma maravilha e uma maluquice e que, de forma alguma, deve ser reproduzida pelos meus Leitores, especialmente pelos que têm amor à vida.
Ryuichi Sakamoto 'The Sheltering Sky'
Quando penso em ter tempo livre para mim, por exemplo um dia que me reforme e que possa dispor livremente do meu tempo, penso em dedicar parte dele a escrever. Nada a sério, que para isso não me parece que tenha suficiente competência, mas para estar entretida ou para me descobrir melhor.
No entanto, quase tão importante como ter tempo suficiente para poder escrever coisas com princípio, meio e fim, é pensar onde. Aliás, se penso em escrever, quase que a primeira coisa em que dou por mim a pensar é nos aspectos logísticos. E, confesso, a coisa não é pacífica. Não quero estar isolada mas também não quero estar distraída. Não quero estar fechada mas também não quero dar por mim a olhar pela janela, não quero estar confinada ao espaço estrito do computador mas sei que, mal dou por mim, estou cercada de livros.
Imagino-me numa mesa grande de madeira. Nas pontas alguns livros mas, no sítio onde escreveria, um espaço aberto. Talvez com uma jarra com flores. Flores frescas, perfumadas.
Quando estou in heaven já experimentei escrever na mesa da sala de jantar mas não me agrada muito, parece que estou desacompanhada.
Mas se me ponho a escrever na escrivaninha da sala de televisão, parece que não tenho o distanciamento suficiente.
Se vou para a rua, para a mesa que está debaixo do telheiro, ou há luz demais ou calor ou frio ou vento ou reparo que devia varrer ou que devia regar.
E depois há os aspectos prosaicos: uma pessoa tem vontade de escrever mas não deixa de ter a sua vida normal e ora é preciso ir ao supermercado, ora é hora de fazer o almoço, ora é hora de ligar à mãe e aos filhos, ora é preciso arrumar a casa, ora tudo isso.
Não sei como fazem os escritores de verdade. Volta e meia leio que pegam na trouxa e vão para um hotel. Mas eu isso acho que não, acho que me parecia impessoal, impróprio para uma pessoa mergulhar dentro de si. Mas depois penso que talvez num hotel ao pé do mar fosse possível e, imagine-se, dou por mim a pensar em Saint-Malo. Não sei porquê mas acho que em Saint-Malo poderia escrever muitas páginas.
Mas se me ponho a escrever na escrivaninha da sala de televisão, parece que não tenho o distanciamento suficiente.
Se vou para a rua, para a mesa que está debaixo do telheiro, ou há luz demais ou calor ou frio ou vento ou reparo que devia varrer ou que devia regar.
E depois há os aspectos prosaicos: uma pessoa tem vontade de escrever mas não deixa de ter a sua vida normal e ora é preciso ir ao supermercado, ora é hora de fazer o almoço, ora é hora de ligar à mãe e aos filhos, ora é preciso arrumar a casa, ora tudo isso.
Não sei como fazem os escritores de verdade. Volta e meia leio que pegam na trouxa e vão para um hotel. Mas eu isso acho que não, acho que me parecia impessoal, impróprio para uma pessoa mergulhar dentro de si. Mas depois penso que talvez num hotel ao pé do mar fosse possível e, imagine-se, dou por mim a pensar em Saint-Malo. Não sei porquê mas acho que em Saint-Malo poderia escrever muitas páginas.
Agora estou aqui na sala, sozinha, a mesa pejada de livros, um candeeiro de pé iluminando o computador, a televisão ligada. Talvez conseguisse escrever aqui mas só de noite. Parece que aqui só de noite quando a cidade dorme e a chuva cai sozinha na rua, escorre aqui na janela, uma solidão boa.
Contudo, aqui, assim, acho que só me dá para escrever coisas à toa.
Contudo, aqui, assim, acho que só me dá para escrever coisas à toa.
Mas estou com esta conversa porque tenho aqui comigo um livrinho que me está a agradar muito. Leio aos bocados, não tenho tempo para mais, mas estou a gostar mesmo. Chama-se 'La cabaña de Heidegger - un espacio para pensar' de Adam Sharr.
Desde el verano de 1922, el filósofo Martin Heidegger (1889-1976) comenzó a habitar una pequeña cabaña en las montañas de la Selva Negra, al sur de Alemania. A lo largo de los años, Heidegger trabajó desde esa cabaña en muchos de sus más famosos escritos, desde sus primeras conferencias hasta sus últimos y enigmáticos textos.
Leemos en su introducción “Este libro trata de una intensa relación entre el lugar y la persona. En el verano de 1922, Martin Heidegger (1889-1976) se mudó a una pequeña cabaña construida para él en las montañas de la Selva Negra en el sur de Alemania. Heidegger llamó a este edificio, de aproximadamente 6×7 metros en planta “die Hütte (la cabaña). En ella trabajó en muchos de sus más famosos escritos, desde sus primeras conferencias, que cautivaron a los estudiantes, y sus primeros apuntes del libro “Ser y Tiempo”, hasta sus últimos y tal vez más enigmáticos textos.
Heidegger pensó y escribió en la cabaña a lo largo de cinco décadas, a menudo solo, reclamando una intimidad emocional e intelectual con el edificio, sus alrededores y el paso de las estaciones.
Heidegger pensó y escribió en la cabaña a lo largo de cinco décadas, a menudo solo, reclamando una intimidad emocional e intelectual con el edificio, sus alrededores y el paso de las estaciones.
Para Heidegger, Todtnauberg fue mucho más que un emplazamiento físico. En 1934 hablaba de entender su obra filosófica como parte de las montañas y de que el trabajo le encontraba a él junto con el paisaje.
Se concebía a sí mismo como un escritor sensible, sugiriendo que la filosofía transmutaba el paisaje en palabras a través de él, casi sin intermediarios.
El filósofo aseguraba que había un sustento conmovedor en el clima cambiante de la localidad, el sentido de interioridad del edificio, la lejana vista a los Alpes y la primavera. Atribuía una “ley oculta” a la filosofía de las montañas.
Mientras que algunos han encontrado un valor en el provincialismo de Heidegger, otros encuentran penosa su abdicación de la acción y su tendencia al romanticismo, dado su destacado compromiso con el régimen nazi en la Alemania de la década de 1930.
Al abordar los escritos de Heidegger - en especial a los que se refieren al “habitar” y al “lugar”, que han interesado a los arquitectos - es importante considerar las circunstancias en las que el filosofo se sintió “transportado” dentro del “propio ritmo” de las obras .
Se concebía a sí mismo como un escritor sensible, sugiriendo que la filosofía transmutaba el paisaje en palabras a través de él, casi sin intermediarios.
El filósofo aseguraba que había un sustento conmovedor en el clima cambiante de la localidad, el sentido de interioridad del edificio, la lejana vista a los Alpes y la primavera. Atribuía una “ley oculta” a la filosofía de las montañas.
Mientras que algunos han encontrado un valor en el provincialismo de Heidegger, otros encuentran penosa su abdicación de la acción y su tendencia al romanticismo, dado su destacado compromiso con el régimen nazi en la Alemania de la década de 1930.
Al abordar los escritos de Heidegger - en especial a los que se refieren al “habitar” y al “lugar”, que han interesado a los arquitectos - es importante considerar las circunstancias en las que el filosofo se sintió “transportado” dentro del “propio ritmo” de las obras .
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Poema de Heidegger recitado por Abujamra
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As fotografias mostram a cabana de Heidegger
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Relembro que, por aí abaixo há mais dois posts, um de humor e outro de natureza, desporto e loucura.
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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma quinta-feira do melhor que há.
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3 comentários:
Pensar e escrever na solitária cabana de Heidegger, de seis metros por sete, na umbrosa e densa Floresta Negra, onde a tranquilidade e a quietude nos deixam antever a essência das coisas, deve ser muito diferente de escrever em cima da mesa da casa de jantar, com a televisão ligada, uma agenda entreaberta, um telemóvel a tocar e mil afazeres por executar, como acontece com a maioria dos simples mortais. É caso para dizer que, assim, não há condições :) Gostei muito do seu post.
Lindo.
Cabana rima com juventude, digo eu.
Quando a etapa do tempo totalmente livre for alcançada, uns passeios na margem do rio, uma esplanada com um livro, um espetáculo, uma conversa,… coisas simples que que nos enriquecem. E escrever… fazer contas é que não!
Martin Heidegger foi um dos mais destacados filósofos e intelectuais não só do seu tempo, mas de sempre. Muitos dos grandes nomes (filósofos) que se lhe seguiram (JP Sartre, por exemplo) acompanharam o seu trabalho e inspiraram-se nas suas ideias e pensamento. Entre alguns dos seus ilustres estudantes (na Universidade de Friburgo), é de destacar um dos maiores pensadores e filósofos do pós-guerra e até hoje, do que viria a ser, de algum modo, a Nova-Esquerda, ou pelo menos, que muito a influenciou: Herbert Marcuse. Embora, as raizes de Marcuse se encontrem igualmente e talvez sobretudo em Marx e Hegel. Mas, indiscutivelmente, Martin Heidegger teve uma influência indiscutivel. Curioso é registar que Hannah Arendt ter sido estudante de Heidegger. Ao que li num livro que possuo aqui em casa, Arendt terá tido um “affair” com o seu professor, o que poderá ter contribuído para o seu (dela) testemunho para ajudar a reabilitar M.Heidegger, no pós-guerra, tendo em conta sua atitude “dúbia” pró-nazi, mais tarde "esclarecida" e que permitiu a sua reabilitação e a possibilidade voltar a ensinar. Herbert Marcuse, tanto quanto posso saber, não se terá referido a essa situação. A sua obra de maior destaque (de Marcuse) “O Homem Unidemensional” (possuo a versão inglesa, que aconselho a quem a queira ler, o fazer com vagar, disposição e atenção q.b, visto ser um livro cuja leitura não é de fácil acesso), que terá “bebido” alguma influência em Heidegger, veio a ser, mais tarde, objecto de análise crítica da parte, entre outros, de Paul Mattick, cujo livro possuo aqui em casa e que, aqui há tempos, me deu para reler. No fim de contas, muitos destes teóricos e filósofos da Nova Esquerda acabaram, de algum modo, por sofrer a influência do pensamento de Martin Heidegger. Indiscutivelmente, um dos mais marcantes e profundos filósofos europeus. Num artigo que guardei, de tempos idos, num jornal já desaparecido, lá vem mencionada a influência de Heidegger sobre Marcuse (que a mim me marcou bastante).
P.Rufino
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