No post abaixo, falei de Herberto Helder. Não gosto de despedidas pelo que não sabia bem como falar dele sem me tornar vulgar. Por ter tido uma pena muito grande não quis deixar de referir a sua morte mas, confesso, foi com dificuldade e alguma relutância que o fiz.
Mas isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra.
Infelizmente o meu tempo é sempre curto e, por isso, o que aqui vou transcrever resulta de não mais do que abrir, ler, folhear, ler, deter-me aqui e ali, aquela leitura picada que me agrada mas que, em alguns casos, me deixa frustrada pois o que me apetecia era reclinar-me debaixo de uma árvore e ler devagar, devagar, pensar nas palavras lidas, talvez lê-las em voz alta para ouvir a sua toada ou sentir-me mais próxima de quem as escreveu. Mas um dia será.
Comprei uma edição muito bonita das Confissões de Santo Agostinho com prefácio de Eduardo Lourenço, um livrinho que parece um missal.
Infelizmente o meu tempo é sempre curto e, por isso, o que aqui vou transcrever resulta de não mais do que abrir, ler, folhear, ler, deter-me aqui e ali, aquela leitura picada que me agrada mas que, em alguns casos, me deixa frustrada pois o que me apetecia era reclinar-me debaixo de uma árvore e ler devagar, devagar, pensar nas palavras lidas, talvez lê-las em voz alta para ouvir a sua toada ou sentir-me mais próxima de quem as escreveu. Mas um dia será.
Escolhi um pequeno excerto do capítulo 30, Tríplice Tentação, do Livro Décimo apenas para poder fazer contraponto com um excerto de um outro livro, A Vida é Breve, no qual Jostein Gaarder ficciona a carta de Flória Emília, 'a mulher com quem Santo Agostinho viveu antes de escolher afastar-se do amor humano para conquistar o amor divino'.
Há no interior do homem tanta inquietude que não está ao alcance de nenhum Deus - nem de nenhuma mulher - poder apaziguá-la.
George Bataille - (no prefácio)
Mandais-me, sem dúvida, que me abstenha da concupiscência da carne, da concupiscência do mundo. Ordenaste-me que me abstivesse das relações luxuriosas. Quanto ao matrimónio, apesar de o permitirdes, ensinaste-me que havia outro estado melhor. E porque mo concedestes, abracei-o antes de ser nomeado dispensador do vosso Sacramento.
Mas na minha memória, de que longamente falei, vivem ainda as imagens das obscenidades que o hábito inveterado lá fixou. Quando, acordado, me vêm à mente, não têm força. Porém, durante o sono, não só me arrastam para o deleite, mas até à aparência do consentimento e da acção. A ilusão da imagem possui tanto poder na minha alma e na minha carne que, enquanto durmo, falsos fantasmas me persuadem a acções a que, acordado, nem sequer as realidades me podem persuadir.
Meu Deus e Senhor, não sou eu o mesmo nestas ocasiões? Apesar disso, que diferença tão grande vai de mim a mim mesmo, desde o momento que ingresso no sono até àquele tempo em que de lá volto!
(in 'Confissões' de Santo Agostinho)
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Baseada nesta confissão concluo que ainda não te deixaste castrar. Sentes a minha falta de vez em quando? Não serão as minhas recordações e os nossos antigos 'hábitos' que te visitam nos sonhos? Espero que não te tenhas deixado castrar ainda, Aurélio, tu que fostes outrora tão vigoroso no meu leito. Podias ter arrancado os olhos, como fez Édipo ou cortado a língua, se não o fizeste até agora, é porque ainda desejas os meus beijos.
O teu sexo era também um órgão sensual. Ou estarei enganada, Aurélio? Falas constantemente do 'prazer sensual' mesmo quando te referes ao deleite do amor.
Crês tu por acaso que os teus olhos ou os teus ouvidos são uma criação divina superior ao teu sexo? Pensas a sério que algumas partes do corpo humano são, perante Deus, menos dignas que outras?
(in 'Vita Brevis' de Jostein Gaarder)
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A música é Only The Winds - Ólafur Arnalds
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Relembro que sobre as palavras de Herberto Helder - que parecem vindas do interior da terra, do ventre húmido das mulheres que ele amou ou das patas das que correm na noite como éguas abertas - tenho um post já aqui abaixo.
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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quarta-feira. Com serenidade. E amor.
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1 comentário:
"A vida é breve, mas cabe nela muito mais do que somos capazes de viver."
José Saramago
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