domingo, dezembro 01, 2013

"Nigela Lawson é viciada em cocaína e em comprimidos". "Bárbara Guimarães é alcoólica e também viciada em comprimidos". Ambas são figuras destacadas no panorama televisivo, ambas conhecidas também pela sua sensualidade. Divorciaram-se ambas na sequência de queixas de violência doméstica por parte dos maridos, maridos esses, respectivamente Charles Saatchi e Manuel Maria Carrilho, que, desde que as acusações vieram a lume, têm feito uma sistemática campanha para arrasar a imagem das ex-mulheres. Não sei se são culpados das acusações de agressões mas lá que são responsáveis por violentas campanhas de violência mediática, lá isso são. E escrevo isto quando sei que este sábado foi morta outra mulher (Celina, 47 anos, Castro Verde) na sequência de longo historial de violência doméstica. A 34ª vítima este ano.


Há uns meses atrás o mundo foi surpreendido ao ver a sensual Nigella a ser agredida em público, num restaurante, pelo marido. Na sequência disso ela pediu o divórcio e ele viu a sua reputação arrasada.

Mas eis que agora os jornais estão cheios de uma revelação não menos surpreendente. Nigella nos últimos 10 anos terá sido consumidora de cocaína e de comprimidos em larga escala. O marido, o milionário Charles Saatchi, nunca desconfiou. Supostamente, como contrapartida para se manterem caladas e sobretudo para que o marido nem sonhasse com o que se passava, as duas ex-assistentes dela, as irmãs Grillo, teriam tido permissão da Higella (como agora Saatchi lhe chama numa alusão ao seu suposto estado de pedrada - high) para gastarem o dinheiro que quisessem com o seu cartão de crédito.


As irmãs foram acusadas de desvio de dinheiro da conta de Nigella e, em tribunal, defenderam-se contando a 'verdade'. Claro que Saatchi não se tem esquivado a dissertar sobre os condenáveis hábitos da mulher, hábitos esses que diz que desconhecia. Por causa disto, já se fala na possibilidade de Nigella ser despedida do Channel 4 onde agora tem estado a trabalhar como júri num programa de culinária. E, seja como for, de vítima rapidamente está a passar a culpada perante a opinião pública.

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Também Manuel Maria Carrilho não se tem cansado de revelar com todo o pormenor os hábitos descontrolados de Bárbara Guimarães que vão desde tomar diariamente dezenas de comprimidos, a beber vinho até à embriaguez, a encher-se de silicone, a viver obcecada com a idade e com o aspecto físico, e sempre de rastos a seguir a cada apresentação de galas ou coisas do género. A partir das entrevistas que ele tem concedido quase ficamos a pensar que, como mãe, Bárbara Guimarães deixa muito a desejar e, que, como pessoa, é fútil e desorganizada.


A semana passada, uma vez mais na fila do supermercado para pagar, deitei mão a uma revista e fiquei, uma vez mais, petrificada com a maldade de Carrilho ao dizer tudo aquilo, com desumano detalhe. Destrói-a. Seja ou não verdade, uma coisa é certa: quem a vir de novo a trabalhar vai olhar para ela de uma outra maneira. 

Bárbara Guimarães regressa aos écrans de televisão este domingo, apresentando o Factor-X. 


Imagino como se deve estar a sentir, a pressão, a insegurança. Como já aqui o disse anteriormente não sou especial admiradora dela mas, independentemente disso, lamento o que lhe está a acontecer e só espero que consiga reunir forças para enfrentar com dignidade este e todos os desafios que tenha pela frente. 


Sofrer humilhações em privado é coisa insuportável. Sofrê-las em público deve ser mil vezes pior. Por isso, é de admirar a força, a coragem, a capacidade de superação que pessoas como Bárbara Guimarães ou Nigella Lawson demonstram quando, depois de tudo o que vêem escrito sobre si próprias, conseguem manter-se de pé, cabeça erguida, a darem o peito às balas. 

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E eu fico a pensar se o que está a acontecer com Nigella Lawson e com Bárbara Guimarães não é aquilo que as mulheres que são vítimas de violência doméstica mais temem: que, apresentando queixa contra os maridos, venham a ser objecto de vinganças, de maldades, de destruição? O que é isto senão uma destruição sistemática, implacável em praça pública? É uma coisa aterradora. É que mesmo que uma consuma cocaína, outra beba, ou que tenham pavor de serem postas de parte nas televisões onde trabalham, ou que façam qualquer outra coisa, isso não deveria nunca ser tão humilhantemente exposto na praça pública onde serão, por muitos, crucificadas e desprezadas. 

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Este sábado Celina, uma mulher de 47 anos com 3 filhos, saíu de casa. Ia levar a filha de 9 anos à patinagem. O ex-marido saíu-lhe ao encalço e, ali mesmo, atingiu-a com um tiro na cabeça. Morreu. A filha de 9 anos terá assistido ao crime. Diz a vizinhança que, quando estavam juntos, era conhecido o historial de violência doméstica. Dizem que, depois da separação, o ouviam dizer que ainda acabava com ela. Acabou mesmo. 




Celina foi a 34ª mulher a ser assassinada este ano em Portugal por maridos, companheiros ou ex. Não entram nesta contabilidade as mulheres cujo carácter é destruído na praça pública e que, não sei como, conseguem continuar a parecer que estão vivas.

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Permito-me informar que, para conhecerem a opinião de outro instigador da violência em Portugal, poderão ler o meu post a seguir onde falo da entrevista do filósofo Rui Nunes concedida ao Expresso deste sábado

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E, por hoje, por aqui me fico. 
Desejo-vos, meus Caros Leitores, um domingo muito bom, vivido em paz.

5 comentários:

Alice Alfazema disse...

Talvez, os vícios sejam o efeito consequência daquilo que passaram, todos sabemos que os vícios são tocas onde escondemos as amarguras.

Realmente somos uns mansos, também isso se deve à violência política exercida ao longo de décadas. A violência nem sempre dói, tal como a violência doméstica, ela pode ser exercida com requintes de malvadez sem que deixe nódoa negra, é isso que este povo sente e não sabe, é uma servidão muda, enraizada nos genes.

Anónimo disse...

A violência doméstica é uma ofensa que deveria merecer do Legislador, em minha opinião, uma punição mais severa. Se olharmos para o que dispõe o actual Código Penal, no seu artº 152º, parágrafo 3º, alínea b) podemos constactar alguma “bondade” quanto ao agente desses maus tratos que resultaram na morte do/a cônjuge, visto só lhe dever ser aplicado uma pena de “3 a 10 anos” de prisão; com um bom advogado, alegando, por exemplo, bom comportamento anterior do réu (hoje somente arguido) e outro tipo de atitudes “da parte da vitima”, embora já morta, é sempre possível ao arguido conseguir da parte do tribunal uma condenação até, digamos, um máximo de 5 ou pouco mais anos, a não ser que existam por demais evidências, ou provas, por exemplo, provenientes de testemunhos anteriores, de que a vítima estava há muito em perigo (a tal censurabilidade ou perversidade do agente). Não se conseguindo demonstrar, ou provar, isto mesmo em tribunal, o dito arguido poderá escapulir-se da cadeia ao fim de uns 3 a 4 anos, mais coisa menos coisa, (por vezes um pouco mais). E, deste modo, a violência doméstica, esmagadoramente praticada por homens sobre as suas mulheres ou companheiras, acaba por raramente ser severamente punida, do ponto de vista penal. O CP em vigor, em muitos aspectos, este é um deles, é, em minha opinião, demasiado benévolo, digamos. Não é apenas neste caso, mas noutros, como no combate à corrupção, tráfico de influências, etc. Mesmo nos casos de homícídio a moldura penal poderia ter ido mais longe (tal como no caso da pedofilia), enfim. Para se compreeder o porquê deste CP convirá ler o seu “preâmbulo”, ou explicação. Embora sejam de se reconhecer as suas intrínsecas boas intenções, a verdade é que o seu conteúdo está desadequado à realidade. Impor-se-ia, talvez, um conjunto de molduras penais mais severas, para uma boa parte dos crimes que se praticam e ali estão previstos e são punidos. Mas, tal levar-no-ia a uma longa abordagem sobre estas questões que passam igualmente por uma alteração de comportamentos sociais, que implicariam uma profunda reforma de valores actualmente vigentes (ou ausência deles), de atitudes, etc.
P.Rufino

Um Jeito Manso disse...

Olá Alice rodeada por alfazema,

Concordo consigo.

A dor que se vai infligindo devagar, de forma surda, sem que ninguém de fora perceba bem.

As formas que se arranjam para ir suportando as agruras.

Mulheres que sofrem o horror da violência, povos que sofrem a violência de governos que os maltratam.

Nem sempre é fácil descobrir a coragem para dar o salto.

Um abraço, Alice!

Um Jeito Manso disse...

Olá P.Rufino,

Agradeço que nos tenha elucidado sobre as molduras penais que podem enquadrar as penas atribuídas aos agressores.

Serão brandas as penas para quem molesta os seus companheiros (maioritariamente companheiras) e, imagino eu, dificilmente quem sofre o medo, a dor das agressões, conseguirá ultrapassar o pesadelo pelo qual passou mesmo quando o afastamento se verifica.

O que se vê é que, frequentemente, quando as mulheres têm a coragem de os denunciar vêem-se sob ameaças ainda mais cruéis: ou são assassinadas ou difamadas.

Terá que haver uma forte consciência social e um forte repúdio para que os agressores se sintam isolados.

Muito obrigada, P. rufino.

Desejo-lhe uma boa semana.

Olinda Melo disse...


Cara UJM

E poderia quedar-me por aqui, com tanto material de primeira classe à minha disposição. Mas, a tarde já vai alta...

Andei à procura deste post que vislumbrei há dias lá do meu Xaile:

A violência doméstica que nos assola, que continua a fazer vítimas num ritmo arrepiante.

Tomara que a sua exposição e a indicação de personalidades conhecidas sirvam para acordar consciências, especialmente daquelas que vivem sob o jugo deste flagelo. E mais: que haja protecção eficaz para as mulheres que têm a coragem de denunciar os agressores.

Minha amiga, bem haja!

Voltarei.

Tenho de ler os posts sobre Nelson Mandela e sobre Nadir Afonso. Mas há tantos e tão interessantes que gostaria de vir para aqui e instalar-me com uma chávena de chá e biscoitos, ao pé de uma bela lareira...

Bjs

Olinda