Transcrevo de uma transcrição das palavras de José Pacheco Pereira no jornal Público de 13 de Julho de 2013, O Navio-Fantasma:
O debate do "estado da nação" teve o mesmo tom irreal do Navio-Fantasma. Um governo póstumo responde às críticas ao "estado da nação" do presente com a promessa de redenção do futuro. A mesma promessa que já fora feita um ano antes, no mesmo debate, com as mesmas personagens. Há um ano, o primeiro-ministro garantira que não iria haver novo aumento de impostos, a que se seguiu o "enorme aumento de impostos". Que valem as palavras ditas por fantasmas? Nada, são um vento oco que perturba o ar.
O debate ocorreu pouco mais de 48 horas depois da intervenção do Presidente da República, que mudou tudo, mas os fantasmas continuaram como se nada mudasse.
O primeiro-ministro, que se tivesse um resto de hombridade já de há muito se teria demitido, engole tudo para permanecer no poder. Acaso ele não compreendeu que há três coisas que o Presidente disse que mudaram tudo? Uma, a de que lhe parecia pouco apropriada à situação a remodelação que o PSD-CDS lhe trouxe, e por isso não a aceitou como boa. Outra, que o PS tem de ser envolvido na governação, ou nas condições de governação, dando ao PS um direito virtual de veto, que por si só também altera tudo.
Já não basta andar a repetir a mantra do "consenso", como o ministro Maduro faz, partilhando da crença enraizada nestes políticos de que basta mudar as palavras para alterar a realidade.
E por fim, que haverá eleições antecipadas em Julho de 2014, e que por isso as juras de fidelidade entre Passos e Portas, para governarem até 2015, desapareceram do mapa. Tudo isto que mudou altera profundamente os dados da situação, e sempre de forma punitiva contra o actual governo que habita o Navio-Fantasma.
Mas enquanto o navio fantasma que se arrasta sem honra - que vagueia de porto em porto sem nunca poder descansar em nenhum, sem bússola que aponte o norte, povoado por um capitão e por marinheiros-fantasmas, amaldiçoados por um qualquer acto de blasfémia, e cujas velas se enfunam no sentido contrário dos ventos - há negócios que se fazem. Portugal pode estar mais pobre e sem futuro mas há quem esteja mais rico e se prepare para continuar a comer a carniça.
Lembremo-nos que na natureza nada se perde. O decréscimo da riqueza portuguesa não é um fenómeno de dinheiro a dissipar-se no ar. Não: é dinheiro a esgueirar-se para outros bolsos (grande parte deles fora de Portugal).
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Na verdade, quem o faz? A Assembleia da República? Se sim, não chega. O Presidente? Provavelmente não. O Tribunal de Contas? Se o faz, não é já tarde? Como as privatizações são feitas por entidades privadas, a quem são concessionadas as avaliações, as negociações e o resto, estas perguntas são ainda mais pertinentes. Como é? O Governo decide a quem dar as avaliações, a quem vender, por quanto quanto paga de comissões - e quem controla isso tudo? Os tempos que correm são particularmente sensíveis, pois há argumentos para vender à pressa, não há muita concorrência, e há muita gente a precisar de negócios para equilibrar contas, entre seguramente outras coisas. Quem saberá responder a estas perguntas? Eu não sei, mas gostava.
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