Em mais um dia diabólico:
- em que o CES faz um relatório arrasador para o Governo que é aprovado por unanimidade (com excepção para os representantes do Governo que se abstiveram),
- em que pudemos observar a subserviência humilhante de Gaspar junto do seu patrono Schauble, mentindo descaradamente, a dizer que em Portugal o ajustamento está a correr bem,
- em que se sabe que a Dívida Pública ultrapassou os 127% e em que já é assumido que atingiu um volume impossível de pagar e que, pior, está a crescer descontroladamente,
- em que vêm a público (e todos os dias, de forma avulsa e atabalhoada, isto vai acontecendo) mais um agravamento de contribuições, desta vez para a ADSE e, uma vez mais, para os reformados do Estado, agora abrangendo os de mais baixos rendimentos,
- em que se sabe que o Conselho de Estado foi quase um golpe de estado,
- em que chovem vozes de pessoas dos próprios partidos que estão no governo a alertarem para os riscos brutais da espiral que se está já a auto-sustentar (o que é próprio das espirais recessivas),
- em que se ouve que em Viana de Castelo 40% dos clientes dos serviços municipalizados não consomem água, deixando toda a gente perplexa e preocupada,
- etc
- .........
percebe-se que Passos Coelho acha que, se se for embora, o belo trabalhinho que fez se perde...!
Ou seja, percebe-se que aquela criatura acha que está a fazer uma coisa de jeito e não quer deitar isso a perder...
Aterradora a falta de noção. Aterrador.
Em dois anos deu cabo da vida de muitos milhares de pessoas, arrasou empresas, vendeu empresas estratégicas para o estrangeiro, espatifou a economia, secou a liquidez da classe média, tudo mal, tudo, tudo, tudo mal, e, enquanto isso, desbaratou dinheiro em assessores, consultores, adjuntos, e outros amigos, que nada sabem, que nada fazem, e que custam muito dinheiro. Tudo na maior leviandade. Sem sensibilidade social, sem compaixão, sem inteligência emocional ou racional.
Uma pessoa inteligente tem noção das suas limitações e sabe que há sempre quem saiba mais e faça melhor do que ele. Um ignorante é o contrário: não tem noção da sua ignorância e acha-se o melhor.
Por isso, para Passos Coelho, para Paulo Portas - que face a TUDO o que se tem passado se mantém ainda ao lado de Passos Coelho -, e para todos os outros ministros ou para quem lhes consiga fazer chegar esta mensagem, aqui lhes deixo uma notável canção de Charles Aznavour.
Talvez alguns dos meus leitores não saibam francês. Por isso, em síntese, a letra da canção diz basicamente isto:
Para quem ainda queira sair pelo seu próprio pé: é preciso saber abandonar a mesa, é preciso saber retirar-se sem olhar para trás, sem fazer barulho. É preciso saber manter a face, sair mantendo a dignidade. É preciso saber sair.
Il faut savoir encore sourire
Quand le meilleur s'est retiré
Et qu'il ne reste que le pire
Dans une vie bête à pleurer
Il faut savoir, coûte que coûte
Garder toute sa dignité
Et malgré ce qu'il nous en coûte
S'en aller sans se retourner
Face au destin qui nous désarme
Et devant le bonheur perdu
Il faut savoir cacher ses larmes
Mais moi, mon cœur, je n'ai pas su
Il faut savoir quitter la table
Lorsque l'amour est desservi
Sans s'accrocher l'air pitoyable
Mais partir sans faire de bruit
Il faut savoir cacher sa peine
Sous le masque de tous les jours
Et retenir les cris de haine
Qui sont les derniers mots d'amour
Il faut savoir rester de glace
Et taire un cœur qui meurt déjà
Il faut savoir garder la face
Mais moi, je t'aime trop
Mais moi, je ne peux pas
Il faut savoir mais moi
Je ne sais pas...
***
***
4 comentários:
Olá UJM!
Uma das minhas canções favoritas dos idos anos 60 do século passado (de que continuo fã)! Nunca pensei que a poderia vir também a considerá-la politicamente tão bem apropriada no meu País!
Obrigada UJM por mais esta observação tão certeira!
Um abraço
Aterrador, como diz. Isto de tão mau e sem se ver uma saída, pois ninguém quer deitar abaixo esta m...de governo, está a anestesiar-me. Comecei por dar conta de estar a centrar-me num projecto de vida diferente, aos poucos, de, inclusivamente, mudar de local para residir (um “sintoma” que se me vem manifestando aqui há já algum tempo – para o campo, bem longe, no Interior e o meu belo e saudoso Porto), de me desligar desta gente, da política, na medida em que confesso não vejo esperança possível para isto, de me desinteressar disto e viver a minha vida como se estes ordinários não existissem. Enfim, se calhar reformar-me, mas mantendo uma actividade privada lúdica (Direito e Vinhas, sim vinho!), ler, gozar amigos, escrever, viajar...ocasionalmente, pois a vida hoje mal o permite, e, francamente, felizmente que já viajei muito, enfim, “desligar-me” disto. Longe disto. Aqui onde vivo sinto-me demasiado perto. Não é que me dê por vencido, mas estou farto de muita coisa e não havendo sedutora alternativa, desinteresso-me, um dia destes, e vou para uma canto qualquer, que já tenho mentalmente escolhido e por ali fico, uma espécie de Jacinto da Cidade e as Serras do Eça, ainda que eu não salte de Paris para Tormes, mas de um sítio idílico junto ao mar para outro nas serranias. Outro dia estive por um desses sítios e, talvez cansado disto, desgastado desta porcaria, pensei cá para mim: “que sossego! Que beleza! Porque não viver aqui?”. Do meu quarto, acordava as manhãs, cedo, com o balir das ovelhas, o que não ouvia assim há que tempos. E senti uma paz interior como não sentia há muito. Com mil diabos, ou ando menos combativo, ou começo a desinteressar-me de muita coisa e a querer viver outra vida, mais repousante. Será que estes estafermos me estão a paralisar?
Tenha um belo dia que o está, de facto.
P.Rufino
Cara Jeitinho,
O sentimento de desanimo é já comum a muita muita gente.
Nasci e vivi os primeiros 25 anos da minha vida num regime de ditadura. Assisti ao seu cair e ao renascer do meu País como a maior emoção da minha vida.
Hoje, sinto que vivemos numa ditadura talvez pior. Numa sociedade sem honra, sem leis, sem consciencia, onde impera a mentira nos mais "altos magistrados da nação".
Presidente, ministros, deputados mentem desesperadamente a coberto de uma democracia que nâo os rege.
Isto são lamentos há muito ouvidos e repetidos, eu sei.
Desculpe mas sinto-me desanimada e triste por ver partir mais um dos homens que viveu com a nossa emoção e esperança uma festa unica. Georges Moustaki faz parte de um conjunto de vozes que me acompanharam na ídade dos sonhos.
Olá UJM,
Estamos todos fartos e mortos por nos vermos livres de tudo isto, mas é verdade é que continuamos a não ver luz nenhuma ao fundo do túnel. Nada acontece, nada, dá-nos a sensação de que estamos num deserto, a pão e água, abandonados aos bichos e à mercê do desconhecido. Que seca!...
Concordo inteiramente consigo e com o seu Leitor Rufino, ninguém faz nada para sairmos do buraco!?
Gostei de rever Charles Aznavour, é curioso que tinha acabado de o ouvir e às suas netas, na canção 'Hier encore j'avais vingt ans..." como o tempo passa!
Um beijinho e continuamos com a vela da esperança acesa no nosso peito!
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