Tenho lido que todas as pessoas têm em si uma parte homossexual e outra heterossexual. Uma dessas partes, geralmente, é dominante. Depois há os que são bissexuais, se calhar os mais afortunados.
No entanto, pensando nisso, não reconheço em mim nenhuma tendência homossexual. Desde que me conheço, sinto atracção pelo sexo masculino.
A heterossexualidade é, pois, em mim, uma coisa intrínseca. Não me esforço para sê-lo: é uma coisa que me é natural. Não me orgulho nem me envergonho de o ser porque isso não depende da minha vontade. Mesmo que me esforçasse, acho que não conseguiria ser nem um bocadinho homossexual. Se me forçar a imaginar-me numa situação homossexual, sinto uma rejeição incontornável. Não dá.
Mas podia ser naturalmente diferente. Podia ser homossexual e, acho eu, pensaria a mesma coisa: nem me orgulharia nem me envergonharia. Provavelmente sentiria a mesma repulsa se me forçasse a imaginar-me numa relação hetero.
Tenho filhos e tenho orgulho em tê-los. Tenho em mim um sentido maternal muito forte e, desde que os concebi e até hoje e para todo o sempre, sinto um dever de protecção em relação a eles. Mas sinto isso por ser eu e não por ser heterossexual.
As mães Mariana e Marta e o filho Matias - uma família com razões para festejar |
Se fosse homossexual quereria, na mesma, proteger os filhos que tivesse, protegê-los o melhor que pudesse e soubesse.
Dito isto, tenho que confessar que me faz um bocado de impressão pensar numa criança a dizer que tem dois pais homens ou duas mães. Imagino que poderá não ser fácil para essa criança.
Mas sei também que isto é uma questão de habituação à ideia, e todos os processos de aculturação são uma luta, um processo de assimilação do desconhecido.
Se eu fosse lésbica e tivesse um filho e vivesse uma relação estável com outra mulher, estou certa de que quereria que o meu filho tivesse a protecção oficial das duas, sentir-me-ia mais segura do seu futuro sabendo que, se eu falhasse, ele não ficaria órfão pois teria a outra mãe. Soa estranho mas, bem vistas as coisas, é isto e faz sentido.
O mais importante para uma criança é que cresça num ambiente em que haja amor, respeito, amparo |
Seja uma criança concebida no seio do casal (homo ou heterossexual), seja uma criança adoptada, penso que é melhor para todos, nomeadamente para a criança, que tudo seja transparente, aceite com naturalidade, e que tudo decorra em ambiente de afecto e partilha.
Por isso, embora me cause ainda alguma estranheza, acho que o que hoje foi decidido no Parlamento foi um passo importante no sentido da inclusão, da aceitação da diferença, do reconhecimento do direito de todos ao aconchego de uma família.
Isabel Moreira na AR: 99 votos a favor, 94 contra e 9 abstenções A emoção de uma mulher forte e com razões para se sentir feliz |
Vi há pouco na televisão as imagens de Isabel Moreira na Assembleia da República e emocionei-me com ela, por ela.
Isabel Moreira é uma verdadeira Mulher-República: corajosa, livre, lutadora, generosa. E é inteligente e lúcida, uma mulher de grandes batalhas, uma mulher determinada. É também uma mulher moderna.
Isabel Moreira já tinha tatuado no braço a data da aprovação do casamento gay. Talvez uma nova data vá parecer em breve no seu braço |
Há nela, para além dos seus traços fortes e bonitos, um toque de modernidade. O seu Pai, Adriano Moreira, deve, certamente, ter muito orgulho nesta sua filha tão valorosa.
Para ela envio um abraço e um agradecimento. Mulheres assim engrandecem a condição feminina e enobrecem o exercício da política.
2 comentários:
É curioso os Partidos Políticos concederem a liberdade de voto neste tipo de questões, como já tinha sucedido, se a memória não me falha, anteriormente, por ocasião da aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo e não concederem noutras, em minha opinião, de muito maior relevância e impacto social, como a política sobre a Saúde, Educação, a Justiça, a Reforma do Estado, a política Económica e Financeira do Governo, etc. Devo dizer que nunca fui muito receptivo a esta questão do casamento e adopção homossexual, pela simples razão que achava e continuo a achar que é um “non issue”. Ou seja, cada um , ou cada uma, dorme, deita-se e tem relações sexuais com quem bem entende e ninguém tem nada a ver com isso. No que respeita ao casamento, a interpretação jurídica, desde sempre, da Antiguidade Clássica até há pouco, era de que tal visava um contrato entre duas pessoas de sexos diferentes, homem e mulher. Inicialmente até, sobretudo na República de Roma e posteriormente, com o Cristianismo, o casamento visava a procriação dos filhos. Há aliás uma pitoresca história sucedida ao tempo em que Roma era ainda uma República, a ilustrar este aspecto do casamento, tendo como objectivo principal a procriação, contada por Lucano na sua “Farsália” envolvendo Catão, sua mulher Márcia e o então famoso orador romano Hortêncio: Hortêncio, sentindo-se velho, não quis morrer sem filhos. Desabafou com Catão, que aceitou emprestar-lhe a mulher, Márcia, cuja fecundidade era segura. Márcia, consultada, aceitou e divorciou-se de Catão, casando-se em segundas núpcias com Hortêncio, a quem assegurou a posteridade. Depois da morte daquele, voltou para Catão, a quem desposou novamente. Ou seja, o objectivo da união do casal, era a procriação de filhos. Naturalmente que tudo evoluíu e ainda bem! E o ênfase da procriação (caricato aos nossos olhos actuais) desapareceu. Todavia, permaneceu, até há bem pouco tempo, a interpretação de que o casamento era um contrato entre 2 pessoas de sexos diferentes. Em minha opinião, possivelmente conservadora (o que politicamente não sou), nunca vi razões que justificassem existir motivos para alterar este conceito. Ninguém contestava, num sociedade democrática, que todos somos livres de escolher as nossas opções, ou inclinações sexuais. Deste modo, impôs-se, por via parlamentar e, seguidamente, jurídica, o tal casamento - e agora a adopção entre homessexuais. O casamento passa assim a ter uma definição jurídica diferente. Pergunto, então: e porque é que não se vai neste caso ainda mais longe e se aceita a poligamia? Conheço um caso de um sujeito que vive feliz com 2 mulheres de quem tem filhos de ambas e se dão todos bem, os 3, e que bem gostariam de legalizar, ou oficializar aquelas suas relações. Mas não podem. Aceita-se o casamento entre homossexuais, o que contraria a anterior definição do casamento, mas impede-se que alguém, como o exemplo que suscito aqui, de oficializar a sua situação, que nem sequer pode ser considerada “união de facto”, por serem 3 as pessoas envolvidas. Talvez seja tempo, quem sabe, de reescrever, ou redefinir o conceito de “casamento”, tornado-o ainda mais abrangente. Por que não? Quanto à adopção, agora aprovada, oxalá não vá implicar situações, quer na escola, quer no futuro, mais delicadas. Como digo, qualquer destas questões, o casamento e adopção por casais homoxessuais nunca me pareceu que devesse ser objecto de discussão no Parlamento. Sempre se me afigurou, como atrás referi, ser um “non-issue”. Mas enfim, aprovados foram. Adaptemo-nos!
Uma nota final: tenho igualmente grande consideração intelectual por Isabel Moreira (e por seu pai, Adriano).
P.Rufino
Olá UJM,
Concordo consigo, mas faz-me também impressão pensar que uma criança tem dois pais ou duas mães, mas uma criança de tenra idade não saberá distinguir as diferenças mas a habituação e o amor do casal homossexual dado à criança será um bom alicerce para que ela cresça e viva num ambiente natural e feliz... Mas interrogo-me, sem a coadopção oficial uma criança deixaria de ser mais amada e mais protegida, por parte do outro cônjuge, caso um deles falhasse a relação assumida? A criança deixaria de ter protecção de um dos pais caso o outro, por qualquer circunstância, desaparecesse da vida da criança? Não sei mas gostaria de perceber que tipo de "Amor" é este que só garante a protecção total de uma criança se a coadopção for oficializada? Talvez o meu desconhecimento sobre a matéria não me ajude a compreender estas modernidades.
Aprecio muito Isabel Moreira e seu Pai.
Um beijinho e bom fim de semana
Enviar um comentário