terça-feira, abril 23, 2013

No Dia do Livro, prova de vida de uma viciada nos ditos


Já vos contei muitas vezes. Sou doida por livros e isto vem de criança. Podia ter sido uma mania infantil e passar, mas não passou. Podia ter sido um entusiasmo adolescente e passar, mas não passou. Ainda dura e é cada vez mais forte. Não sei se é vício. Talvez seja.

No outro dia almocei no Estoril (e, já agora, umas fofocas: fiquei na mesa ao lado de uma jornalista-directora de um canal de televisão, bem simpática, que apostava com os amigos se o governo caía ou não caía até ao final deste ano - uma das amigas dizia que, se calhar, antes do governo cair, caía o País -, e fiquei na diagonal em relação a uma ex-ministra que agora anda por aí a dar cartas à gente grande) e, ao vir do restaurante, passei junto ao Casino. A quantidade de gente de todas as idades e extractos sociais que está à porta, à espera que sejam horas para entrar para as máquinas, faz-me um bocado de impressão. Desta vez não quis ver o espectáculo de ver aquela gente a correr para 'apanhar' a sua máquina de estimação porque tudo aquilo me impressiona. Impressiona-me, especialmente, ver tanta gente de idade, tantas mulheres de idade. 

Eu não sou bem assim com os livros, não fico à porta antes das livrarias abrirem nem corro desesperada para as estantes. Mas não passo sem por ali andar a ver o que há de novo, a passar as mãos por eles, a pegar, a folhear. E vou trazendo mais e mais livros para casa. Não sei quando os lerei e isso causa-me uma sensação estranha, de impotência, de finitude. A minha vida não tem dias que cheguem para ler todos estes livros que me rodeiam e que se espalham pela casa, nem todos os que irei comprando.

Em tempos consegui organizá-los e o meu marido, num trabalho de meses, conseguiu registá-los numa base de dados. Mas a minha indisciplina e o ritmo a que se vão juntando novos volumes não é compatível com a paciência dele, pelo que agora a coisa já está outra vez a ficar caótica. 

Já tenho aqui ao pé de mim três estantes só com livros não registados. E ao lado do sofá já está uma grande cesta cheia de outros em iguais circunstâncias. E eu já saí da minha pequena e simpática secretária para voltar à mesa redonda que deveria servir para outros fins e não para estes. Pior: já está cheia dos livros que vou puxando para a minha beira. O computador já mal aqui cabe. O meu marido esta semana quis abrir aqui o computador dele e mal teve espaço. Todo desiludido, diz que eu ocupo o espaço todo. Pois é, reconheço. Não consigo controlar esta minha paixão.

Haverá quem gaste dinheiro em idas semanais ao cabeleireiro, em madeixas, nuances, unhas, ou em limpezas de pele, massagens semanais, em sapatos ou carteiras caros, em roupa de marca, em coisas assim. Eu não: eu perco a cabeça com livros. E depois tenho sempre uma preocupação (mas que é capaz de ser daquelas desculpas que os viciados arranjam): tenho receio de um dia deixar de ter possibilidade de os comprar e, assim, quero prevenir-me. 

Claro que sei que sou uma privilegiada: tenho rendimentos que me permitem comprar tantos livros e sei que isso hoje é luxo a que muitas pessoas não se podem dar. E, até por isso, ainda mais valor lhes dou. Meus amados livros.



A mesa redonda onde escrevo, afastando a custo os livros que me cercam



Ontem comprei uns quantos e estou desejando de os ler. Provavelmente vai acontecer como ultimamente quase sempre acontece: leio um bocado, páginas, faço diagonais e retenho uns quantos para ler, então, nas férias ou, então, no carro ao fim de semana (isto se não tiver o Expresso para ler). Talvez daqui por uma dúzia de anos eu consiga, então, dedicar-me à leitura atenta e gostosa de alguns deles.


Falo-vos, portanto, apenas nos de ontem:

  • Oferenda de João Miguel Fernandes Jorge e Jorge Pinheiro, da Editora Modo de Ler - um livro lindo, daqueles objectos preciosos
  • Pela parte que me toca de Helder Moura Pereira da Editora Assírio & Alvim
  • Jorge de Sena, António Ramos Rosa, Correspondência 1952-1978, Editora Guimarães
  • Cividade de Agustina Beesa-Luís da Editora Guimarães
  • Mulheres Pintoras em Portugal, de Josefa de Óbidos a Paula Rego, coordenadoras: Raquel Henriques da Silva e Sandra Leando da Editora Esfera do Caos
  • O Testamento de Maria de Colm Tóibín da Editora Bertrand
  • Papa Francisco, conversas com Jorge Bergoglio de Francesca Ambrogetti e Sergio Rubin da Paulinas Editoras
  • Este último livro deu direito a um outro de oferta, o Papa, o Bispo e o Filósofo de Alexandre Dorozynski (mas este, se calhar, não conta porque foi presente)


Sonhei com isto. E há momentos em que deixo o sonho prolongar-se pelo dia dentro e viver comigo, em que me sento naquela cadeira e sinto que o estou a abraçar, o corpo dele limpo e liberto de dor e eu própria limpa e liberta da dor que senti, que fazia parte da dor dele, a dor que partilhámos. Tudo isto é fácil de imaginar. (de o Testamento de Maria)


*

Espero ainda cá voltar esta noite.

3 comentários:

Isabel disse...

Também sou viciada nos livros. É vício, mesmo. Actualmente é mesmo a única coisa em que gasto dinheiro, porque não chega para mais extravagâncias. Mas nos livros...não consigo cortar! Não há semana em que não cheguem mais uns quantos. Tento resistir, sinceramente, mas não consigo.
Enfim, há vícios bem piores!
Tenho lido pouquíssimo.
Mas sinto-me feliz rodeada dos meus livros, trazendo novos (ou velhos, de alfarrabistas) para casa!

Um beijinho

Maria Eduardo disse...

Olá UJM,
Também adorava que o dia tivesse o dobro ou o triplo das horas para poder fazer tudo o que gosto, mas, não sendo viável, rodeio-me das coisas que gostaria de fazer e todos os dias acontece algo e também nasce mais uma ideia!... O sonho comanda a vida e as paixões, alimentam-nos a alma e nunca estamos sós! A UJM está muito bem acompanhada dos seus amados livros!
Um beijinho e obrigada pela partilha!

Anónimo disse...

Tenho o mesmo problema. Não resisto a entrar numa livraria, qualquer que seja e, depois, quase sempre acabo por adquiri mais um livro. Entro sempre devagar, olhando para todas as prateleiras, vasculhando aqui e ali e depois indo de encontro ao que me interessa, sem, todavia, deixar sempre um olho atento ao que possa aparecer de interessante, noutros temas. E gosto de ver as capas, de os folhear, de lhes passar uma vista de olhos e finalmente de comprar um, dois, enfim, os que me interessarem, ainda que, hoje em dia, a crise me obrigue a ter mais parcimómia. Ás vezes ponho-me a pensar que só gostaria de morrer depois de ler todos os livros que possuo e que tenciono comprar, o que no fim de contas é o mesmo que pedir à morte para esperar um pouco mais, adiar, adiar o meu último dia, visto que os livros que possuo em casa, a esmagadora maioria já os devorei, alguns repeti a leitura.
Isto de livros e de ler ou se é assim, se gosta de ler – o que para mim é um dos prazeres que não dispenso, adoro ler! – ou não. Conheço gente que nunca entra numa livraria. Aquilo dá-me arrepios. Falo, naturalmente, de pessoas que era suposto, pelo seu estatuto social e estudos, lerem.
Boas leituras, cara UJM!
P.Rufino