domingo, abril 07, 2013

Clarice Lispector, a hora da Estrela - uma maravilhosa exposição de palavras na Gulbenkian, palavras de uma diva que muito amou a língua portuguesa







... escrever não é um ofício? ... aprendizagem então...?
- Clarice Lispector


Irei até onde o ar termina, irei até onde a grande ventania se solta uivando, irei até onde o vácuo faz uma curva, irei até onde meu fôlego me levar.



Ver a verdade seria diferente de inventar a verdade?
- Clarice Lispector


Sentou-se para descansar e em breve fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, (...) faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava de morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus.



Você magnética
Dar paz ao rosto

(Lista de lembretes curiosos rabiscados pela escritora; Clarice nos anos 50 em Washington, fotografada por Erico Veríssimo)


Ali, enfim familiar, toda revelada para ele, o homem a examinou. Ela não seria bonita, se uma pessoa não a amasse. Mas tinha a beleza que se vê quando se ama o que se vê.



Olhar-se no espelho e dizer-se deslumbrada: como sou misteriosa - Clarice Lispector


Nos braços os pelos claros douravam a moça como se ela não pudesse ser trocada. Uma vez amada, ela era de rara delicadeza e beleza. Ele olhou-a curioso, simpático. Ela era capaz de fazer a felicidade de um homem; mas estranhamente tivera que enganá-lo com truques até fazê-lo feliz, e só então é que lhe mostrará que não o enganara e que a felicidade que lhe dava era real.



Aí está ele, o mar, a menos ininteligível das existências não-humanas. E aqui está a mulher, de pé na praia, o mais ininteligível dos seres vivos - Clarice Lispector


'De profundis'. Joana esperou que a ideia se tornasse mais clara, que subisse das névoas aquela bola brilhante e leve que era o germe de um pensamento. 'De profundis'. Sentia-o vacilar, quase perder o equilíbrio e mergulhar para sempre em águas desconhecidas. Ou senão, a momentos, afastar as nuvens e crescer trémulo, quase emergir completamente... Depois o silêncio.



Bilhete da amiga Lygia fagundes Telles sobre um livro de Clarice Lispector 


E o primeiro verdadeiro silêncio começou a soprar. O que eu havia visto de tão tranquilo e vasto e estrangeiro nas minhas fotografias escuras e sorridentes - aquilo estava pela primeira vez fora de mim e ao meu inteiro alcance, incompreensível mas ao meu alcance.



Imagem de uma das salas da exposição. Dentro de algumas gavetas os fragmentos, as cartas, as fotografias, os apontamentos.


Estava muito bonita neste momento, tão elegante; integrada na sua época e na cidade onde nascera como se a tivesse escolhido. (...) Espiava as pessoas com insistência, procurando fixar naquelas figuras mutáveis seu prazer ainda húmido de lágrimas pela mãe.



A transcendência era em mim o único modo como eu podia alcançar a coisa? - Clarice Lispector?


Era o ponto de realidade resistente das duas naturezas que esperavas que nos entendessemos. Minha ferocidade e a tua não deveriam se trocar por doçura: era isso o que pouco a pouco me ensinavas, e era isto também que estava se tornando pesado. Não me pedindo nada, me pedias de mais.



Clarice Lispector fala sobre a sua vida (entrevista disponível no youtube); em primeiro plano a máquina de escrever



Pois olhando agora absorta ao redor de si, nem ela própria saberia de que modo tornar lógico e racional o facto de seu profundo amor estar espalhado, o facto do mistério estar guardado.




Cada vez eu escrevo com menos palavras. Meu livro melhor acontecerá quando eu de todo não escrever - Clarice Lispector

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Clarice Lispector, a hora da estrela

A exposição pode ser vista na Sala das Exposições Temporárias da Gulbenkian (cá em baixo, junto à Biblioteca, à Loja, ao Bar)

Começou no dia 5 deste mês e vai estar até 23 de Junho.



Sabendo-se da minha paixão pela obra desta escritora, foi com muito prazer que esta tarde me misturei com as suas palavras. 

Uma tarde maravilhosa. Um sol bom.

Mas, ao fim da tarde, já se fazia sentir um friozinho, gostoso mas friozinho.



Ao fim da tarde, os dois manos e a sua priminha, amigos, lindos, uns amorzinhos muito doces
(o bebé ficou em casa, adoentadinho, meu rico menino)

*

Os textos (até o filme de baixo) são excertos escolhidos ao acaso, aqui dispostos sem qualquer ordem premeditada, de 'Uma maçã no escuro', 'Laços de Família', 'A paixão segundo G.H.', 'Uma aprendiz ou o livro dos prazeres', 'Perto do coração selvagem' e 'A hora da estrela', todos, claro, de Clarice Lispector (Ucrânia, 1920 - Rio de Janeiro, 1977)


Lá em cima, é Renée Fleming interpretando Casta Diva. Achei que ficava aqui bem.


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E, depois disto, apenas vos quero desejar um domingo muito feliz. 

6 comentários:

JOAQUIM CASTILHO disse...

Olá UJM

Obrigada pela reportagem!
Lá irei!
Um abraço

Anónimo disse...

Também lá estive. Lá retornarei. No entretanto, as imagens de UJM.

«Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho».

Clarice Lispector, A Hora da Estrela, 1984. Rio de Janeiro.Editora Nova Fronteira

AdeSá

jrd disse...

Só que ama assim a escritora é capaz de uma composição com esta.
Abraço

Helena Sacadura Cabral disse...

É belíssima. Mas tem que ser vista duas vezes para ficarmos entranhados das suas palavras!

Olinda Melo disse...


Olá UJM

Lindo, lindo! Uma reportagem preciosa, com o seu incrível jeito para a fotografia e o enquadramento do que é importante.

Lá irei, talvez, na próxima semana, para uma segunda abordagem. A primeira foi através deste seu excelente post. :)

Muito obrigada.

Bj

Olinda

Isabel disse...

Espero conseguir ir ver. Penso que vou a Lisboa ainda este mês.
Tenho vindo aqui ver os seus post, mas não deixo comentários.
Um beijinho e continuação de boa semana!