quarta-feira, fevereiro 13, 2013

Barbara (ou o amor sob suspeita) - o prazer do Cinema


Esta terça feira fui ao cinema. Mas não me apetecia ver um daqueles filme mainstream, Lincoln, Mentor, Hitchcock, todos muito bons mas, não sei porquê, com alguma probabilidade de serem também uma seca. Quando toda a gente diz muito bem, a mim passa-me a vontade. Acho que não sou elitista mas, se calhar, sou. 

O meu marido não estava com muita vontade de ir ao cinema, muito menos para ver filmes longos, sérios, potencialmente chatos.

E eu também estava sem paciência para ir a cinemas onde toda a gente entra ruidosamente e de balde na mão, ou melhor, baldes, um com pipocas e outro com coca-cola. 

Por isso, depois de ver o que está em cena, optei pelo filme Barbara. Claro que, quando disse que era um filme alemão, o meu marido disse logo que isso não augurava nada de bom. Quando, já sentados na sala, lhe disse que tinha ganho um prémio no Festival de Berlim, resmungou, ainda pior.

Já antes, quando o meu filho me tinha perguntado o que é que íamos ver e eu lhe disse, ele franziu o semblante e perguntou se não seria alguma intelectualice. O meu marido disse logo que devia ser. Na altura ainda estava convencido que ia arranjar maneira de me demover.

Mas não demoveu, nem conseguiu que nos atrasássemos e, por isso, lá fomos. 

Cinema King ali ao Maria Matos. Um clássico, dos poucos que sobreviveram.

Sala 3. Para lá chegar passa-se pelo espaço tão agradável do barzinho, livraria.



O simpático barzinho do Medeia King (antes King Triplex, acho eu)


Aqui pouca gente mas, lá ao fundo, algumas pessoas lanchando. Claro que não fotografei para não ser expulsa (nem daqui pelas pessoas fotografadas, nem de casa pois o meu marido fica incomodado quando faço coisas do género)



Ainda um dia hei-de ir com tempo para poder estar ali sentada, à meia luz, a ter uma conversa inteligente


Depois na sala uma surpresa: a sala muito composta, muito mais gente do que seria de esperar.

Aqui, ao contrário do que acontece nos Cinemas Lusomundo, não há, antes do filme,  carradas de anúncios de outros filmes, geralmente filmes para gente com QI abaixo da média ou gente de gostos estranhos (diálogos abaixo de cão, vampiros com sangue a escorrer dos dentes, gente à pancada, carros a espatifarem-se contra vidros, bonecos assustadores, tretas, barulho, um barulho ensurdecedor). Aqui não, há anúncio de um ou dois filmes, bons, e depois, logo de seguida, passa-se ao que nos leva lá.

Um dos belos filmes que vi recentemente (enfim, não tão recentemente como isso: para aí há uns 6 anos) foi também um filme alemão, A Vida dos Outros.

Pois bem, este filme, Barbara, é também um belíssimo filme. Nada a ver com as tretas habituais que quase não têm história. Este tem. E tem muito bons desempenhos. E tem cadência. E tem ambiente. O ambiente da vida vivida sob observação, da vida vivida sob o forte desejo de alcançar a liberdade, da vida cercada onde, apesar do medo, desponta o amor.


Nina Hoss é Barbara, a médica  da RDA



Ronald Zehrfeld é Andre, o médico por quem Barbara acaba por se apaixonar


Transcrevo a sinopse:

Título original: Barbara
De: Christian Petzold
Com: Nina Hoss, Ronald Zehrfeld, Rainer Bock
Outros dados: ALE, 2012, Cores, 105 min.

1980, República Democrática Alemã. A exercer medicina em Berlim, Barbara tenta arranjar um visto que lhe permita ir ao encontro de Jörg, o namorado, à Alemanha Ocidental. Após a recusa do Governo, é desterrada para um hospital de uma localidade rural, longe da capital. Enquanto Jörg tenta encontrar um plano de fuga, ela aguarda pacientemente, evitando tudo o que a possa ligar àquele lugar. Porém, com o passar do tempo, acaba por se sentir atraída por Andre (Ronald Zehrfeld), um colega particularmente caloroso que se esforça para que ela se sinta em casa. Mas, mesmo quando acaba apaixonada por ele, Barbara não consegue entregar-se totalmente, obcecada com a hipótese de ele ser um espião contratado para seguir os seus passos. Assim, à medida que Barbara se vai deixando levar pelos sentimentos que a ligam a Andre, acaba por ser forçada a tomar uma decisão que mudará, irremediavelmente, a sua vida.
Um filme do alemão Christian Petzold ("Yella", "Jerichow"), que acabou por arrecadar, em 2012, o prémio de melhor realizador no Festival de Berlim. (PÚBLICO)


Não encontrei o trailer com legendagem em português mas, apesar disso, incluo aqui a versão com legendas em inglês. Sei que deve ser filme que provavelmente não vai sair do estrito circuito da Medeia em Lisboa e, se calhar, também não sairá o DVD mas, aos que podem, recomendo que não deixem de ver. Saí de lá com uma lagriminha no canto do olho e foi com pena que vi que tinha acabado.



Um belo filme, é o que vos digo.


PS 1: O meu marido gostou.


PS 2: Porque é que os filmes alemães, franceses, italianos, etc, não entram normalmente no circuito normal de distribuição em Portugal? Porque é que somos sujeitos a esta permanente banhada de filmes americanos? E não me refiro aos filmes bons como os que comecei por referir no início deste texto mas a todo o inominávle lixo que alastra pelas salas de cinema? Se isto não é uma forma oculta e perversa de colonização... (e olhem que sou aversa a teorias da conspiração...)


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Uma chamada de atenção: este já é hoje o meu 4º post
Por isso, se tiverem curiosidade, não fiquem por aqui, deixem-se deslizar pelo écran abaixo

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E ainda: muito gostaria que me suportassem ainda um pouco mais (eu sei, eu sei que é dose...!). Hoje, no Ginjal, pela mão de David Mourão-Ferreira, e há lá melhor mão?, as minhas palavras atravessam todas as águas e, se lá forem, verão porquê. A música, senhores!, a música é genial e genialmente interpretada. Bach por David Fray. Uma maravilha.

*

E já chega, não é? Tenham, meus Caros Leitores, uma bela quarta feira. 
Vivam bem cada bocadinho da vossa vida, sim?


9 comentários:

Isabel disse...

Fico contente de ver aqui a sua opinião, porque não tinha ainda ouvido nada sobre o filme e na próxima sexta-feira está cá no Cine-Teatro. Espero ir vê-lo.
Um beijinho

jrd disse...

O "King" foi, é e (assim o espero) será sempre um lugar de culto.
Veremos se ainda vou ter tempo de ver o filme, antes de passar a fronteira...

Abraço

Anónimo disse...

Olá Jeitinho.

Ele há coisas...
Acabei de chegar da cidade e trouxe um jornal cá do burgo.
Então não é que o filme Barbara passa no dia 15 às 21,30h?
E o Amour passa dia 19, também às 21,30h.

Pelas razões que já lhe expliquei não vou poder ir, mas é bom saber que é cinema de qualidade.

A Isabel é que vai ficar contente!

Bj


Antonieta

Anónimo disse...

É de facto lamentável esta limitação no que respeita ao cinema europeu que aqui nos chega. Sou de um tempo em que se podia ver, em vários salas, cinema europeu, de excelente qualidade. É certo que o pouco que consegue chegar ainda hoje a algumas salas de cinema mantém, de forma geral, a mesma anterior qualidade. E, se observarmos bem, de uma maneira geral o tipo de realizações não só tem temáticas diferentes, como se filma de outra forma, sem tanto recurso a efeitos especiais, dedicando mais atenção ás personagens, aos diálogos, expressões, aos pormenores, ás relações, etc. O cinema norte-americano tem uma marca muito comercial, excesivamente comercial. Um filme, nos EUA, faz-se para ser visto por muitos e ter um saldo final altamente rentável. Daí que se produz e realiza filmes tendo por base aquilo que o público (norte-americano) gosta e consome, digamos. No fim de contas, o cinema norte-americano é um produto da sociedade mercantil de que faz parte, ou em que se insere. Este tipo de filmes que viu (e vou tentar seguir a sua sugestão) nos EUA estariam, seguramente, destinados ao fracasso, por não irem de encontro ao que o consumidor/público aprecia. Nos EUA existe, convém igualmente não esquecer, todo uma “cultura” de violência, a começar pelo acesso a qualquer tipo de arma, à criminalidade em excesso, aos actos de assassinatos colectivos (escolas, etc), que acaba por se reflectir no cinema de acção violenta. E isto talvez esteja no subconsciente dos espectadores. Mas, o tipo de filmes que se produzem nos EUA tem também a ver com uma certa cultura, a cultura deles. E depois, a indústria do cinema é muito mais poderosa do que na Europa e é isso mesmo, uma indústria a sério e como tal produz e realiza tendo sempre em vista um saldo financeiro substancial. São pois filosofias de se ver e olhar o Cinema muito diferentes. Prefiro o que por cá se faz, nesta Europa velha, mas com um património cultural inigualável. A propósito de cinema, recordo-me de há uns tempos atrás, em conversa com uns nossos conhecidos norte-americanos, que o conhecimento deles sobre este tem era nulo no respeitante ao que se faz na Europa. E ficaram muito espantados (para não dizer escandalizados) quando mostrei desconhecimento por algumas figuras de conhecidos actores e actrizes (deu-me um gozo enorme pretender esse mesmo desconhecimento): “ bem sabem, mas por cá preocupamo-nos mais com o que aqui, na Europa, se faz, se produz, se pensa, etc, bem vistas as coisas, como vocês, por lá, nos States!”.
P.Rufino

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Então depois me dirá se não é um filme que nos toca...

Um beijinho!

Um Jeito Manso disse...

Olá jrd,

Ah, então, já se está a preparar outra vez para dar o 'salto'...!

Mas, então, se ainda der tempo, veja se consegue dar uma saltada ao King pois é um filme que nos impressiona pela simplicidade, pela genuinidade.

E tomara que o King se vá aguentando. Se um dia fecha, então, é que eu fico mesmo a sentir-me abandonada pelo cinema. Claro que ainda há o Nimas mas, não sei porquê, nunca engracei muito com o Nimas. O Monumental também é Medeia mas está no meio do Centro Comercial, não tem aquele ar já um pouco decadente que dá patine ao King.

Um abraço!

Um Jeito Manso disse...

Olá Antonieta,

Fico mesmo com pena que não possa ir pois é bom ir ao cinema, em especial quando o filme é bom. Talvez ainda possa arranjar maneira de ir um dia destes.

Seja como for, é bom sinal que o cinema esteja a escolher bons filmes. Podia escolher tralha mas, por estes, vê-se que há critério.

Um beijinho!

Um Jeito Manso disse...

Olá P. Rufino,

Mas o que se passa de enfeudamento a produções americanas estende-se também à programação televisiva.

Claro que ainda temos - vá lá! - alguma (boa) produção inglesa. Mas, tirando isso, já quase nada nos aparece de outros países europeus. lembra-se do Polvo? Tão bom e que agradável ouvi-los a falar em italiano. Quando eu era miúda havia também umas ´series francesas que eu adorava. E era uma maneira de se ouvirem outras línguas. Agora nada.

A cultura geral americana é muito básica, muito simplista e, por isso, os gostos deles são também muito pouco elaborados. Claro que há produções magníficas, muitas vezes dos chamados 'independentes'. Mas, em quantidade, a maioria é lixo, enlatados, tretas. As salas de cinema estão cheias disso. A programação televisiva está cheia disso.

Por isso, não admira que a população vá estupidificando e sendo, cada vez, menos exigente.

Gostei de ler o que escreveu, as suas reflexões são sempre muito interessantes de ler.

Obrigada, P. Rufino!

Isabel disse...

Venho só aqui dizer que gostei imenso do filme. Muito mesmo.
Na próxima terça-feira vou ver o Amor e já comprei bilhetes para ver todos os que vêm ao Cine-Teatro até final de Março.
Um beijinho e obrigada pela sugestão que aqui deixou. Este filme vale a pena!