quinta-feira, agosto 16, 2012

Do espiritual na arte - a palavra a Wassily Kandinsky (aqui sobre o vermelho e sobre o amarelo)


Um arabesco, por favor


O guitarrista Richard Durrant interpreta o seu arranjo do Arabesco nº1 de Debussy. 
O filme animado é da autoria de Miranda Vincent.


Enquanto me embrenho tentando descobrir quem assassinou selvaticamente o solitário escritor Michel Houllebecq, intercalo com a leitura de um pequeno e fascinante livrinho, Do espiritual na arte, de Wassily Kandinsky, pintor que admiro bastante.

Como já aqui referi inúmeras vezes, gosto muito de pintura abstracta. O que não existe senão quando é produzido por um artista interessa-me muito mais do que uma representação tal e qual da existência tal como a conhecemos.

Ouvir e ler sobre a arte tal como a sentem os artistas que admiro é coisa que me motiva sobremaneira. Por isso, a leitura deste livro quase me emociona. Se vos transcrever aqui algumas partes, muitos dos que me estão agora a ler são capazes de achar que não sou boa da cabeça para me emocionar com coisas assim. Mas é um facto.

Acho que a este livrinho irei voltar frequentemente. Agora deixo-vos aqui apenas um pouco, antes de me ir outra vez deliciar com a sua leitura.



Élan tempéré - última obra de Kandinsky (1944)


Numa composição triste, só a utilização do vermelho introduz o elemento dramático. Com efeito, o vermelho, quando isolado, não causa qualquer tristeza no tranquilo espelho da alma.

Quando aplicado a uma árvore, estamos em presença de um caso totalmente diferente. O tom fundamental do vermelho subsiste tal como nos exemplos precedentes; mas aqui junta-se o valor psíquico do Outono para a alma sensível (já que esta palavra, 'Outono', é, só por si, uma unidade psíquica, como o é qualquer conceito real, abstracto, imaterial ou físico). A cor associa-se intimamente ao objecto, e constitui um elemento que age sozinho, privado do som dramático (...).

Com um cavalo vermelho é outro caso bem distinto. Basta pronunciar estas duas palavras (cavalo vermelho) e somos transportados para outra atmosfera. Um cavalo vermelho não existe na realidade. A sua impossibilidade natural exige um envolvimento igualmente artificial. Sem isso, seria apenas uma curiosidade (cujo efeito superficial nada teria em comum com a arte), um conto de fadas mal interpretado (e, portanto, uma curiosidade que dificilmente passaria por obra de arte)


Pintura de Kandinsky

(...) 

Com efeito, o primeiro movimento do amarelo, a sua tendência para prender o olhar, tendência que, ao forçar a intensidade que lhe é própria, se pode tornar importuna; e o segundo movimento, ao saltar todos os limites, expande força à sua volta, assemelhando-se às qualidades de qualquer força material que se precipita inconscientemente sobre o objecto e se derrama de modo desordenado para todos os lados. Considerado directamente (em qualquer forma geométrica), o amarelo atormenta o homem, espicaça-o e excita-o, impõe-se-lhe como um constrangimento, importuna-o com uma insuportável insolência. Esta propriedade do amarelo, que tende sempre para os tons mais claros, pode atingir uma intensidade insustentável para o olha e para a alma. Assim potenciado, soa como uma trompeta vibrante, que tocasse cada vez mais alto, ou como uma fanfarra ruidosa.

*

Partilhemos agora um pouco a opinião de Helen Mirren sobre Kandinsky, junto de Kandinsky.


*

Tenham, meus Caros Leitores, um dia cheio de cor.

2 comentários:

Isabel disse...

Estive a ouvir o video, mas não consegui perceber tudo e tenho pena. Mas gostei na mesma.
Gosto muito de Kandinsky e fiquei curiosa sobre esse livro.
Um post lindo!
Um beijinho

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Mas só ouvir a forma como a Helen Mirren fala já é um gosto, mesmo não se percebendo tudo. Este livro é o livro em que ele, como pintor, reflecte sobre pintura, sobre a sua pintura e sobre a arte. Gosto das palavras dos artistas.

E Kandinssky é um cá 'dos meus': não se prende a pormenores, nem se preocupa em fazer coisas para que todos entendam. E falo no presente de propósito porque autores como ele nunca morrem.

Um beijinho, Isabel.