Há quase um ano, num tempo já cheio de incertezas e medos, fez um temporal in heaven e o vento partiu uma árvore, despedaçando-me o coração.
Depois de ali ter ficado assim durante algum tempo, infeliz, tronco rasgado, achámos que a imagem era triste demais e o tronco foi cortado, cerce, sempre se reparava menos, era uma ausência menos notada. De qualquer forma, para mim, uma dor de alma.
Ao meu amiguinho pequenino também custou a imagem da árvore cortada, 'Partiu-se? O vento partiu a árvore? Como foi?' e olhava triste para o tronco escuro rente ao chão. 'E o vento vai partir mais árvores...?', que não, tranquilizei-o eu, 'Então porque é que o vento partiu esta?' e eu que 'esta estava mais fraquinha, talvez'. E ele 'Porquê? e eu... (etc, etc)...... (porque o meu menininho está na idade dos porquês)
Pois bem, meus Amigos, o que tenho a dizer-vos é que nunca nos entristeçamos antes de tempo.
Música! maestro.
Eis que há pouco tempo, inesperadamente, um pequeno rebento verde começou a surgir do toco que parecia morto. Fiquei intrigada. E expectante venho vigiando o milagre, assistindo maravilhada ao ressurgimento da vida onde eu já não a esperava.
A minha grevílea robusta renascendo, envolta em sedas e brocados dourados A vida renascendo em pleno outono, numa altura em que as outras árvores se despem |
Hoje, in heaven, tal como provavelmente em todo o país, choveu que Deus a deu. Um vendaval que levava as folhas pelos ares, que quase fazia voar as ramadas das árvores.
Um cheiro bom a terra molhada, a terra que se quer fértil, húmida, cheirosa, um cheiro a vida. Fico por dentro dos vidros e aponto a máquina. São apenas folhas secas, douradas, ramos verdes, água da chuva. Eu sei que é só isso mas isso é tanto para mim.
A primeira chuva deste outono: água abençoada |
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Depois, na volta, deixando para trás a quietude, a mansa e tranquila paz de espírito, começaram logo as más notícias. Para meu espanto, ouvi na rádio que o ministro Miguel Macedo ia desistir do subsídio de alojamento. Fiquei siderada com a falta de consistência desta gente.
Com casa própria e a viver em Algés, Sua Excelência usava o artifício de ter outra casa em Braga, que utiliza como morada fiscal, para usufruir de um subsídio de 1.400 euros por mês. Numa altura em que aos pobres funcionários públicos e pensionistas com ordenados miseráveis vão ser suprimidos os subsídios de natal e de férias, eis que Sua Excelência vivia de bem com a sua consciência vivendo em Algés e alapando-se com um subsídio - que tomaram muitos ter como ordenado - como se vivesse em Braga. Arrepia pensar na (falta de) ética destes governantes de tão insignificante dimensão.
Pois agora, como a coisa veio a público, anuncia que vai renunciar, numa falta de consistência assustadora. Claro que fez bem em renunciar - não tinha, aliás, como não o fazer a menos que passasse a andar com a cara pintada de preto. Mas se sabia que estava a receber indevidamente este subsídio, porque o pediu? Ou, se o pediu, não devia agora ao menos tentar justificar porque o fez? Parece uma gentinha de meia-tijela que foi a correr ao pote mas que, apanhada em flagrante, assobia para o lado, 'não fui eu...'. Que falta de tudo, credo, que falta de tudo.
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Depois, já aqui onde agora escrevo, vejo na televisão que a cimeira voltou a parir um rato ou nem isso, e lá vi aqueles entediados e amorfos governantes europeus, bovina e mansamente deixando-se ir na conversa do casal Angela e Nicolas que já falam em nome de todos, subindo ambos ao púlpito e anunciando as conclusões a que não chegaram.
(Aliás, qual rato?! Pariu mas foi um urso de peluche que foi o que a Merkel ofereceu ao Nicolas pela sua filha Giulia)
Angela Merkel, a mulher que tem o Nicolas no bolso e que, entretanto, enquanto a crise alastra, vai empatando a Europa toda |
A seguir vejo o nosso ex-Doce, de cabelo cortado, casaco cinzento claro de mais, com uma gravata fúcsia que ficava desastrosa naquele conjunto, falando, sem lábios, para dizer coisa nenhuma.
Com ar de quem levava o rabo entre as pernas, lá ia o agora fustigado Berlusconi contra quem a fúria dos mercados agora se virou. Presumo que já nem lhe apeteça dizer da Angela o que há bem pouco tempo dizia, nem que tenha ânimo para as festanças do costume com as jovens que tinha avençadas...
Com ar de quem já não é o (único) mau da fita, Papandreu, um homem que acho que tem presença e charme, já dizia que 'o problema não é grego, é europeu'. E tem razão.
No meio disto, Durão Barroso remeteu-se outra vez à sua alma de cherne e lá o vi de óculos na ponta do nariz, enfiado, e, no fim, rodeado de microfones a dizer banalidades, de novo submerso nas águas profundas em que geralmente se oculta.
A Europa a afundar-se e aquela corte ali anda, a cumprimentarem-se uns aos outros, a falarem pelos cantos, a encanarem a perna à rã.
A Grécia a ferro e fogo, os portugueses a caminho da pobreza, Espanha e Itália a irem rapidamente também para o buraco, multidões indignadas nas ruas, e estes burocratas sem visão não são capazes de um golpe de asa que relance a economia e redefina o papel da Europa, afirmando um papel no mundo à altura da sua história.
Vi também o horror da Turquia: acts of god, force majeure. Destruição e morte num forte abalo sísmico. Que a maldição não nos atinja tão cedo, sabendo eu que já estamos a desafiar as probabilidades que apontam para que um abalo deste género é inevitável e (matematicamente falando) já deveria ter acontecido por cá há algum tempo (noc-noc-noc, batam três vezes na madeira, se fazem favor).
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Mas isto não é maneira de começar a semana, com conversetas deprimentes, ideias assustadoras, com notícias tristes. Nem pensar. Por isso, meus Caros, vamos lá a abrir um sorriso que eu dou uma ajudinha, está bem?
Boa semana. Aproveitem bem a vida.
8 comentários:
O seu post está de acordo com o tempo... de tempestade.
Packard,
Pois - mas eu ainda tento esforçar-me por encontrar algumas résteas de esperança, algumas résteas de humor... Mas não é fácil.
Boa semana para si, de preferência pouco tempestuosa.
Ontem foi mesmo vendaval por aqui também.
Sem net, sem tv e lá fora os arbustos numa dança desgarrada.
Hoje, ao ler o seu post, lembrei-me dos meus dois pinheiros bravos, os mais altos do bairro, os primeiros a ver nascer o Sol...
Há tempo que os nossos vizinhos delicadamente nos diziam que o muro alto que nos separa, estava ameaçado pelas raízes... e podia cair-lhes em cima. Alguns estudos. Nada a fazer.
Levei tempo a aceitar que um dia tinha de ser. E foi. Nessa noite fui ve-los pela última vez. Altaneiros
desconheciam que estavam no corredor da morte. E nós que desenhámos cuidadosamente a casa de forma a incluir os quatro pinheiros, sobravam-nos dois. Os outros apanharam a doença.Paciência, foi morte natural.
Nessa noite não dormi.E não foi porque o Prof. Cavaco tinha ganho as primeiras presidenciais. Queria lá saber.
De manhã vieram as máquinas. Só tiveram tempo de ver o último nascer do Sol. Saí cedo e só voltei à noite.
Fui ficando doente. Foi um ano de muitas perdas e a maior já se avistava...
Hoje nesse lugar há um espaço muito agradável com vista para o castelo de Palmela...
O luto está feito.
Como podemos amar as árvores desta maneira?
Voltei a pensar nisso...
Sempre em Jeito manso, vai falando de uma árvore renascida, da beleza da chuva, do cheiro a terra molhada (hum... que delícia), dos porquês sábios de uma criança, dá-nos música bela e...
Vêm o sr.ministro, convencido que, nos convence, a Bela Ângela e o recém papá, o Cherne de água doce, a desgraça na Turquia, tudo o que pode trazer problemas, terminando com a ironia mansa, do ursinho de peluche.
Amiga, você joga com as palavras, de uma forma que, me atrai. Tem um espírito de ironia fino e saboroso.
E tudo isto, de "Um Jeito manso", só seu.
Pronto. Chega de elogios por hoje.
Maria
O que me ficou deste post: o mais bonito a grevílea; o mais triste a ministra da Economia da Espanha, Elena Salgado, cada vez que abre a boca diz "España no es Portugal", para contentar os espanhóis e eles acreditam...
Era uma Vez,
Gostei muito de ler o que escreveu. Percebo tão bem esse amor por árvores. Eu venero-as, aparo os pequenos ramos indesejados como se cortasse o cabelo a filhos, ajeito-as, cheiro-as (os eucaliptos, os pinheiros, os loureiros), ando por perto a vigiá-las, e se vejo alguma a ficar seca, fico num susto como se fosse uma pessoa da família a ficar doente e velha. Este ano morreu uma figueira (e ainda estou para perceber como morre uma árvore assim, está bem, vigorosa e depois começa a definhar, a definhar). Agora ando nesta dúvida, se havemos de cortá-la já ou se esperamos a ver se, na primavera, renasce.
Percebo o que diz quando refere que agora está mais desafogado, que se vê o castelo. Mesmo à frente da janela da cozinha tenho uma figueira grande que tapa a luz mas o que eu tento evitar que ela seja fortemente desbastada...
Enfim, são pancadas...!
Muito obrigada, Maria, olhe que eu ainda fico para aqui toda babada...
Muito gratificantes as suas palavras.
Sabe? Gosto de coisas simples, de podar árvores, de andar no meio da terra, de plantar coisas (sem luvas... o que me dá cabo das mãos...), mas, simultaneamente, gosto muito de palavras, de livros, de pintura, de fotografia, de música.
O complicado é conseguir conciliar tudo isso com a família, o arranjo da casa, o trabalho, o tempo gasto no trânsito... e com o sono (que ando sempre a precisar de pôr o sono em dia).
Mas, enfim, desde que as coisas se façam com prazer, tudo se faz. E estar aqui a escrever e a responder aos comentários é um enorme prazer.
Obrigada pelas palavras e pela visita.
Um beijinho, Maria.
Olá Rosa Amarela,
Tem toda a razão, as palavras da espanhola pouca graça têm quando comparadas com uma pequena árvore que renasce (qual fénix...).
Volte sempre, Rosa Amarela, é sempre muito bem vinda por estas bandas.
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