'São João Baptista', 1599-1600, 129 x 94 cm, Caravaggio |
Tive há algum tempo atrás o privilégio de poder visitar uma exposição dedicada a Caravaggio. O museu transbordava, como é habitual fora de Portugal.
A mim puxa-me sempre mais para os abstractos, ou para os expressionistas e, vá lá, para os impressionistas.
Por isso, ia ver o Caravaggio porque gosto de pintura, porque gosto de museus, porque é uma obra marcante mas, tenho que confessar, a minha ignorância da altura (ou a minha inexperiência) não permitia que as expectativas fossem muito altas.
No entanto, quando percorri aquelas salas cheias de gente em silêncio, como numa igreja, deixei-me tomar por uma sensação de devoção, de fascínio. As imagens que aqui coloco não deixam perceber, nem de longe, o que é ao vivo.
Ao vivo, é uma coisa carnal, íntima, visceral. Há uma densidade nas tintas, há um claro/escuro envolvente, há uma emoção que sai das telas, um realismo extraordinário, os dentes estragados, as unhas sujas, a pele áspera, os olhos ensanguentados, o cabelo empastado, a transpiração e a lubricidade, o riso por vezes alarve, ou a dor, ou a raiva, ou a intimidade, ou a vaidade, ou o sorriso sorrateiro, ou o desespero limite.
Autoretrato, pormenor de 'David segurando a cabeça de Golias', 1605-1606(ou 1610), 125 x 100cm, Caravaggio |
Viveu uma vida de excessos, de brigas, de prisões, de álcool, de sexo, de desafio, de aventura, de ódios, de desejo, de tormentos, de violência, de amores proibidos, in the edge, in the border line. Como todas as criaturas excessivas, foi amado com paixão, foi odiado, e como todas as pessoas assim, tomadas pela fúria da paixão, morreu cedo. Apareceu morto numa praia, ainda não tinha 40 anos.
As suas pinturas desvendam esse mundo de excessos e está lá tudo. Está lá a carne, o sangue, o suor, o esperma, as lágrimas.
Pormenor de 'O martírio de S. Mateus', 1599-1600, 323 x 343 cm, Caravaggio |
A grande dimensão de algumas telas ajuda a transmitir-nos a sensação de que estamos lá, como se estivéssemos a presenciar os jovens nus, lúbricos, os amigos ébrios, a mão que degola, o sangue que escorre, o cheiro dos corpos.
Estas fotografias tirei-as a páginas de um livro da Taschen e a luz reflecte-se introduzindo manchas de luz onde elas não existem. No entanto, coloco-as na mesma.
Para quem não tenha a oportunidade de sentir ao vivo a emoção de estar junto aos originais de Caravaggio, sugiro que os procurem nos museus virtuais, nomeadamente na Uffizi onde se encontram alguns, através da ferramenta da Google, Google Art Project.
No post abaixo poderão ver o trailer do filme homónimo que ajuda a compreender o background que justifica a intensidade extraordinária da pintura de Caravaggio.
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