Esta sexta-feira foi quase o esfolar do rabo de Outubro. Vai mudar a hora, o que não é bom, mas parece que, felizmente, vai vir chuva a valer, e isso é bom. Mas o dia, em si, para mim, veio carregado de complicações, telefonemas pouco animadores, enrolos. Aliás, ainda dormia o sono dos justos e já o telefone buzinava. Acordar para ser de imediato informada de pepinos ou para atirarem macacos para o meu colo é coisa sem a qual passaria muito bem. E muitas indefinições. Gosto de coisas claras, actividades bem definidas, prazos que possam ser controlados. A nível profissional não gosto de me mover em geometrias variáveis cujos vectores não controlo. Não saber quando me vou ver livre de uma determinada actividade que julguei que, a esta hora, já estivesse mais que concluída, chateia-me. E, quando tento perceber em que param as modas, apercebo-me do mesmo de sempre: não é possível fixar datas com objectividade. Por mais que tente, está fora do meu alcance. Tenho que adaptar o meu corpo e a minha mente a isto de me deixar ir. Mas não me é fácil, ensarilham-se-me os neurónios.
Para acabar em beleza, dentista. E nem foi que o tratamento tivesse custado muito. Mas o pagamento custou. Dantes ia-se ao dentista e o dentista observava, brocava, anestesiava, desvitalizava, fazia o acabamento -- e estava feito. Agora um espreita, outro abre, outro desentope o canal, outro tapa e, no fim de várias sessões da treta, por causa de um não-problema da treta, largamos centenas de euros. Protestei que me fartei mas o protesto não aplacou o meu desagrado. O progresso, de vez em quando, perde-se no seu rumo, descamba, atropela-nos. Não gosto disso.
Ao fim do dia fomos passear para a praia. Dentro de dois dias, àquela hora será noite cerrada. Aliás, na volta da caminhada já era noite. Gosto. Cheira a maresia, é bonito. Mas estava cansada, sem grande vontade. O meu marido é que quis. Diz que é melhor para passear o urso, que gasta mais energias. Sei lá se é.
O que sei é que estou francamente cansada. Há bocado, estava a dar o Master Chef Australia, um dos meus programas preferidos, adormeci profundamente. Creio que coisa de escassos minutos mas profunda, a pique. Vi-me grega para acordar. E, depois de acordada, fiquei a olhar para a televisão e para o computador, numa lentidão adormecida, entorpecida.
Nenhuma notícia me suscitou atenção a não ser a da exposição sobre o trabalho inovador e excêntrico da inspirada Elsa Schiaparelli (nascida em 1890 e morta em 1973).
Não ando numa de viajar mas, se andasse, era moça para dar uma saltada a ver a exposição Shocking! Les mondes surréalistes d'Elsa Schiaparelli no Musée des Arts Décoratifs de Paris.
A audácia quando anda de mãos dadas com a criatividade e com a inteligência fascinam-me. E isto de a moda inspirada na fantástica obra de Schiaparelli estar a renascer, exuberante e belíssima, através de mãos que sabem reinterpretar o espírito original e dar-lhe novo corpo parece-me daqueles milagres de ressurreição que devem ser colocados num altar.
E que as mãos que produzem tal fascinante milagre sejam de um americano, Daniel Roseberry, ainda mais extraordinário me parece. Das suas mãos nasce a irreverência e a arte colorida com que, em tempos, Elsa Schiaparelli sonhou para surpreendeu os que assistiam à sua intrépida arte avant-garde.
Shocking! The Surreal World of Elsa Schiaparelli
Since the founding of her namesake Maison, Elsa Schiaparelli (1890-1973) remains an iconic figure for our times. This exhibition retraces her life and the legacy of her avant-garde work, her incredible freedom, her fascination with art and her groundbreaking collaborations with artists such as Jean Cocteau, Salvador Dalí, Man Ray, Alberto Giacometti and Marcel Vertès…
Está também em vias de divulgação o documentário «Shocking Schiaparelli» que vai contar a vida desta mulher que conviveu com os surrealistas, que soube transportar a fantasia para as suas criações, que não temeu o excesso.
E, embora com um ano de desfasamento, não quero deixar de aqui incluir o fantástico desfile de outono/inverno 21/22. É tudo delirantemente belo, esfuziantemente excessivo, loucamente exuberante. Um festim.
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A acompanhar-nos, agora que se foi, Jerry Lee Lewis com o sempre fantástico Great Balls Of Fire!
Nota: o nome da Exposição e do Documentário vem do nome do perfume de Schiaparelli: Schocking
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Um bom sábado
Saúde. Bom descanso. Paz.
1 comentário:
Texto muito bem escrito recheado de ironia. Gostei muito.
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Um Sábado feliz … Saudações cordiais.
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