Aprendemos, quando estudámos História, que há sempre gente que se põe do lado do invasor. Desde tempos imemoriais. Enquanto uns querem manter a nacionalidade com que nasceram e defendem a sua terra como se defendessem a sua casa e o seu coração e querem a independência da sua terra e do seu espírito e a liberdade para escolher o que querem, há sempre os que se baldeiam para o lado de lá, defendendo os agressores. Sempre assim foi. Corre-lhes nas veias o sangue de Miguel de Vasconcelos. Vêem vantagens em alinhar com os invasores, criticam os que lhes fazem frente.
Claro que lutar pela liberdade custa muito. Por vezes custa a liberdade. Por vezes custa a vida. Mas há os que antes livres, embora em risco, do que ajoelhados e servis.
Não vale a pena eu tentar imaginar o que faria se fosse ucraniana e quisesse continuar ucraniana e quisesse viver civilizadamente, livremente, junto dos outros europeus livres e, ao mesmo tempo, tivesse medo da ameaça do ditador assassino. Se calhar lutava com todas as minhas forças a favor da Ucrânia livre, quereria que a Ucrânia aderisse à UE e, provavelmente, com medo de que neutralidade significasse ficar indefesa, quereria que a Ucrânia pertencesse à Nato. Se calhar.
Há por aí muito fala-barato a pregar que a Ucrânia não apenas deveria estar caladinha para não afrontar o violador Putin como que nunca deveria ter dito que gostaria de estar dentro da Nato.
Mas o que se vê é no que deu a neutralidade em que a Ucrânia está. Neutral e indefesa -- sem que a Nato se arrisque a defendê-la não vá o criminoso carregar em mais botões, nomeadamente os nucleares, e não apenas abrir uma cratera invernal onde andes havia um país como espalhar a guerra por todo o mundo. Se a Ucrânia pertencesse à Nato certamente o cão raivoso teria pensado duas vezes. Assim está à vontade: destrói, esventra, dizima, extermina. E nós, os civilizados, os livres, nada podemos fazer para travar o criminoso porque, como a Ucrânia não pertence à Nato, estamos de pés e mãos atados. Bela neutralidade a da Ucrânia... muito conveniente para a Rússia.
E, perante estes crimes tenebrosos, ainda há quem venha criticar a Ucrânia ou lembrar guerras pretéritas. Não sei como funciona a cabeça desta gente que, num momento em que o que há a fazer é exigir o fim da guerra e o fim da invasão e afirmar o total repúdio pela actuação de Putin, aparecem a invocar outras guerras e nem todas com mão de Putin. Claro que nem todas as guerras à superfície da terra têm mão de Putin. E daí?
Vamos continuar a matar-nos uns aos outros até que não sobre vivalma porque antes houve uma guerra e antes de essa uma outra e antes uma outra e antes uma outra e antes uma outra? Vamos ser burros a esse ponto?
O mundo não é linear nem a história é a preto e branco. Sei que há muitas sombras, muitos cinzentos, mil sombras de cinza. Mas no meio de tudo há uma linha vermelha, traçada a sangue. E aí a compreensão dos factos simplifica-se: há os que estão de um lado dessa linha e os que estão de outro.
Eu estou do lado da liberdade, da democracia, do direito à livre escolha dos cidadãos, eu estou do lado da paz. Nem tudo é perfeito neste lado. Mas, ainda assim, é o lado que prefiro. Do outro lado há os que defendem regimes autocratas, ditatoriais, intimidatórios, os que não querem saber de liberdades e direitos individuais, os que não respeitam a dignidade ou a vida humana.
E há ainda a corte dos agressores, violadores, assassinos: gente que os desculpabiliza, que acusa as vítimas, que invoca os 'mas' que sempre há para invocar. Do lado desses, bem como do lado dos cobardes, vendidos e influenciáveis claro que não espero mais do que aquilo de que são capazes: intriga, ameaças, manipulação, maledicência, conversa fiada.
Mas dos corajosos eu espero que não se calem.
É importante que muitas vozes consigam chegar até à Rússia. É importante que comece a formar-se na opinião pública russa o sentimento de revolta e de consciência da insustentabilidade daquele regime corrupto, podre, diabólico, malévolo. É importante que rapidamente apeiem o criminoso. Putin tem que ser impedido de continuar a fazer mal, tem que ser impossibilitado, seja de que forma for, de continuar a espalhar o mal e a envenenar o ar que se respira.
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