sexta-feira, dezembro 27, 2019

O meu último dia de Natal do ano da graça de 2019 -- também com reportagem fotográfica




Esta noite estou verdadeiramente na ressaca. Aliás, a ressaca começou ao início da noite, na viagem de regresso de casa dos meus pais. Mal o carro arrancou, qual bebé, adormeci profundamente. Mas não fui só eu: os três que vinham no banco de trás do carro caíram igualmente no sono. Cheguei a casa quase inerte e assim me tenho mantido. 

De manhã, só os dois, tínhamos ido passear para a beira do rio, lugar de todos os retemperos.


Fotografei e foi o deslumbramento de sempre. Olhar a bela cidade através da lente tem outra magia, parece que os movimentos das gaivotas são coreografias, que as cores das casas o cenário, parece que os pormenores se salientam para passarem para primeiro plano, tudo parece muito belo e sereno. Olho tudo como a primeira vez e essa atenção descansa-me a mente e o corpo. Entrego-me, de todo, à boa sensação de ali estar.

Olhei as águas, a paisagem, aspirei o ar fresco. Tão bom. Fico sempre a sentir-me renascida.

Já aqui o disse algumas vezes: se calhar, sem o saber, isto tem em mim o efeito que a meditação tem noutras pessoas.


O ria ia cheio de frutos e daquela folhagem que as fortes chuvadas arrancam das margens e que as correntes puxam a caminho do mar.

O meu marido gozou logo: será que o Marcelo, qual sereia, vai atirar-se ao rio para o limpar? É que, na reportagem da véspera, ele diz que viu o Marcelo a apanhar daquilo. E eu até o gravei a fazer essa pergunta. Mas agora, ao ver se dava para colocar aqui, reparo que, como sempre, não mantive a máquina estabilizada e almareia só de olhar.


Voltámos mesmo a tempo de preparar o almoço, misto de restos e misto de coisa nova. É que logo, logo, chegou parte da turma que iria connosco, juntando-se aos restantes, em casa dos meus pais. Almoçámos e zarpámos. 

Como sempre, apesar de mais do que avisada para evitar os habituais abusos, a minha mãe voltou a preparar um banquete. Mesa farta. Tudo feito por ela. Uma coisa surpreendente. Não apenas o lanche foi dos bons como as meninas grandes ainda vieram carregadas de petiscos. Não sei que energia e boa cabeça é aquela: apesar dos oitenta e muitos mantém-se impecável e acho-a mais jovem de cabeça do que quando eu era miúda e vivia lá em casa. Os presentes que comprou para toda a gente, quase todas as compras para a casa, a orientação e acompanhamento de todas as rotinas relacionadas com o meu pai e, sempre que as tropas se reúnem lá em casa, lanche para todos. Uma força, uma agilidade, uma criatividade fantásticas. Quem me dera que seja genético e que tenha passado para mim e para os meus filhos e netos.


Desta vez não houve futebolada no jardim. Nota-se que os rapazes estão cansados. Em vez da bola, das lutas, das corridas e da confusão barulhenta, puseram-se a ver televisão. A maior agitação deu-se quando eles quiseram ver futebol e ela lhes rapinou o comando e quis pôr nos canais de desenhos animados ou coisa do género.

Os mais crescidos também já davam mostras de algum cansaço e talvez a mais fresca fosse mesmo a minha mãe.

O meu pai, apesar de não ver e de mal ouvir, parece que pressentia que havia movimentação e estava um bocado agitado. Por isso, felizmente os miúdos não estavam naqueles dias de grande fuzuê senão é que ele ficava mesmo inquieto.

De tarde os rapazes, os grandes e os pequenos, tinham estado a apanhar laranjas e, portanto, também trouxémos umas sacadas.  Umas laranjas sumarentas e doces de dar gosto.

De presente da minha mãe recebi o Nº5, eau de parfum que sempre me oferece, uma écharpe macia e quentinha numas belas cores quentes que coloquei logo e que ainda não tirei. Desdobra-se e fica uma capa de lã aconchegante.

E recebi um livro surpreendente. É um livro da autoria do seu médico de sempre, um médico que ainda tem mais idade que ela mas que é outro jovem de cabeça. Tenho estado aqui a folheá-lo e é bastante interessante, conjugando medicina e história. E, graça das graças, tem uma dedicatória que me é dirigida. 

Conheço estas figurinhas nem sei há quanto tempo.
Pelo Natal saem à cena.
Agora estão no móvel pequeno onde estão as fotografias dos cinco bisnetos, quando recém-nascidos:
é o presépio da casa dos meus pais

Estivemos também com o meu tio. Tenho-o achado mais caído. A minha tia tem estado adoentada e o alterarem a sua rotina de saírem todos os dias, está a deprimi-la e, a ele, está a causar abalo pois não apenas os seus hábitos se têm alterado como ver a minha tia assim o deixa também bastante triste. E a mim custa-me muito vê-lo assim. Para mim ele será sempre aquele meu tio amigo e cúmplice que, tal como o meu outro tio, ia comigo dar passeios de mota à socapa dos meus pais. Mas o tempo passa. Hoje, daqueles três homens muito jovens, o meu pai e os meus dois tios, desportistas, todos cheios de vida, um está acamado, outro já morreu e outro está a envelhecer a olhos vistos. Enfim. Vi que ele ficou contente a conversar com os sobrinhos-netos e, em especial, com o meu filho que lhe falou da empresa onde ele trabalhou a vida inteira.

E, com esta visita e com este dia dei por encerrada a época natalícia. E, como é bom de ver, já se começou a falar do que será o almoço do primeiro dia do Ano Novo.

Tempus fugit. Vita brevis.

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E, nem sei bem se a propósito de alguma coisa, permitam que coloque aqui dois vídeos com bailados do Nederlands Dans Theater, um lugar muito especial. Talvez sejam dois presentes para quem me faz companhia aí desse lado. Já vêm fora de tempo mas pode ser que aquilo de Natal ser quando a gente quiser seja verdade.

Com músicas de Heinrich Ignaz Franz Biber, John Cage, Philip Glass, Johann Sebastian Bach e coreografia de Jiří Kylián: uma beleza do outro mundo



Sobre música de Igor Stravinsky e coreografia de Jiří Kylián: belíssimo


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Uma boa sexta-feira.

2 comentários:

Anónimo disse...

Viva, UJM!

Passo aqui só para dessejar um bom Ano Novo! Já que o Natal deixei-o entretanto passar...

Este ano o meu Natal foi que, passeando pela praia na véspera, depois da manhã prolongada no escritório, antes da companhia da garrafa que guardei de reserva e da outra companhia com quem não sabia ainda se partilharia a garrafa ou não, a areia macia sob os pés, a água fria a embater com insistência boa nos tornozelos, leio em letras garrafais "FELIZ NATAL". Estupidamente, senti com toda a certeza que eram para mim.

Afinal, todos precisamos de uma estrela. Sob a forma que lhe apeteça a ela. Desde que para nós.

"Escutai, pois! Se as estrelas se acendem / é porque alguém precisa delas. / É porque, em verdade, é indispensável / que sobre todos os tetos, cada noite, / uma única estrela, pelo menos, se alumie."
(Valdimir Maiakovski)

Há de ser assim que as estrelas funcionam. Como não?

Um abraço,
JV

Um Jeito Manso disse...

Olá JV,

Também me atrasei a responder. Mas aqui estou. Isto do Natal é o que é e cada vez sinto que devia ser outra coisa. Nem é certo que o dia 25 seja o tal dia. Portanto, acho que não nos devemos focar demais numa coisa que tende a ficar submersa pela pressão comercial e pela banalização de votos, tantas vezes sem sentido.

O que eu lhe desejo, JV, e desejo muito é que se sinta bem e que encontre o seu caminho, se possível que encontre a companhia que a fará sentir mais completa, e que se sinta todos os dias motivada e que sinta o reconhecimento e estima por parte dos outros.

E que muitas estrelas se vão iluminando à sua passagem.

Um abraço, JV. Seja feliz.