domingo, fevereiro 18, 2018

Flâneur, a livraria


Gosto de flanar. Sou do género turista acidental -- ver por ver, ao acaso, sem saber onde os passos me levam. Se vou passear para algum lugar, não sou do género de pessoa que, antes, se prepara exaustivamente, que estuda tudo o que há a ver, que sabe onde se come o quê e por quanto, que bate aos pontos os autóctones sobre a história de cada monumento ou edifício. Nada. Posso dar uma vista de olhos a vol d'oiseau sobre alguma informação mas não de modo a que, ao andar por lá, corra o risco de não estar disponível para ceder de improviso.

Flâner, em francês. Passear sem propósito, sem pressa.

Posso dizer que sou uma flâneuse. Com uma máquina fotográfica na mão para melhor atender aos pormenores ou aos ângulos de visão que proporcionam a melhor perspectiva, sem pressa, sem rumo, assim gosto eu de andar pelas cidades.

Assim também a ler. Leitora não estudiosa, não sistemática, sem nunca anotar nas margens, sem nunca aprofundar temáticas, sem dissecar frases ou temas para descobrir influências, sem sacrificar o prazer da leitura ao rigor da análise, sem a disciplina de leituras completas ou não evitando leituras intercaladas. Flâneuse também na leitura.

Foi, por isso, com imediata empatia que soube da existência de uma pequena livraria no Porto com esse nome. Flâneur. Um nome feliz para uma livraria de bairro no centro de uma grande cidade. Que é ao pé da Casa da Música, que é de um casal muito simpático, que é uma livraria muito tranquila, com um ambiente de livraria de bairro -- isto foi o que me disseram.



Almoçámos no restaurante da Casa da Música, uma comidinha boa, jazz por companhia, num 7º andar onde se acede ao terraço dos azulejos que ontem mostrei e de onde se tem uma bela vista sobre a zona da Boavista.


E, de seguida, estômago confortado, lá fomos. Ruas de pequenas casas, de pequenos prédios. Por detrás de uma das zonas mais centrais e movimentadas do Porto, está-se numa zona de ruas quase sem trânsito, muito pacata

De fora, mal se vê. O meu marido: 'Eu não disse? Deve ser daquelas coisas...Estou mesmo a ver.'. Não comentei para não estimular as piadas.

Foquei-me, antes, num poema escrito no vidro da porta. Manuel António Pina (que também tem lá dentro o 'seu' espaço).

A livraria é um pequeno espaço (pequeno se se comparar com as Fnacs ou Bertrands desta vida) mas um espaço luminoso, muito agradável. Há largueza, bom gosto e há, sobretudo, boa visibilidade para as obras expostas.


Sentada a uma mesa, a jovem que presumo que seja a Cátia e, ao balcão, de pé, o Arnaldo. Sorridentes, afáveis. Um ambiente zen.

Éramos os únicos clientes. Depois chegou um senhor que conhecia a livraria de um anterior espaço e que estava todo contente por vê-los ali, que estavam melhor, e por ver bicicletas, uma novidade. Vi depois, no site, que se pode encomendar livros e que, no perímetro do Porto e arredores próximos, é o Arnaldo que os entrega de bicicleta.


Enquanto cirandava pelas estantes, a Cátia analisava encomendas e validava com o Arnaldo se seria de oferecer ou cobrar os portes. O ambiente é, pois, naturalmente informal.

Estava à espera que o meu marido começasse a segredar-me que estava mesmo à espera que fosse uma coisa assim e que só eu é que meto na cabeça fazer tantos quilómetros para ver uma pequena livraria de bairro. Não gosta de estar em lojas em que somos os únicos clientes e em que, sabe-se lá porquê, parece que temos que sussurrar para não perturbar os vendeores. Mas, curiosamente, não disse nada e esteve a ver os livros.


Trouxe os livros que abaixo vos mostro, presumo que se trate de fundos de colecção já que os preços eram muito baixos. Paguei pelos cinco livros creio que trinta e picos euros. E de uma coisa poderão os meus Leitores estar certos: se eu morasse no Porto ou por lá perto, não deixaria de passar assiduamente pela Flâneur.


E daqui desejo as maiores felicidades à Cátia e ao Arnaldo: que a Flâneur se torne uma livraria de referência no Porto.

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