Aquilo que me ligou à Sophia de Mello Breyner não foi a amizade, que resulta dum contexto de ideias ou duma compatibilidade histórica; quer dizer, do facto de sermos contemporâneos, sujeitos a uma mesma disciplina moral e cultural. Não era isso. Nós tínhamos a capacidade de nos impressionarmos; como as crianças têm.
Thomas Mann, a dado momento da sua vida, ao ver uma criança a repetir sempre a mesma brincadeira, pôs-se a reflectir sobre isso que lhe parecia extraordinário. Era assim connosco. Tomávamos a sério coisas que no fundo nos divertiam. A Sophia e eu não sabíamos o que era a solidão. O concreto era a aventura, e a poesia era a sua forma de ser concreta.
Falando-lhe eu um dia do Marquês de Pombal e da atitude pessoal que teve no processo dos Távoras, simplesmente não me quis ouvir. Não gostava de discutir as coisas que não eram da sua linhagem intelectual.
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Debatíamos isto, ela a tomar chá e a fumar.
Eu replicava que não há nada pior do que o fastio de se ser sensato. Era assim que nos entendíamos. Mas raramente conversávamos. Às vezes pedia-me conselhos e dizia-me: "Não quero bons conselhos, desses estou até aos olhos. Antes aqueles conselhos que se esquecem depressa como o vento que nos desarruma o cabelo.". Era assim que nos entendíamos. Mas raramente conversávamos. Dava muito trabalho defendermo-nos do ciúme de quem disputava a amizade dela. A outra amizade.
Uma coisa era certa. Acabávamos sempre por estar de acordo sobe o Marquês: "Um chato."
Era assim connosco. Era bom.
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Tal como no post abaixo, no qual Agustina fala de Callas, também aqui a selecção das músicas e as fotografias é coisa minha.
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1 comentário:
É isso, "as coisas que passam ficam para sempre numa história exacta." E um pouco chata, digo eu.
Agustina devia ser fã de Tom Jobim e da sua insensatez.
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