domingo, fevereiro 14, 2016

A autora de Um Jeito Manso comemora o Dia dos Namorados com a Deliciosa de Rabelais
[1º capítulo]




Eram abundantes e revoltos os opulentos cabelos, que ela enrolava com uma deliciosa e voluptuosa negligência, na qual pairava uma pontinha de coquetterie muito expressiva. De mediana estatura, mais alta do que baixa, era franzina de formas, magra mesmo.

Dava nas vistas a maneira aprimorada como ela se calçava. Sempre meias de seda e sapatos ou botinhas da mais fina qualidade e do mais elegante e bonito talhe.

Contavam os que de perto a conheciam que as ligas eram verdadeiros bijous de rendas e combinações de cores, e que as camisas que usava se singularizavam pela arrojada fantasia que expressavam.

Uns depreciavam-na dizendo que ela não era merecedora de que lhe rendessem culto. Outros elogiavam-na afirmando que ela era uma histérica dotada de um temperamento de fogo, que se interessava excessivamente pelas lutas de Vénus e que possuía segredos quase maravilhosos para elevar às regiões de inenarráveis gozos as mais insensíveis e cristalizadas decadências, gastas no abuso dos prazeres da deusa.

Eu fui sempre da opinião dos segundos.


Realmente aquela mulher estava longe de possuir a formosura fisionómica de Ninon de Lenclos ou a beleza plástica de Friné e da Lais, gregas que à história passaram como exemplares irrepreensíveis da plástica feminina.

Mas... achava-lhe um não sei quê, um tic, uma nota irritante e expressiva que me mordia a carne como um estilete de fogo, pois me segredava que aquela mulher devia possuir verdadeiros tesouros de volúpia quando a ardência de seu temperamento, expressa no seu olhar quente e singular, a levasse a interessar-se pelo homem que a possuísse.

E, depois, era artista de gosto e cuidava do seu corpo com o mais requintado escrúpulo.


Levava mesmo esses cuidados até ao excesso de nunca se deitar sem banhar em água aromatizada os seus mimosos pezinhos, e todas as manhãs, apenas saía do leito, tomava um banho tépido, ungindo depois as carnes com pomadas de amêndoas e leite, o que lhe dava uma frescura deliciosa.
...

Foi ela quem me veio abrir a porta, fazendo-me entrar para um pequenino gabinete modestamente mobilado, mas de muito gosto e fina ornamentação.

- Já vejo que é homem de palavra -- disse, sentando-se a meu lado e deixando a descoberto os seus elegantes embora não muito pequenos pés, calçados em sapatos de cetim branco e meias de seda negras bordadas.


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[A história da Deliciosa continua aqui]

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma belo dia de domingo
(e, claro está, que me estou nas tintas para o Dia de S.Valentim ou Dia dos Namorados ou o que for: namorar é sempre que a gente quiser -- e puder, of course)

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