domingo, setembro 27, 2015

O homem irracional - ou como pode ser perturbante não se conseguir identificar com exactidão o ponto em que se atravessa a fronteira entre o bem e o mal


Estava in the mood para ver um filme romântico, até podia ser uma coisa na base da comédia soft-depressive. 


Fui, pois, ver o Homem Irracional. Um Woody Allen que se preze terá sempre alguma pancada a polvilhar o charme discreto da burguesia, bons ambientes, decorações agradáveis, um romancezinho bem gramaticado.


Mas este filme não foi bem isso. Nadinha. Sim, tem romance, sim tem bons ambientes, tem academia, boas casas (e casas com livros), gente com aquele desequilíbrio que tem os seus laivos de sedução - mas depois tem aquele elemento de casualidade (e aqui a palavra casualidade derrapa perigosamente para o sentido da palavra quase homónima em língua inglesa) que, aos poucos, vai introduzindo ansiedade no argumento.

Claro que não vou falar na história mas, para mim, mais perturbador talvez que tudo tenha sido a ideia que me passou pela cabeça quando saí de lá. Comecei por calá-la. Mas depois verbalizei-a, mas verbalizei-a com má consciência - até porque me estava a referir a uma pessoa muito conhecida e muito na ordem do dia cá no burgo. Quem me ouviu, acenou que sim.
E quase parecia que sim, que há casos em que parece plausível que a alguém ocorra fazer uma coisa assim com um pretexto moral. 
Temas em que é difícil pensar, estes.

O personagem principal, desempenhado por Joaquin Phoenix (uma vez mais uma interpretação low profile mas, como sempre, também a pisar o limiar da inquietação), é um professor de filosofia e, portanto, há referências filosóficas ao longo de todo o filme. Hannah Arendt, claro, vem à baila. Mas nem é bem a banalidade do mal: é mais a indefinição moral do mal que pode levar a que, por um bom motivo, se enverede pelos movediços caminhos do mal. 

O bem e o mal, o crime e o castigo, o amor e o dever, a felicidade e a angústia - tudo isto anda de mãos dadas e a questão está em saber discernir onde se encontra a linha ténue (e móvel) que separa os opostos.

Perturbante.




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