sábado, março 10, 2012

O que é a beleza? .... Nem tento responder, mostro antes algumas coisas que acho belas (com a ajuda de Rodin, Degas, Van Gogh, Annie Leibovitz, Joana Vasconcelos, Sophia de Mello Breyner, Jane Campion, Grupo Corpo e, ainda, da matemática e do Jardim Botânico de Lisboa)


O que é a beleza?

Não sei responder. Poderia tentar mas ficaria sempre aquém do que qualquer outra pessoa diria. É uma coisa tão subjectiva. Eu gosto de amarelo porque, para mim, é luz, é alegria. Para outras pessoas o amarelo pode ser considerado berrante, uma cor de mau gosto. Ou acho um homem moreno mais sexy mas haverá quem os prefira lourinhos. 

Quando há uns anos andei à procura de casa, vimos dezenas de casas, novas ou usadas. Algumas das usadas ainda estavam mobiladas e nós ficávamos espantados com a fealdade do que víamos. Móveis  escuros em chão escuro ou com carpetes escuras, portas escuras, bibelots soturnos, quadros horríveis pregados quase junto ao tecto, sofás medonhos, etc, e no entanto as pessoas mostravam as casas com o desvelo de quem mostra uma coisa muito bonita, muito querida. O que para nós era horrível, para eles era a casa dos seus sonhos. Uma vez fomos parar a uma moradia que, pela descrição parecia uma maravilha. Quando lá chegámos só não virámos costas de imediato por boa educação. O chão era de mármore mas todo cheio de efeitos especiais, as portas tinham vidrinhos encaixados em metal, puxadores trabalhados de um dourado reluzente, no hall vitrais do mais duvidoso que se imagina, e cortinados cor de rosa no quarto e uma colcha inenarrável e tudo cheio de enfeites, quadrinhos de péssimo gosto, uma coisa que só vista . Por onde passávamos, eu só não ficava de boca aberta porque sei comportar-me em público. Pois a senhora, que me contou a sua história (o marido tinha-a trocado por outra e, para efeito de separação de bens, ela não tinha como compensar o marido caso ficasse com a casa pelo que a iam vender). E, ao falar em desfazer-se da casa, a senhora chorava, era a casa que tinha escolhido, que tinha decorado com tanto carinho, uma casa tão boa, tão bonita. Eu ouvi-a e senti a sua genuína angústia, era como se estivesse a desfazer-se de uma parte de si. Ela não compreenderia se soubesse que eu achava a casa horrorosa.

É como a caligrafia. O que é 'ter-se uma letra bonita'? Bem, em abono da verdade se diga que é questão que quase não se põe, dado que quase não escrevemos à mão. Mas, ainda assim, o que é uma letra bonita?

Há poucos anos frequentei o curso de Grafologia no Centro Nacional de Cultura, ministrado pelo Dr. Alberto Vaz da Silva. O local é óptimo, as instalações lindas e o professor uma pessoa interessantíssima. Pois bem, aprendi que a letra de uma pessoa revela muito do que ela é. Uma pessoa solar terá uma letra solta, fluida, as letras juntando-se umas às outras com elegância e naturalidade, uma escrita rápida. Pelo contrário, uma pessoa com amarguras terá uma escrita mais densa, uma letra mais apertada, mais incerta. E há a escrita ascendente e a inclinada para a frente que significa um apelo pelo futuro, pela novidade, uma vontade de seguir em frente, e há o contrário que já indica o peso do passado ou alguma depressão. E há a forma como se terminam as palavras e as margens à direita e à esquerda e a forma como se assina e o local em que se assina e tudo tem o seu significado. Uma letra pode ser muito certinha, muito bem feitinha e isso significar que a pessoa ainda é um bocado imatura ou que é muito sujeita a convencionalismos ou que é artificial, prezando, acima de tudo, as aparências..

(O estudo da grafologia é aliciante. Sempre que posso, pratico estas análises e, de facto, sabe-se muito de uma pessoa pela análise dos seus manuscritos. Só ainda não fiz a análise da minha escrita; acho que corria o risco de ser tendenciosa)

Por isso, o que é uma letra bonita?

Resumindo, a beleza não existe enquanto tal: é algo que varia consoante a pessoa que a aprecia.

O que eu sei é que a beleza proporciona um bem estar mental e emocional, eleva-nos, apazigua-nos. Apetece-nos estar perto, tocar, deixarmo-nos envolver pelo que é belo. Um quadro, uma paisagem, uma escultura, um filme, um rosto, uma expressão, um movimento.

Por isso, mais do que teorizar sobre o conceito abstracto ‘beleza’, vou antes exemplificar mostrando-vos algumas coisas que acho belas, estando eu muito certa de que alguns dos que me estão a ler acharão que, de belo, o que vou mostrar não tem nada. Seja.


Rodin - La danaide (a pedra macia que se transforma em carne de uma alvura  transcendente)



Degas - Bailarinas (a cumplicidade e a feminilidade em toda a sua graça, a harmonia da cor e do movimento)


Van Gogh - Seara com ciprestes (a cor, o sol não no céu mas na seara, o movimento da aragem,
o céu e a  turbulência da alma - e falo nesta turbulência numa altura em que há quem ponha em causa
a tese do seu suicídio, vide documentário 60 minutos na SIC N)



Annie Leibovitz - Kate Moss (a leveza da imagem que capta a essência do retratado)


Fractal - a beleza abstracta que se desmultiplica (ou que se divide? ou que se multiplica?



Joana de Vasconcelos e os seus Corações Independentes
(Brilho, luz e leveza nas formas tradicionais - filigrana ou talheres de plástico? Que importa?)


Jardim Botânico do Príncipe Real em Lisboa - a beleza sem tempo de um fresco, mágico, intemporal jardim 

Sophia de Mello Breyner - a caligrafia de uma mulher livre, inteligente, sensível, lutadora, única



Van Cleef and Arpels - Colar de diamantes, a beleza de uma jóia perfeita. Será cara, esta...? :) 




O Piano - dirigido por Jane Campion



Grupo Corpo -  aqui dançando 'Mi corazón'


Procurem a beleza e sintam-se bem, sim?  E tenham, meus Amigos, um belo sábado!  Divirtam-se!

13 comentários:

Maria disse...

Querida Jeitinho:
Sim, a beleza é muito subjectiva.
Quanto às casas, utilizo uma frase, que minha avó, usava para as pessoas:
"Quem feio ama, bonito lhe parece".
Para mim, as casas reflectem as pessoas que as habitam. Podem parecer-nos horrorosas, mas eles amam-nas.
Gosto de alguns amarelos. Um campo de girassóis é lindo. Os amarelos de Van Gogh, são lindos.
As esculturas imensas e intensas de Rodin, são maravilhosas. Mas a Pietá de MichaelAngelo, fez-me chorar de emoção. As bailarinas de Degas dançam na tela, mas os nenúfares de Monet respiram, na transparência esverdeada das águas.
Sophia, a menina eterna, que fazia poemas como ninguém. Piano e bailado gosto, quando me comove, detesto, quando não me toca. Estes tocaram-me. Jardim Botânico, a minha selva maravilhosa da infância, um local onde gosto de estar.
Jóias, como estas gosto. Detesto as espalhafatosas, tipo, novo rico.
Matemática, já sabe, não gosto.
Amo boa poesia, boa prosa. Um livro pode ser um objecto lindo.
Há pessoas aparentemente feias, mas cheias de tal beleza interior, que parecem bonitas.
Que grande testamento!
O seu texto é lindo.
Beijinhos
Maria

Maria disse...

Jeitinho amiga:
Acabei por não dizer que "O Piano" é um dos meus filmes especiais.
Beijinho
Maria

margarida disse...

Wow...

Anónimo disse...

Cara UJM

Sem dúvida um sítio para visitar e abusar pelo bom gosto e sensibilidade da autora, pela diversidade e despretensiosismo dos temas, pela beleza das imagens e ainda pela música e bailado.

Depois das tarefas prosaicas que alguns sábados impõem, UJM apresenta-nos a Beleza para terminar o dia.
Pequenos nadas? Felicidade!

Leanor pela verdura

Isabel disse...

Gostei de todas as suas escolhas para interpretar a beleza. Algumas já as conhecia.
Beleza é realmente um conceito muito subjectivo, mas eu acho que em arte, aprendemos a apreciar, à medida que conhecemos mais, e isso acaba por se ir reflectindo também nos nossos gostos.
Não sei se me fiz entender.
Desejo-lhe um bom domingo

patricio branco disse...

rodin é de facto um dos grandes escultores mas na escultura do corpo humano não há como os gregos, fidias, ou os bronzes (guerreiros) de riace.
Nós tempos o pensador que tamnbem não está mal.
e miguel angelo, a pietá

Um Jeito Manso disse...

Mary,

Escreveu um testamento...? Não senhora, escreveu um texto lindo. Gostei do passeio que fez pelas coisas de sua eleição, a Pietá, os nenúfares... Não há como a arte, seja em que forma for, mas nos trazer bons feelings, não é?

Engraçado dizer que o Jardim Botânico ser a selva da sua infância. Teve sorte e deve ser por ter tido uma infância num jardim de tanta beleza que se fez uma mulher forte e, ao mesmo tempo, sensível, assim como é.

Um beijinho e escrever sempre assim que eu gosto de a ler (e os leitores aqui do UJM também devem gostar).

Um Jeito Manso disse...

Margarida,

Wow também para a 'menina' que não há quem se lhe iguale em partilhar belas fotografias, boas músicas, pensamentos originais, excertos de outros blogues que descobre como ninguém.

Um beijinho, Margarida!

Um Jeito Manso disse...

Leanor que vem pela verdura,

Depois de tarefas prosaicas, diz...? Pois... eu com essas tarefas e com a casa tomada de assalto pela criançada toda (... que este fim de semana a casa ficou virada do avesso, várias vezes virada do avesso...), só agora (domingo às 10 da noite) aqui estou a responder aos vossos amáveis comentários e já quase a dormir... de tal forma estou KO.

Nem sei se hoje vou conseguir fazer alguma coisa por aqui. Às vezes esperto à medida que a noite avança, vamos ver.

E, Leanor, obrigada pelas suas palavras sempre tão incentivadoras.

Um Jeito Manso disse...

Isabel,

Fez-se entender muito bem. O gosto é subjectivo tal como a beleza mas tem razão: a aprendizagem e a habituação são essenciais.

Eu há uns anos não gostava da Paula Rego. Hoje, depois de ver várias exposições dela (e a Casa das Histórias em Cascais), depois de ter lido alguns livros sobre a sua obra e visto algumas entrevistas, tenho uma percepção totalmente diferente e gosto imenso. E o mesmo me tem acontecido com outros artistas, da pintura, à música, à poesia. A nossa cabeça vai-se abrindo, vamos sendo receptivos a outras maneiras de ver as coisas.

Obrigada pela visita, Isabel, e volte sempre.

Um Jeito Manso disse...

Caro Patrício,

Já Maria, acima, também referiu a Pietá. Claro que há expressões superlativas, únicas, insuperáveis.

Concordo com os grandes exemplos que referiu. São os grandes casos da arte.

Mas não nos podemos ficar apenas pelas grandes, grandes obras. Há as outras, as que não sendo feitas por 'deuses' são, na mesma, bons locais onde repousar a nossa mente.

Vejo, Caro Patrício, que apesar de reconhecer o mérito ou a beleza da arte mais contemporânea, as suas preferências vão mesmo é para os grandes clássicos, não é?

ERA UMA VEZ disse...

Provavelmente pouca gente saberá onde se encontra a sepultura de Sofia.
Eu sei. Infelizmente.Antes não soubesse.
É no alto de uma colina, perto de um moinho em ruínas.

Cada vez que lá vou, divido com ela as flores que levo e junto-as às pedrinhas da praia que lhe enfeitam a morada.
Às vezes atrevo-me a pedir-lhe inspiração. À minha irmã, conto segredos e saudades.

Nunca tinha visto a sua letra.
Pareceu-me a letra de uma menina que tenta os primeiros versos.

Que bonito!

Um Jeito Manso disse...

Querida Era uma Vez,

Deve ser um sítio bonito e a sua irmã está em boa companhia. Mas é muito triste que se tenham encontrado em tão tristes condições. Resta o consolo de que, ao visitar a sua irmã, pode pensar que ela está perto de uma outra pessoa especial.

Quanto à letra é uma letra especial. Tem esse lado de menina, sim, mas tem também sinais de que era uma pessoa ligada a coisas concretas. E tem também sinais de que apreciava os momentos em que estava consigo própria, a pensar.

Gosto de analisar a letra das pessoas. Claro que não é por um pequeno texto que se podem fazer análises completas mas dá para recolher indícios.

Um abraço, Erinha.