Parece que este sábado é Dia das Bruxas (aka Halloween) e, portanto, isso é bom porque a bruxaria é uma profissão da qual convém não nos esquecermos. Não sei bem quais as skills das Bruxas nos tempos que correm mas acredito que sejam mais polifacetadas do que dantes. Talvez roguem pragas on demand, talvez preguem partidas do destino a la façon. Não sei se prestam serviços de teletransporte nem sei se efectuam serviços por via remota, não sei se têm take away para patas de galinha ou olhos de morcego nem sei se trabalham com o Uber. Talvez, parece-me provável, faria sentido.
Seja como for, é sempre bom a gente estar de bem com elas. Nunca se sabe quando vamos precisar dos seus serviços ou, pelo menos, se alguém requerer os seus serviços contra nós, talvez, estando nós de bem com elas, talvez elas nos poupem. Pelo menos um bocadinho.
Seja como for, para festejar o dia, fiz um bolinho à maneira. Caso queiram provar, sirvam-se de uma fatia. Nham nham, parece tão apetitoso...
Mas, pronto, se os miolinhos ensanguentados vos parecerem um bocadinho nojentos, tenho aqui um outro acepipe mais apropriado a meninos sensíveis e a meninas apertadinhas, um inocente e little dedinho (por sinal, um dedinho a quem a vida correu um bocadinho mal).
Mas, enfim, reconheço, é só um dedinho. Para os lambões que achem que um dedinho não é nada, que nem enche a cova de um dente, tenho aqui um pratinho deles. Ui, tão bom, tão bom... Temos é que nos abstrair de olhar para eles para não nos incomodarmos com as artroses nem percebermos que já foram usados para limpar o nariz, para retirar cera dos ouvidos e para fazer toques rectais a garganeiros.
Bom apetite.
Talvez possam banquetear-se enquanto vêem este amoroso vídeo.
_________________________________________________
E, vá, para quem costume frequentar este boteco apenas para ouvir a bela música que habitualmente aqui é servida, para não desiludir, aqui vos deixo a banda sonora de um filme bem fofinho (e agora estou a falar mesmo a sério).
Primeiro bolinho do Halloween daqui, restantes daqui e não encontrei as receitas
Voltei aos dias em que a literatura não me acompanha. Desde que me levanto até sair para fazer uma caminhada, agora já bem de noite, não tenho um minuto de sossego. Por vezes penso que talvez consiga descansar um pouco a seguir ao almoço, ler umas páginas. Mas não tem sido possível. Olho o calendário e todos os dias constato que está a passar a correr.
No outro dia tive uma reunião -- remota, claro -- com pessoas de duas outras empresas. Uma das empresas era aquela para a qual trabalhei até há poucos meses. Revimo-nos, perguntámos uns pelos outros, sorrimos, e um deles, o que me era mais próximo, ao referir-se a mim a um dos da outra empresa, disse que eu tinha saído de lá há cerca de um ano. Não quis interrompê-lo. A ele parece-lhe que já foi há tanto tempo? Como pode ele ter-se enganado assim? Foi no verão, há poucos meses.
Mas não posso admirar-me: no outro dia recebi a visita de um ex-colega. Contou-me coisas de lá, de outros meus ex-colegas, contou-me como se fossem coisas empolgantes com as quais eu iria vibrar. Esforcei-me por mostrar alguma coisa mas a verdade é que ouvi com absoluto desinteresse. Foi como se fossem personagens de um tempo tão remoto que eu mal recordava.
Mas, nessa tal reunião, o outro a quem o meu ex-colega se dirigia falando de mim, para surpresa de todos, incluindo minha, disse que me conhecia há cerca de vinte anos, numa outra empresa, que tinha tido três reuniões comigo, recordava-se do meu gabinete, recordava-se do que tínhamos tratado. Eu não me lembrava dele, não o reconheci. Depois, quando ele detalhou, lembrei-me, sim, que tinha tratado daquele assunto, lembrava-me da empresa para a qual ele, então, trabalhava. Mas do seu nome, do seu rosto não me lembrava nada. Mas fiz de conta que sim, que já estava a reconhecê-lo.
No outro dia, experimentei fazer um teste idêntico ao que várias pessoas da empresa tinham feito. À pergunta: 'Sobre o que conheceu no passado, reconhece mais facilmente números e acontecimentos ou rostos e nomes?'. Hesitei. Acho que não ligo muito a coisas que perdem relevância com o tempo como é o caso de números e acontecimentos. Mas depois lembrei-me que passo a vida a encontrar pessoas que vêm cumprimentar-me, dizendo-me que me conhecem muito bem e eu zero, nem ideia. Assinalei como correcta 'Números e acontecimentos'. É estranho. Mas é verdade.
O tempo passa, dizia.
Não sei o que fica do tempo que passa. Vestígios, sedimentos. De uma pessoa ficar-me-á o sorriso, a esperança, a gentileza, as palavras tão cheias de azul e de luz. De outra ficar-me-ão umas palavras ditas numa tarde enquanto olhava pela janela: falava do voo de um pássaro, fazia um movimento ondulante com a mão como se fosse um esvoaçar lento. De outra talvez um poema dito, inesperadamente, na língua de origem. De outra, os livros que me recomendou. De uma outra, num dia em que fui encontrá-lo numa sala mergulhada na penumbra, ficar-me-á o que me disse: 'Agradeço o abraço que sinto que, com as suas palavras, está a dar-me'. De um outro, um que se portava muito mal, as palavras com que se despediu, ao abraçar-me: 'Não lhe digo que se porte bem, porque se porta sempre bem'. Apontamentos soltos. De algumas pessoas guardarei a imagem do rosto, o nome, algumas palavras, o momento em que foram ditas. Poucas essas. De outras, a maioria, não guardarei nada.
[Agora que falo nisto, lembro-me: comprarei algum dia «Sobre as Falésias de Mármore» de Ernst Jünger que um dia me recomendaram? Agora que não frequento livrarias, arriscarei comprar um livro sem o ter antes nas mãos, sem lhe espreitar os interiores? Não será uma desilusão? Se ao menos pudesse ainda sentar-me ao sol do fim da tarde, a sentir o calor dourado e bom sobre a pele, para o poder ler com o coração quente. Foi há quanto tempo que me falaram neste livro? Há uns meses? Há uns anos? Nunca? Sonhei? Como o saberei?]
De algumas pessoas é isso mesmo: nada. No outro dia tive uma reunião com um conjunto de pessoas. Tudo ali me pareceu sem nexo: o tema, o ar convencido dos meus interlocutores. Uns dias depois, perguntaram-me quando é que eu poderia dar feedback. Tive que me esforçar: não apenas não recordo o nome de nenhum deles, nem a imagem do rosto e, pior, nem me lembro de que raio de feedback estão à espera. Mesmo que de forma involuntária, varro para debaixo do tapete do meu esquecimento tudo o que não me interessa. Esqueço-me imediatamente. Se sou forçada a voltar a conviver com quem não me interessa é com indisfarçável sacrifício que me sujeito a isso.
Nas conversas com a pessoa que me convidou para a presente empresa, quero traçar uma linha vermelha. Quanto sinto que ele quer mais de mim do que o que estou disposta a dar, relembro a linha vermelha. Ele fica desconfortável, muda de conversa. A linha vermelha não é nada de mais, é apenas um horizonte temporal. E eu, que vejo o tempo a passar, interrogo-me sobre como vou conseguir manter-me, firme, do lado de cá da linha que não quero transpor. E, no entanto, para o conseguir, abdico de ler, de fotografar, de me deslumbrar com as flores que, por aqui, são escandalosamente belas, de passear na praia, de ver o mar.
Já estamos no fim da semana, no fim do mês, qualquer dia no fim de um ano que se revelou miserável, um ano prenhe de más notícias, de desgostos, de problemas sem precedente. O que me ficará deste ano? Não sei. Acho que nem vou querer saber. Tomara que zero. Mas não, nem isso. Infelizmente, muito menos que isso.
Um ano de perdas, certamente.
Estou cansada e com sono, desculpem. É isso.
Fotografias de Ana Zibelnik ao som de Prélude No 4 en mi mineur, Chopin, na interpretação de Khatia Buniatishvili
Sem querer, passei pela SIC Notícias e aqui está ela, no Eixo do Mal, feita histérica, revoltada contra tudo e contra todos, contra incertos, contra o ar que se respira, contra os outros que respiram o ar que, se calhar, não era para ser respirado. O que é que ela diz? Não faço ideia. Com palavras avulsas proferidas com um ar ressabiado, assanhado, ela antecipa desgraças, fatalidades, cataclismos, toda a espécie de fenómenos sinistros. Ela superior a tudo e a todos, dizendo parvoíces, banalidades, contradições parvas, e tudo com ar furioso, toda ela arrogância, acusa o Governo, acusa as pessoas, acusa o vírus, acusa não se sabe bem o quê.
Tudo espremido, o que ela diz vale zero. Zero. Nem o penteado lhe vale. Pelo contrário, acentua-lhe o ar de galinha espremida das ideias. Fútil, populista, leviana, fala-barato, transbordante de vã soberba, intragável.
Enquanto ela fala, o Pedro Marques Lopes olha-a incrédulo. Vai ter que aturá-la até ao fim do programa. Eu não. Bye, bye Madame Cagona.
Já o disse mil vezes: acredito desde há muito que, nisto do coronabicho, uma das grandes fontes de contaminação, para além do contacto directo com alguém que esteja contagiado, sem máscara, a pouca distância e durante um bom bocado, é o ar. Acredito que é isso que, por exemplo, explica o contágio generalizado nos lares quando lá aparece o primeiro caso.
A mãe de uma colega minha morreu há poucos dias. Estava num lar em que todos os protocolos de higiene sanitária eram seguidos. Cada pessoa em seu quarto, sem conviverem. E, no entanto, também por lá, tem sido uma ceifa assustadora. A minha colega não encontra explicação. A mãe estava sempre de máscara, as pessoas que entravam no quarto, as funcionárias, estavam com fatos de protecção da cabeça aos pés. Os familiares estavam com ela de máscara e com um acrílico de permeio. Portanto, concluo eu, foi contagiada enquanto dormia ou comia.
E essa é uma das razões pelas quais, em minha opinião, à medida que o tempo arrefece e as janelas se fecham, ficando o ar interior mais viciado e contaminado, o número de contágios em todo o mundo (em que se caminha para o tempo frio e/ou chuvoso) vêm aumentando.
Ainda hoje eu me insurgia com a falta de atenção que está a ser dada a isto. Respondiam-me que seria impossível verificar todas as instalações de ar condicionado, substituí-las, garantir a sua qualidade. Bem sei. Por isso, por parecer missão impossível, todos os estudos que o comprovam acabam ignorados. Percebo a dificuldade em levar a cabo e percebo o pânico que poderia gerar-se se isto fosse assumido. Mas, pergunto eu, não seria possível traçar um plano de ataque, ter um plano de formação para abranger muita gente que está desempregada para que haja gente que possa verificar, desinfectar, montar, arranjar instalações deficientes, e, em cima disso, ter um plano de apoios financeiros para quem não consegue suportar esses custos? E não seria preferível isso a deixar que morra gente ao ritmo a que está a morrer (à data que escrevo já vai em 1.163.459 o número de mortes identificadas como resultantes da Covid)? Não seria preferível isso a deixar que a economia se afunde como não há memória? Que a pobreza alastre avassaladoramente? Que a tragédia do desemprego avance desabaladamente?
Não é um problema português, contudo. Por todo o lado adoece e morre gente e, para tentar conter a propagação, avançam os recolheres obrigatórios, os confinamentos -- e a onda de psicoses e pânico que isso provoca, sobretudo em quem fica sem fonte de rendimento. E, por todo o lado (salvo recentes e pontuais excepções), o tema da propagação a partir do ar passa despercebido. Ou seja, não é problema que possa ser atribuído a Marta Temido ou Graça Freitas: é geral.
Também não percebo como, mal se viu a curva a empinar (quando ainda nem se entrou no inverno), não se decretou a obrigatoriedade do teletrabalho para todas as funções que o permitam (e para todos os trabalhadores que o aceitem -- porque há quem considere não ter condições em casa... e até pode ser porque está lá a sogra...). É essencial retirar gente de circulação sem que isso prejudique a actividade normal. Já o disse mil vezes e vou continuar a repeti-lo: é essencial. Não pode ficar ao arbítrio de cada chefe que resolva armar-se em macho man, valentão das dúzias, e ache que não há que ter medo de um viruzeco da treta, há é que vencer a miúfa e ir para o local de trabalho. Não pode ser. Não pode ficar sujeito à interpretação de cada um pois, se o exemplo não vem de cima, fica difícil fazer imperar o bom senso. Tem que vir uma ordem com força de lei: teletrabalho obrigatório e imediato (nas condições que referi).
Mas isto não é só coisa de cá e, muito menos, é da responsabilidade da Marta Temido ou Graça Freitas.
E ainda vejo muita gente que acha que isto das máscaras é importante mas não sempre, não em qualquer circunstância -- e isto mesmo que se esteja num espaço fechado com alguém que circula sabe-se lá por onde.
Dou um exemplo. A minha mãe tem muito medo, é cuidadosa, lava as mãos, desinfecta-se, usa máscara. Mas depois faz coisas do além. Para além de ainda ter o hábito de agarrar qualquer coisa que dela se aproxime; por exemplo, se lhe aproximamos um telemóvel para que veja qualquer coisa, a primeira coisa que faz é agarrar nele. Isto com a maior das naturalidades como se não fosse um daqueles objectos que, se usado assiduamente por alguém com covid, é mais do que certinho que terá merdinhas em cima. Mas faz mais. Uma amiga fez hoje anos, noventa e três anos. Ontem tinha-me dito que se calhar ia fazer um bolo e levar-lhe lá a casa. Percebi que se estava a dizer isso é porque já tinha decidido lá ir. Temi logo o que poderia acontecer e avisei-a: 'Mas alerte-a logo que tenha máscara e, se ela quiser convidá-la para comerem juntas uma fatia, diga-lhe que sim mas na varanda, ao ar livre'. Fez aquele suspiro que sei bem que significa que não o fará. Hoje perguntei-lhe como tinha sido. Foi levá-lo, entrou em casa, a amiga não tinha máscara. Fiquei passada. Não quis aborrecer a amiga, diz que ela não liga nada a isto, que vai todos os dias às compras, que vai ao banco, que vai ao restaurante buscar take away, que não se preocupa nada e que, portanto, não ia, estando a visitá-la em casa dela, pedir que ela pusesse máscara. è aquela coisa das regras de delicadeza e boa educação que estão enraizadas mas que, agora, fruto do momento, têm que ser bem avaliadas e, em algumas situações, reequacionadas. Fiquei, pois, ainda mais passada. A outra podia estar infectada, sabe-se lá, nisto não há que recear ofender, há que recear é contagiar o outro ou ser contagiado. Alega em seu favor, a minha mãe, que não esteve lá muito tempo e que estava de máscara. Mas, em espaços fechados, e em situações de proximidade física, a máscara é eficaz se os comparsas estiverem todos de máscara. Ora eu sei que a amiga, uma senhora encantadora, uma amiga de todos os momentos, está surda que se farta. Portanto, estiveram próximas, de certeza absoluta. E se são as duas de risco... Já tiveram ambas problemas oncológicos e, pela idade, são mais do que de risco. E são ambas ex-professoras, pessoas dir-se-ia que bem informadas. E, no entanto, é o que se vê.
E aqui, sim, acho que é responsabilidade de Marta Temido e Graça Freitas: faltam campanhas de informação claras, com situações concretas, passando mensagens explícitas, inequívocas. E na televisão, na rádio, nas redes sociais, no youtube, em todo o lado onde possa chegar a públicos diversificados: o que se deve e não deve fazer.
Mas calma, não é isto que chega para crucificar quem se tem aguentado firmemente à frente desta avalancha de acontecimentos, todos desconhecidos, tentando tomar as melhores notícias no meio da incerteza que é tudo isto, dando o peito às balas, resistindo a raios e coriscos, vendavais e toda a espécie de ameaças. forces majeures, acts of God. E elas sempre ali, tentando dar o seu melhor, ouvindo especialistas, lendo relatórios, coordenando serviços, resolvendo conflitos, fazendo contas, coligindo informação, atendendo a comunicação social, respondendo em todo o lado a toda a hora, certamente mal dormidas (e já lá vão uma data de meses). O que elas têm feito e aguentado poucos mortais o aguarentariam. Só por maldade e vil cegueira se pode dizer o contrário. Admiro-as e agradeço-lhes. E espero bem que António Costa mantenha o apoio que lhes tem prestado -- bem o merecem.
E, vendo a coisa por outro prisma: se o que está a acontecer é culpa de Marta Temido e Graça Freitas, então, por acaso, são elas também as responsáveis pela desgraça que alastra na Bélgica, em França, em Espanha, em Itália, na República Checa, no Reino Unido, na Rússia, no Irão, em... quase tudo o que é sítio?
Então porquê a mesquinhez, a maldade, a estupidez de as culpar e querer punir pelo descalabro que está a ser a segunda onda um pouco por todo o lado em que coincide com a entrada no tempo frio?
Da minha parte -- e se soubesse que o que aqui escrevo lhes chega -- só poderia deixar-lhes os meus agradecimentos e desejar que se mantenham com saúde, força e disposição para continuarem a aguentar-se tão corajosamente como até aqui o têm feito. São mulheres de fibra, inteligentes, fortes e resilientes como pouca gente o conseguiria ser numa situação como esta que atravessamos. Bem hajam.
__________________________________
Fotografias do Best Bird Photography of 2020 ao som da Gymnopédie No.1 de Erik Satie na interpretação de Khatia Buniatishvili
Agora, aqui, não vou falar do Trump. Já o fiz no post abaixo e, ao ver o pequeno vídeo que ali partilho tal como de cada vez que observo aquele psicopata, fico irritada. Portanto, por hoje já chega. Quanto muito vou acender uma velinha a ver se todos os santinhos intercedem junto da Suprema Autoridade Divina no sentido de os americanos darem uma valente corrida em osso ao palhaço Donald.
Também não vou falar do modo de actuar do BE nesta coisa da votação do OE2021. Não me apetece. É mais do mesmo. São, uma vez mais, iguais a elas próprias. Por petulância, vendem a alma ao diabo se necessário for. Não digo que por vezes não tenham razão. Mal fora se nunca a tivessem. Digo é que não olham a meios para atingir os fins e, nessa demanda, esquecem-se dos interesses do País para defenderem os interesses do partido. Como meninas birrentas, metem uma na cabeça e ficam a fazer finca-pé enquanto não lhes fazem a vontade. Agarram-se com unhas e dentes a uma árvore sem quererem saber se o resto da floresta está a arder. Querendo fazer-nos crer que têm uma visão moralmente superior aos comuns mortais, a verdade é que passam a vida a mostrar à saciedade que têm uma visão pequenina e medíocre do que é a política.
O que elas defendem parece simpático? Claro que parece. Céu azul todos os dias? Claro que quero, é bom, levanta a moral, toda a gente deve ter direito a isso. Ir à praia todos os dias? Claro que é bom, claro que todos devem ter direito a isso. Pôr o carteiro a deixar um envelope com mil euros todas as semanas na caixa do correio de toda a gente? Claro que é bom, claro que toda a gente deveria ser contemplada. Mas, se não conseguirem isso, faz sentido fazerem birra? Ah... não me parece. Mas sei lá. E do que não sei não falo. Nem me apetece falar das manas Mortágua, em especial da arrogante Mariana, nem da artista encartada Catarina. São apenas, em permanência, um desnecessário e desagradável déjà-vu.
E muito menos vou falar dos merdinhas dos totós cor-de-rosa que por aí andam em vara, destravados, escoiceando, empinados, indomáveis. Apesar de invisíveis, conseguem fazer ajoelhar o mundo. Pelo andar da carruagem, talvez o verão do ano que vem não traga o pesadelo que este trouxe. Pode ser que, até ao próximo outono, haja vacina para todos (mas quem vai pagá-la? a segurança social, cada vez mais a tender para a descapitalização...? -- melhor nem pensar nisso), quiçá tratamento. Isto se passado algum tempo não aparecer outro corona e a história voltar a repetir-se. O futuro não será radioso. Se não forem os coronas, será a falta de insectos, a falta de polinização. Se não for isso, será o degelo. Se não for o degelo serão os microplásticos. Se não for...
Portanto, afigura-se-me que é muito bem capaz que o melhor que temos a fazer seja manter esses pensamentos racionais bem sossegados atrás de uma cortina que, de vez em quando, corremos. Olhos que não vêem, coração que não sente. Portanto, com os assuntos reais e concretos bem escondidos, a gente pode divagar e alienar-se à vontade como se o mundo fosse perfeito, céu azul todos os dias, praia ao dispor para todos, gaivotas dançando e inspirando lindas canções, velhinhos saudáveis e eternos, crianças felizes e sempre com boas notas, casais sempre amantíssimos até ao fim dos tempos. E perfumes maravilhosos. E, de entre eles, o meu preferido: o Nº5, claro. Está a fazer 100 anos e é como se ainda fosse um jovem.
O Natal -- que provavelmente este ano também vai ser o novo Natal (para rimar com o novo-normal) -- está a aproximar-se e, com ele, os bons sentimentos transformados em cadeaux. E, portanto, já aí está na calha a publicidade de qualidade. Perfumes, claro. Chanel, obviamente.
Marion Cotillard é a diva que dá corpo ao que se idealiza como sendo o espírito Nº 5. Vejamos. E deixai-nos sonhar, Senhor.
___________________________________________
As fotografias são da autoria de Annie Leibovitz e a fotografada é Cate Blanchett
Vê-se e não se acredita. Em tempos normais isto que aconteceu no outro dia e de que partilho abaixo um pequeno excerto seria o descrédito imediato. Haveria um grupo de gente com cabeça bem estruturada que falaria e diria: esta besta quadrada não serve; rua!, uma besta quadrada assim é um perigo para o mundo. E haveria uma maioria de gente bem pensante que se alinharia para apear a alimária.
Agora não. Agora pode estar um estupor, uma azémola psicopata, um palhaço demente, um porco mentecapto ou uma hiena putrefacta à frente de um país que não acontece nada. Já se acha normal. Já não é tema. A malta já não está nem aí. Por lá se calhar querem saber dos arrufos da Kardashian com o West ou com cenas afins tal como, por cá, querem é ver os instagrams da Cátia Aveiro ou ler sobre as surdas disputas entre a Teresa Guilherme e a Pipoca Mais Doce. Trump...? Bahhhh... já não há saco... deixem-no lá estar e não chateiem...
E o cão cor-de-laranja com patinhas minúsculas e pénis de gafanhoto pode fazer comícios sem máscara, a dizer alarvidades em catadupa que há sempre uma multidão de broncos, apinhada, maioritariamente sem máscara, a aplaudir.
E quando se esperaria que, ao fim de anos a assistir às patifarias, às cavalices, às grosserias dele, tivesse uma derrota humilhante que o fizesse deitar-se no chão a espumar e a espernear, a ver é se não arranja maneira de lá continuar para vexame dos americanos inteligentes e para estupefacção da malta que, um pouco por todo o mundo, ainda se espanta com isto.
Não aguento isto.
Why did Trump abruptly exit his 60 Minutes interview with Lesley Stahl?
Fomos até ao campo no sábado e foi aquela paz imensa que ali, mais do que em qualquer outro lugar, me invade de uma forma tão envolvente e feliz. Aqui, onde agora vivo, também há sossego, silêncio e canto de passarinhos. Mas não há a protecção da serra em volta, não há a serenidade rural que ali é absoluta. Mas o tempo anda-me a correr e eu mal consigo agarrá-lo. Foi ir, desfrutar um pouco, fotografar as belas cores de outono, os cogumelos que começam a irromper da terra, almoçar, descansar, olhar tudo, olhar como se quisesse ficar com as imagens, os sons e os cheiros impressos nas minhas células. Depois, no regresso, ainda fomos a casa da minha mãe. Ia escrever 'a casa dos meus pais' mas o meu pai é agora apenas memória. Quando estou com ela, tento não falar nele ou, se falar, falar com naturalidade. Sei que, se demonstrar emoção, a minha mãe não conseguirá controlar o pranto que lhe corre dentro.
Viemos tarde e, por isso, como sempre, jantámos muito tarde. O meu marido anda saturado, diz que não são horas, queixa-se que há muito tempo que não consegue descansar. Concordo. Também eu.
No domingo, cedo, voltámos à outra casa. Horas de labuta, uma labuta que cansa. Os quartos que eram dos meus filhos, o que eles deixaram. Escolher, separar, coisas para dar, coisas para o lixo, coisas para trazer. Roupas, papéis, dossiers, cenas de toda a espécie. Olhar, avaliar, decidir. Infindavelmente. E trazer os móveis que fazem sentido trazer para cá, dar outros. Caixas, sacos, hesitações, discussões. O meu marido é apologista de deitar tudo fora, a eito. Como sabe que o meu ponto fraco tem a ver com os miúdos, filhos e netos, quando quer manipular-me é essa a arma a que deita mão: agora, de cada vez que eu acho que faz sentido trazer, ele sai-se com esta: 'queres complicar a vida aos teus filhos, quando tiverem que decidir o que fazer às nossas coisas? queres que passem anos a revirar a tralha que queres guardar?''. Claro que é argumento de peso. Mal ouço isto, equaciono se será coisa a que eles ou os seus filhos achem graça ou queiram aproveitar. Senão, ponho de lado. Mas também pode ser roupa que, por ser boa e bonita, ainda pode ser aproveitada. Dúvidas, dúvidas. Dúvidas que têm que ser resolvidas em ambiente de desmotivação e cansaço.
De tarde, já aqui em casa, chegou a minha filha com os miúdos. Eram quatro e tal e ainda estávamos a almoçar. Depois fomos passear, todos. Conversando, na boa. Uma caminhada à tarde e em família é do melhor que há. Um dos meninos levou a trotineta. Experimentei e gostei. Aquilo ganha mesmo velocidade. A minha filha filmou e partilhou. Quando vi, achei que não fazia jus. Ela gozou comigo. Lanchámos já era de noite. Na rua. A maior parte do tempo andámos de máscara. Tenho pena que tivéssemos chegados até aqui... mas nada a fazer: é o que é.
Hoje madrugámos. O meu marido levantou-se às cinco. Dividimo-nos: entre a madrugada, a hora de almoço ou o after hours, com uma empresa de mudanças acabámos esta tremenda empreitada. Para casa do meu filho foram umas coisas que eram dele e para cá o que faz sentido. Coisas da minha filha ainda lá ficaram mas muita roupa dela ou foi para dar ou, alguma, repesquei e ela que resolva o seu destino. E algumas coisas, móveis, candeeiros, uma máquina de secar que já não estava grande coisa, e até um móvel óptimo, de excelente construção e acabamento e bela madeira, um móvel feito à medida para a outra casa e que aqui não encaixava bem em lado nenhum, ficaram para a empresa de mudanças. Vi que estavam contentes. Se calhar, distribuem entre eles.
Ainda lá há alguma roupa por escolher, em particular roupa do meu marido. Recusa-se a olhar para aquilo e escolher, não tem paciência. Mas também ainda há coisas minhas. Agora tudo é para escolher, nada que seja declaradamente para trazer. Mas é roupa que está nos roupeiros embutidos. Ou seja, já não há mais mudanças contratadas. Nem há urgência. Agora apenas teremos que de lá tirar tudo quando vendermos a casa (era bom que fosse depressa) ou, quando nos enchermos de coragem, para tirar isto da ideia. Eu prefiro despachar tudo o mais rapidamente possível. O meu marido, que habitualmente também é assim, neste caso nem quer pensar no assunto.
Hoje, enquanto lá estive, consegui deixar as divisões vazias, sem tralha restante pelos cantos. Mesmo assim, uma varanda está cheia de sacos com roupa para dar. E um vaso com terra. E uns baldes de tinta que soprou de anterior pintura. E um cesto onde estão as cortinas de crochet que tinha numas janelas e que agora não tenho onde pôr mas que me dá pena deitar fora. Noutra varanda, num canto, há uns cestos com brinquedos desencontrados, incompletos, e uma figura de madeira pintada, de que muito gostava e que, não sei como, ficou com a cabeça partida. Se a colar fica boa. Mas não sei bem onde colocá-la. Talvez debaixo do alpendre. O meu marido ralha: não enchas tudo de tralha. Ele é minimalista. Eu quase sou mas também gosto de ter alguns objectos atípicos e nos quais reconheço beleza ou graça.
Agora, aqui na casa nova, voltámos a ter caixas por abrir, sacos para esvaziar. A cave está cheia de coisas para arrumar . Mas eu gosto que as coisas sigam uma lógica, uma harmonia. Por isso, antes de começar a arrumar coisas ao acaso, quero pensar onde vou arrumar as revistas de decoração, onde vou arrumar os bibelots sobrantes, onde vou arrumar as molduras que não tiveram lugar até aqui. O meu marido, que odeia o caos, olha para o panorama e passa-se, por vontade dele não tinha agora trazido nada. Eu vivo bem no meio da confusão pois sei que, qual polinómio complexo que se vai simplificando, mal se faça luz na minha cabeça, acabará tudo arrumado, sem que pareça amontoado ou cheio de tralha.
Mas, com isto, estou mais do que cansada. Foram muito poucas horas de sono, muito andar acima e abaixo, a dizer onde se põe isto, onde se põe aquilo. Já para não falar que, antes e a seguir ao jantar, estive a ver e responder a mails, a despachar e aprovar coisas da empresa ou, no meio de tudo, andei a telefonar, a mandar mails, a resolver trapalhadas. Mas, enfim, acho que esta noite devo conseguir dormir bem. Nestas alturas de mudanças, durmo mal. Acordo a pensar e a ter ideias sobre o destino a dar a cada coisa.
Por exemplo, não sabia onde haveria de pôr a aparelhagem, uma aparelhagem à antiga, um móvel preto, tipo ikea, mas com amplificador, leitor de cassetes, gira-discos, leitor de cd's, colunas separadas. De noite, acordei com a solução. E os LP´s, os CD's. Ponho-me a pensar nisto e, às tantas, não durmo. Agora já se sabe onde vão ficar mas é preciso tirá-los das caixas e arrumá-los. Ai.....
A ver é se não fico toda derreada, tantos pesos carreguei, tanto subi e desci. Os meus músculos costumam ressentir-se com o esforço concentrado e excessivo. Enfim. O que vale é que depois passa.
E agora ainda tenho que ir consultar um cv para uma reunião determinante que tenho de manhã. A covid pode estar por aí aos pinotes mas o mundo -- felizmente -- não estaciona.
E, já agora: que ideia absurda é essa de porem a Prova Oral a começar depois da uma da manhã? Logo hoje que queria tanto ver o maluco do Pedro Paixão... Não percebo quem são os palermas que fazem a programação dos canais de televisão.
Bem, já que estou numa de décor, permitam que partilhe um vídeo que gostei de ver.
A pintora italiana Malù Dalla Piccola mostra a sua casa em Paris. E eu gosto tanto de ver casas. Fará casas com a pinta desta.
Os ambientes fechados são um perigo quando se fala em contágio através do coronavírus. Não é forçosamente tiro e queda mas é um risco. Contudo, pode mitigar-se através do uso de máscara, de boa ventilação e de tempo de permanência.
Muita polémica tem havido desde o início da pandemia: de um lado os cientistas que sabem o risco do efeito de aerossolização das gotículas contaminadas, do outro os agentes económicos.
Fábricas, escritórios, escolas, hotéis, restaurantes, centros comerciais, hospitais, lares, ginásios, pavilhões desportivos, cinemas, salas de concertos... tudo sítios em que, em geral, as pessoas que os frequentam estão em espaços fechados, durante bastante tempo, frequentemente respirando ar condicionado. Mesmo em casa, ao aproximar-se o tempo frio e de chuva, se se juntarem várias pessoas, num espaço relativamente pequeno e se um estiver contagiado, facilmente os demais convivas serão infectados.
Não me tenho cansado de falar nisto mas repito-me: se o espaço for conveniente ventilado, com condutas desinfectadas, com filtros adequados correctamente substituídos, com a frequência devida, com injecção de ar fresco do exterior, se as pessoas estiverem de máscara e se não estiverem durante muito tempo juntas com alguém que esteja contagiado, talvez consigam escapar. Senão as probabilidades são mais do que muitas de haver contágios.
Acontece que, em casa, as pessoas não andam de máscara nem guardam distanciamentos. E, em todo o lado, quando estão a comer ou a dormir, ninguém está de máscara. Com sorte não há ninguém contagiado no mesmo espaço mas, se houver, o caldo poderá entornar-se para o lado dos restantes. Veja-se o que acontece nos lares.
Claro que há os que, afortunadamente, são geneticamente imunes ou os que já tiveram covid e ainda estão imunes. E há os resistentes (e felizardos) que, sendo infectados, permanecem assintomáticos. E há ainda os que, tendo sintomas, a coisa corre bem, sem chatice de maior. Mas depois há os outros, os que ficam mal, mal. E, infelizmente, os que não resistem. No início, morreu a mãe de uma amiga, agora morreu o pai de uma colega. Um outro colega meu contou-me no outro dia que perdeu uma amiga. Aos poucos vamos sabendo de alguém. O meu filho, contou-me de um vizinho que andava pelos sessenta. Covid, covid, covid.
E o problema é que, apesar de a percentagem de fatalidades ser baixa, a base sobre a qual ela incide é progressivamente maior. E, assim, é um ápice enquanto se atinge o limite de vagas em enfermaria e, de seguida, nos cuidados intensivos. E, ao atingir-se esse máximo, estaremos a entrar no capítulo do grande sofrimento, do drama.
Ouvi o Paulo Portas na TVI e teve razão, ele, ao referir os limites também de pessoal hospitalar. Cansados e, por vezes, em quarentena ou, mesmo, infectados, reduzindo a produtividade, reduzindo a capacidade para tratar os que arfam e agonizam. Não sei se é na Bélgica que já há médicos infectados a continuar a trabalhar.
En estos momentos, las autoridades sanitarias reconocen tres modos de contagio de la covid. Las gotas que expulsan los contagiados al hablar o toser, que acaban en los ojos, boca o nariz del infectado. Las superficies contaminadas, aunque los Centros para el Control y la Prevención de Enfermedades de EE UU (CDC) indican que este caso es el menos probable y el Centro Europeo para la Prevención y Control de Enfermedades advierte de que no se ha descrito ni un solo contagio por esa vía. Y por último, la infección por aerosoles, cuando se respiran estas partículas infecciosas invisibles que exhala una persona enferma y que se comportan como el humo al salir de su boca. Sin ventilación, quedan en suspensión y se condensan en la sala a medida que pasa el tiempo. (...)
Al comienzo de la pandemia, se tuvo la impresión de que el principal vehículo de contagio eran esas grandes gotas que expulsamos al toser o estornudar. Sin embargo, ahora sabemos que gritar o cantar en un espacio cerrado, mal ventilado y por mucho tiempo también genera un alto riesgo de contagio. Esto sucede porque al hablar a pleno pulmón se lanzan 50 veces más partículas cargadas de virus que cuando estamos en silencio. Estos aerosoles, si no se diluyen con ventilación, se concentran con el paso del tiempo, aumentando el riesgo de contagio. Los científicos han demostrado que estas partículas, que también liberamos al respirar o con mascarillas mal ajustadas, pueden ser contagiosas a cinco metros de un enfermo y durante muchos minutos, dependiendo de las condiciones. Esas son las condiciones que reproducimos en estos ejemplos y que conviene evitar a toda costa. (...)
Para calcular las probabilidades de contagio de las personas presentes en situaciones de riesgo, usamos un simulador desarrollado por un grupo de científicos, liderado por el profesor José Luis Jiménez (Universidad de Colorado), creado con la intención de mostrar la importancia de los factores que obstaculizan el contagio por aerosoles. El cálculo no es exhaustivo ni puede incluir las innumerables variables que concurren en un contagio, pero sirve para ilustrar la progresión de los riesgos en función de los factores en los que podemos intervenir. Los sujetos mantienen la distancia de seguridad en las simulaciones, eliminando el riesgo de contagio por gotículas, pero aun así pueden infectarse si no se actúa sumando todas las medidas a la vez: ventilar correctamente, acortar los encuentros, reducir aforos y llevar mascarillas. En todos los contextos, el escenario ideal sería en exteriores, donde las partículas infecciosas se diluyen rápidamente. Si no se mantiene la distancia con el posible paciente cero, la probabilidad de contagio se multiplica porque entran en juego las gotas expulsadas y porque la ventilación no sería suficiente para diluir los aerosoles si las dos personas están muy pegadas. (...)
Portanto, desculpem a insistência mas permitam que volte a frisar alguns conselhos:
Na companhia de outras pessoas, estar o mais possível ao ar livre
Sempre que em espaços fechados, tentar estar de janela e/ou porta aberta
Não podendo estar de janelas e portas abertas, tentar reduzir o espaço de permanência em espaços fechados e não ventilados
Sempre que em espaços fechados em que não se está de porta ou janela abertas, estar de máscara (mesmo em casa, se lá estiverem pessoas que circulam em espaços pouco controlados ou mesmo no gabinete ainda que não esteja lá mais ninguém)
E que o Governo não apenas divulgue estas informações como também:
1 - Ensine a usar a máscara (quanto tempo de seguida consoante o tipo, como se lava, com que frequência, onde guardar nos intervalos, etc)
2 - Ensine o que não deve ser feito. Por exemplo, ontem cruzei-me com um grupo de ciclistas que estavam a fazer uma prova. Uns quantos tinham parado e estavam em círculo, ofegantes, a beber água e a conversar, a respirar na direcção uns dos outros, sem qualquer distanciamento e, obviamente, sem máscara.
3 -- Retire, ao máximo, gente de circulação sem prejudicar a actividade económica: teletrabalho obrigatório sempre que as funções o permitam e as pessoas o aceitem
4 -- Decrete o recolher obrigatório e limitação de ajuntamentos nos concelhos de risco.
5 -- E, insisto, insisto, insisto: fazer análises à qualidade do ar em recintos fechados (lares, hospitais, escritórios, centros comerciais, etc) e garantir que o ar é renovado com ar do exterior.
Gosto imenso de Marta Bateira, aka Beatriz Gosta. Penso que gostaria imenso dela ao vivo, como pessoa, não apenas como personagem ou como comediante. Gosto. Simpatizo. É daquelas pessoas que acho inteligente, rápida no gatilho, boa pessoa, querida e, claro, com um fantástico sentido de humor.
Já várias vezes aqui esteve e espero que muitas mais venha a estar. Esta é uma casa em que será sempre bem acolhida. Quando no outro dia soube que estava grávida senti logo ternura por ela. Vai ser uma mãe fantástica, amorosa. Desejo-lhe as maiores felicidades.
Os vídeos abaixo mostram-na a contar como lá chegou e como se desforrou do confinamento.
Boa sorte para a Beatriz e para o rebento (e para o pai do rebento também, claro)
_______________________
E não esperem que me pronuncie sobre as futilidades do BE e sobre as incongruências do PSD a propósito do OE2021. Não merecemos. Ninguém merece. Ainda por cima numa altura destas.
Quando eu era miúda ouvia falar aos meus pais e tios e amigos deles sobre algumas grandes divas. Os homens encantavam-se com a sua beleza e sensualidade, as mulheres admiravam-nas, apreciavam as toilettes e, no fundo, gostavam de ser como elas.
A minha avó tinha uma amiga, anos mais nova que ela, que era uma mulher quase proscrita. Aliás creio que seria mais ou menos da idade da minha mãe. Tinha um cabelo comprido, ondulado, arruivado. Usava-o frequentemente apanhado em rabo de cavalo que prendia com fitas largas e coloridas. Era olhada de lado, falava-se dela à boca pequena. Era a outra de um homem casado. Ele tinha uma família, era um homem de sociedade. E tinha, ali, naquele bairro, uma outra família, clandestina: essa mulher e o filho de ambos. Ia visitá-la de vez em quando num grande carrão e, quando o rei fazia anos, levava-a a passear. Ela era bonita, vistosa, curvilínea, seios fartos, alegre. Mas pouco saía de casa e a alegria era restrita a quem convivia com ela.
A minha avó sempre foi pessoa de mente aberta e tanto se lhe dava que ela fosse a amante de um homem casado como outra coisa qualquer. Por isso, volta e meia ia visitá-la e passavam horas na conversa, divertidas. Como ela não trabalhava e quase não saía de casa, entretinha-se a ver revistas que ele, para a manter sossegada em casa, lhe levava. Creio que ela também se entretinha a costurar os seus vistosos vestidos e provavelmente com outras coisas mas disso não sei. O que sei é que depois emprestava as revistas à minha avó. E a minha avó, sabendo que a minha mãe gostava de ver os 'modelos' e que eu me pelava por tudo o que fosse literatura daquela, quando ia a nossa casa levava um saco com revistas.
Eu devorava-as. Uma vez, os meus pais fotografaram-me, pequena, os pés longe de chegarem ao chão, a ler uma dessas revistas. Quando a professora da primária pediu que levássemos uma fotografia à escolha para depois fazermos uma redacção sobre ela, levei essa fotografia. E ainda me lembro da D. Maria, ar levemente incomodado: 'Ah... mas isso não são coisas apropriadas para ti...'. Quando contei à minha mãe, que tinha sido sua aluna e, na altura, já era sua colega, encolheu os ombros: 'Que mal tem...? Cada vez mais antiquada...'. Nessas revistas eu via todas aquelas divas que faziam poses fantásticas, que tinham vestidos lindos, que tinham amores múltiplos, romances que faziam sonhar.
Uma dessas divas era Sophia Loren. Tinha uma beleza atípica que eu não reconhecia como extraordinária. Achava-a exótica, não propriamente bela.
De entre as italianas, achava a Claudia Cardinale a mais bonita.
Anos mais tarde, estava a falar disto com um colega que me disse que tinha viajado com ela no avião e que, até ao fim, tinha estado na dúvida se era ela pois parecia quase uma velhinha quase pequenina. No entanto, nessa noite, tinha ido a uma recepção na qual lá estava ela. E era outra, sensual, toda elegante, com um porte que impunha respeito. E, quando foram apresentados, ele quase se sentiu intimidado com o seu charme. Mas, dizia ele, ah, minha querida, a Cardinale é uma graça, uma sedutora... mas a Sophia... ah... a Sophia é outra coisa...
Esse meu colega, de quem tenho muitas saudades, era um valdevinos de primeira. Tinha sido apanhado pela mulher a sair do prédio da amante. Sujeito a um vexame, obrigado a sair de casa, mudou-se para casa da amante, uma mulher interessante, uns vinte e tal anos mais nova que ele. Ao fim de algum tempo já não se aguentava com a sua jovem namorada, até porque ela tinha um filho pequeno e ele já não tinha paciência para crianças pequenas nem para mulheres com TPM. Tendo uma casa de 'praia' na Linha, volta e meia inventava que tinha uma viagem de serviço, fazia a mala... e ala moço que se faz tarde... escapava-se para a sua bela casa, uma casa com um belo jardim. Conheci essa magnífica casa. Contíguo ao seu jardim estava o jardim da casa de uma italiana da idade dele, uma italiana que apanhava banhos de sol toda nua. Ao fim de algum tempo ou a italiana saltava o muro ou ele saltava o muro para o lado dela. E, dizia ele, era como se estivesse a fazer amor com a Claudia ou com a Sophia, toda aquela fogosidade italiana, todas aquelas belas palavras de amor condimentadas com pimenta.
Não sei o que diria ele se visse a sua fogosa Sophia neste filme de que abaixo mostro o trailer. Talvez ficasse com lágrimas nos olhos. Talvez ficasse ainda mais rendido à sua beleza, à sua grandiosidade, à sua 'classe', talvez voltasse a dizer-me: ah, minha querida, a Sophia... ah, minha querida, acredite, a Sophia é outra coisa.....
O filme é realizado por Edoardo Ponti, filho de Sophia Loren, e baseado no livro homónimo de Romain Gary
Os números de novos infectados continuam a subir a pique e, não tendo nós pela frente um tempo propício ao ar livre nem a perspectiva de um confinamento total (dois factores que, obviamente, favoreceriam o achatamento da curva), o que temos pela frente não serão, certamente, boas notícias.
No outro dia, em comentário, o Corvo dizia que eu, lutadora e resiliente, não deveria desmoralizar. Pois não, não desmoralizo. Mas não estou relativamente tranquila como estava em Março, Abril ou Maio, isso não.
E não estou pois não apenas há aquelas duas condicionantes críticas e incontornáveis (os dois factores que acima referi) como continuo a não ver acontecer três coisas que me parecem fundamentais para tentar conter o disparo a que se assiste:
Não vejo a DGS a fazer campanhas de divulgação intensivas, assíduas, explícitas, e sobre todos os meios, sobre cuidados a ter, boas e más práticas, hábitos arreigados que têm que ser alterados, etc
Não vejo o Governo a decretar que, sempre que as funções o permitam (e os trabalhadores o aceitem), o teletrabalho é obrigatório (reduzir o número de pessoas em circulação sem prejudicar as actividades é vital)
Não vejo serem enunciadas regras concretas para garantir a qualidade do ar, com auditorias à qualidade do ar obrigatórias e com apoios a empresas e organizações em geral que tenham que reformular os seus sistemas de AVAC por forma a garantirem a injecção de ar novo, a desinfecção de condutas, a substituição regular dos filtros (que devem ser os indicados e não os mais baratos)
E porque o que continuo a ver são as televisões e os comentadores a olharem para o passado e a quererem encontrar culpados (como se, em Março ou Abril, quando toda a gente ainda estava a assimilar o que estava a acontecer e não havia experiência sobre a covid, os governantes portugueses devessem ser mais inteligentes que os cientistas de todo o mundo) ou reportagens a puxar à censura pública e à maledicência (como a que vi hoje no noticiário da noite da SIC) sem acrescentarem nada de concreto para resolver os problemas daqui em diante, começo a ficar apreensiva, sim, Corvo.
Mas não sou de me deixar afogar em apreensão pelo que, quando estou preocupada ou arreliada, depois de espingardar, apetece-me é espairecer.
Para já vou pôr uma máscara, para dar o exemplo. Com vossa licença.
E agora aqui estou agora a partilhar o vídeo que acabei de ver das meninas mais doidonas do Brasil e arredores. Avós da Razão, claro está. Hoje, cada uma em sua casa, curtindo a quarentena, falam de como é quando a velhice toma conta do corpo (ou melhor, como o corpo é o que é e que se dane a velhice)
O meu dia foi de seguida, quase sem pausa para almoço. Mas tudo a andar bem, todos in the mood. Não for love mas, ainda assim, na boa. Dia sem stress e sem crise é dia bom, dia em que parece que a paz pousa em mim como uma daquelas abençoadas rolas brancas que, por aqui, pousa nas árvores.
Ao fim da tarde, quando nos reencontrámos em casa, fomos caminhar. Conversamos, observamos as casas e os jardins enquanto andamos. Depois, de novo em casa, fomos prender ramos e hastes da trepadeira, guiando-os para que floresçam como um arco.
Os telefonemas do fim do dia também todos tranquilos. Sem chover, os pássaros contentes, as flores a desamarrotar as grandes pétalas, tudo na serenidade.
[Não quero saber dos chiliques e das petulâncias das meninas bloquistas. Aquilo não faz o meu género. Tudo se há-de resolver. Não perco tempo com fricotes.]
Já tarde, a noite já avançada, recolhi ao sofá e adormeci. Uns minutos apenas mas os suficientes, os que me faltavam. Fico logo mais fresca, com vontade de me surpreender.
Circulo, então, por onde posso. Em dias assim não pego em livros, parece-me que se me fecha a disponibilidade para coisa que se adentre em mim. Ponho-me, então, a navegar aos deus-dará.
E, então, deambulando na vagabundeza, fui parar a mais um antológico trecho de Eberth Vêncio.
E, ao lê-lo, recordei a vez em que constipada, congestionada e engripada resolvi ir ao médico. Não havia corona-dos-totós pelo que foi sem medos que lá fui, apenas por não saber o que tomar. Era menina recém-casada, andava a estudar e a dar aulas, não queria piorar, não queria faltar aos meus compromissos. Morava num lugar totalmente desconhecido, sem quaisquer conhecidos por perto. O meu marido disse que, ao fim da rua, tinha visto uma tabuleta, médico de clínica geral. Lá fui. Era um homem já entrado. Perguntou de que padecimento me queixava. Não eram precisas grandes explicações: a voz, o semblante, os olhos, tudo falava pelo meu estado. Mandou, então, que passasse para a sala ao lado e me deitasse na marquesa. Mandou-me que despisse as cuecas.
Estaquei, incrédula.
Mandou-me que pusesse as pernas num suportes. Admirada, não obedeci: 'Acho que não percebeu o que eu disse'. Mas sentia-me febril, sem energia e doente. Faltavam-me as forças para me rebelar. Ele disse: 'Percebi bem. Mas este é o protocolo.'. Tentei protestar: 'Estou constipada ou com gripe, só isso'. Ele, seco, médico velho e sem paciência para frescura de menina, zangou-se: 'O médico aqui sou eu. Tem que ser observada e fazer uma lavagem vaginal'. Em condições normais, teria saído porta fora, talvez a correr para apresentar queixa na Ordem. Mas estava sem força, doente, zonzinha de todo. Ainda hesitei, mas até para a hesitação me faltavam as forças. Ele já estava com um reservatório na mão, autoritário: 'Deite-se'. E eu, fraca e doente, deitei-me. Pela primeira e única vez na vida, fizeram-me uma lavagem vaginal. Furiosa com o bode velho, furiosa comigo, mas sem energia para atear a fúria, deixei que a fizesse. Logo a seguir, ainda sem perceber o que me tinha acontecido, levantei-me. Auscultou-me, viu-me à transparência, viu-me a garganta, os ouvidos, prescreveu-me o que entendeu, mandou que me apresentasse lá passados uns dias. Nunca mais. Saí de lá doente e desnorteada. Quando contei ao meu marido, ficou espantado. Também eu. Ao fim de tanto tempo ainda estou: o que foi aquilo? Abuso? Reinação? Método arcaico?
Mas, enfim, coisas esdrúxulas que acontecem na vida de uma mulher.
Bom mesmo era o doutor Pecker que colocava as mãos na clientela sem pressa, malícia e asco. Sobretudo, aceitava o pagamento em bandas-de-leitoa. Decorava bulas, sonetos e até “O Navio Negreiro”, de Castro Alves. Tinha cultura e boa memória. Para tratar pedras nos rins, quebrava os rigorosos protocolos científicos ao receitar os caminhos tortuosos de Drummond. Para a contenção dos gêiseres fertilizantes e dos fluidos contaminados por intrépidos treponemas que espocavam das varas, instruía o uso de camisinhas-de-força.
Para evitar o dissabor de um neném não planejado, servia-se aos casais um tira-gosto: azeitona; sim, uma azeitona estrategicamente alocada entre os joelhos da mulher amada. Era batata, ou melhor, era azeitona; desde que não se deixasse cair o caroço na cama. Aliás, azeite alentejano, para amenizar a secura vaginal, fazia parte da régia estratégia para escorregar-enguia-na-loca e temperar o relacionamento durante os bravos verões da menopausa.
Para corrimento, pausa. Para os dias de TPM, recomendava guardar melhor distância. Para frieza sexual, receitava jeitinho mais cobertor de orelha. Para ejaculação precoce, indicava manteiga-de-tartaruga e punhetas com a mão esquerda. Macetes para inzonar. Para garantir plena eficácia contraceptiva, caçava gametas com a mesma gana de quem caçava confusão; instalava, ele próprio, fraco e mirradinho, com o artifício de binóculos e de um cilibrim, minúsculas arapucas e umas tais micro-ratoeiras importadas da França (tinham ratos de sobra em Paris naquela época) para surpreender o verter das picas e capturar espermatozoides no arcabouço da cratera vaginal.
Havia uma compreensível, justificável e natural falta de luz no fim do túnel. Ali, deitado em berço esplêndido, jazia boquiaberto um colo uterino, prestes a engolir novas expectativas de vida. A mãe-do-corpo, como sempre acontecia, urrava. Mulher sofria e sofre. Não restava dúvida ao médico ateu de que as fêmeas da espécie tinham levado imensa desvantagem durante o ato divino da criação.
Padecia também o descrente doutor desses tipos de incongruências filosóficas. Para retesar o desatino da frouxidão crônico-involuntária dos esfíncteres e dos orifícios, deveria o moribundo piscá-los em salvas de trinta vezes, a intervalos de oito horas.
Para a impotência sexual masculina, ovos-de-pata mais os famosos exercícios de levitação do professor Karnal. Para dor de veado, tinturas de arco-íris. Para frieira, beirada de rede. Para batedeiras no peito, repiques com o dedo indicador num portal de madeira para ensinar o coração a bater no ritmo correto.
Para as dúvidas existencialistas, listas de exercícios de matemática. Para transtornos bipolares, uma terceira opinião. Para moléstias mentais do tipo desespero de causa e loucura absoluta, cadeiras elétricas de frente ao mar. Amar. Carecia armar o espírito, no qual ele não cria, com aquelas cálidas cápsulas de claves-de-sol. Mais incongruências.
O tempo passou. Há roupa no varal e doses homeopáticas de devaneio nesse texto em tributo à medicina humanizada. Espero ser bem compreendido. Adveio tecnologia avançada com o uso trivial de caríssimas máquinas-de-tirar-dúvidas nas quais se entra numa extremidade, enquanto o laudo sai noutra. Ganha-se de um lado, perde-se de outro. Eis a vida. Já não se fazem mais médicos como o desprovido doutor Pecker que sumiu engolido por sucuri.
Instruído por Hipócrates, arrancava bala à grito, mandava veia parar de sangrar e cochichava coisas que ninguém entendia enquanto operava milagres num singelíssimo hospital no interior do Brasil. Se eu não soubesse da sua flauta de fé, poderia jurar que se aconselhasse com o próprio Deus enquanto desembaraçava tripas.