quarta-feira, julho 23, 2025

Dicionário made in silly season

 

Futilidade: sondagens sobre as Presidenciais quando ainda não se conhecem todos os candidatos e quando os portugueses ainda estão muito longe de se ralarem com tal coisa.

Cábulas de primeira: deputados do Chega que, de cada vez que abrem a boca, revelam que não sabem do que falam

Cábula de segunda: Luís Montenegro que vai para a Assembleia da República armado em bom, em erudito, a citar Sophia de Mello Breyner, quando, afinal, a frase referida era da autoria de José Saramago. Ou o tipo que lhe escreveu o texto quis divertir-se à sua custa, colocando-lhe uma casca de banana debaixo dos pés, ou foi outro cábula que nem se lembrou de confirmar o que escreveu. Seja como for, ele próprio, o Luís, deveria ter tido a lucidez de confirmar o que ia dizer para evitar fazer um papelinho mais do que triste

Cábulas de terceira: alguns dos comentadores deste blog que aparecem aqui não para referirem factos concretos ou para rebaterem, factualmente, o que aqui se diz, se limitam a 'mandar' bocas ou, mais calinamente ainda, vêm revelar que têm uma bizarra fixação em Sócrates. 

Incompetente em expoente máximo: Ana Paula Martins. Não há dia em que as notícias não nos deixem estupefactos com as cavalices que se passam sob a égide de Madame Aparelhista

Ridícula: a defesa atotozada dos Anjos que não se calam com a cena do acne. Agora entregaram fotografias que atestam a borbulhagem

Embuste: quando eu trabalhava, sempre que havia actualização das tabelas de retenção de IRS, o que o Departamento de Recursos Humanos fazia era 'carregar' essas tabelas na aplicação informática de processamento de salários e escrever a data a partir da qual a nova tabela vigorava. Se a tabela fosse carregada em Agosto mas com incidência a Janeiro, automaticamente a partir de Agosto apareceria já a nova taxa de IRS e, nessa altura, o sistema calculava retroactivamente o IRS que deveria ser retido, devolvendo o que tinha sido retido a mais. Não havia ciência oculta. O valor retroactivo resultava de uma conta simples: o valor a mais em cada mês vezes o número de meses. Acontece que nada disto acontece com o Ministério das Finanças agora faz: o valor devolvido em Agosto e Setembro é muito superior ao valor resultante daquele referido cálculo. Verifica-se que a partir de Outubro (ordenados a pagar no fim de Outubro, ie, depois das eleições) a diferença no imposto retido é cagagesimal, alcagoitas. Mas o que vão devolver em Agosto e Setembro (antes da data das eleições) são valores simpáticos. Se isto não é manipular as pessoas ou comprar votos, que venham todas as virgens rasgar as vestes e me expliquem qual a lógica matemática desta jogada. 

Escapista: Marcelo Rebelo de Sousa, o palrador-mor, o omnipresente e ubíquo  Presidente que, depois de ter feito a vida negra a António Costa, com bocas encapsuladas e bocas directas ou indirectas, usando-se a si próprio ou usando a so-called fonte de Belém, e de ter feito o possível e o impossível para correr com o PS e para pôr o PSD no governo, agora, haja o que houver, remete-se ao silêncio. Não é apenas que se tenha tornado discreto, é mais que isso, praticamente desapareceu, emudeceu, empalideceu, quase se tornou um fantasma.

Rita Matias, Catarina Furtado, os tachos e as ignorâncias. Já para não falar em Ana Paula Martins que diz que anda a aprender com as mortes devidas a atrasos do INEM.
O populismo é isto
-- Uma vez mais, a palavra ao meu marido --

 

No seguimento de uma entrevista a propósito das demolições de Loures a Rita Matias, uma das caras da moda dos populistas do Chega,  Catarina Furtado -- que sempre me pareceu uma pessoa sensata, que defende os valores comuns às pessoas que respeitam e têm preocupações com o próximo -- fez-lhe uma referência crítica nas redes sociais, alegando a ignorância demonstrada por Rita Matias ao falar de uma realidade que desconhece. 

A Rita Matias, moça fina, danada, publicou um vídeo de resposta -- vídeo esse em que parece ir a guiar e, simultaneamente, a gravar o vídeo (o que, a ser verdade, terá sido um perigo para quem se cruzasse com ela, já que não desviou o olhar do ecrã do telemóvel). O vídeo revela bem o que são os populistas de extrema direita. Afirma que se o Chega for governo, não demorará a despedir, da RTP, aqueles de que não gostam: "estes tachos e tachinhos na RTP são para acabar e o problema deles é que sabem que o Chega, quando chegar ao Governo, vai mesmos atrás destes tachos incompreensíveis". 

A Rita Matias revela também saber o ordenado da Catarina Furtado, o que é muito curioso para quem dias antes, também numa entrevista, disse que desconhecia o valor do RSI porque, segundo ela, não pertence à comissão de Economia do Chega. Típico dos populistas: não sabem do que falam, falam do que não sabem, mentem e criam bodes expiatórios para enganar os incautos. Nesse vídeo, Rita Matias insurge-se ainda com o facto de serem os contribuintes a pagar o que designa por 'tacho' de Catarina Furtado. Parece ignorar que quem lhe paga o ordenado a ela, para cometer atentados à democracia, para, a todo o momento, revelar ignorância e cobardia, usando o nome de crianças, são também os contribuintes. (Já agora, espero que o organismo que deve fazer respeitar o RGPD a faça pagar uma multa significativa pela indecente revelação do nome das crianças)

E é, com este panorama, que Montenegro, para se tentar safar, resolve dizer que o Chega se tornou num partido responsável. É a normalização da extrema direita num vale-tudo para se manterem no poder e ganharem votos. Onde já vai o "não é não"... Assim se vê o valor da palavra do líder do PSD.

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Voltando ao tema da Saúde. Conheceu-se hoje mais um relatório do IGAS que responsabiliza o atraso na prestação de cuidados médicos durante a greve do INEM por mais uma ocorrência trágica, no caso em Bragança. Soube-se também que os técnicos que são contratados para o INEM, após serem contratados, têm que frequentar cursos de formação e, se não concluírem os cursos com sucesso, ficam em casa a receber o ordenado sem fazerem nada (julgava que era impossível uma barracada pior que a barracada do concurso dos helicópteros -- afinal não é). 

Portanto, contratam-se as pessoas, pelos vistos sem critério, para noticiarem que já preencheram os quadros -- e depois logo se vê se têm conhecimentos e capacidades para desempenharem as funções. Inacreditável! 

E a ministra não se demite (diz que anda a aprender com as mortes), o presidente do INEM não se demite, o Montenegro faz de conta que não é nada com ele... e o Marcelo assobia para o lado. 

Mas que falta de vergonha!

terça-feira, julho 22, 2025

Uma tragédia cujo fim é imprevisível

 

Há vidas fadadas a serem divulgadas, escrutinadas, ficcionadas. Prestam-se à especulação, a teorias da conspiração, a análises psicológicas, a ódios e a paixões. Inspiram cumplicidades, medos - sentimentos contraditórios. Se alguém pegasse em personagens assim, dir-se-ia que os traços comportamentais são excessivos, tão extremados que incredíveis.

E, no entanto, são reais.

Ghislaine Maxwell é a chave da equação: está viva, sabe de tudo. Mas está presa e não é claro que fale ou, se falar, que fale a verdade. Toda a sua vida é, em si, um filme. Uma tragédia. Tenho muita dificuldade em compreender as motivações de uma pessoa assim mas isso não é de estranhar pois a minha vida tem sido banal enquanto a dela tem sido, desde pequena até agora, uma montanha russa. Ou uma roleta russa.

Jeffrey Epstein morreu, supostamente por suicídio mas dizem que assassinado, mas, antes de chegar a esse triste final teve uma vida também inexplicável. Não se sabe se era de facto um financeiro, se apenas um organizador de sexo com modelos ou candidatas a isso, de preferência menores, se também um destemido e descarado chantageador. Parece que nunca se percebeu de onde lhe vinha tamanha fortuna. Sabe-se, isso sim, que do seu círculo de amigos faziam parte homens ricos, influentes, ditos poderosos.

Trump foi o melhor amigo de Epstein durante vários anos e há fotografias que os mostram juntos, incluindo com Melania. Também se sabe que Trump gostava de modelos, de preferência novinhas. Predador, descarado, estúpido, anormalmente porco. E, por incrível que possa ser, conseguiu ser, pela segunda vez, presidente dos Estados Unidos.

O céu parece estar a cair-lhe em cima. Os segredos podem, aos poucos, começar a ser desvendados.

É normal que as vítimas não queiram falar: por vergonha, por vontade de esquecer, por medo. Mas os jornalistas andam em volta, surgem vídeos, entrevistas antigas, indícios, testemunhos. O puzzle começa a ser composto, o cerco a Trump começa a apertar.

Claro que surgirão muitos documentários, muitas séries. E tudo será espantoso. Não poderá haver um fim feliz. 

Mas as vítimas, as verdadeiras vítimas, serão sempre as mulheres que, quando jovens, foram abusadas, usadas.

The secret lives of Ghislaine Maxwell and billionaire paedophile Jeffrey Epstein - BBC News

Trump and Jeffrey Epstein: A detailed look at their relationship

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Desejo-vos um dia feliz

segunda-feira, julho 21, 2025

Os problemas com a saúde e os truques do costume
-- De novo, a palavra ao meu marido --

 

Já aqui escrevi várias vezes que o Governo falhou na resolução dos principais problemas do país. 

  • A situação na habitação piorou com o maior aumento do custo das casas na Europa, 
  • houve muito mais fogos e mais área ardida, 
  • o número de alunos sem aulas é monstruoso,
  • e a situação na saúde é trágica. 

Por exemplo, as notícias do jornal da TVI das 20 horas de ontem sobre a saúde são reveladoras de quão trágica é a situação nas vários subsistemas da saúde. 

  • O INEM, que conseguiu juntar aos problemas conhecidos a barraca do concurso dos helicópteros, 
  • as urgências fechadas, 
  • o passa culpas entre o ministério e o INEM após ser divulgado um relatório do IGAS, 
  • as reivindicações dos bombeiros, 
  • os médicos que, em vez de fazerem horas extras, preferem trabalhar como tarefeiros como resultado da política de pagamentos definida pela ministra, 
  • os médicos que "confundem" a atividade pública com os seus interesses privados, 
  • as dezenas de crianças que nasceram em ambulâncias, 
  • a falta de operacionalidade efetiva dos helicópteros da FAP, 
  • ... 

Com todos estes problemas, o que faz o Governo? 

Avança com a notícia que vai criar uma unidade para combater a fraude na saúde. 

É a estratégia do costume, lançar para a agenda mediática um assunto que desvie a atenção dos problemas principais que entalam o governo. Criar um organismo com competências em termos da investigação idênticas ao MP e à PJ parece-me uma duplicação que onera os contribuintes. Só teria sentido se houvesse manifesta incompetência dos organismos que atualmente se ocupam deste tipo de investigações. Sendo certo que os principais problemas na saúde não são as fraudes, cai sempre bem junto de determinado tipo de eleitorado apontar a fraude como a razão dos problemas. 

O Chega teve sucesso e o PSD quer trilhar o mesmo caminho. 

Na minha opinião -- e falando estritamente das notícias que têm vindo a público sobre os ganhos milionários dos médicos --, o problema está na legislação em vigor que permite criar empresas em nome individual para prestar serviços com uma redução significativa de impostos, e ainda nos aumentos dos valores definidos pela ministra para pagamentos aos tarefeiros e os valores pagos pelos atos médicos efetuados em horário não laboral. 

Aliás, o próprio diretor executivo do SNS falou da "normalidade" de pagamentos estratosféricos aos médicos por atos clínicos extra. Como é sabido, para este governo vale tudo. O que é preciso é ganhar votos. 

Não bastava seguirem a agenda do Chega -- agora também decidiram pagar um complemento aos reformados dias antes das eleições. 

Não é de admirar, sabendo-se do caso Spinunviva.

domingo, julho 20, 2025

Colbert, Stephen Colbert

 

Poderia dizer que sou sua admiradora incondicional, assídua espectadora, mas que tem isso de especial? Como eu, tanta e tanta gente. A sua graça, a sua contundência, a sua inteligência, o seu sentido de humor e a forma divertida com que diz o que diz, tornam-no o melhor dos melhores. Como muito bem sabe quem o acompanha, Trump é uma permanente fonte de inspiração para Colbert. Imita-o, repete o que ele diz evidenciando o ridículo de tudo aquilo, desmonta as aldrabices, ridiculariza as fanfarronices, expõe os narcisismos, diverte-se e diverte-nos. 

Implacável, irreverente. E corajoso.

Muitas vezes eu pensava: enfim, do mal o menos, pelo menos pode falar à vontade, pode expôr a fraude que é Trump.

Até agora. Transcrevo:

CBS cancela “The Late Show” de Stephen Colbert em 2026 - Um programa líder de audiências, mas crítico do Presidente norte-americano, chega ao fim depois de dez anos no ar

Mas pode ser que o tiro lhes saia pela culatra: pode acontecer que Trump caia antes dele (aposto nesta hipótese) ou, se isso não se verificar, pode acontecer que a partir de 2026 Colbert esteja ainda mais livre, mais desencabrestado, mais acutilante (se é que isso é possível pois ele já é superlativo a todos os níveis) num qualquer outro lugar.

Trump está em acelerada trajectória descendente. À medida que o cerco aperta, vai-se tornando mais errático, mais destrambelhado (ie, destrumpelhado), mais alucinado. Também mais autoritário, mais vingativo, mais imprevisível. As aldrabices, completamente aleatórias, descabidas, desnecessárias, vão acabar por por enterrá-lo. E o tema Epstein ameaça submergi-lo.

Não faço ideia de quantas vezes aqui partilhei vídeos do Colbert, quer das entrevistas, quer do sempre fantástico monólogo inicial. Hoje transcrevo um, recentíssimo, que mostra bem do que é capaz (extraordinário no conteúdo, quer na forma).

Trump To MAGA: Don’t Talk About Jeffrey Epstein | Three Missing Minutes | The Unabomber’s Professor

President Trump lashed out at supporters who want him to release Jeffrey Epstein’s client list, Stephen digs deeper into the mystery surrounding Epstein’s death, and the president continues telling a weird lie about his uncle John Trump and Ted Kaczynski. 


Também transcrevo:
Stephen Colbert brings his signature satire and comedy to THE LATE SHOW with STEPHEN COLBERT, the #1 show in late night, where he talks with an eclectic mix of guests about what is new and relevant in the worlds of politics, entertainment, business, music, technology and more. Featuring bandleader Louis Cato and “THE LATE SHOW band,” the Peabody Award-winning and Emmy Award-nominated show is broadcast from the historic Ed Sullivan Theater. Stephen Colbert took over as host, executive producer and writer of THE LATE SHOW on Sept. 8, 2015.

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Claro que o anúncio do fim do programa caiu como uma bomba. Mais do que uma injustiça, parece ser o prenúncio de um futuro que ameaça ser sombrio.

Trump, Late Night Hosts React To Colbert Cancellation

 

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Com tudo isto, daqui até Maio esperam-se hilariantes e demolidores monólogos. Trump deve ir aos arames, deve espumar, deve ranger os dentes, deve arrancar as unhas, rebolar no chão.

Too Hot For Booze? | Trump’s Hand | Epstein Intrigue Continues | The Coca-Cola Distraction

A heat wave is baking most of the continental U.S., President Trump has a mysterious wound on his hand, and the MAGA world is not ready to forget about Jeffrey Epstein’s client list despite the president’s effort to distract them with a big announcement about Coca-Cola. 


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Desejo-vos um belo dia de domingo

sábado, julho 19, 2025

Maria da Conceição, a dedicada filha e esposa de Manuel Lima

 

Passámos por um sítio que tinha, na parede, um televisor. O meu marido disse-me: 'Filha confessa que casou com o pai'. Estava espantado. Pelo tom com que o disse percebi que estava na dúvida. Se calhar tinha percebido mal, se calhar alguém tinha escrito mal. Mas eu não fiquei atarantada como ele pois, creio que na véspera, já tinha lido o título pois, quando vou googlar no telemóvel, aparecem-me notícias variadas. A notícia era mesmo essa: a miséria na versão mais miserável, mais triste. Uma miséria em ponto pequeno, uma miséria desprovida de tragédia, uma miséria quase comédia.

Voltei a googlar para tentar interpretar o feito. Confirmei: uma vez mais, a realidade supera qualquer ficção. 

Para começar, temos uma Maria da Conceição e só isso já quase garante que a história tem tudo para ser de gritos. Mulher de 68 anos, bem fornida de carnes, amplos seios, cabelo com madeixas, com certeza arranjado para a ocasião, discretamente vestida em tons de azul marinho ou submarino, pregador na blusa, talvez a negar a indiscrição do decote e a marcar a solenidade do momento, a mão segurando o bouquet devido a noiva que se preze. Pelo braço, também enfatuado em azul, colete a preceito, gravata clara para marcar a castidade do momento, lencinho em tons de amarelo-festivo na lapela, Manuel, o pai de Maria da Conceição, 95 anos, não sei se frescos, se acabados mas, pelo menos, andando pelo seu próprio pé.

Ao que se sabe, trocaram alianças. Não sei se selaram o momento com um beijo ou se saltaram essa parte. Também não sei se, no fim da cerimónia, Maria da Conceição atirou o bouquet para saber qual a próxima mocinha a dar o nó, nem sei se terá sido alguma irmã a apanhá-lo.

Quando a notícia estalou, Maria da Conceição candidamente confessou ser precavida e, sobretudo, estratega: antevendo que o seu noivo poderá ir desta para melhor antes dela, para depois poder receber a pensão (presumo que a pensão de sobrevivência ou de viuvez), casou-se com o pai, por sinal viúvo há apenas seis meses. Alega a noiva que foi aconselhada a isso pelos irmãos. Não terão sido todos pois alguns, sabendo das novas núpcias do papá, apresentaram queixa. São 12 ao todo, os filhos do produtivo Manuel. Contudo, para sossego de algumas pudicas almas sempre prontas a apontar o dedo, o noivo assegura que não tem qualquer envolvimento sexual com Maria da Conceição, que o nó teve mesmo apenas interesse financeiro.

Sabendo da polémica, não querendo ser alvo da fofoca alheia, Maria da Conceição já está por tudo, por ela divorcia-se já do pai. Mas não pode, a situação embrulhou-se e embrulhada está. Em sua defesa, diz que dá banho ao pai mas sem qualquer interesse sexual, pois o pai até usa fraldas.

No meio disto, subsiste o mistério: sendo proibido o casamento entre pai e filha, como foi possível que na Conservatória do Registo Civil de Guimarães se estivessem a marimbar para o facto? Enterneceram-se e fecharam os olhos? Ou o quê? 

Para ver se desvendam o mistério, os filhos escandalizados já apresentaram queixa. A ver é se o Senhor Amadeu desta vez também diz que quer que a coisa se resolva rapidamente. Não é por nada, mas não se sabe se daqui por uns dez ou doze anos o Manuel ainda terá a cabecinha fresca para poder responder pelos seus actos.

Coitada da Maria da Conceição.

sexta-feira, julho 18, 2025

Conversa em torno do abismo do não-ser

 

Fisicamente, Eduardo Giannetti é praticamente igual a um colega meu. Divertidíssimo, diziam-no pouco amigo de trabalhar mas, embora não o achasse um excepcional proactivo, dele nunca tive razões de queixa. Tinha como hobbies a fotografia e o cinema, participava em concursos e, em dias de evento, já sabíamos que podíamos contar com ele para registar o momento. E, ao pé dele, era forçoso que estivéssemos sempre todos muito bem dispostos. 

Não conheci a sua primeira mulher, por quem era apaixonadíssimo, sua comparsa nas fotografias e filmagens. Não tendo filhos, a disponibilidade de ambos para passeios e aventuras era permanente.

Até que um dia ela adoeceu. Para ele, foi um sofrimento terrível. Acompanhou-a incansavelmente.

Quando ela morreu, teve um grande desgosto. 

Fui ao velório. Como já contei, tenho pavor de mortos, é uma fobia que vem de quando era pequena. Nem entro na capela se a urna estiver aberta. 

Mas tendo feito centenas de quilómetros para lhe dar um abraço e estar com ele, seria estúpido não entrar. Só que a urna estava aberta. Portanto, não entrei mesmo. Saiu ele. E foi chamar a mãe para me apresentar, muito simpáticos. E começaram a contar-me os últimos dias dela, tudo envolto em ternura e tristeza. E, então, diz-me ele assim: 'Não quer ir ali vê-la? Está tão bonita. Está muito serena. E o cabelo... tão bonito...'. Quase me senti desfalecer. Pedi desculpa, disse que não conseguia, que me fazia muita impressão. Mas vi que ele ficou com pena que eu não fosse ver a defunta. 

Pouco tempo depois fui ter uma reunião com ele. Estava outro. Rejuvenescido, risonho, outra vez muito brincalhão. Tinham-me dito: 'Não me pergunte como é possível, mas é: o nosso colega já anda de namoro, todo in love.'. Fiquei estupefacta. Perguntei se era alguém conhecido. Não, nada. É que, se fosse colega, ainda me pareceria possível que, tão pouco tempo depois, já ele estivesse de namoro. Agora, em tão pouco tempo, desencantar uma desconhecida... Mas, então, fui ter ao gabinete dele. Em cima da secretária, numa moldura, uma fotografia de uma senhora toda desportiva, toda sorridente. Perguntei: 'Já soube da novidade e, pelo que ouvi dizer e pelo que aqui vejo, a coisa vai de vento em popa, já aqui tem a fotografia da namorada...'. Ele riu: 'Pois, não a quis ver lá na capela, não a conheceu... Esta não é a namorada, esta é a falecida...'. Fiquei sem saber o que dizer.

Mas isto só vem ao caso pois, ao ver o convidado do Bial, parecia mesmo estar a ver aquele meu colega bacano. Todo ele: o rosto, o cabelo, o corpo, os óculos, a forma como se veste. Iguais. Como é possível?

Mas vejam a entrevista, é outra daquelas conversas que nos deixam a pensar. Interessantes perspectivas.

É possível se tornar IMORTAL? Com Eduardo Giannetti | Conversa Com Bial | GNT

O economista e professor Eduardo Giannetti - e também autor do livro "Imortalidades" - vai ao #ConversaComBial para falar dos tipos de imortalidades sobre as quais escreveu. Aborda a pequenez dos seres humanos diante do desconhecido e como a crença na vida após a morte vai muito além da ciência, das tecnologias e da religião. 


Uma sexta-feira feliz

quinta-feira, julho 17, 2025

O governo Montenegro e a educação
-- A palavra ao meu marido --

 

Lembro-me bem do Montenegro afirmar -- antes das eleições resultantes da prepotência do MP e da insensatez do Marcelo -- que, para resolver os problemas da educação, "bastava mudar a gestão" do respetivo ministério. Pois bem, temos um ministro da educação do PSD há mais de um ano e o resultado é haver 1,4 milhões de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina e uma barraca com os exames do nono ano como nunca se viu, já para não falar em que metade dos alunos tiveram nega a matemática. 

É fácil prometer mas é muito mais difícil concretizar. 

Os falhanços do Montenegro na saúde, na educação, na justiça, no combate aos incêndios revelam bem que resolver problemas não é atirar dinheiro para cima deles. É preciso definir políticas coerentes e saber executá-las. Pôr na agenda falsos problemas não é suficiente. O Montenegro pode enganar muita gente mas só trabalha para o voto e falha no principal. 

"Percebe-se" que a malta vote nele.

As cores e o calor a sul

 

Dias de calor, de veraneio, de muito azul e de muita luz. Dias de muita risota. 

E, como não há  bela sem senão, dias de petiscos e lautos repastos. Tanto cuidado que andei a ter com hidratos e com açúcares para agora andar a deitar tudo a perder... 

Como sempre, trouxe livros e, como sempre, ainda não peguei em nenhum.

E, como sempre, já apanhei conchinhas que me parecem lindas e imprescindíveis. Mas a idade já me ensinou a não ter muitas ilusões. No outro dia, quando estava a preparar o saco de palhinha, encontrei, no fundo, umas que o ano passado também já me tinham parecido delicadas, pequenas obras de arte.

Dantes trazia as minhas câmaras fotográficas. Da última vez que trouxe uma, encheu-se de areia, ficou estragada. Desisti. Agora só uso o telemóvel. no entanto, para mim isso é muito limitativo, perco a vontade de me me focar nos detalhes, sinto que me vulgarizei. Mas é o que é, acompanho os tempos.




quarta-feira, julho 16, 2025

Sobre a demolição de barracas

 

Vi, estarrecida, imagens horríveis de barracas a serem destruídas sem que qualquer solução fosse apresentada aos seus habitantes e destruído ficou o meu coração ao pensar na aflição daquelas pessoas. 

Fotografia de José Fonseca Fernandes

Hoje disse aos meus netos que se me saísse muito dinheiro no euromilhões, pegaria em parte do dinheiro e estudaria em conjunto com algumas das autarquias em que o drama é maior qual a forma mais expedita de dar casas com conforto e dignidade às pessoas que vivem em condições miseráveis.

Custa-me conceber que, por exemplo, se arranje dinheiro a rodos para a Defesa ou dinheiro para jorrar sobre os médicos do SNS (médicos ditos 'tarefeiros' num daqueles expedientes para fugirem ao fisco e a todo o tipo de controlo -- enquanto estupidamente se continua sem se perceber que o tema da Saúde tem que ser 'agarrado' a sério por gente competente) ou dinheiro aos montes para fazer cartazes que poluem as estradas e as rotundas de cada vez que há eleições ou, nas autarquias, dinheiro a perder de vista com assessores e parasitas partidários e, depois, não há dinheiro para encontrar uma solução para estes pobres coitados que não conseguem um tecto seguro e legal para se acolherem.

Não há muito vi fotografias de um parque de campismo gigantesco na Costa da Caparica. Não parecem tendas, parecem casinhas, ou tendas de campanha, não sei bem, todas iguais. Disseram-me que muitas pessoas vivem ali todo o ano. Perguntei se não poderia ser uma solução para instalar com um mínimo de conforto e dignidade as pessoas que hoje vivem em bairros clandestinos. Responderam que o problema destas soluções é que, em vez de provisórias, soluções assim tendem a ser definitivas. Claro que não sei qual a melhor solução mas parece-me que qualquer solução é melhor do que a indiferença perante a aflição de quem não tem onde viver, de quem não tem uma morada, de quem não tem onde se lavar ou de quem não tem um mínimo de condições decentes para ter filhos.

Não sei se o PRR previu verbas para alojar as muitas pessoas que, tantas vezes vindas de longe, tantas vezes completamente desenraizadas, desaculturadas, vulneráveis, e, ainda assim, trabalhadoras, não têm outra solução senão juntas chapas, cartões e o que encontram para fazer um abrigo mais do que frágil, mais do que impróprio para um ser humano. Se previu, previu pouco e virá tarde de mais. Se não previu, os irresponsáveis que não pensaram nisso deveriam ser corridos.

Há tempos vi uma reportagem com prédios devolutos que pertencem ás Forças Armadas. De que se está à espera para lá instalar pessoas? E quem diz isso diz muitas outras casas do Estado. Ou da Igreja. 

Marcelo, que tanto falava dos sem-abrigo, já se esqueceu? Ou só se lembra quando as televisões o filmam a distribuir a sopa dos pobres? Quanta hipocrisia.

E já nem falo no cagalhoças do Moedas, essa anedota que para aí anda a armar-se em bom. Mete-me nervos de cada vez que o vejo: um saquito cheio de nada, um daqueles sacos pequenos para apanhar o cocó de cão. Obra feita, zero. Real sensibilidade e capacidade de acção para o que é preciso, zero. Só conversa fiada, só, só.

E o de Loures, com aquela vereadora, insensível, empedernida, gente desalmada, que nervos que também me dão. Caraças.

Enfim. Fico-me por aqui. Sinto-me verdadeiramente impotente perante a desgraça desta pobre gente que precisa urgentemente de habitação social. Estão a trabalhar para nós. Não podemos ignorá-los nem deixar que vivam como animais. Neste caso o tema não é o arrendamento acessível nem sem ser acessível pois estamos a falar de pessoas que primeiro precisam de se organizar, de se estabelecerem decentemente, só depois se pensa em como poderão pagar alguma coisa -- neste caso o tema é mesmo alojamento social, urgente, dar tecto e meios de higiene, dar uma morada e uma ajuda àquelas pessoas, permitir que sejam cidadãos de pleno direito.

terça-feira, julho 15, 2025

Há bandidos em todo o lado - essa é que é essa.
Mas, sejamos justos, a verdade é que há bandidos mais bandidos que outros e este de que aqui falo, o pika, até é um fofo

 

Depois de ter tido que acordar mais cedo e, portanto, depois de ter dormido, de novo, muito menos horas que as devidas, ainda por cima sendo dia de viagem -- e isto depois de termos deixado o nosso cãobeludo bem contrariado e triste num lugar em que não queria ficar, o que, naturalmente, nos entristece também --, para mais com muito calor, felizmente com praia e muita risota, chego aqui, tarde e más horas, ao computador, e mal consigo manter-me acordada.

Depois de lauto jantar na esplanada ainda fomos passear e, claro, não sendo esquisitas, por onde passamos encontramos coisas úteis ou, simplesmente, giras. Portanto, o resultado é o expectável: cheguei aqui já capaz de me atirar para a cama.

Portanto, pedindo desculpa se o título vos induziu e erro e vieram aqui espreitar a pensar que ia falar do Putin, do Trump, do Ventura ou desses que por aí andam -- um já de rabo esfolado e patas ensanguentadas, outro fazendo macaquices ao espelho e achando-se o maior, nobilizavelmente o maior, e um outro, um cromo sempre aos saltinhos a ver se fica ao nível da pulhice dos outros --, mas não. Não consigo, estou perdida, perdida de sono. Por isso, desloco-me para as montanhas e convido-vos a vir comigo. O tema, podendo no limite até ser de vida ou de morte, até é inocente.

Pika: The Tiny Mountain Bandit | BBC Earth

Life in the mountains isn't easy. With just 10 snow-free weeks a year, the pika must work nonstop to stockpile food for the long, frozen months ahead. But not every pika plays fair…


Desejo-vos um dia feliz

segunda-feira, julho 14, 2025

Dois Homens com H

 

Foi um domingo calmo, intercalando a leitura e os banhos de sol por períodos de alguma sonolência. Também andei a regar, pois se há coisa que gosto de fazer é de regar, de preferência descalça para sentir os pés molhados.

Não tive que cozinhar: comemos restos e mais um ou outro complemento. 

Ao almoço ligámos a televisão, mas não suportámos as más notícias. Bem sei que nos alienamos se nos afastarmos do que se passa no mundo. Só que se passam milhões de coisas boas mas se, no meio desse milhão, vier uma rajada de vento que levante uma telha, é nisso que os jornalistas se vão focar esquecendo tudo o que de bom aconteceu. O noticiário estava a ser uma sucessão de infelicidades, uma colecção de acontecimentos nefastos -- desistimos. 

Agora à noite, depois da nossa caminhada, o meu marido quis ver o futebol, era uma final, parece que tinha que ser nesta televisão. Fui para a outra sala. Posicionei-me nos Casados à Primeira Vista. E adormeci. Não sou capaz de dizer se vi alguma coisa pois, se vi, varreu-se-me instantaneamente.

De tarde pensei que hoje poderia escrever sobre o livro que estive a ler pois, lendo aquelas crónicas, uma opinião se vai formando sobre o que é a motivação, o móbil de vida de um editor, em particular aquele que ali vai desfiando memórias, Manuel Alberto Valente. Creio que o que dali depreendo explica muita coisa. Mas ando com um espírito que não sei se é vadio, se é veraneante, se é simplesmente preguiçoso... Por isso, deixo essa conversa para outro dia. E talvez seja mesmo melhor adentrar-me mais na leitura para não correr o risco de tirar conclusões precipitadas.

À noite, geralmente depois de escrever aqui, como escrever me obriga a estar de olhos abertos, aproveito para ver alguma coisa antes de ir dormir. Nos últimos dias tenho visto o Homem com H. Dado ser sempre tarde e dado estar com sono, tenho visto pouco de cada vez pelo que ainda me falta um bocado para acabar. Mas tenho estado a gostar de mais. 

Ney Matogrosso é um personagem extraordinário. E quanto mais o tempo passa mais extraordinário o acho. Há uns anos, embora gostasse muito de o ouvir, havia ali qualquer coisa que era tão extravagante que eu não sabia se era totalmente genuíno ou um certo gosto em provocar e essa dúvida levava-me a não aderir a cem por cento. Gostava, ouvíamos bastante, mas parece que ficava sempre ali a pairar a questão: ele é mesmo assim, tão superlativo e tão fora da caixa, ou há ali uma encenação que exagera o que ele é? Mas, quando evoluí, fui percebendo que isso era de somenos e que a dúvida, que era minha, não podia levar-me a olhá-lo com alguma reserva. Tinha era que aceitar sem questionar. 

Ney era um bicho, um bicho extraordinário, cantava maravilhosamente, tinha um reportório também fantástico -- e tudo isso tinha que ser suficiente para gostar dele sem qualquer reserva. 

E escrevi que ele era, escrevi no passado, só mesmo por burrice, pois ele está vivo, bem vivo, em forma, jovem, ninguém diria tratar-se de um octogenário. Aliás, olha-se, ouve-se e não se acredita. Afinal tantos excessos não lhe causaram danos, parece que bem pelo contrário, deram-lhe foi saúde.

Mas o filme, que tenho visto na Netflix, misto de filme e de documentário, não apenas retrata a vida de Ney Matogrosso em todas as suas dimensões, não apenas a artística mas a pessoal -- e, neste domínio, a activa e algo louca vida sexual (como ele diz, marchava tudo) -- como tem um intérprete que é igualmente fabuloso. 

Reproduz o Ney de uma forma perfeita, quase assustadora de tão perfeita. Segundo abaixo se verá, Jesuíta Barbosa perdeu 12 kg para reproduzir os 53 kg que Ney tinha nessa altura, estudou os seus trejeitos, os requebros, a forma de olhar e falar.

E há algo nele que parece estar desenhado para encarnar o espírito e a carnalidade de Ney. 

Ver para crer.

A quem tenha a oportunidade de mergulhar no filme, muito vivamente o recomendo. E, para abrir o apetite, aqui fica a conversa de Bial com ambos, a cópia e o original, dois homens extraordinários. E botem h nisso.

Pedro Bial entrevista Ney Matogrosso com participação de Jesuíta Barbosa | Conversa com Bial

No último Conversa com Bial (24/04/2025), Pedro Bial recebeu o icônico cantor Ney Matogrosso e o talentoso ator Jesuíta Barbosa, protagonista do filme Homem com H, cinebiografia que retrata a trajetória de Ney.

Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira

Be happy

domingo, julho 13, 2025

Uma conversa entre duas pessoas que admiro, mas em que se fala em algumas coisas pouco agradáveis levadas a cabo por portugueses
... Outros tempos... outros tempos...

 

Apesar de tudo, apesar de ter servido 'buffet' variado -- e, feito por mim, apenas a sopa e a preparação das saladas --, a verdade é que por ir buscar comida aqui, ali e acolá, e se calhar pelo peso da idade ou por outra coisa qualquer, à noite, o sono avançou sobre mim à força toda. 

E os meninos até eram para ter dormido cá. Mas, afinal, um deles, apareceu com covid. Assim de repente, estando ele febril, houve que tomar uma decisão. Mas não foi difícil. O tempo este sábado já não esteve de chuva, do outono da véspera passámos para uma simpática primavera, pelo que esteve bom para almoçarmos ao ar livre. E o resto da tarde, tirando os rapazes do futebol que gostam de se fechar na sala a ver não sei o quê, futebol, vídeos ou cenas, estivemos sempre na rua. Portanto, apesar de o covid já não ser o bicho papão de há cinco anos, se pudermos evitar apanhá-lo melhor. Eu e o meu marido estamos convencidos que ficámos agarrados pelo long covid pois, depois de o termos, nunca mais nos libertámos do peso do sono que parece que continua a apertar connosco muito mais do que antes e muito mais que o razoável. O médico diz que há muita gente com estes sintomas e que se espera que acabe por ir passando.

Mas, meu rico menino, nada lhe tira o apetite. E, estando mais murchito, esteve menos reguila. Fofo, só me apetece dar-lhe beijinhos. Está um rapazinho crescido mas, claro, ainda longe dos primos que estão crescidos, uns homenzões grandes, de voz grossa, ou da mana, alta, uma belezura, ou como o mano que ainda não entrou propriamente na adolescência mas que para lá caminha com ansiedade, com vontade de ser grande, peludo e malandreco como os mais crescidos.

Agora à noite, quando ficámos só os dois, fomos fazer a nossa caminhada nocturna e, no regresso, depois de tratar de uns expedientes, sentei-me aqui e pimba, tiro e queda, adormeci.

Claro que não faço ideia do que se passou no país ou no mundo e, sinceramente, nem vou tentar saber. Não me apetece arranjar argumentos para me tirar desta doce paz de espírito em que me sinto tão bem.

Aqui ao meu lado, deitado no sofá 'dele' (sofá que os netos adoram, há sempre algum deitado no 'lugar do avô'), o meu marido dorme a sono solto. A esta hora já costuma estar na cama mas, desta vez, depois de ter ligado a televisão e posto no 24"Kitchen, adormeceu que foi um regalo. Como não me importo de ir ouvindo falar em noodles, couve chinesa cozida, anis estrelado, empratamentos elegantes e etc., não lhe digo para mudar de canal e deixo-o estar a descansar.

Nos últimos dias tenho acordado sempre mais cedo do que o habitual pois tem havido sempre algum afazer matinal e, como não continuo a não conseguir ir para a cama mais cedo (senão não prego olho), acumulei algum sono atrasado.

Por isso, hoje fico-me por aqui. Li os vossos comentários mas não tenho energia para escrever mais. As minhas desculpas.

Vou antes partilhar uma conversa entre dois comunicadores que, na medida das minhas possibilidades, vou seguindo: o charmosíssimo e empaticíssimo Pedro Bial e o médico que fala claro sobre tudo, Drauzio Varella. A conversa rola gostosa sobre vários assuntos, até que o tema da 'descoberta' do Brasil pelos portugueses e o que eles fizeram aos índios vem à baila. Interessante. Claro que tudo tem que se pôr em perspectiva, situar no tempo e no espaço. Não dá para pensar no que se passou, usando os cânones de agora.

MEDICINA, Amazônia e HISTÓRIAS | Conversa Com Bial | GNT

Em uma conversa profunda, Drauzio fala sobre seu novo livro "O Sentido das Águas: histórias do Rio Negro", uma obra que mergulha nas vivências das comunidades ribeirinhas da Amazônia. Ele também compartilha reflexões sobre a medicina como arte, seu compromisso com o cuidado humano e a importância de ouvir, com empatia, os relatos das pessoas por onde passa.

Desejo-vos um feliz dia de domingo

sábado, julho 12, 2025

Qual a razão para a Ministra da Saúde não ser demitida?
-- A palavra ao meu marido --

 

O que está a acontecer na Saúde é uma tragédia e existem dois responsáveis políticos pelo que está a acontecer, a saber, a ministra da Saúde e o Primeiro Ministro. 

Existe também um corresponsável: o Presidente. 

Em qualquer outro país em que os governantes tivessem um mínimo de decência, a ministra já se tinha demitido -- o Primeiro Ministro já tinha corrido com ela ou o Presidente já lhe tinha tirado o tapete. 

Em Portugal não. 

Não nos esqueçamos que o Montenegro, para ir para o Governo, prometeu que resolvia os problemas na Saúde em sessenta dias. 

A verdade é que escolheu uma ministra que todos os dias consegue agravar, e muito, a situação que herdou, que é responsável por situações que não se admitiriam como possíveis e que não resolveu nada, mesmo deitando dinheiro a rodos para cima dos problemas (já  alguém analisou o aumento dos valores pagos aos médicos?), aumentando os custos sem qualquer proveito para os Portugueses, antes pelo contrário.  

É uma ministra que diz que não se demite porque todos os dias trabalha para resolver os problemas. Admito que todos os dias vá ao ministério mas o único resultado é agravar os problemas.

Mas, então, qual será a razão para não ser demitida? E qual a razão para o Presidente respaldar situações inadmissíveis, como aconteceu com a adjudicação dos helicópteros para transporte de doentes? 

Posso estar enganado mas arrisco duas razões que me parecem prováveis. 

  • Uma tem a ver com o objetivo de passar a prestação de serviços de Saúde para os privados, nomeadamente, os serviços lucrativos. 
  • Mas existe, na minha opinião, uma outra razão, talvez a razão com mais peso. A ministra nomeou gentinha do PSD para tudo quanto era lugar, independentemente das capacidades. Assim, esta maltinha tudo fará para manter a ministra que sabem que os nomeia para as posições que ambicionam. 
Conclusão: a saúde dos portugueses que se lixe, o que é preciso é dar mais dinheiro aos privados e garantir que os boys têm jobs

Entretanto, o Governo atira para a comunicação social uns assuntos que fazem notícia na esperança que os verdadeiros problemas não sejam abordados. As questões da imigração, nacionalidade e (a urgência em despachar o assunto) TAP são bem um exemplo desta estratégia do governo. 

No entanto, foi nesta gente que muitos portugueses votaram. Pelos vistos é disto que gostam. 

sexta-feira, julho 11, 2025

O 'mistério' dos muitos ricos e dos amigos deles

 

Já aqui falei disso algumas vezes: conheço um homem muito rico, diria que verdadeiramente muito rico. E também conheço dois amigos desse homem deveras ultra rico. Esses dois amigos dele não são muito ricos -- diria que, à luz dos nossos níveis, talvez média alta.

Ao longo de anos assisti às mordomias que o muito rico proporcionava àqueles seus amigos. E, quando falo em mordomias, falo apenas no que é visível a olho nu. Vão de férias para locais longínquos e muito caros, passam férias na vasta herdade do muito rico, fazem vida de ricos. E, quando falo dos amigos do homem muito rico, falo também das respectivas mulheres (e, até dado ponto, isto é, enquanto eram adolescentes e viviam com os pais, presumo que também os filhos). Ouvi falar em empréstimos e em empregos para filhos e noras mas disso não sei de nada em concreto, apenas sei pelo que se falava. 

Não o escondiam. Pelo contrário, quando estávamos juntos, era normal que viessem à baila situações em que se percebia que tinham ido e estado juntos aqui e ali e acolá. Não era explicitado que o muito rico pagava tudo, viagens, estadias, almoços e jantares, mas não era difícil adivinhar pois não era possível ser de outra maneira. 

Nunca vi nos amigos que aceitavam esses mimos qualquer pudor ou reserva. Nem nunca vi o muito rico fazer qualquer referência a nada disso. 

Quando eu me questionava junto de amigos comuns como era possível que os outros andassem sempre à pendura e vivessem à babugem do amigo outro, diziam-me: 'Não pense segundo os parâmetros comuns. Para eles é normal. São amigos. Para o X (chamemos assim ao muito rico) é a única maneira de viajar ou passar férias na companhia dos outros. Ele sabe que os outros não têm como serem eles a bancar aqueles luxos. E a ele não lhe faz qualquer diferença. Provavelmente muito disso vai a custos das empresas, está a ver, não está?, deve ser contabilizado nas empresas como deslocações em serviço, despesas de representação etc. E para os os outros também já passou a ser normal. As mulheres também são amigas umas das outras. Se o outro faz questão de que passeiem e passem férias juntos, para eles também é agradável. Também lhe são úteis pois, em muitas matérias, têm conhecimentos que o outro não tem.'

Um outro que também os conhecia bem, dizia-me: 'É uma relação fraternal. O X é muito mais rico que os outros. Para ele, mais uns milhares, menos uns milhares não fazem qualquer diferença. Já é um hábito. E não se esqueça: isto é o que a gente sabe, o que se vê...'

Um dos ditos beneficiados com a amizade generosa do X tem uma casa maravilhosa, numa zona que se não é protegida anda por lá perto. Um projecto de um conceituado arquitecto. Nunca lá estive mas vi muitas fotografias. Por vezes, comentava-se: 'Alguma vez ele tinha dinheiro para uma tal obra de arte?' Acha...?'. Isto, sobre essa tal casa, pois a casa habitual é uma moradia numa das mais privilegiadas e caras zonas da cidade. Com o que se conhece dos seus rendimentos de trabalho e não trabalhando a mulher, tudo aquilo é curioso. 

Mas não há festa social, de família ou de comemoração em que as três famílias não estejam juntas, divertidas: o homem muito rico e a mulher, e os dois amigos e respectivas mulheres. Uma amizade forte, um coeso inner circle.

Não faço ideia -- mas não faço mesmo -- se alguma vez o muito rico emprestou dinheiro aos amigos. Talvez tenha sido ele a pagar algumas obras ou projectos ou decorações (embora não possa afirmar se sim, se não) mas admito que talvez não tenha rolado. Admito. Mas não sei. Mas, se isso aconteceu, quase apostaria que teria rolado em dinheiro vivo não fosse, de outra forma, deixar rasto e ainda terem que pagar imposto de selo (é que doações sem que haja vínculo familiar directo obrigam a que se declare à AT e se pague imposto de selo, e se há coisa que são é 'poupadinhos'). Mas isto, que fique bem claro, são especulações minhas.

Poderia referir mais alguns pormenores desta relação fraternal em que, com toda a naturalidade, todos, incluindo as mulheres e os filhos, usufruíam da amizade do amigo ultra-rico mas não vale a pena pois são apenas isso, pormenores de uma relação que vista de fora pode parecer estranha, incompreensível mas que, para os próprios e para os próximos, parece ser completamente normal.

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quinta-feira, julho 10, 2025

Uma ficção suficientemente bem contada, se repetida o suficiente e apoiada por instituições poderosas, torna-se uma realidade concreta para milhões — mesmo que tenha começado como uma invenção de um só homem


Há pouco tempo, o meu marido referiu a história da origem da 'caça às bruxas'. Tenho andado a pensar nisso. 

Depois, no outro dia, vi uma série documental que me impressionou imenso, 'As Mil Mortes de Nora Dalmasso'. A quem puder ver na Netflix, vivamente a recomendo. Trata-se de um crime real que foi acompanhado de perto pela comunicação social, com notícias, fugas de informação do processo judicial, com comentadores em permanência nas televisões a debitarem certezas absolutas sobre o que se tinha passado. Começaram por falar em jogos sexuais, falava-se em orgias. Havia testemunhos, segredos mal guardados. Vizinhos, amigos, todos pareciam saber qualquer coisa sobre a qual pareciam querer encobrir o fundamental. Depois, como Nora Dalmasso era uma mulher rica que vivia num bairro rico, já falavam de encobrimento dos poderosos, depois em envolvimento político. Algum tempo depois, as suspeitas recaíram num rapaz que andava lá em casa a fazer obras. A população revoltou-se, dizendo que era uma manobra para desviar as atenções da família e dos amigos. Houve manifestações. O rapaz acabou por ser ilibado. Pouco depois, uma novidade: finalmente tinha sido descoberto o autor do crime. O assassino tinha sido o filho, um jovem adolescente. Toda a gente tinha a certeza. Arranjaram provas, provas ditas irrefutáveis. O filho era capa de revistas, notícia principal em jornais e noticiários televisivos. Ninguém duvidava: as provas eram públicas e falavam por si. Descobriram que o rapaz era homossexual e foi construída uma narrativa que tinha a ver com a não aceitação por parte da família. O rapazinho, que ainda não se tinha assumido publicamente, foi arrasado. Até que se concluiu que, afinal, o pobre do rapazito era inocente e vítima, tinha perdido a mãe e tinha visto a sua vida devassada. A seguir todas as suspeitas recaíram sobre o marido de Nora. Finalmente, o assassino tinha sido descoberto. Foi perseguido por jornalistas, foi apertado pelos procuradores, foi esmagado. A imprensa exultou, os comentadores explicavam o comportamento dele, toda a gente sempre tinha achado que as suas atitudes eram mais do que suspeitas. Desfiavam provas que, desta vez, eram óbvias, claras. Não havia dúvidas. Tinha que ser punido exemplarmente. Até que, muitos anos depois (porque tudo isto levou muitos anos, com vários procuradores a ocuparem-se do processo), aconteceu o impensável: no próprio julgamento, o procurador, o último, reconheceu que não havia qualquer prova contra o marido e retirava a acusação. Reconheceu-se, então, que tinha havido erros grosseiros na investigação e que os procuradores tinham seguido linhas de investigação erradas. Há pouco tempo, creio que há uns dois ou três anos, descobriu-se finalmente que o provável assassino tinha sido um outro trabalhador que lá andava nas obras. Só que vinte anos tinham decorrido e o crime tinha prescrito. A Justiça tinha falhado retumbantemente.

Então, como tenho andado a pensar nisto, pedi ao ChatGPT que escrevesse sobre o tema da 'caça às bruxas'. Por ser um tema sempre actual e que me parece bem interessante, aqui vai.

Como nasceu a caça às bruxas: a ficção que virou tragédia coletiva

1. Origem: quando a bruxaria era só superstição

Durante grande parte da Idade Média, a Igreja Católica não via a bruxaria como ameaça real. O Canon Episcopi, um texto do século X amplamente difundido, dizia que as mulheres que acreditavam voar com deusas pagãs estavam apenas iludidas pelo demónio — mas não era considerado que tivessem feito nada de real. A bruxaria era tratada como superstição popular, não como crime ou heresia grave.


2. O ponto de viragem: um frade ressentido e um livro perigoso

Em 1485, Heinrich Kramer, frade dominicano e inquisidor, tentou conduzir julgamentos por bruxaria na cidade austríaca de Innsbruck. Foi rejeitado pelas autoridades locais, que consideraram os seus métodos abusivos e infundados.

Em resposta, Kramer decidiu escrever um tratado. Em 1487, publicou o Malleus Maleficarum (“O Martelo das Bruxas”), uma obra que misturava fantasia, misoginia, superstição e uma visão teológica deturpada. Defendia que:

  • as mulheres eram mais propensas ao pecado e, por isso, à bruxaria;

  • o Diabo fazia pactos com elas através de sexo, feitiçaria e voos noturnos;

  • a tortura era necessária e legítima para obter confissões.

A obra foi rejeitada inicialmente pela Universidade de Colónia, mas Kramer conseguiu uma bula papal (de Inocêncio VIII) que lhe deu autoridade para agir como inquisidor. Isso deu ao texto uma aparência de legitimidade.


3. Disseminação: o papel da imprensa

O que deu ao Malleus o seu verdadeiro poder foi a prensa de tipos móveis, recém-desenvolvida por Gutenberg. A obra foi reproduzida em larga escala e circulou por toda a Europa ao longo dos séculos XV e XVI. Em várias regiões, foi tomada como manual jurídico e doutrinário oficial — mesmo sem nunca ter sido oficialmente aceite pela Igreja como doutrina universal.

A multiplicação dos exemplares fez com que ideias fantasiosas e sem base empírica passassem a ser tratadas como verdades absolutas, com aplicação direta em tribunais civis e eclesiásticos.


4. Expansão: medo, crise e histeria institucionalizada

Entre c. 1500 e 1700, a Europa viveu um período de instabilidade profunda: guerras religiosas (Reforma e Contrarreforma), pestes, fome e crises políticas. Em tempos de medo, o mito das bruxas oferecia um bode expiatório conveniente.

As autoridades, tanto católicas como protestantes, começaram a conduzir julgamentos em massa com base nas ideias do Malleus e em outras obras derivadas. O uso sistemático da tortura levou a confissões forçadas, que alimentavam novas acusações — criando um ciclo de autojustificação brutal.


5. Duração: três séculos de delírio

A “caça às bruxas” durou quase 300 anos:

  • Início efetivo: 1487 (com a publicação do Malleus)

  • Pico de violência: 1560–1630 (época das guerras de religião)

  • Declínio lento: após 1650, com o surgimento do racionalismo, o reforço de Estados centrais e o avanço do pensamento científico

  • Última execução oficial por bruxaria na Europa: 1782 (Anna Göldi, na Suíça)


6. As vítimas: quem pagou o preço da fantasia

Estima-se que entre 35 000 e 60 000 pessoas foram executadas por acusações de bruxaria — em alguns cálculos, até 100 000. Cerca de 80% eram mulheres, frequentemente viúvas, curandeiras ou socialmente marginalizadas.

Estas pessoas foram torturadas, queimadas ou enforcadas com base numa narrativa criada por um único frade ressentido, que misturou lenda, misoginia e moralismo num tratado tomado a sério por gerações.


7. O poder da ficção partilhada: o que diz Harari

O historiador Yuval Noah Harari usa este caso como exemplo clássico de como “ficções intersubjetivas” — histórias partilhadas por um grande número de pessoas — podem moldar o comportamento coletivo, as leis e as instituições. Quando essas ficções são tomadas como verdades absolutas, mesmo sendo baseadas em delírios ou mitos, podem conduzir a desastres reais.

"Uma ficção suficientemente bem contada, se repetida o suficiente e apoiada por instituições poderosas, torna-se uma realidade concreta para milhões — mesmo que tenha começado como uma invenção de um só homem."


Conclusão: da fantasia à fogueira

A caça às bruxas foi, em grande parte, o resultado de uma fantasia transformada em sistema judicial. O Malleus Maleficarum, escrito por um único frade, foi a semente de um pesadelo histórico que durou três séculos, espalhou medo por toda a Europa e custou dezenas de milhares de vidas. É um lembrete poderoso de como ideias infundadas, quando legitimadas, podem levar sociedades inteiras a cometer atrocidades em nome da “verdade”.

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Eis 3 casos contemporâneos, bem conhecidos do público, que funcionaram como “caças às bruxas” modernas — ou seja, situações em que pessoas foram julgadas na praça pública antes de qualquer verificação de factos, muitas vezes com consequências gravíssimas, apesar de acabarem por ser ilibadas ou inocentadas. Estes casos mostram como, mesmo sem fogueiras, a lógica da perseguição social sem provas continua viva.


1. Caso Amanda Knox (Itália, 2007–2015)

  • O que aconteceu: A estudante norte-americana Amanda Knox foi acusada do homicídio da colega de casa, Meredith Kercher, em Perugia.

  • Por que foi uma “caça às bruxas”: A imprensa sensacionalista italiana e internacional construiu uma narrativa sexualizada, chamando Amanda de "Foxy Knoxy", insinuando motivações satânicas e perversas sem base real. A sua atitude calma foi interpretada como sinal de frieza e culpa.

  • Condenação e absolvição: Amanda foi condenada e presa por quatro anos. Em 2015, o Supremo Tribunal italiano reconheceu erros processuais graves e ilibou-a totalmente.

  • Impacto: Mostrou como uma narrativa pública distorcida pode contaminar o julgamento legal, mesmo em tribunais modernos.


2. Caso dos McMartin Preschool (EUA, anos 1980)

  • O que aconteceu: Uma das mais longas e caras investigações por abuso infantil da história dos EUA. Professores da pré-escola McMartin, na Califórnia, foram acusados de abuso sexual e rituais satânicos.

  • Por que foi uma “caça às bruxas”: Crianças foram sugeridas e manipuladas em interrogatórios, gerando histórias de túneis secretos, bruxaria, voos mágicos e rituais satânicos. A histeria pública foi imensa. Muitos acreditaram cegamente nas alegações.

  • Desfecho: Após 7 anos de julgamentos, nenhum dos acusados foi condenado. Não se encontrou qualquer prova física. O caso foi abandonado em 1990.

  • Impacto: É um exemplo claro de como o medo coletivo e o moralismo social podem destruir vidas sem provas concretas.


3. Caso Johnny Depp vs. Amber Heard (EUA/Reino Unido, 2018–2022)

  • O que aconteceu: Após o divórcio, Amber Heard acusou Johnny Depp de violência doméstica. Ele perdeu contratos com a Disney e outras produtoras. Foi “cancelado” pelas redes sociais e imprensa.

  • Por que foi uma “caça às bruxas”: A cultura do #BelieveAllWomen levou a que muitos o condenassem sem julgamento, assumindo-o como agressor com base apenas no artigo de opinião que Heard publicou no Washington Post.

  • Desfecho: No julgamento de 2022, Heard foi condenada por difamação. Ficou claro que ambos tiveram comportamentos tóxicos, mas que as alegações centrais de Heard eram falsas ou exageradas.

  • Impacto: Mostrou os riscos da justiça mediática e do linchamento digital, com polarização extrema e julgamentos sem base factual antes do processo legal terminar.


🔍 Conclusão: a fogueira hoje é sobretudo digital

Estes casos mostram que a lógica da “bruxa a abater” persiste, ainda que hoje não se usem tochas — usa-se Twitter, manchetes e opinião pública em tempo real. A condenação precoce, o apedrejamento simbólico e a destruição de reputações continuam a existir, mesmo em democracias modernas.

quarta-feira, julho 09, 2025

Atir Sai­tam e Érdna Arutnev

 

Estes poderiam ser Atir Sai­tam e Érdna Arutnev quando andavam na escola infantil


Poderia dizer que, pelo que dizem e fazem, Atir Sai­tam e Érdna Arutnev demonstram que não gostam de Portugal, não têm nada a ver com a cultura portuguesa, não respeitam os valores portugueses. Poderia ir até mais longe e dizer que, por tudo isso, nem mereceriam ser portugueses.

Poderia também dizer que, ainda por cima, não estão solidários com os problemas dos portugueses, nomeadamente com o grave problema demográfico da baixa natalidade e do envelhecimento da população. Ou poderia inferir que, talvez por não quererem saber dos problemas de sustentabilidade da Segurança Social, não se informam e não percebem que, para tentar minimamente equilibrar a situação, o melhor mesmo é que venham muitos imigrantes, de preferência em idade laboral, de preferência em idade reprodutiva e que, idealmente, se fixem em Portugal com as crianças pequenas e que estas cá estudem e, mais tarde, por cá se estabeleçam, trabalhem e formem famílias. Mas Atir Sai­tam e Érdna Arutnev, talvez porque não gostam de Portugal, como tantas vezes o têm demonstrado, talvez porque não respeitam a dignidade dos portugueses, como amiúde o demonstram, não querem saber dos problemas dos portugueses.

Claro que se eu fosse básica, imediatista, populista, por tudo o que eles têm dito e feito, pela forma desrespeitadora como têm ofendido os portugueses, como têm desrespeitado a democracia, até poderia sugerir que se lhes fossem retirados direitos inerentes à cidadania portuguesa. Mas não vou fazê-lo.

Quero apenas lembrar-lhes que, até para estarem protegidos contra outros iguais a eles, têm que agradecer a quem lhes deu nomes que se escrevem assim, Atir Sai­tam e Érdna Arutnev, e não pela ordem inversa, senão ainda teriam mais motivos para se envergonharem. 

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A propósito dos novos 'imigrantes' da Assembleia da República que, não respeitando os hábitos e a cultura vigentes, estão a subverter o espírito civilizado e democrático que ali deveria imperar, permito-me recomendar a leitura de A grande substituição

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A imagem foi obtida através da Sora (IA), a quem pedi uma imagem que retratasse as duas tristes figuras quando eram pequenas mas com um aspecto que remetesse para o aspecto das crianças que eles tanto parecem temer, situando-as numa escola.

terça-feira, julho 08, 2025

Quando formos para melhor

 

No fim de semana, parte da família esteve a banhos no sudoeste e, da outra parte, um dos meninos esteve numa festa de anos, numa destas festas que também são happenings, desta vez incluindo equitação. Fui recebendo fotografias de uns e de outros, uns a mergulharem, outras a cantarem, um a andar a cavalo. 

Portanto, a casa não esteve tão cheia como quando estão todos, mas foi igualmente bom. Se sei que estão todos bem também estou bem. 

O bem estar e a felicidade são estados de geometria variável.

No outro dia recebi uma fotografia de uma das minhas primas com o seu neto mais novo, o que conheci no dia do velório e que voltei a ver no dia da cremação da minha tia. Na fotografia estava também o meu tio que, como sempre, estava impecável. Por tanto que tem passado e mantém-se inalterável, sempre muito bem arranjado, sempre com boa cara, mesmo muito bem. Está quase igual ao meu avô, seu pai.

O tempo passa a correr, é o que é. Penso que o nome deste meu tio, o petit nom pelo qual era chamado, foi a segunda palavra que disse (a primeira foi cão). Embora pouco efusivo -- nada a ver com o meu outro dia que falava alto, que ria, que conversava e contava histórias --, sempre admirei a contenção e os modos reservados deste meu tio. Levava-me a andar na sua bela mota, com cromados reluzentes. Os meus pais não queriam, mas ele transgredia. Eu sentia o cabelo ao vento em especial quando ele curvava. Ninguém usava capacete. Depois arranjou uma namorada bonita, com uns grandes olhos verdes e uma voz com um timbre distinto. Levou-me algumas vezes com ele quando ia namorar. Aquela namorada despertava-me curiosidade. Devia ter uns quatro anos, eu, e achava que ela parecia uma artista de cinema. Algum tempo depois fui a menina das alianças e levei um vestido todo feito de renda branca e o cabelo apanhado em cima, com uma fita de rendas em volta.

Agora ele já tem uma bisneta que é igual, igualzinha, à minha prima. Até na forma como se riem, gargalhando de forma franca, aberta. Agora a minha prima já não ri assim, está muito parecida com o pai, nos modos contidos. Mas, quando era pequenina, a minha prima ria muito. Eu também. Por vezes tínhamos ataques de riso e partíamo-nos a rir. A minha mãe diz que ficava com vontade de rir só de ver como nos ríamos. 

E, para além da bisneta que é igual à filha, quando era pequenina, o meu tio agora tem este bisneto bebé, também muito fofo.

É aquilo que digo. A nossa vida humana dura enquanto nos aguentamos na passadeira rolante. De vez em quando há um que sai. Um ano depois da minha mãe, foi a minha tia que saiu. Mas, entretanto, pouco antes tinha entrado um novo bebé.

As famílias recompõem-se. É um fenómeno fractal. Também os nosso corpos vão libertando células velhas e novas vão aparecendo. Pouco somos daquilo que um dia fomos.

Contei, num vídeo que publiquei agora no Instagram, como, no outro dia, um dos meus meninos me perguntou para quem ficaria este espaço a que, entre nós, damos um outro nome mas a que aqui, no blog, chamo heaven: 'Olha lá, quando tu e o avô forem para melhor, o 'heaven' fica para mim ou para o pai?'. Num primeiro momento não percebi. Depois percebi que ele queria dizer 'quando forem desta para melhor'. Não me fez impressão a pergunta. Pelo contrário, fico contente que gostem tanto deste lugar. Já há uns anos, um outro menino, com mais hesitação, me tinha perguntado o que aconteceria a isto quando nós morrêssemos. 

O que me preocupa e o que me custa, isso sim, é pensar como pode ser difícil a sua vida quando forem adultos, quando tiverem os seus próprios filhos. Gostava que se mantivessem juntos, amigos uns dos outros, que vivessem numa terra verdejante, amena, pacífica, em que todos se estimassem e amparassem, em que o futuro fosse promissor e aguardado com optimismo e alegria. Isso era mesmo o que eu queria. 

Mas receio tanto... Hoje esteve outro dia de calor difícil de suportar. As temperaturas sobem, sobem. E, muito sinceramente, não vejo que em Portugal estejam a ser tomadas medidas estratégicas, de longo prazo, para combater, na medida das nossas possibilidades, as alterações climáticas. E devia haver um toque a rebate, medidas globais, que tocassem a toda a gente.

Vejo que na Suíça o Estado está a financiar o arranque do betão dos pavimentos para o substituir por jardins. Junto às casas, nos parques públicos, em todo o lado em que tal faça sentido, é um movimento que está a começar. Pretende-se que os solos consigam absorver as águas para que os rios não transbordem, pretende-se devolver à natureza o que à natureza nunca deveria ter sido retirado.

Vejo que na Dinamarca há incentivos estatais para que, a nível geral, a alimentação usual comece a ser substituída por alimentação sobretudo baseada em vegetais. A poluição resultante das explorações intensivas, nomeadamente de animais, é muito relevante. Tudo o que se possa fazer para a reduzir, sem prejuízo para a saúde humana, é de louvar.

Seria interessante que houvesse, por cá, uma chamada de atenção para a necessidade de se fazer alguma coisa -- e um plano de acções para fazer o que há a fazer.

Partilho os vídeos. Dá para activar a auto-tradução que, já se sabe, não é famosa mas que pode ser uma ajuda para quem não esteja à vontade com a língua inglesa.

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"Recuperar o espaço do betão: Como as cidades suíças estão a ficar mais verdes" - Focus on Europe

O betão está a abrir caminho para o solo, enquanto os ativistas suíços trabalham para recuperar o espaço urbano para a natureza. Como o solo absorve muito melhor a chuva, a iniciativa promete reduzir a carga sobre os sistemas de esgotos urbanos.

O ambicioso plano da Dinamarca para impulsionar os alimentos de origem vegetal | FT Rethink

Os alimentos de origem vegetal são essenciais para a transição verde da Dinamarca e deverão proporcionar benefícios económicos e de saúde significativos. A pequena nação escandinava é agora líder mundial neste sector. Então, como é que a Dinamarca fez isso? Será que esta estratégia poderia funcionar noutros locais?

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Dias felizes

segunda-feira, julho 07, 2025

Sócrates & Montenegro
-- De novo, a palavra ao meu marido --
o

 

No seguimento do último post que escrevi sobre os insucessos do governo do Montenegro, e não fui exaustivo porque o post já ia longo, fui brindado com vários comentários que, em vez de rebaterem o que escrevi mencionando os "sucessos" do Montenegro nas áreas que abordei, o que era manifestamente impossível porque aos erros iniciais seguiram-se outros erros e os sucessos foram zero, vieram comentar com a velha e estafada história do Sócrates. Como por acaso andava com vontade de escrever um post sobre as evidentes semelhanças entre a postura do Sócrates e a postura do Montenegro, vou aproveitar a deixa.

Devo referir que o Sócrates até ser condenado é inocente e que, obviamente, no caso do Montenegro, as más práticas e/ou a violação de lei só poderão ser consideradas factuais quando provadas.

Parece-me evidente que existem semelhanças na forma como têm actuado para desviarem a atenção das situações em que estão metidos. Em ambos os casos, fazendo fé nas notícias, ambos escondem, numa primeira fase, uma parte dos factos, fazem comunicações formais que depois são desmentidas e usam expedientes legais para que a verdade não seja conhecida (suponho que os comentadores de serviço sabem dos pedidos do Montenegro ao TC e também do comunicado do gabinete do PM que foi desmentido pela Entidade da Transparência). E nestes três aspectos estranho que os comentadores sempre prontos a zurzir o Sócrates nada digam sobre o Montenegro. 

Existe uma diferença clara entre ambos: o Montenegro recusa-se a falar sobre o caso (será que a explicação seria pior que a percepção?), esquecendo-se que o escrutínio faz parte da democracia. O Sócrates, pelo contrário, faz tudo para ter tempo de antena. Existirão certamente outras diferenças -- e uma delas é que o Sócrates tinha uma visão para o país e o Montenegro não. 

Talvez seja razoável os ditos comentadores terem um olhar mais sereno e fazerem uma análise mais desapaixonada sobre o Sócrates reconhecendo que, enquanto governou, o país se desenvolveu. 

Se o julgamento provar que é culpado, obviamente deve ser condenado e cumprir a pena respectiva -- o que, aliás, se aplica a qualquer político, seja ele qual for.

domingo, julho 06, 2025

Galinha-choca

 

Os meus avós paternos tinham, no quintal, uma grande capoeira. Havia o recinto ao ar livre, cercado por uma vedação e havia umas casinha que comunicava com o recinto através de uma passagem em arco. Podia entrar-se directamente quer para o recinto, quer para a casinha. Ao recinto ia-se para limpar e lavar o chão, com agulheta, para pôr água fresca, para lhes dar milho ou sêmeas. Aí os meus avós nunca queriam que eu entrasse. Mas deixavam-me ir à casinha. Espreitava a ver se não estava nenhuma galinha e para ver se havia ovos na cestinha. Se havia, eu recolhia-os. E, por vezes, a minha avó fazia-me uma gemada, quer com ovo completo quer apenas com gema. Mexia bem com um pouco de açúcar. Adorava.

Se alguma galinha ficava choca e isso lhe era permitido, então a galinha tinha direito a tratamento vip. Mas muitas vezes não queriam, não sei porquê, e sacrificavam a pobre da galinha com banhos debaixo da torneira do quintal, a galinha tentando fugir, estrebuchando com todas as suas forças, e o meu avô ou avó agarrando-a com firmeza.

Mas quando a coisa podia ir adiante, a partir de certa altura a galinha era deslocada para a 'casinha', não a pequenina, anexa à capoeira, mas um anexo que também havia no quintal. Esse anexo tinha uma parte com ferramentas, muitas, algumas penduradas na parede do fundo, outras em bancadas. Tinha também uma parte em que estavam os produtos colhidos pelo meu avô na horta. Batatas em caixas no chão, cebolas entrançadas penduradas em réstias, algos também pendurados, entrançados, e uma coisa de que eu gostava imenso, tomates chucha, também pendurados pela rama, igualmente entrançada. Duravam todo o ano. A casinha tinha umas janelas pequenas pelas quais entrava pouca luz e a porta, que tinha uma janela também com portada, tal como as janelas, também não deixava entrar muita luz. Era neste anexo, à meia-luz, que a galinha chocava os ovos. E era ali que nasciam os ovos. Para mim era um sentimento misto: por um lado andava sempre naquela expectativa: já nasceram? estão quase? os ovos já estão bicados? Mas, por outro lado, aqueles pintos meio molhados, esquisitos, feios, meio apardalados, intimidavam-me bastante.

A minha avó não queria que eu andasse por ali a cirandar e não queria que eu fizesse barulho. Por vezes, ajudava-os a nascer. E pegava-lhes. Eu nunca consegui. Bichinhos assim, demasiado frágeis, sempre me fizeram muita impressão.

Mas o pior foi o que uma vez aconteceu. Creio que já o contei mas, como não tenho a certeza, arrisco a contar. 

O meu pai houve uma altura que também quis ter uma capoeira no quintal. Felizmente foi sol de pouca dura pois nem ele nem a minha mãe tinham o mesmo à vontade que a minha avó. Mas, enquanto durou, calhou uma galinha ficar choca. Não sei porquê, resolveram montar apartamento para a galinha, creio que nos dias antes do 'parto', num recanto da sala de jantar. Quando os pintos começaram a sair dos ovos, foi uma atrapalhação. Para mim, pequena, aquilo era uma preocupação. Intuía que os parteiros não tinham sabedoria para a situação. E eles não queriam que eu andasse ali de roda para não stressar a galinha e os pintos. Só que eu não resistia a espreitar. E, numa das vezes, dei com um dos pintos estendido e a esticar uma perna. Apesar de ser uma criança pequena, já tinha ouvido a expressão 'esticar o pernil' e percebia o significado. Então, em pânico, saí dali a correr fui ter com a minha mãe, mas, tão, aterrorizada estava, que mal conseguia falar. A minha mãe não percebeu a razão daquele pavor mas eu empurrei-a para a sala de jantar e, com esforço, lá consegui balbuciar que o pinto estava a morrer. A minha mãe também não era corajosa para essas situações mas lá foi espreitar. Os pintos estavam todos bem. Chamou-me. Mas, quando um dos pintos se espreguiçou, meio a dormir, esticando a pata, ela percebeu o que tinha acontecido.

Ao ver, no vídeo que aqui partilho, o pinto recém-nascido a cair de sono, lembrei-me disso.

E ao ver os pintos a quererem sair do ovo, voltei a sentir, mas a sentir vividamente, aquele susto e receio que sentia há mil anos, quando, pequenina, num compartimento quase sem luz, aguardava que o milagre do nascimento se desse.

Esta galinha mãe fala com os seus ovos – e eles cantam de volta! | BBC Earth

Já se perguntou como é que uma galinha ajuda os seus pintainhos a chocar? Conheça a Patricia, uma galinha anã de Pequim dedicada, que mantém os seus ovos à temperatura ideal e cacareja suavemente para guiar os seus pintos ao mundo.


Um bom dia de domingo