Música, por favor
Marta Dias com António Chainho interpreta Fadinho Simples
Quando eu era pequena gostava muito de andar no campo, de correr. Havia entre a casa da avó - onde ficava quando saía da escola e até chegar a hora de ir para casa dos meus pais - e a escola uma ladeira muito íngreme. O que eu gostava de vir desde lá de cima a correr...! Ganhava balanço, a velocidade ia aumentando e eu sentia que, se quisesse parar, não o conseguiria. Sentia que quase voava.
Ainda hoje tenho nos joelhos marcas das quedas que ali dei.
Na parte de cima da casa dessa minha avó, havia campo, muitas árvores, montes, pedras. Era também para aí que eu gostava de ir brincar. Via os pássaros, adorava andar à procura de ninhos, para espreitar os ovos. Pouco parava dentro de casa.
Também, por essa altura, perto da casa dos meus pais havia campo. Agora já pouco há, quase só casas. Mas na altura havia largueza, um ar muito puro, e era também à solta que eu mais gostava de andar.
Quando comecei a namorar, novinha, dava grandes passeios com o meu namorado. Jardins, beira mar e, também, livrarias. Mais tarde, por alturas da faculdade, assim me mantive, jardins, parques, praia, beira-rio e, por essa altura, para além de livrarias, também museus.
Quando comecei a namorar, novinha, dava grandes passeios com o meu namorado. Jardins, beira mar e, também, livrarias. Mais tarde, por alturas da faculdade, assim me mantive, jardins, parques, praia, beira-rio e, por essa altura, para além de livrarias, também museus.
Ainda hoje sou assim. Por força das circunstâncias obrigada a trabalhar, fechada, em ambiente de escritório, logo que posso é a andar ao ar livre, a passear, a calcorrear livrarias e museus que eu me sinto melhor.
Temo maçar-vos com a descrição recorrente destes meus passeios mas, gostando tanto de os fazer, gosto também de partilhar convosco este gosto.
Por isso, com as minhas antecipadas desculpas pelo déjà vu, aqui vos dou conta do dia de hoje, um dia que, para mim, foi uma maravilha.
Eu, caminhante, qual ave em terra, lá fui. E, claro, vocês já me conhecem, lá fui fotografando tudo.
Eu, caminhante, qual ave em terra, lá fui. E, claro, vocês já me conhecem, lá fui fotografando tudo.
Comecei, claro, pela beira do rio.
Hoje as gaivotas voavam alto, muito alto, voos largos, uma fantástica dança aérea.
Hoje as gaivotas voavam alto, muito alto, voos largos, uma fantástica dança aérea.
Gosto de fotografar os pescadores. São pessoas que se encontram envoltas em azul, no meio de vastos horizontes, no meio da beleza, numa tranquilidade expectante. Quando são em sucedidos nas suas pescarias, sinto que gostam que eu registe o fruto do seu sucesso.
Hoje um apanhou um belo choco.
Colocou-o no chão, creio que de propósito para eu o fotografar. Reluzente, o choco agitava-se na calçada. Vejo agora na fotografia que até ficou com uma pena de gaivota presa na viscosidade da sua pele. E um belo cheiro a maresia sempre presente.
Colocou-o no chão, creio que de propósito para eu o fotografar. Reluzente, o choco agitava-se na calçada. Vejo agora na fotografia que até ficou com uma pena de gaivota presa na viscosidade da sua pele. E um belo cheiro a maresia sempre presente.
De tarde, depois de almoço na zona do Chiado, novo passeio.
Início no Largo do S. Carlos, junto à estátua de Fernando Pessoa, não a da Brasileira mas esta, de um Pessoa com um livro no lugar da cabeça.
Início no Largo do S. Carlos, junto à estátua de Fernando Pessoa, não a da Brasileira mas esta, de um Pessoa com um livro no lugar da cabeça.
A seguir, visita a um local de recordações, a Bertrand do Chiado, uma livraria linda, em que se vai de sala em sala e dentro da qual tanto tempo passei, tantos livros comprei.
Quando eu andava na faculdade e havia os saldos da Bertrand eu gastava todo o dinheiro que tinha e não tinha, era uma perdição.
Junto ao Teatro São Luíz, carrinhas das estações de televisão e muitas pessoas, algumas conhecidas, que iam recordar a pessoa feliz e boa que era Miguel Portas. Vi agora na televisão que foi um ambiente de ternura que, de forma muito digna e tocante, envolveu a sua memória. Os seus pais sentiram, certamente, muito orgulho no filho que ficará para sempre no coração de toda a gente; e os filhos, tão bonitos, meiguinhos, sentiram também, com certeza, que o seu pai foi um homem muito especial.
A seguir o passeio dirigiu-se a um dos vários miradouros da cidade, desta vez a Sta. Catarina.
Um local belíssimo, cheio de tradição, mas no qual encontrei uma frequência algo duvidosa. Não é que eu as receie mas uma excessiva profusão de rastas, cerveja a litro, cigarros e cheiros algo suspeitos tornam o local muito pouco ecológico.
Mas, enfim, bonito na mesma, o Adamastor imponente a desafiar todas as rastas deste mundo.
Um local belíssimo, cheio de tradição, mas no qual encontrei uma frequência algo duvidosa. Não é que eu as receie mas uma excessiva profusão de rastas, cerveja a litro, cigarros e cheiros algo suspeitos tornam o local muito pouco ecológico.
Mas, enfim, bonito na mesma, o Adamastor imponente a desafiar todas as rastas deste mundo.
A seguir, de novo em direcção ao rio. Àquela hora da tarde, o rio estava platinado, brilhante, de uma beleza quase insuperável.
Naquelas gradações de prata brilhante do Tejo, os veleiros ficavam quase abstractos contra a luz. E as gaivotas sempre presentes, sempre belíssimas.
Naquelas gradações de prata brilhante do Tejo, os veleiros ficavam quase abstractos contra a luz. E as gaivotas sempre presentes, sempre belíssimas.
A nossa ideia era ir ver a World Press Photo no Museu da Electricidade mas a grande fila cá fora dissuadiu-nos, pelo que nos pusemos a caminho do Centro Cultural de Belém. Em dia de festa da música, uma numerosa multidão animava o espaço. Aliás, desde o restaurante até ao Chiado, à beira do rio e ao CCB a presença de turistas era assinalável.
Acabámos por ir ver a BES Photo 2012 e a retrospectiva 'Nikias Skapinakis, presente e passado, 2012-1950' ao Museu Berardo.
Na altura havia jazz no ar, vindo de um concerto que devia decorrer num pavilhão pois o som era bem audível, uma maravilha.
Muito mais gente do que é costume, na maior parte estrangeiros. Não interessa. O que interessa é que hoje encontrei um museu vivo, com gente a falar ou a ver em silêncio, a fotografar, a rir com algumas peças - ou seja, um museu como os museus devem ser, um local onde é bom estar.
Destaco em especial a exposição de Skapinakis. Muito completa, muito apelativa, um gosto.
Novos, velhos, crianças, toda a gente apreciava com alegria a imaginação fértil, o sentido de humor e o equilíbrio da obra de Skapinakis.
Termino porque vocês, meus queridos Leitores, já devem estar maçados com estes meus passeios na cidade. Mas eu gosto tanto de me deleitar com a beleza natural que nos rodeia e com as diversas manifestações da arte que fico a sentir-me quase na obrigação de vos dar testemunho da alegria e prazer que é percorrer estes caminhos.
Já agora: não custa dinheiro. A entrada no Museu Berardo é gratuita; a rua, os miradouros, o rio, as gaivotas, os veleiros, também o são... (e não me alongo não vá o Gaspar ter alguma ideia infeliz).
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Ouçam, agora, por favor, um poema de António Ramos Rosa
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[Já agora, antes de me ir: não querem dar uma espreitadela lá ao meu Ginjal e Lisboa? Hoje temos palavras em volta de um belo poema de Maria do Rosário Pedreira. E esta semana continuamos com a grande música e as grandes vozes: Puccini. Serão muito bem vindos por aquelas minhas bandas.]
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E tenham, meus Caros Leitores, uma bela semana a começar por esta segunda feira.
E sejam muito felizes, está bem?