Hoje à hora de almoço ouvi Rui Rio referir-se, com ironia, a mais uma das metáforas de que Hélia Correia no outro dia falava: a saída limpa do programa da troika.
Dizia ele que isto é mais uma das habilidades a que já nos vamos habituando para que as pessoas adiram de imediato, sem cuidar de saber de que se trata. Sendo a coisa limpa as pessoas vão imediatamente aderir pois o oposto de limpo é sujo e quem é que vai querer defender uma coisa suja?
Concordo.
Começa a ser difícil a gente manter a cabeça limpa no meio de um ambiente cada vez mais conspurcado, em que o sentido das palavras é adulterado, em que se criam fantasias infantis à volta de assuntos sérios.
Dizia Rui Rio que sair directamente para os mercados sem rede (leia-se: ir pedir dinheiro emprestado sem alguém a afiançar) é um risco enorme e estúpido. Diz ele que obviamente um sistema qualquer que sirva de rede (chame-se programa cautelar ou programa prudente) é essencial uma vez que só o facto de se saber que o há, já os 'mercados' que emprestam o dinheiro têm a garantia que o vão reaver e, portanto, baixando o risco, os juros serão inferiores. Diz ele que esta parvoíce do Governo e partidos que o apoiam andarem a apregoar que vão fazer uma saída limpa já anda a deixar as agências de rating em alerta. Diz ele que os riscos de se andar nesta leviandade são tremendos para o País. Diz ele que é do PSD.
Neste momento em que escrevo está Manuela Ferreira Leite, que também é do PSD, a falar nisto na TVI 24: diz ela que só por eleitoralismo, para fazer flores, por irresponsabilidade se pode agora andar a apregoar uma saída limpa depois de se andar a falar compulsivamente de austeridade e ao mesmo tempo que se continua ainda a exigir sacrifícios de toda a espécie porque ainda não estamos bem.
Pois. A questão é que estes governantes da treta não são gente séria, nem são capazes de ter uma conversa adulta e informada. Presumo que os que manobram, sabendo do que a casa gasta, lhes explicam as coisas como se estivessem a falar com crianças de 3 anos. E eles repetem isso como se fosse uma conversa normal. Ou então juntam-se a inventar palavras de forma a que as pessoas até se sintam mal se não alinharem com eles.
Outra que ouvi hoje da boca daquele ministro que já me parece sinistro, tamanhas as enormidades que diz sempre com um sorrisinho hipócrita no canto da boca, o Marques Guedes.
Agora apareceram com um menu de razões para poderem despedir os trabalhadores mas, acrescenta ele, que agora vão receber mais contributos para densificar o cardápio.
Densificar. O que é isso? Opacizar? Tornar opaco? Incompreensível, uma teia?
Qualquer governo decente quereria tornar as leis transparentes, em especial num assunto tão sensível como o dos despedimentos.
Estes não, estes querem densificar.
Uma cambada. Palavra. Uma cambada.
Já custa a aguentar gente tão pouco transparente, tão pouco séria, que parece desconhecer o que é a honestidade intelectual, uns infantilóides que julgam que toda a gente é tão imbecil como eles.
Caraças.
E caraças para o Totózero que não dança nem sai da pista. Porque é que o PS, perante tudo isto, não dá um murro valente na mesa?
(Do BE nem falo, nem se dá por ele. E o PC parece que também anda a dormir na forma. O que é que deu nesta gente, senhores? Será que o Cavaco ou alguém por ele anda a anestesiar toda a gente da oposição?)