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terça-feira, junho 03, 2025

A Inteligência Artificial vai atirar o desemprego para uns assustadores 20%? Já é caso para alarme?
Ou vamos esperar a ver no que dá e, até lá, que não nos doa a nós a cabeça...?

 


Quando comecei a trabalhar havia profissionais que, mais tarde, desapareceram. Por exemplo, havia codificadores. Mais tarde, as próprias pessoas escolhiam os códigos que, de entre a lista, melhor se adequavam. Na informática, que ocupava enormes 'salões', havia 'analistas' de diversos tipos, programadores e 'operadores de recolha'. Os diversos serviços enviavam diariamente montanhas de documentos que estes últimos 'recolhiam'. Aos poucos, a 'recolha' acabou pois os diversos serviços introduziam a informação directamente nos sistemas.

Dentro dos centros de informática propriamente ditos, espaços gigantescos, havia os preparadores que organizavam a sequência em que entravam os 'jobs' e, para a informação ser cozinhada, havia programas que 'corriam' de noite. E, de manhã, os estafetas distribuíam lençóis, 'pijamas', por todos os serviços - listagens enormes de papel às risquinhas com buraquinhos dos dois lados. Aos poucos isso foi saindo nas impressoras que estavam nos serviços e mais um conjunto de profissionais ficou sem trabalho.

Havia salas enormes com operadores de telex. Os serviços preparavam o que hoje seriam mails, os 'contínuos' levavam à sala dos telex's. 

E havia a enorme sala de dactilografia. Só senhoras. Eram elas que 'batiam à máquina' cartas, relatórios, contratos e o que houvesse a fazer em letra de forma. Algum tempo depois, essas salas desapareceram.

Outra das salas enormes, enormes mesmo, era a da Contabilidade. As facturas dos fornecedores chegavam lá, eram contabilizadas em máquinas de manivela, e eram registadas e arquivadas em mais do que uma via.

Já mais recentemente, as facturas chegavam, alguém abria os envelopes, organizava-as e passaram a ser digitalizadas à chegada e, a partir daí, todo o processo passou a ser automatizado, com sistemas que transformam imagem em dígitos, com workflows para que circulassem por quem as aprovava, e, daí até entrarem directamente no sistema, eram um ai. Vários profissionais foram dispensados, claro. Posteriormente, a mudança foi ainda maior com os fornecedores a registarem directamente as facturas no portal que a empresa disponibilizava. E mais redução de pessoal, claro.

Fazer o orçamento da empresa e fazer o acompanhamento mensal, quando entrei, ocupava muita gente e era um trabalho terrível. Tinha que se recolher informação manual de todas as áreas e fazer infindáveis cálculos manuais. Fazer uma alteração implicava, frequentemente refazer todo o processo. O produto do orçamento era um dossier enorme, cheio de folhas datilografadas, que era distribuído pelas direcções. Mensalmente eram produzidos, em papel, relatórios com os desvios e as suas explicações bem como uma projecção dos impactos no resultado anual. Uma trabalheira que hoje dificilmente se imagina.

Aos poucos, os escritórios foram encolhendo. O que antes requeria edifícios gigantes com muitas centenas de funcionários ficou reduzido a um andar em que a maioria das pessoas já estava afecta a áreas mais 'nobres' como planeamento, investigação, inovação, qualidade, gestão de talento e coisas assim.

Fora dos escritórios a revolução foi também brutal. Os armazéns, por exemplo, antes fervilhavam de gente: uns recebiam o material, outros codificavam, outros inseriam as guias de entrada em dossiers e em folhas de registo para serem 'recolhidas' ou, mais tarde, directamente no sistema, isto depois dos codificadores catalogarem tudo. Depois havia os que arrumavam os artigos, outros que faziam inventários, outros que atendiam quem lá ia levantar artigos e, aí, faziam os movimentos inversos. Hoje poucas pessoas lá trabalham. Tudo está informatizado, automatizado.

E podia continuar mas o panorama seria sempre o mesmo.

Em cada um destes movimentos houve sempre alguém que foi sacrificado mas, vendo a posteriori, nada disto foi globalmente dramático pois as pessoas iam sendo 'reconvertidas', outras saíam com indemnização e arranjavam lugar noutras actividades. E isto era um processo gradual.

O que aconteceu nas empresas em que trabalhei, aconteceu em todo o mundo.

Mas não sei se a revolução que a inteligência artificial não vai ser mais disruptiva. Não a vejo como um interruptor -- hoje funciona assim e amanhã já é de outra maneira e, de um dia para o outro, saltam pessoas aos milhares -- pois as organizações levam tempo a assimilar as mudanças e a adaptar-se. Mas, assim que se inicie a migração para processos que incorporem a inteligência artificial, o movimento será irreversível e rápido.

Hoje ainda não sabemos dizer ao certo todas as áreas em que a IA vai mexer mas é só questão de começar. Onde ela entre, o movimento será imparável.

A nível caseiro, já a uso a toda a hora -- e já sinto que há um antes e um depois do ChatGPT. Dou um exemplo: contei no outro dia que a rega não tinha arrancado. Herdámos o sistema de rega com a compra da casa. Tem sido sempre uma aventura atinar com o seu funcionamento pois não ficou nenhum manual e, quando tínhamos jardineiros, cada um mexia à sua maneira, dizendo que tinha reprogramado. E havia noites em que regava em permanência, outras vezes arrancava de dia, em horas impróprias, outras vezes funcionava dia sim, dia não. Quando resolvemos que estávamos melhor sem jardineiros, esse imbróglio passou para nós. O incrível mundo das electroválvulas e das estações e dos programas passou para nós. O mal das coisas complexas e sofisticadas -- que dão para adaptar a tudo e mais alguma coisa e que permitem combinações de tudo com tudo -- é que descortinar o que está programado e o que se pode fazer sem fazer perigar todo aquele equilíbrio instável é um desafio. O meu marido é apologista da técnica de mexer o menos possível. Eu sou o contrário: eu sou de tentar perceber tudo e depois refazer tudo em consciência. Mas, antes, faltava-me o apoio técnico. 

Até que chegou o ChatGPT. Agora fotografo o programador e coloco dúvidas. Ele reconhece a marca e o modelo e começa a interpretar o que vê. E vou seguindo o que 'ele' diz. Claro que ele não me diz tudo às primeiras pois é sabido que a maior ignorância é a que desconhece a dimensão da sua ignorância. Portanto, não pergunto tudo o que há para perguntar e, portanto, vou recebendo respostas que são apenas uma parcela do que há a fazer. Uma luta. Tentativas infrutíferas umas atrás de outras. Mas não desisto. Faço, fotografo o que diz o monitor, volto ao ChatGPT, volto ao programador, e assim sucessivamente. Neste momento, já estou mais perto de dominar a coisa. Ainda não estou lá, mas já vi a luz ao fundo do túnel mais longe... Claro que ainda não cheguei à parte a que provavelmente nunca me atirarei: a do aspecto físico da coisa, o das electroválvulas, a sua associação às estações respectivas. Mas, se calhar, até para isso, 'ele' me ajudaria. O que antes requereria um jardineiro especialista em sistemas de rega, agora está nas minhas mãos e nas do ChatGPT. 

E quem diz isto diz interpretar um balanço e uma demonstração de resultados, apontando pontos críticos, áreas a requerer atenção -- e isto através do 'upload' de um ficheiro ou de fotografias. Isso ou interpretar análises clínicas ou relatórios de exames médicos. Ou fazer o upload de um livro, ou de um contrato ou do que for, e pedir um resumo, uma apresentação ou o que for. E o trabalhinho aparece imediatamente feito.

O impacto disto nas empresas, nos escritórios de advogados, na Administração Pública, na Investigação, na análise das imagens de exames médicos, em todo o lado..., vai ser imenso.

Claro que haverá sempre muitas profissões que não desaparecerão. Muitas. E novas profissões surgirão. Muitas. 

Estudar o impacto, área a área, de tudo isto é imperioso: para programar a formação e as vagas por curso, para repensar a sociedade no seu todo. Se tudo for pensado e planeado, decorrerá sem sobressaltos de maior. Se nada se fizer, será um ver se te avias de crises, crises daquelas bem problemáticas.

A entrevista que o Anderson Cooper conduz com o CEO de uma empresas de Inteligência Artificial é interessante. Penso que é um tema que deveria ser trazido para a ribalta. Em vez de andarem mais do sete cães a um osso a ver quem diz mais mal do Gouveia e Melo mais valia que se antevisse o futuro. Com pés e cabeça. Com factos, com objectividade. Com gente que saiba e não com papagaios. Estou farta de papagaios.

AI company's CEO issues warning about mass unemployment

Anthropic CEO Dario Amodei tells CNN's Anderson Cooper that "we do need to raise the alarm" on the rise of AI and how it could cause mass unemployment.

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Imagens geradas, a meu pedido, pelo Sora (IA)
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Dias felizes

quarta-feira, outubro 30, 2024

Quais as causas para haver, em simultâneo, em vários países, uma crise na Habitação?

 

Até há relativamente pouco tempo não se ouvia falar em crise na Habitação. 

Aliás, há uns anos, antes da 'acalmia', mais concretamente em 2008, houve uma crise mas de sinal contrário. Se agora, o problema é a escassa oferta e, consequentemente, os preços muito elevados, há uns anos o que aconteceu foi o contrário: era área de forte investimento até que a dita bolha imobiliária rebentou, deixando os bancos entalados e, logo, o sistema financeiro a tremer.

Mas agora não é apenas em Portugal mas em vários países, alguns com ainda maior premência do que por cá, que as pessoas vêm para a rua gritar pelo direito a uma habitação digna. Casas não as há, quer para vender quer para alugar, pelo menos a valores compagináveis com os rendimentos da classe média baixa. Parece que as casas 'económicas' desapareceram. Há, sim, casas milionárias ou milionaríssimas que, estranhamente, também se vendem e arrendam bem, embora certamente a outra camada da população, se calhar, até, a estrangeiros.

Há pouco, estávamos a jantar e a ver, na RTP 3, o Jon Stewart com Josh Shapiro, Governador da Pennsylvania. E, para meu espanto, um dos temas abordados foi também o da crise da Habitação.

Ora o que há de comum entre Portugal, Espanha, França, Irlanda, Reino Unido... e Argentina, Canadá, Austrália, Estados Unidos... para que não haja casas disponíveis para a classe média e média-baixa?

A população está a aumentar de forma rápida, não orgânica? 

Em Portugal, o número de imigrantes é de ordem a justificar a escassez de casas? Até pode ser. Felizmente, a demografia anémica de Portugal está a ser compensada com os imigrantes. Já aqui o referi muitas vezes: tomara que por cá se mantenham e se instalem e formem família, de preferência com muitos filhos. Mas, na realidade, são centenas de milhares de pessoas que têm que ser alojadas.

Ou a crise da Habitação tem também a ver com o advento do turismo fora do âmbito hoteleiro? Estará a crise relacionada com a implantação de plataformas como o Airbnb (escrevo no plural pois não sei se não haverá mais)? Por todo o lado há casas que saíram do mercado do arrendamento tradicional ou em que provavelmente os donos desistiram de as pôr à venda pois o rendimento que obtêm com o alojamento local é bem mais atraente.

Gostaria de ver um estudo exaustivo sobre este tema, identificando, por um lado, o número de casas que seria necessário para alojar o acréscimo de população e, por outro, o número de casas que foram subtraídas do mercado habitacional por transferência para o mercado turístico. Creio que estes dois factores são transversais a todo o mundo dito ocidental (que acolhe imigrantes e turistas).

Penso que, com um estudo fundamentado e com números exactos e uma distribuição geográfica das carências, seria mais fácil encontrar soluções.

O que me confunde é que ouço frequentemente dizer que o problema não é a falta de casas. Não sei se há nuances semânticas nisto. Não vale dizer que há casas, são é de gama alta. Se a população que se queixa de falta de casa é gente com fracos rendimentos, o facto de haver casas de 1 milhão ou com rendas de mais 2 mil euros não vem ao caso. Nem vale dizer que há casas, por exemplo podem usar-se conventos ou quartéis, pois instalações dessas poderão ser reconvertidas para hotéis mas dificilmente para apartamentos (digo eu).

Ou seja, penso que tem que haver um mapeamento exacto do que falta e das suas características e localização. 

E também não vale a pena tentar travar o que não é travável, tal como o turismo que se se instala em alojamentos locais. Quando muito consegue racionalizar-se, mas não travar. Pode, também quando muito, tornar-se o arrendamento habitacional mais atractivo para os senhorios (impostos mais baixos, por exemplo). Mas nunca a solução passará por aí.

Seja como for, em abstracto, creio que o que há é fomentar a construção rápida, económica e bem pensada de construção de habitação, não direi social mas para uma população de baixos rendimentos. E isto deveria ser pensado de forma articulada, discutido, entregue a quem sabe: equipas mistas de arquitectos, sociólogos, engenheiros civis e engenheiros urbanistas. 

Não pode ser feita uma coisa às três pancadas, na periferia. Não queremos, certamente ter mais bairros sociais, indistintos, nos limites das cidades, futuros ghetos. 

Creio que há técnicas de construção económicas e seguras que não têm que ser necessariamente ruinosas para os empreendedores. Ainda agora vi que em Estarreja, numa fábrica, estão a apostar em técnicas económicas e sustentáveis para a construção. Tem que haver investigação e investimento forte nestas áreas.

Não creio que tenha que ser construção pública. Pode ser. Mas não tem que ser forçosamente pois as naturais limitações orçamentais do Estado não devem ser um travão para a resolução deste grande problema. 

Agora que se perceba de que é que efectivamente se está a falar, quais as causas, de que é que se precisa exactamente. E que se perceba que isto é um tema global. Que se aprenda com os outros, no que for de aprender. 

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Partilho um vídeo sobre o tema. Contudo não são abordadas possíveis causas que me parecem bastante prováveis como as que referi (o disruptivo e não linear crescimento da população pela incorporação de imigrantes no tecido social e o grande afluxo turístico que se aloja em casas que antes eram habitacionais).

The Global Housing Crisis in 5 Minutes

The global housing market has reached boiling point. Prices are going through the roof, home-ownership rates are at all-time lows, and supply is consistently below what is needed. As we go through multiple global cities, we investigate the main problems with the housing market, as well as the possible solutions.


segunda-feira, julho 06, 2020

Quando temos um martelo na mão, tudo nos parece um prego.
É isso e a Bíblia ser maioritariamente um desfiar de fake news.
E outras coisas que Harari dixit





A democracia baseia-se na ideia de que o eleitor é que sabe, o capitalismo de mercado livre acredita que o cliente tem sempre razão, e o sistema educativo liberal ensina os alunos a pensarem pela própria cabeça. No entanto é um erro depositar tanta confiança no indivíduo racional, 

Os economistas comportamentais e os psicólogos evolucionários têm provado que a maioria das decisões humanas se baseia em reacções emocionais e e atalhos heurísticos em vez de análises racionais, e que, embora as nossas emoções e heurísticas tenham sido adequadas à vida na idade da Pedra, infelizmente são desadequadas à Idade do Chip. 

Não só a racionalidade como a individualidade são um mito. Os seres humanos raramente pensam pela própria cabeça. Pensamos em grupo. 

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O poder em grande quantidade distorce a verdade inevitavelmente, O poder prende-se com a mudança da realidade, não com vê-la como ela é. Quando temos um martelo na mão, tudo nos parece um prego; e quando temos uma grande quantidade de poder nas mãos, tudo parece um convite para nos imiscuirmos. Mesmo que consigamos conter este impulso, as pessoas à nossa volta nunca deixarão que nos esqueçamos do gigantesco martelo na nossa mão. Todas as pessoas que falarem connosco terão intenções conscientes ou inconscientes, pelo que nunca nos podemos fiar inteiramente no que dizem. Nenhum sultão pode confiar que a sua corte e os seus súbditos lhe dirão a verdade. 

Assim, o poder em grande quantidade funciona como um buraco negro que distorce todo o espaço à sua volta. Quanto mais próximos estamos dele, mais distorcido tudo se torna, todas as palavras ficam mais pesadas ao entrar na sua órbita. Se temos muito poder, todas as pessoas que vemos tentam lisonjear-nos, agradar-nos ou pedir-nos algo. Elas sabem que não podemos dispensar-lhes mais de um minuto ou dois, e têm receio de dizer algo de inadaptado ou confuso; acabam, portanto, por proferir frases vazias ou os maiores lugares-comuns.

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Assim, se o leitor culpa o Facebook, Trump ou Putin por terem aberto alas à nova e assustadora era do pós-verdade, recorde a si mesmo que há muitos séculos os cristãos fecharam-se a si próprios numa bolha mitológica de autofortalecimento, sem nunca se atreverem a questionar a veracidade factual da Bíblia, ao passo que milhões de muçulmanos depositaram a sua fé inquestionável no Alcorão. Durante milénios, muito do que era visto como 'notícia' ou 'facto' nas redes sociais humanas eram histórias sobre milagres, anjos, demónios e bruxas, com jornalistas destemidos a darem notícias directamente das profundezas mais recônditas do submundo. Não há quaisquer provas científicas de que Eva tenha sido tentada pela serpente, que as almas de todos os infiéis ardam no inferno após a morte, ou que o criador do universo não goste que um brahmin se case com uma intocável  -- no entanto, milhões de pessoas têm acreditado nestas histórias ao longo de milhares de anos. Certas fake news duram para sempre. 



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Obviamente as fotografias não têm -- nem tinham que ter -- nada a ver com o texto. São da autoria de Eylül Aslan e, se as suas fotografias não têm a ver com o texto, de uma coisa podem Vossas Senhorias estar certas: é de que elas têm muito a ver comigo.

James Blunt que aqui vem interpretar Halfway também não deveria ser para aqui tido nem achado. Veio porque quis e porque a dança daqueles ali me enternece; e tenho para mim que isso é razão mais do que suficiente para ele ser aqui bem recebido.

Os textos são excertos de '21 Lições para o Século XXI' de Yuval Noah Harari e escolhi estes como poderia ter escolhido muitos outros. Talvez ainda, um dia destes, venha a escolher. Vou intercalando isto com cenas do Livro do Desassossego, coisa que também não tem grande explicação. Só uma que não é para aqui chamada.

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Votos de uma boa semana a começar já por esta segunda-feira. 
Saúde, energia, alegria e mais coisas boas.

quarta-feira, junho 24, 2020

As três realidades básicas do universo


Por entre tentativas disto e daquilo, quase todas goradas, estive com o Harari ao colo. Estive a tentar acompanhá-lo naquilo da diferença entre cérebro e mente. E estive a ler sobre o nosso desconhecimento sobre tudo isso. Na verdade, fiquei a pensar no total desconhecimento de tudo o que de mais íntimo nos diz respeito. É muito estranho, isso. E é tema que muito me intriga. Diz ele que já estamos na fase em que os algoritmos sabem as nossas preferências e que, se não nos apressamos, um dia serão eles a determinar o que nos é dado a conhecer.

Já estamos quase lá. E mantemo-nos indiferentes a essa evolução do rumo dos humanos. Um dia, talvez não muito longínquo, já pouco teremos daquilo que somos hoje. Se chegarmos até lá, claro. É que pode haver uma pandemia em que o vírus seja menos condescentente que este coroninha tinhoso ou pode o degelo encharcar meio mundo e a outra metada ficar ressequida, com os humanos feitos carapaus secos. 

Mas, até lá, iremos evoluindo no sentido em que agora vamos: cada vez mais fúteis, mais parvos, mais mentecaptos. Vítimas de tudo, reféns de tudo, nomeadamente de tretas como as redes sociais -- e, talvez por isso, narcisistas, burrificados, superficiais. Mas isto já sou, não é ele, que ele é mais contido que moi.

Também estive a ler o que ele diz sobre a preocupação das pessoas com o que acontece depois da morte. E concordo com o que diz. Se as pessoas não se importam em saber o que são antes de morrer, porque se preocupam tanto com o day after? E preocupam-se como se, enquanto estivessem vivas, fossem unas, com uma identidade imutável. Ora se mudamos todos os dias, mudam as nossas células, muda o que as mantém vivas e unidas, muda a nossa perspetiva, muda tudo, porque nos olhamos sem nos vermos como somos, algo em permanente mudança? Mas olhamo-nos como se fossemos calhaus, havendo muita gente que se gaba de, se fosse hoje, faria o que fez há mil anos, da mesma maneira. Pensam que mostram coerência. Contudo, o que eu ali vejo são anos de aprendizagem desperdiçados. E nem se dão conta da burrice que revelam, E estas apreciações também já são de minha lavra. 

E li sobre outras coisas mas agora não vos quero maçar mais. Tinha pensado em transcrever algumas coisas mas estive aqui de roda de outra coisa e já é tarde demais para me armar em copista. Ainda se, com a mente, eu pudesse seleccionar um trecho de uma página e, copy paste, pumba para aqui... 

Agora assim, o estado da arte ainda não chegado a esse ponto e tendo que ser à mão, limito-me a esta coisa pouca:

"(...) as três realidades básicas do universo são que tudo está em constante mudança, que nada tem uma essência duradoura e que nada satisfaz totalmente".

A seguir ele explica porque são estas e não outras as realidades básicas do universo mas isso é informação preciosa demais para ser despachada aqui em três penadas, 

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Fotografias de Ren Hang que, como é bom de ver, não tinham nada que ser para aqui chamadas. 
Talvez por falta de inspiração, não me ocorreu nenhuma música desapropriada para aqui colocar

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E tenham uma boa quarta-feira, está bem?

domingo, dezembro 03, 2017

Sobre o Questionário aplicado no 2º aniversário do Governo, a palavra a um Leitor que participou no trabalho





Já vem tarde este meu post. Outras coisas se foram metendo, o meu tempo sempre escasseando, a actualidade, que é breve, fugindo.

Não é, pois, tema actual o que aqui me traz hoje. Ao ritmo a que o tempo é arrebatado pela vida, quase roubo por esticão, tudo parece ganhar uma relevância exagerada num instante para logo cair no esquecimento no instante seguinte.

Este ímpeto devorador a que se entregam as mentes mais limitadas e a que a comunicação social dá palco é um perigo. Perante iniciativas que as suas pobres mentes não alcançam, logo os seres mais limitados se prendem às migalhas e delas, e apenas delas, se alimentam. Tudo o mais, que não percebem, é triturado como se de resíduos se tratasse. Ora isto conduz, forçosamente, à estupidificação colectiva.

Por isso, tentando, na modestíssima medida das minhas fracas possibilidades, contrariar esta onda de mediocridade, aqui estou a repescar o assunto.

E o assunto é o que de seguida passo a expor.


Aquando do 2º aniversário do Governo e da sessão que decorreu na Universidade de Aveiro (UA), o tema ocupou como um fogacho a comunicação social descerebrada que nos calhou na rifa.


Como geralmente acontece com os idiotas que, ao verem apontar as estrelas, se focam na ponta do dedo que aponta, assim a Madame Cristas da Coxa Grossa & Cérebro de Galináceo. E assim os seus seguidores  que pululam no PSD e que, à falta de líder, se encostam a qualquer galinha que cacareje mais alto.


Não quiseram conhecer as perguntas, não quiseram saber das respostas, não quiseram conhecer os estudos subjacentes, não quiseram saber nada: apenas se focaram nas ajudas de custo que os participantes na sessão de perguntas e respostas receberam para ali estarem.

Gentinha descerebrada -- que acha que fazer política é andar a expelir sound bites, na ânsia de, com esses dejectos, conquistar o apoio suficiente para se alcandorar a lugares onde possa ter mais poder --, não sabe que fazer política é uma coisa séria, que deve apoiar-se em avaliações sistemáticas, em estudos bem fundamentados, que deve levar em conta o que as populações pensam (o que pensam mas não de forma superficial mas, sim, estruturada -- o que pensam os jovens das zonas mais desenvolvidas, o que pensam os das zonas mais carenciadas, o que pensam os desempregados de longa duração, o que pensam as mulheres trabalhadoras, o que pensam as reformadas, o que pensam os trabalhadores mais qualificados, o que pensam os funcionários públicos, etc, ec).


Infelizmente o rebotalho não vem ganhando terreno apenas na política (e veja-se, mas veja-se bem, o que são hoje o CDS e o PSD). O refugo inunda também a comunicação social. Já mal vejo os media portugueses, especialmente os malfadados espaços de comentário televisivo mas, se calha ver, é, salvo raras excepções, uma coisa miserável. Não acrescentam valor à reflexão -- pelo contrário, poluem-na.

Pois bem, no meio da agonia que senti ao ouvir a onda de comentários alarves que, na altura, se formou e que ignorou por completo o lado sério do trabalho, eis que recebo de um Leitor que é bolseiro na UA e que participou no estudo, um mail, e depois mais outro, falando no assunto.

O que abaixo transcrevo, em itálico, é parte do que me enviou e que, daqui, lhe agradeço.

Espero que, lendo, percebam como seria importante para todos que fosse dado o devido relevo a trabalhos desta natureza. Melhor: que fossem incentivados, que fossem postos ao serviço de um país melhor.


Ao contrário do que passou na comunicação social e do que sugeriram os Pafientos, o que aconteceu na UA foi um exercício bem mais interessante do que o show-off (que, claro... também fazia parte... senão o governo teria feito aquilo à porta fechada...).

Basicamente foi uma iniciativa que conjugou 3 elementos: 
  • um exercício de prospetiva (avaliação de quais devem ser as prioridades governativas nos próximos 2 anos), 
  • um exercício de participação pública (debate e partilha de opinião entre os cidadãos para formular um conjunto de perguntas ao governo e respetiva interação com o governo) 
  • e, por fim, um exercício de ciência política, com duas dimensões: a) avaliar se as percepções dos cidadãos se alteram com a interação direta com os governantes e b) avaliar as diferenças na avaliação de prioridades governativas entre o grupo de cidadãos representativo e os governantes. 
Para realizar este "mega empreendimento" foram mobilizados: a empresa Aximage, que forneceu cerca de 50 participantes, numa amostra que se exigia aleatória e o mais representativa possível da população (nós verificamos os dados sócio-demográficos das pessoas e o grupo cumpria esse requisito), o grupo de ciência política e, por fim, o grupo de sistemas de apoio à decisão.

Dentro das várias coisas que fazemos, uma em que temos tido mais trabalho externo é precisamente os estudos estratégicos e prospectivos (fazemos essencialmente no apoio à decisão em políticas públicas locais - por exemplo, construção de planos estratégicos), bem como no contexto de empresas e sectores económicos. São métodos de apoio à decisão muito interessantes! 



Portanto, fiz parte da equipa de apoio técnico na última semana e, especialmente, durante o dia de ontem e de hoje, para a aplicação do questionário (realizado através de um mecanismo de avaliação par a par das opções governativas, controlado por um sistema de avaliação / detecção de incoerências (para detectar pessoas que hajam de forma incoerente / aleatório).

O menos engraçado nestes dias foi a pressão da comunicação social (uma coisa assustadora), a quantidade de informação errada que fizeram circular no espaço público e... claro... o combate político com danos colaterais.

Permita-me algumas considerações adicionais: o objectivo central do exercício de domingo era a possibilidade de confrontar as prioridades de um grupo de pessoas com as prioridades dos governantes. Este confronto de perspectivas prospectivas tinha duas dimensões de análise: 
i) se as prioridades das pessoas mudavam após a interacção com os governantes e  
ii) se as prioridades das pessoas coincidiam com as prioridades dos governantes. 

Em termos técnicos, cingindo-me ao exercício de avaliação prospectiva (escolha de prioridades governativas) - aquele em que participei - efectivamente colocou-se a questão da representatividade. Ao contrário do que sugere a senhora prof da Universidade Católica (nos Prós e Contras na RTP 1) não é fácil reunir as condições ideais de realização destes métodos: reunir 200 pessoas, numa amostra aleatória representativa, é complexo em termos logísticos (recrutamento aleatório, custos, etc) e metodológicos (apesar de o inquérito ser desenvolvido num suporte informático, deve incluir a interacção dos participantes, por forma a produzir consensos - a análise estratégica prospectiva não é só escolher as prioridades mais votadas mas também potenciar a formação de consensos. Ora, acções de debate entre 50 pessoas já foram um desafio. Ainda assim, a solução de compromisso que encontramos foi dividir as pessoas em grupos de 5/6 elementos, tendo como critério o facto de terem dado respostas semelhantes no inquérito - ou seja, em grupos homogéneos. Assim, numa primeira fase, estes grupos procuraram chegar a um consenso, sobre qual a questão a colocar ao governo e depois apresentaram-na aos restantes participantes, recebendo críticas e/ou sugestões sobre a questão que pretendiam ver esclarecida pelo governo. É óbvio que realizar isto com 200 pessoas é muito mais complexo. Obrigava a muitas mais rondas e, a certa altura, é questionável se as pessoas mantém o foco no estudo... (notemos que todo o exercício durou cerca de 8h - com mais pessoas teria de durar ainda mais!).


Não vou ser chato a descrever todos os prós e contras, dificuldades, desafios, deste tipo de trabalhos. O meu ponto essencial é: a representatividade para extrapolação estatística é um elemento central num inquérito de opinião usual (como uma sondagem). A natureza deste exercício (um exercício predominantemente prospectivo!) tinha um objectivo diferente (aliás, as questões colocadas ao governo, transmitem claramente isso: não são questões sobre o que fizeram até aqui mas sobre o que pensa o governo fazer, no futuro, em certas áreas!). No entanto, é de realçar que o trabalho incluirá ainda uma componente de sondagem típica: o inquérito será disponibilizado online de forma livre e aberta, estando todos os cidadãos convidados a responder ao mesmo. Os dados recolhidos serão depois tratados por forma a desenhar uma amostra aleatória representativa da população - caso os dados o permitam - e serem assim tratados e apresentados. Volto a frisar que esta componente inquérito é distinta da anterior (exercício de prospectiva), que requeria o tal painel.

Para terminar, gostava de referir que a universidade católica tem também um centro de investigação financiado com dinheiro público (aliás, apesar de ser uma universidade privada, por via da concordata, tem um estatuto especial no acesso a fundos públicos para o ensino superior e ciência, que a aproxima bem mais de uma instituição pública que privada). Portanto, quer pelo facto de a actividade da universidade católica ser financiada com dinheiro público, quer pelo facto de que este exercício não foi uma sondagem mas um exercício de prospectiva - coisa que a senhora da universidade católica parece que não percebeu - acho extremamente injustas as acusações que são feitas à falta de credibilidade do exercício (e a comentários que já li pela blogosfera e redes sociais - de "prostituição intelectual").



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Mais informação sobre este trabalho no espaço que a Unidade de Investigação da Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) da Universidade de Aveiro dedicou ao assunto e cuja leitura recomendo.


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As fotografias que usei não vêm a propósito do texto, estão aqui apenas porque sim. Fi-las in heaven.

Lá em cima, Ludovico Einaudi interpreta Experience

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Caso estejam mais numa de passeios à beira-mar, pois então recomendo-vos que desçam até ao post seguinte onde o sol da Caparica em noite de lua cheia vos espera. 

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terça-feira, outubro 11, 2016

Taxi versus Uber
[E o que ainda está por vir]


Declaração de desinteresses

Raramente ando de taxi e de uber nunca andei. 
Por isso, sendo a minha opinião completamente desinformada, não vou formular comparações. 


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Começo com um breve apontamento de memória. Uma vez a minha filha era miúda e eu ia ao médico com ela, na Baixa. Apanhámos um táxi. Ela teve um ataque agudo de soluços e, então, ríamos as duas que nos fartávamos. O taxista perguntava qualquer coisa e, quando eu ia responder, soltava-se dela um sonoro soluço e eu, maria parva, desatava a rir sem conseguir falar. O homem já não sabia o que havia de fazer. Devia querer saber onde exactamente nos devia deixar e nós as duas naquilo.
O meu filho também lá devia estar e devia estar envergonhado com as nossas figuras. Nessas alturas ficava constrangido com a nossa dificuldade em controlarmos o riso perante desconhecidos. O meu marido felizmente não estava. Aliás, se estivesse, não teria sido preciso irmos de taxi. Eu é que, naquela altura, com as dificuldades em estacionar, não me aventurava a ir de carro e com os miúdos para lá. 
E o pobre taxista, pacientemente, lá ia tentando que a coisa acalmasse e alguém lhe respondesse.
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Tenho ideia que os taxis são carros antigos e os taxistas pessoas relativamente humildes. Tenho ideia que, em geral, não conhecem etiquetas, que não lhes ocorre ter algumas deferências para com os clientes. Vendo-os, percebe-se. Imagino que não ganhem muito e, portanto, admito que não lhes seja fácil trocar de carro. Muitas vezes, a profissão de taxista era um complemento de outra profissão igualmente humilde. Por tudo isto, respeito a profissão de taxista e imagino os riscos que correm quando fazem alguns percursos.

Sendo, muitas vezes, uma profissão que exercem a título individual e dadas as circunstâncias, parece-me compreensível que não tenham sabido modernizar-se. Já as grandes cooperativas poderiam tê-lo feito mas, sem concorrência, não houve motivação. As coisas são o que são.

O drama deles foi que a concorrência veio de onde não se esperava: não de uma empresa de carros mas de uma plataforma informática. O mundo mudou e para algumas profissões mudou de forma radical. Não deve ser fácil para eles, de repente, verem a concorrência por parte de carros novinhos, com ar condicionado, conduzidos por pessoas cheias de nove horas, com mordomias como carregadores de telemóveis, chocolatinhos, facturas electrónicas (como ouvi na TSF).

Não sou, pois, capaz de dizer mal dos taxistas porque compreendo que uma onda lhes passou por cima e que, sem grande preparação para nadarem nestes novos e alterosos mares, tentam desesperadamente sobreviver num mundo que já não é o deles.

Penso que, para melhor tentarem aguentar-se, deveriam organizar-se mas de uma maneira diferente, não numa de 'mata e esfola' mas numa de 'precisamos de ajuda', juntarem-se para investirem talvez conjuntamente, modernizarem-se com algum apoio de quem conhece outros mundos, perceberem que o tempo nunca anda para trás e que a história está cheia de espécies que, por não saberem adaptar-se, pereceram e de empresas que, porque a revolução as derrotou, num ápice soçobraram. 

Entretanto, li que a Uber já está a ensaiar os carros sem condutor (que é uma das grandes tendências tecnológicas) pelo que, não tenhamos dúvidas, estamos apenas na infância do que está por vir.



Por isso, os riscos para quem faz da condução a sua profissão são mais do que muitos -- e a sociedade melhor faria em unir-se para ajudar os profissionais das profissões em risco, não apenas estas mas várias outras.

Que alguns taxistas são uns broncos detestáveis é um facto. Mas broncos há-os em todas as profissões. Nem preciso de ir muito longe. Bem pode o Marcelo vir agora puxar-lhe o lustro que a nossa memória não é a de um gafanhoto: o Cavaco é um bronco e não era taxista, conseguiu chegar a presidente da República.



Vejo na televisão a manifestação e ouço o que dizem os taxistas e tenho pena deles e ouço os comentadeiros a criticarem e a falarem quase com nojo dos taxistas e fico aborrecida. Há quem tenha tanta pressa em cavalgar qualquer onda que nem pára para pensar.

Se, por exemplo, os professores vissem de rebente surgirem escolas em que as aulas eram dadas não por professores mas pela internet e que, para acompanharem os meninos, contratavam gente simpática, disponível e fresca, aplaudiriam? Gostariam de ouvir relatos envolvendo professores saturados, mal dispostos, rezingões, toda a gente a falar deles como se tivessem sarna?

Portanto, acho que, em vez da rejeição colectiva, todos nós deveríamos ser solidários antes de, como de costume, de imediato termos virado justiceiros. E o Governo deveria pensar no assunto e ter uma abordagem mais inclusiva e abrangente desta situação. E acho que a comunicação social, em vez de salivar, a ver se consegue um directo envolvendo ameaças e pancadaria, deveria lançar uma discussão séria sobre profissões ameaçadas ou sobre como sobreviver a revoluções desta natureza. É a vida de muita gente que está em causa. Um dia poderemos ser nós a ver a nossa profissão ameaçada, nós os que agora nos armamos em pequenos lordes desprezando aqueles pobres que desesperadamente (e com pouco discernimeno, concordo) tentam manter uma profissão que se encontra seriamente ameaçada -- talvez, a prazo, bem mais ameaçada do que agora imaginam.


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E queiram continuar a descer caso vos apeteça ver o Stephen Colbert em casa, com o gatinho ao colo, a comentar o segundo debate presidencial.

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quinta-feira, julho 28, 2016

Adel, Ali e o filho dos pais que, ao meu lado, tão angustiadamente falavam
- ou os riscos de atentados terroristas nesta desorientada Europa




Esqueço-me frequentemente que o meu corpo tem limites que a minha mente desconhece e o resultado disso é que, volta e meia, tenho umas 'cenas'. Nada de mais, pelo menos até ver (noc, noc, noc - três vezes na madeira) mas há exames, análises, médicos, ou seja, maçadorias adicionais e, sobretudo, recomendações de repouso, repouso, repouso.

Hoje, de tarde, numa dessas incursões, estava eu no balcão da recepção e o sistema informático bloqueado, não conseguiam emitir facturas, aceder às agendas dos médicos, etc. E eu ali à espera. Mas, como estava sem pressa, não me fez confusão. E, sobretudo, às tantas comecei a ouvir a conversa de um casal que, encostado também ao balcão, perto de mim, falava com a que me pareceu ser a chefe do atendimento. Mesmo que não quisesse ouvir, ouvia na mesma dado que falavam com naturalidade. Ao princípio, eu estava distraída, reparando na aflição das pobres coitadas que ligavam e desligavam os computadores, que diziam umas às outras para experimentarem carregar aqui ou ali -- e nada funcionava.

Mas, depois, como aquilo não desenvolvia -- e ligaram para um técnico de informática que fosse lá com urgência pois já estavam fartas de fazer tentativas com ele do outro lado -- olhei para o lado e vi quem mantinha aquela conversa com a 'patroa' da recepção.


Era um casal talvez com uns quarenta e tais, classe média (a classe média portuguesa que é pouco mais do que remediada). Falavam do filho, agora com 19 anos. Que estava cada vez mais estranho, que não estudava, que dizia que não valia a pena porque depois não há trabalho, que passa os dias fechado no quarto de roda do computador, que ouve músicas muito estranhas (o pai acrescentava: pesadas; e depois contava que o filho lhe tinha perguntado se não havia nenhuma música com a qual se identificasse e que ele tinha respondido que não, e depois virava-se para a senhora da recepção e dizia: está a ver? Tem conversas destas, cada vez mais estranhas). A senhora da recepção fazia um ar compreensivo.


A mãe tinha um rosto de angústia e perplexidade e continuava: que ele se veste de forma cada vez mais estranha, que acha que não é gótico mas que é muito estranho, e aquelas músicas, tão esquisitas que quase dão medo. E que se tem apercebido que ele visita sítios muito estranhos na internet. Que não se interessa por procurar coisas úteis, só coisas estranhas que a deixam preocupada.

A senhora da recepção perguntou se não havia outros casos na família e a mãe do rapaz, num tom de voz mais baixo, disse que o pai há uns anos tinha passado por uma fase muito difícil e que isso tinha marcado muito o filho, e aí o marido encolheu-se nos ombros, quase envergonhado, fez que sim com a cabeça e disse: foi complicado, foi. A mãe continuou: e a avó também tinha problemas de nervos. A senhora da recepção fez um discreto e entendido sorriso: estas coisas são genéticas, muitas vezes são.

A mãe, com o rosto branco e derrotado, continuou: que já o tinham posto numa instituição mas que, quando ele fez 18, lhes disseram que, a partir daí, só se ele quisesse, que não o podiam ter preso. E que o filho não quis.


O pai dizia que já tinham marcado consultas mas que ele nunca ia. E que não sabiam se havia de ser psiquiatria ou psicologia. A senhora da recepção decretou: Psiquiatria - porque ele precisa de medicação. E que a psiquiatra depois é que havia de dizer se devia ter também acompanhamento psicológico. 

Os pais perguntaram, quase a medo, quanto custava. A senhora da recepção perguntou se tinham seguro. Que não. Então explicou-lhes que tinham que pagar na totalidade. 90 euros a primeira consulta, porque é a mais demorada, e 60 (ou 70, não me lembro) as seguintes. Os pais entreolharam-se, preocupados. Depois a mãe perguntou: E tem que vir quantas vezes à consulta? Uma vez por semana? A da recepção disse que não, que até podia ser de 2 em 2 meses, que as de psicologia é que poderiam ser mais mas que isso a psiquiatra é que depois havia de recomendar, que até podia não ser preciso.

Aflitos, disseram: Pois, se for muito a gente não pode. Depois a mãe disse ao pai: Se calhar havíamos mesmo de ver isso do seguro. E o pai disse: Pois, temos que ir ver. Imaginei que deviam estar a pensar que um seguro também não é barato. E não é.

Mas marcaram uma consulta e que iam convencê-lo a ir, porque começavam a sentir medo do que ele pudesse fazer. E lá saíram os dois, esmagados.


Fiquei numa ansiedade. Imagino o sofrimento de ver um filho assim, de não lhe conseguir chegar.

Não sei se no Serviço Nacional de Saúde não haverá psiquiatras e psicólogos que façam um tratamento atempado e de proximidade junto de jovens que começam a derrapar em planos perigosamente inclinados. Se calhar não, ou se calhar não em número suficiente.

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Agora, ao percorrer os jornais online, leio que o autor do acto bárbaro na igreja francesa era um jovem de 19 anos que desde há anos era problemático, tanto que ainda andava com pulseira electrónica, e que quem o acompanhou no acto foi outro jovem talvez ainda mais jovem. Vi a foografia: pouco mais que um menino grande.

Jovens como Adel, perturbados, que se sentem desinseridos -- ou Ali, o outro jovem de 18 anos, que matou tantas pessoas em Munique e que tinha perturbações de foro mental, tendo conhecido o outro jovem que o teria acompanhado no ataque no centro de apoio psiquiátrico e que tinha como ídolo o doido varrido do Breivik -- são verdadeiras bombas-relógio com as quais os pais não sabem lidar e, como se tem visto, nem os pais nem as sociedades.


Adel Kermiche virou-se para o Daesh porque é o que está a dar, a 'onda' mais mediatizada, enquanto Ali andava obcecado com a matança de Breivik, tão mediatizada cinco anos atrás.


Vê-se as fotografias de ambos e o que se vê são putos, adolescentes, jovens a quem, certamente, os pais não conseguem compreender ou amparar.


Claro que no Daesh qualquer destes infelizes jovens caem que nem ginjas na sua estratégia de marketing já que nem têm que os treinar nem influenciar: estão, por eles mesmos, prontos para fazer maluquices a eito e por conta própria.

Por isso, uma vez mais o digo: mais do que andarem por aí a falar em guerras religiosas, a imaginar grandes complots, penso que seria bom que quem manda percebesse o problema grave, endémico e profundo que tem em mãos. O mal maior não está fora das fronteiras da Europa: está dentro. Há um sentimento de desenraizamento e desesperança entre muitos jovens e esses sentimentos, muitas vezes, são maus conselheiros. Em minha opinião, deveria ser planeado, com urgência, acompanhamento sociológico/psicológico/psiquiátrico a todos os jovens identificados como jovens de risco.

Deve também, de uma vez por todas, encarar-se o grave problema do tráfico de armas. Se em França ou no outro dia num comboio foram usadas facas já o rapazinho de Munique, se não estou em erro, tinha um arsenal bélico em seu poder. Adquirido na dark internet, ouvi dizer. Certo. A internet não detectada, sites a que não se acede pelas vias normais. Ok. Mas teve que as pagar e o dinheiro é físico, e sobretudo as armas são físicas, materiais, não são virtuais. Circulam. A toda a hora se houve falar em rixas que acabam em tiroteio. Parece que meio mundo tem armas.


Se estou a ver bem o que se tem estado a passar, nenhum destes atrozes atentados teve na génese o Estado Islâmico. Se bem leio a realidade, tudo se tem passado às mãos de europeus desequilibrados: um adulto jovem desempregado, em processo de divórcio, perturbado, outro que sofreu bullying em miúdo e que vivia fechado na adoração de mitos bélicos, outro que sonhava com guerreiros do deserto que degolam prisioneiros, mais ou menos, tudo nesta base. 

O que a mim me parece, face ao que observo, é que estamos perante uma sociedade que não sabe interpretar a causa dos riscos, uma sociedade que gera líderes fracos como galinhas atarantadas, uma sociedade que explora até à náusea as desgraças sem as saber perceber e sem, sequer, perceber que a invenção de heróis que são uma espécie guerreiros do Daesh é um incentivo para adolescentes que não reconhecem outros 'idolos' que não os que as televisões e os jogos e filmes de guerra idolatram.


Nota: Comecei este texto refeindo uma conversa a que hoje, involuntariamente, assisti e derivei para o tema dos atentados. Contudo, não sei quais os riscos que tanto atormentam os pais que ali, por várias vezes, vi prestes a rebentarem em lágrimas.

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As imagens que usei são algumas das belas obras de street art que se podem ver em Lisboa e que, sabendo sou grande admiradora, Leitor a quem muito agradeço há dias me enviou. Poderão ver tudo aqui.

Lá em cima Benjamin Clementine interpreta The people and I 

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta-feira.

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quinta-feira, setembro 06, 2012

As mulheres em órgãos de liderança segundo Bruxelas; as mulheres que morrem às mãos de companheiros ou ex-companheiros; o papel das mulheres na sociedade; as mulheres (algumas) descritas por elas próprias - breves apontamentos, breves lamentos. E tudo na companhia de algumas mulheres de Paula Rego


Ave Mundi (In Memoriam)


 Rodrigo Leão


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A notícia não é de hoje mas evito falar de temas mórbidos pelo que, na altura, não quis falar nela. Contudo uma outra notícia, aparentemente não relacionada, fez-me ontem ter vontade de pegar no assunto. Mas ontem, ao escrever, tinha chegado de um passeio deleitoso e não estava com disposição para coisas tristes. Mas aqui estou agora, portanto.

Este ano já foram assassinadas 26 mulheres por companheiros e ex-companheiros.

Creio que a última foi a professora de Lagos que as televisões mostraram caída num jardim. Houve o pudor de não mostrar o rosto e o tronco. Apenas vi o que parecia serem umas calças largas de algodão fininho em azul escuro e branco, uns pés ainda com as sandálias de verão, as unhas pintadas, uma mulher descontraída num dia de verão. Diz quem os viu que conversavam num banco de jardim e que parecia ser uma conversa normal. A professora foi ao encontro do homem que lhe ia tirar a vida e, se calhar, para bem dela, nem se apercebeu que era isso que estava prestes a acontecer-lhe. Depois de estarem a conversar como um qualquer casal, o professor reformado, um homem ainda relativamente novo, cerca de 60 anos, ter-se-á levantado e, dizem que friamente, atirou a matar.



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Mas o que quer dizer friamente? Não estar aos gritos? Mas e o estado em que estava o seu coração? Talvez estivesse descompassado. E a sua cabeça? Talvez estivesse desvairada. Não sabemos.

Foi apenas mais um caso. Matou-se a ele próprio depois, mas isso apenas prova a perturbação que vai na cabeça de quem comete um acto limite destes.

Li na comunicação social que, neste caso, se teriam separado e que ele nunca teria aceitado a separação. É referida depressão, algum desleixo pessoal, desinteresse pela vida. Morrer de amor, mourir d’aimer, diz-se em casos assim. Mas isto não é amor: é perturbação, loucura, mal de vivre; ou seja, é qualquer coisa que requer tratamento clínico e não tratamento literário.



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Imagino o medo, a permanente inquietação das mulheres que vivem atormentadas por companheiros (sejam eles maridos, namorados, amantes, o que for) quando este tipo de ameaças paira no ar. Assim, latejante, permanente, o medo, o medo da violência, o medo de represálias, de sustos, de vexames, o medo calado, a inquietação surda, latente. 

Sabe-se que estes casos são geralmente acompanhados por ciúmes doentios, desconfianças, obsessões, uma insegurança limite.

E nem falo de outros fenómenos que costumam acompanhar esta sintomatologia tais como alcoolismo ou qualquer outro tipo de dependência e que contribuem para a desgraça do próprio e de quem sofre na carne a violência das suas manifestações.



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Viver com uma pessoa assim deve ser um tormento. Ouvi no outro dia um psicólogo dizer que, num quadro destes, geralmente o risco aumenta com a separação. Aí, o homem tende a sentir-se rejeitado, envergonhado na via pública, e, a tudo o que antes sentia, junta-se o despeito, a vontade de vingança, se não és para mim, então não serás para ninguém. E a vida começa a girar em volta dessa ideia nefasta.

É, então, nesse caso, a mulher um ser indefeso? E é mais indefesa por ser mulher?

Talvez seja, não sei. Mas, se pensar um pouco no assunto, admito que sim. E não porque a sua condição feminina a torne física ou psicologicamente mais vulnerável mas porque a mulher se sente ainda, aos olhos da sociedade, um alvo mais fácil. Alvo de censura, alvo de rejeição, alvo de chacota, alvo de vergonha. A sociedade, pelo menos a população mais rural, menos aberta, nos meios mais pequenos, ainda tende, em primeiro lugar, a culpar a mulher ou a fazê-la sentir-se culpada. 



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Talvez a uma mulher, num meio fechado, seja mais difícil dizer: aquele homem é insuportável, estou farta de o aturar, quero partir para outra, tenho direito a viver a minha vida sem ter que carregar um fardo como aquele, tenho direito a recomeçar a vida sozinha ou com quem me apetecer. E ponto final que não tenho que dar mais satisfações

Talvez seja mais difícil chegar ao posto local da GNR e apresentar queixa porque talvez tenha medo de retaliações por parte do acusado ou de censura por parte dos vizinhos. 

Ou seja, para uma mulher que vive uma situação de risco, há ainda um caminho a percorrer mas penso que, seja qual for esse caminho, ele passa sempre, numa primeira fase, por pedir ajuda - ou ligar para um número de ajuda pedindo orientações, ou ir a um posto local da PSP ou GNR ou ao tribunal. Não sei exactamente como deve ser mas há, certamente, quem esteja preparado para ajudar.



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Mas o que as mulheres que atravessam problemas deste género não devem fazer é esconder a sua situação.

A vida é uma apenas e deve ser vivida com dignidade e com qualidade. Esconder o medo e encobrir o agressor ou o doente que lhes faz a vida num tormento é que não.

Apenas falando e pedindo ajuda se poderá avançar.


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Claro que a luta pela igualdade deve ser uma luta permanente (embora eu a ache uma luta absurda e ridícula). Devia ser uma coisa natural e não uma coisa pela qual lutar. 

Li que: “A Comissão Europeia quer obrigar as maiores empresas da União Europeia (UE) a ter pelo menos 40% de mulheres entre os membros não executivos dos seus conselhos de administração.

A medida consta de uma proposta de directiva que o executivo comunitário está a discutir internamente e que abrange as empresas cotadas em bolsa, que deverão atingir aquela percentagem em 2020”



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E foi esta notícia que também me pôs fora de mim e me leva a estar hoje a escrever sobre isto. Repare-se no absurdo: estamos a falar em cargos não executivos ou seja cargos ocupados por  gente que, de facto, não manda nem exerce funções operacionais, gente que geralmente apenas reúne quando o rei faz anos e que está lá, nas empresas, para ser informada ou, quanto muito, opinar. E estamos a falar numa meta de 40% para 2020. Podia ser 50% das mulheres em cargos executivos de gestão no prazo de 3 anos. Mas não, trata-se de 40% em 2020 e em cargos não-executivos.  Ou seja, parece até uma brincadeira, é um absurdo.

Mas ainda mais brincadeira e absurdo é que isto seja apresentado como uma grande coisa. E ainda muito mais brincadeira e mais absurdo quando, se calhar, se não for assim, nem estas ridículas metas serão atingidas.

O estranho em tudo isto é que a população é maioritariamente feminina, e que, além disso, está mais que provado que, na gestão, as mulheres geralmente apresentam melhores índices de desempenho pois pelas características do cérebro feminino, as mulheres são mais multi-task, estabelecem melhores redes, estabelecem consensos com maior facilidade, são mais pragmáticas nos processos de decisão.

Então a que se deve este papel tão secundário para o qual as mulheres ainda estão relegadas?



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Penso que a vários motivos. Os historiadores, antropólogo, sociólogos saberão disto mil vezes melhor que eu, mas arrisco. Julgo que se deverá, em primeiro lugar, a motivos ancestrais. As mulheres pela sua condição de dar à luz, amamentar, etc, tendem a, naturalmente, ficar mais tempo em casa com os filhos e isto é um facto e é natural e defensável que assim seja. Depois haverá os preceitos das igrejas, feitos por homens, que inculcam nas mulheres a função maternal acima de qualquer outra, desta forma protegendo os direitos deles próprios, homens. Depois, tudo isto em conjunto, ao longo dos tempos terá ido formando uma base de aculturação que amarra as mulheres a estes preconceitos, formatando-as para a culpa e para o sentimento de vergonha sempre que o seu comportamento se afasta destes cânones. Depois, uma coisa arrasta a outra: se a mulher fica em casa, não tem rendimentos próprios e, se os não tem, fica dependente; e, se fica dependente, fica submissa. 

E anos e anos e anos disto terá acabado por se transformar em ortodoxias, coisas que se aceitam sem se questionarem. E, mesmo quando aos poucos algumas coisas vão mudando, a base ainda lá está. 

E talvez por tudo isto, se assista, depois, a que são as próprias mulheres a contribuir bastante para este estado. Repare-se como, tantas vezes, mesmo algumas mulheres tidas por mais evoluídas, quando se manifestam publicamente, parece que se comprazem em manter-se no registo de mulherzinhas, criticando como uma ladainha os homens que são maus, infiéis, pouco sinceros, pouco atenciosos, ou falando da sua própria condiçãozinha de criaturas que gostam acima de tudo de sapatos, ou de coitadinhas que padecem de calores, afobações e outras abulias. Colocam-se frequentemente no papel de criaturas que pouco mais além olham do que o próprio umbigo ou a ponta dos pés, gostando de relatar a sua infelicidade e fraqueza, procurando a companhia de outras que padecem dos mesmos males. Autênticas comunidades de mulheres que fazem gala em auto-proclamar-se como abandonadas, preteridas, virgens ofendidas, indefesas e fúteis criaturas que se acham moderninhas trocando gracinhas sobre sapatinhos.

Ora, com uma atitude tão confessadamente condicionada por humores, por ressentimentos, por manias, por propaladas fraquezas, como podem depois querer ser levadas a sério e olhadas como seres responsáveis, competentes e com capacidade para exercer cargos de coordenação ou liderança?

E isto é válido para as empresas, para a vida em sociedade e para a política.

Onde andam as mulheres na política? Uma infeliz minoria.

E que falta fariam - mas mulheres de pleno direito, inteiras, fortes, orgulhosas, determinadas.

Mas onde estão as mulheres que falam de peito feito sobre a sociedade, que falam sem recear a crítica social, que falam e lutam pelas suas opiniões com orgulho e cabeça erguida, ou que falam dos seus amantes em vez de se queixarem das amantes dos maridos? São raras. As mulheres, elas próprias, frequentemente relegam-se para o plano de vítimas, de coitadas. 






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O trabalho de afirmação começa, pois, na cabeça das próprias mulheres.


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Todas as imagens são pinturas de Paula Rego uma mulher livre que muito admiro e que tem no Um Jeito Manso lugar cativo.

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E, por hoje, nada mais... e já não é pouco (e perdoem-me se encontrarem gralhas mas é que, dado o adiantado da hora, já não consigo voltar atrás e reler do princípio).

Desejo-vos, Caros Leitores, um dia muito feliz!