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segunda-feira, dezembro 22, 2014

Lançar garrafas ao mar, atirar flores, levantar os braços para gerar nuvens, acolher os anjos


No post abaixo falo de duas histórias incríveis. Ambas têm animais no seu centro e ambas mostram como os animais são capazes de compaixão e afecto. Muito gostaria que vissem os vídeos pois, em qualquer dos casos, é uma coisa que só vista.

Mais abaixo ainda relato uma de um dos meus pimentinhas a propósito de os flamingos darem leite (refiro-me ao meu menininho de seis anos que - deixem que aproveite a boleia para me babar - recebeu agora a ficha de avaliação do seu 1º período do 1º ano e que nos deixou à beira das lágrimas tais as coisas que lá dizem dele. Bem, estou a dar a entender que ficámos todos emocionados mas tenho que fazer uma ressalva. O meu marido, face às manifestações a que assistiu da minha parte e ao que a minha filha dizia no mail no qual enviava a ficha, resmungou: 'O que é que tem de especial? O puto é esperto. Qual a surpresa?'. Pronto, gosta de se armar em seco, nada a fazer.)

Mas, enfim, isso é a seguir.

Aqui, agora, a conversa é outra. Se concordarem, vamos com música.


La fleur que tu m'avais jetée


[Jonas Kaufmann com a Orquestra Filarmónica de Berlim]



Escrevo aqui sem saber para quem, sem saber como me interpretam, se levam à letra tudo o que escrevo, se ficam escandalizados, se ficam enternecidos, se ficam zangados.

Muitos Leitores me têm contactado desde que por aqui ando e com alguns tenho vindo a estabelecer relações de proximidade, admiração ou afecto. Mas muitos outros não faço ideia quem sejam. Vejo, nas estatísticas, que a maioria é de Portugal mas há muitos do Brasil e de vários outros países, alguns longínquos e inesperados.

Por exemplo, neste preciso instante, se a maioria dos Leitores está em Portugal, estão a visitar esta minha casa também pessoas da Alemanha, França, Espanha, Angola, Rússia, da Ucrânia, dos Estados Unidos e República Checa. Pelas mensagens que estão a ser vistas, estabeleço relação com os países (talvez quem esteja a ler sobre Valérie venha de França, talvez os que lêem sobre os Vistos Gold venham de Angola ou Rússia - mas sei lá se é).
Sei que há ferramentas estatísticas que permitem identificar os endereços electrónicos dos leitores ou saber exactamente quanto tempo cada um está em cada página. Eu não uso nada disso pois essas coisas parecem-me uma intrusão na privacidade das pessoas, prefiro ignorar quaisquer aspectos dessa natureza. Acho que a beleza de se estar aqui neste vasto universo reside na possibilidade da liberdade total, na possibilidade de navegar sem bússula num meio desconhecido, imenso. Que os meus Leitores sejam novos, velhos, coxos, trapezistas, que vivam na minha rua, em Marte ou na Cochinchina, a mim tanto me dá. São todos muito bem vindos e só desejo que se sintam bem por aqui, que tenham vontade de cá voltar.

Muitas vezes, olhando pela janela enquanto escrevo, imagino que estas minhas palavras se soltam de mim, atravessam a noite, sobrevoam o rio, conquistam o oceano, atravessam países ou continentes e chegam a casas desconhecidas onde alguém, tomando-as nas mãos, se sente próximo de mim, como se pudesse ver as minhas mãos, ouvir o meu riso, ver os meus olhos embaciados pelas lágrimas.

Mas não sei.

Há pessoas que me escrevem e dizem que eu sou a família que não têm, ou que, lendo-me, sentem uma energia que as faz acreditar que é possível. Acabo de ler no post abaixo um comentário de alguém que diz que me descobriu e que gosta de ver a forma como falo sobre as coisas e, claro, fico feliz. Outras pessoas pedem-me conselhos ou dizem-me palavras que me deixam emocionada e agradecida. Mas também recebo palavras zangadas, pessoas que não concordam com o que digo e que o manifestam de forma agressiva ou ameaçadora. 

De certa forma, embora seja sensível a todas essas palavras, tenho que me abstrair de tudo isso para poder continuar a ser eu, escolhendo os temas de que me ocupo em liberdade, escrevendo ou dizendo o que me apetece. As únicas vezes em que me contenho é quando penso que posso incomodar os meus filhos. Claro que eles conhecem-me, dão o devido desconto, mas, ainda assim, não quero chocá-los para além da conta e, por isso, por vezes apago algumas frases ou dou a volta ao texto. Mas, tirando isso, não quero deixar-me influenciar por nada ou ninguém pois acho que só faz sentido uma pessoa estar aqui se for para deixar o seu cunho autenticamente pessoal (passe a redundância). Por isso, nem escrevo com a preocupação de agradar nem com receio de incomodar. Escrevo para dizer ou partilhar o que me apetece - e, no entanto, que bom se as minhas palavras forem bem interpretadas e apreciadas, que bom se eu puder tocar aqueles que, aí desse lado, as recebem.


Estou a escrever depois de ler o que J. Rentes de Carvalho escreveu, Who's On Your Site?:
Sem que daí venha proveito ou benefício, mantenho este blogue gastando nele horas que roubo a outros afazeres. Em contrapartida, porém, é através dele que realizo um sonho de menino: o das garrafas que tanto quis, mas nunca deitei ao mar, as que levariam mensagens para a gente exótica que se sentiria feliz ao descobri-las nas praias de mares longínquos. Fantasias.

Sorri ao ler estas palavras. Compreendo-o muito bem. E daqui, deste país complicado que também é o de J. Rentes de Carvalho, lhe digo que não há dia em que tendo ele deitado uma das suas garrafas ao mar, uma delas não chegue até mim. Fazem-se ao mar, elas, atravessam o oceano, entram neste rio que eu tanto amo, depois, chegadas à margem, destapam-se das águas, sacodem as penas, e voam até pousarem aqui na minha janela. Apanho-as, então, com desvelo, e tomo-as para mim.


Ia escrever sobre essas palavras que aqui me chegam de um Tempo Contado, ia dizer que são palavras irónicas, por vezes, amarguradas, outras, provocadoras, etc, mas depois voltei atrás e apaguei o parágrafo. Quem sou eu para poder falar sobre a escrita de quem tão escorreitamente as escreve? Que presunção a minha. Por isso, apaguei o que escrevi.

E estou agora a lembrar um seu outro post, Má ideia, na qual diz J. Rentes de Carvalho que:

Levado pela proximidade dos festejos do nascimento em Belém, andei uns dias a remoer a ideia, dizendo-me como dentro do espírito natalício seria agradável distribuir cumprimentos a uns quantos blogues. Este e aquele de gente conhecida, outros de anónimos que me divertem, com quem tenho aprendido ou por vezes me levam a rever a justeza de alguns dos meus cavalos de batalha. (...)
Mas, mais adiante, acrescenta:
Ainda bem que, acalmado o entusiasmo, e recordando Henry David Thoreau (1817-1862) autor que bastante contribuiu para a minha formação na adolescência, encontrei nele a razão de não levar a ideia por diante. Porque de facto, quem raio sou eu, que autoridade me dou para distribuir cumprimentos?
Afirma esse meu antigo mentor (...):
(Devido à pretensão que implicam, os cumprimentos e a lisonja provocam muitas vezes o meu desdém; pois quem é esse que supõe poder lisonjear-me? Cumprimentar implica com frequência uma pretensão de superioridade por parte daquele que cumprimenta. É, de facto, um subtil desapreço). 

Portanto, sigo-lhe o exemplo e abstenho-me também de lhe tecer elogios, limitando-me a dizer que sim, me sinto feliz ao ler as palavras que, como um menino, coloca em garrafas e que generosamente atira ao mar.

Acredito que, mais coisa menos coisa, somos todos assim, meninos inocentes que, nos nossos sonhos, lançamos garrafas ao mar, lançamos flores, lançamos pontes - e ficamos felizes quando sabemos que algures no mundo há gente que as segura, as leva nas suas mãos, as guarda dentro de si.



E o que desejo é que estejamos sempre disponíveis para isso, para recebermos as palavras que nos chegam e para ouvir os ventos que sopram e fecham os caminhos entre as nuvens e que contemplemos as ninfas celestiais antes que elas terminem de dançar e retornem aos céus.

Pode até ser que um dia, quando menos o esperarmos, um anjo chegue e fique junto a nós para nos proteger, para nos ajudar, para nos fazer ver o mundo de uma outra forma. Sabemos lá.

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As fotografias que usei para ilustrar este post foram feitas este domingo na Gulbenkian. As duas últimas referem-se à bela exposição sobre caligrafia japonesa (da qual extraí as expressões em itálico do penúltimo parágrafo).

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Permitam que relembre que nos dois posts a seguir há histórias que enternecem.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela semana a começar já por esta segunda-feira. 
E muita saúde, boa disposição e sorte é o que vos desejo, entre outras coisas boas.