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quarta-feira, julho 31, 2024

Andam anjos in heaven?
Ou vamos mas é ao que interessa: a minha voz é igual à de José Castelo Branco?
(Se acharem que sim, agradeço que me poupem)

 

Dormi que foi um regalo. Acordei tarde, acordei descansada. 

E foi um dia bastante produtivo. 

Tenho sempre muitas coisas que fazer e isso agrada-me, em especial quando são coisas que me agradam (passe a redundância). Mesmo quando trabalhava, quando não havia coisa nova e se entrava quase na monotonia, ficava stressada. De vez em quando, o Grupo comprava empresas e era preciso assimilá-las rapidamente, metê-las no perímetro de gestão das empresas do grupo (metê-las no sentido de enfiá-las, nem que fosse contra a vontade delas), organizá-las, pô-las a funcionar como as demais, e tudo em prazo recorde. Se grande parte dos meus colegas ficava em ponto de rebuçado, achando que eram prazos impossíveis, que as circunstâncias eram irrealizáveis, toda eu vibrava.

Nada me agradava mais do que ter desafios que pareciam irrealistas e equipas descrentes ou equipas que tinham que ser formadas à pressão para começarem a colaborar nesses projectos. Mesmo quando era acusada de me atravessar 'à maluca' ou me atirar para a piscina ainda sem saber se teria condições para isso, e mesmo se eu própria, cá para mim, me assustava e pensava 'caraças, para que é que me fui meter nisto...?', a verdade é que essa adrenalina era um tónico indispensável para a minha existência.

Agora, reformada, também não paro de me meter em cenas e de me atirar 'à maluca'. Gosto de arriscar, gosto de ir à luta e, apesar das derrotas (que tendo a encarar como percalços naturais), muito dificilmente desisto. Posso ajustar o rumo, posso repensar estratégias mas desistir é para mim muito difícil.

Bem. Adiante.

A meio da tarde deitei-me cá fora e pus-me a olhar para o céu. E só pensava: 'Azul'. Ou não pensava nada, simplesmente olhava. Estive ali durante muito tempo a olhar para o céu e a única coisa que atravessava a minha mente era a palavra azul. Depois reparei que, muito lá em cima, um pequeno pontinho branco se movia. Como estava presa ao 'azul' levei algum tempo a pensar: 'avião'. Mas logo retrocedi e me fixei no mesmo: 'azul'. Depois ocorreu-me que, se calhar, estava a meditar. Para a coisa ser mais consubstanciada, pus-me a fazer respirações. 

No fim estava ainda mais descansada. 

Depois estraguei tudo. Fui aos figos. Comi uns poucos. E isto preocupa-me pois já sei que a balança vai castigar-me. Mas é o que é. Parece que nasci mais para pecar do que para ser abstémica.

E, como habitualmente, andei a passear in heaven e, mais uma vez, me deu para fazer vídeos. Fiz dois. Mas, para não ser uma overdose de maluqueira, hoje partilho apenas um.

Um dia destes tenho que ver se é possível transformar os vídeos feitos com telemóvel em vídeos de écran inteiro. Acho que seria melhor, não acham?


Dias felizes para todos!

quinta-feira, agosto 17, 2023

Tranquila e silenciosa contemplação

 

Dias de férias. Não tem havido horários, rotinas ou compromissos. 

Tenho tratado de algumas coisas, tenho organizado outras (porque isto com o computador nas mãos consegue tratar-se de muita coisa), mas, de modo geral, durmo até à hora em que acordo espontaneamente, almoço às horas que calha, faço o que me dá na realíssima gana. Chego a não saber qual o dia do mês ou da semana em que estou e, geralmente, também não sei que horas são.

O cão também anda à vontade, não há horas para passeios. Sai e entra quando quer.

Não vejo um noticiário de seguida há vários dias (melhor: há várias semanas). Se espreito as notícias, nada desperta a minha atenção. Passo de raspão, desinteressadamente. 

[Ou melhor, dito de outra maneira, mais verdadeira: as que despertam a minha atenção têm a ver com desgraças de dimensão quase apocalíptica, muito para além do que a minha limitada dimensão humana consegue abarcar]. 

Tenho lido, ouvido música, visto vídeos. Isto para além de caminhar em silêncio ou fazer uma coisa que descobri e que tenho achado o máximo: deito-me à superfície da água, braços e pernas abertas e deixo-me estar a flutuar, a olhar o céu, sem pensar em nada. Quando interrompo, tenho que me deixar estar um bocado, devagar, para que os fluidos voltem a circular dentro de mim pois parece que toda eu fico em stand by enquanto estou naquilo. Pressuponho que seja a isso que se chame meditar.

O meu marido perguntou-me porque é que também não faço férias no blog. Não soube responder. Parece que, em boa verdade, ainda estou a aprender a ter férias-férias, parece que ainda não consigo, bem, desligar-me completamente de tudo. Claro que desligar-me mesmo é uma forma de dizer pois continuo a falar duas vezes por dia com a minha mãe e uma vez com cada filho. Mas isso não conta. Há cordões umbilicais que pulsam em qualquer circunstância.

Mas, no que se refere ao blog, de facto, este mês o número de visualizações tem sido consideravelmente reduzido face ao que costuma ser nos outros meses, tem dias que nem chega bem às mil e quinhentas visualizações. Mas, ainda assim, são quase mil e quinhentas as vezes que aqui vêm Leitores ver o que escrevi. Várias pessoas me escrevem a dizer que, mesmo que nem sempre concordando comigo, têm em mim uma companhia e que não passam sem vir ler o que escrevi. Embora não saiba dizer com rigor as razões que me impedem de aqui fazer férias, creio que a principal tem a ver com o respeito -- e estima -- por quem está aí, desse lado, a acompanhar-me.

Mas, claro, estando nesta onda zen, desligada do mundo, não tenho nada de especial para dizer... 

A ver se amanhã consigo que o meu marido me sugira alguma coisa ou se, durante o dia, penso nalguma coisa que possa ter alguma ponta por onde se lhe pegue.

Sorry.

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A fotografia da autoria de Julian Elliott e que fui buscar ao Guardian, chama-se "Quiet Contemplation" e mostra: A Vietnamese woman sits in the front room of her house looking towards the window light, quietly contemplating her afternoon.

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Desejo-vos um bom dia

Saúde. Dias descansados e felizes. Paz.

quinta-feira, julho 13, 2023

Mais uma voltinha, mais uma viagem

 

De facto, continuamos a girar neste vasto universo e nem damos por isso. Quase nos convencemos que pisamos solo firme numa realidade estática. E, no entanto, por aí andamos às voltinhas. E, depois, há outra. A organização do tempo que leva a contabilidades a que nos agarramos como se fossem condicionantes, bem vistas as coisas são meras abstracções.

Mas cá estamos para irmos fazendo de conta que, quando há um determinado alinhamento, faz sentido apagar velas, cantar, bater palmas. Desde pequena que, no que a mim diz respeito, acho isso uma fantasia em que me encaixo com algum esforço.

Contudo, logo que tive filhos e vi como para eles e para a família era importante um festejo, passei a encarar os aniversários com maior bonomia. Aliás, fazer festinhas de anos para eles era para mim uma alegria, com amiguinhos da escola, primos e, à noite, a família toda. Como é tudo gente do verão, só me lembro dos calores que me apanhavam quando já estava cansada e a precisar de férias.

Enfim.

O que posso dizer é que, portanto, podendo facilmente estar enfiada no campo sem qualquer comemoração, a verdade é que a opção foi outra: cá estivemos, todos juntos, malta dos 6 aos 90, tudo junto, tudo à conversa, conversas sobrepostas, os miúdos com aquele apetite voraz que os caracteriza, e uma boa disposição contagiantemente maravilhosa. Complicado mesmo é conseguir uma fotografia de grupo em que não fique um a olhar para baixo, outro a fazer cara de totó, outro a fazer cornos a alguém, outro fora de ângulo. E, passado algum tempo, já estão todos fartos e vai cada um para seu lado. Uma frustração.

A ementa foi daquelas que os deixa felizes só de verem as bancadas compostas: crepes chineses, diversas caixas de sushi, pizzas várias daquelas boazonas em forno de lenha, arroz chau chau, frango assado, batatas fritas. Só faltaram as chamuças e o pão naan mas já não tivemos tempo. O bolo foi de pão de ló com mascarpone, morangos e amores-perfeitos. E havia também pão de ló com doce de ovos e bolo de limão merengado. Uns gulosos.

A ver se entro em dieta para me conseguir enfiar com elegância nos fatos de banho.

Conclusão: a esta hora, como é bom de ver, estou cansada, com sono. 

Ficou cá um menino mas também estava cansado pois foi logo para a cama e, depois de mais uma história, ficou instantaneamente a dormir.

E, como é bom de ver, foi mais um dia sem ver televisão. Não sei de notícias, não sei de nada. A vida sem a gente conspurcar a mente com uma overdose noticiosa pode ser bem melhor.

E, para não darem o vosso tempo por mal gasto, vindo aqui para nada, partilho dos vídeos que me parecem interessantes.

Why Yuval Noah Harari meditates


An Architect's Hidden Family Home Built Into A Hillside

Um dia bom

Saúde. Vida longa e feliz. Paz-

domingo, março 27, 2022

De que se fala quando se fala em meditação...?

 




Dia preenchido e bom. Almoço fora, em família, passeio à beira-rio, meninos felizes na brincadeira e na conversa uns com os outros, a minha mãe toda contente embora de vez em quando preocupada com o seu amigo little teddy bear, home alone. O céu estava cinzento mas ao ver as fotografias confirmei aquilo que me tinha parecido: todos estavam coloridos e sorridentes. Já lhes enviei as fotografias.

Não apareço, claro, pois eu era a fotógrafa. Mas gostava de ter podido fixar aqueles momentos em que os meninos vêm conversar comigo e caminhamos em conjunto. O meu mais crescido, já mais alto que eu, já com voz quase de homem, já com conversas e modos de rapaz crescido, é um bom conversador. Tem dúvidas, coloca questões, começa a pensar no seu futuro. Os outros ainda vivem apenas no presente, brincalhões e ruidosos na sua alegria. 

Ao fim da tarde fomos levar a minha mãe mas, antes, viemos a casa resgatar o nosso watch dog. De manhã, vendo os nossos preparativos, ele já mostrava que estava intrigado. Sentava-se a olhar para nós, seguia-nos pela casa, desconfiado. Quando saímos, veio a correr para nos acompanhar. Geralmente corre na brincadeira para ver se o conseguimos apanhar. Este sábado não, precipitou-se para o portão. Dissemos-lhe que não vinha, que ficava a tomar conta da casa. Ficou sentado, triste, a olhar para nós. Mas já está mais crescido. Antes, atirar-se-ia contra o portão, a ladrar, a ganir, num desespero. Hoje apenas ficou triste, desconsolado. 

Tínhamos deixado, no pátio junto à cozinha, a cama almofadada e a tigelinha da ração e a da água.

Quando chegámos, a almofada estava no jardim, ao lado do portão. E não tinha tocado na água nem ração. E, quando nos viu, ficou louco de alegria. Saltava, abraçava-nos, corria à nossa volta numa daquelas euforias que nos faz rir. A surpresa por ver a minha mãe, então, deixou-o fora de si, tanta, tanta a alegria. Alegria, de resto, recíproca.

Claro que, enquanto estávamos no almoço, depois a jogar matraquilhos, a passear, no parque infantil, a comer gelado e etc., todos, incluindo os meninos, perguntavam por ele e todos estavam com pena que o seu amiguinho não estivesse ali.

A minha mãe, quando íamos a caminho de sua casa, dizia que tinha sido um belo dia e que assim era muito mais descansado para mim. De facto, desde há dois anos que não íamos todos almoçar fora. Durante a pandemia todos os almoços em família têm sido cá em casa, de preferência ao ar livre. Por isso a minha mãe diz que assim é melhor para mim. Mas a verdade é que estou cansada, com sono, sem energia. É certo que acordei cedo e me tinha deitado tarde e é certo que a semana foi complicada. Talvez seja isso. É que hoje nem ânimo tenho para arrebitar a pele da cara com o pink jade-roller.

Ao sentar-me aqui, há pouco, ocorreu-me que, se calhar, está na altura de começar a meditar. Mas tenho com a meditação aquele mesmo desentendimento que tinha quando comecei a conduzir e não conseguia perceber o conceito do ponto de embraiagem. Diziam-me quando usar mas não me explicavam exactamente como era e como funcionava para se obter o ponto pretendido. Então, quando parava numa subida íngreme e tinha que arrancar, sofria horrores com medo de deixar descair o carro, bater no que estava atrás e não conseguir arrancar. Até que alguém me explicou detalhadamente os passos e a explicação. E tudo se tornou claro.

Com a meditação é a mesma coisa. Dantes, pensava que meditar era o mesmo que pensar. E que a meditação era boa quando se conseguia convocar pensamentos bons. Para meu espanto, vim a descobrir que é exactamente o oposto: não pensar. Por isso, se calhar é isso de que estou a precisar: esvaziar a cabeça, abolir os pensamentos. 

Já o contei aqui algumas vezes. Na única vez em que fui a uma sessão de meditação, deitei-me no colchão e, quando a professora mandou que fechássemos os olhos e pensássemos num lugar em que nos sentíssemos bem, pensei num campo verde, com as ervinhas a ondularem ao vento. E instantaneamente adormeci. Portanto, não sei de que se tratou entre aquele momento e aquele em que me dei conta que já tinha acabado e que estávamos a ser convidadas a respirar fundo e nos levantarmos devagarinho.

Para mim seria importante perceber de facto porque é que a meditação é benéfica: 

  • Porque, no fundo, consiste em respirar fundo, várias vezes a respirar fundo, e, portanto, oxigena-se bem todo o organismo, em particular o cérebro? é disso que se trata? 
  • E o tempo todo estamos alienados do mundo, concentrados apenas na respiração e, ao estarmos atentos à respiração, faz-nos esquecer tudo o que se passa à nossa volta? 
  • É isso que faz com que as pessoas se sintam tranquilas? 
  • Ou sentem-se revigoradas? 

Não sei e gostava de saber. Sem perceber isto parece que não consigo dar o passo seguinte que é de experimentar como deve ser.

Vejo vídeos mas é tudo muito conversa mística ou operacional e não os fundamentos científicos da coisa, as razões fisiológicas para as pessoas se sentirem bem. 

É que, por exemplo, estou a escrever isto e, ao mesmo tempo, estou a pensar que vou ter que me levantar cedo pois tenho um compromisso, estou a pensar nas horas a que tenho que me levantar, depois estou a pensar no que não posso esquecer-me de dizer às pessoas com quem me vou encontrar, depois num presente que tenho que comprar para mais um aniversariante, depois que gostava de ir comprar um banco para pôr numa parte do jardim em que é bom estar mas onde não há onde nos sentarmos a não ser no chão, nas lindas horas a que haveremos de conseguir almoçar, nas reuniões que tenho na segunda feira e em mais não sei o quê. Aliás, sei bem em quê, sei. No que se passa na Ucrânia. 


No carro, ouvimos as notícias e a minha mãe disse que o que já tinha dito ao almoço e que não reproduzo aqui para não ferir almas sensíveis. E falou, com revolta e pesar, da destruição sangrenta e feroz que está a ser levada a cabo. O meu filho diz que não devemos personalizar no Putin, que isto é uma questão geoestratégica. Não quero saber. Quando se invade um país para o destruir que se lixe a geoestratégia. E se me lembram os Iraques desta vida também não quero saber. Não determinei, aplaudi ou defendi essas guerras. Caraças para o Iraque: tantas pegas que tive nessa altura por não acreditar naquelas patranhas das armas de destruição maciça, tanto que me manifestei contra a porcaria da guerra no Iraque! E, por todas essas guerras serem absurdas, indesculpáveis, criminosas, destrutivas e desumanas é que me revolta que não se tenha aprendido nada e se volte a cometer os meus atentados contra a liberdade, contra o património, contra a vida.

Enfim. Adiante. É tarde. 

Deve estar quase a mudar a hora. Aliás: já mudou. Menos uma, ainda por cima. O que vale é que é por uma boa causa. Dias a crescerem é um sopro de oxigénio na minha disposição, fico sempre mais animada. É bom termos dias grandes, cada vez maiores, a encherem-se de luz. Tomara que tragam também mais paz a este mundo desgraçado.


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Já agora, a propósito da meditação:

Porque é que Yuval Noah Harari pratica meditação?

Seventy thousand years ago, our human ancestors were insignificant animals, just minding their own business in a corner of Africa with all the other animals. But now, few would disagree that humans dominate planet Earth; we've spread to every continent, and our actions determine the fate of other animals (and possibly Earth itself). How did we get from there to here? Historian Yuval Noah Harari suggests a surprising reason for the rise of humanity.


Qual é a ciência por trás da meditação?

Meditation has been practiced for thousands of years in many cultures to nurture calmness and inner peace. But what does science say about it, and how can we fit it into our busy, modern lives? CNN speaks to a psychologist about what it does to our brains and how we can do it better

[Não tem as respostas para as minhas perguntas mas aqui fica na mesma] 


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Pinturas de Andrey Remnev na companhia de Diana Tishchenko que interpreta Melody de Myroslav Skoryk

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Desejo-vos um belo dia de domingo 
(e que o milagre da paz comece a desenhar-se no horizonte)

quarta-feira, março 31, 2021

Massajar o cérebro: extremely fucking satisfying

 



O meu dia foi, outra vez, cheio como um ovo. Hoje o meu marido, ao ver-me a colocar a roupa na máquina, referiu uma toalha que estava em cima da mesa. Perguntei-lhe de que mesa estava a falar. Disse-me que na mesa grande. Perguntei-lhe de que toalha estava a falar. Não estava a ver. Ele encolheu os ombros e disse: 'Não deves viver cá em casa'. Depois elucidou: uma toalha que eu própria tinha posto na mesa quando os miúdos cá estiveram para evitar que a riscassem já que, sem pensarem duas vezes, lá pousavam o que quer que fosse que tivessem na mão. Depois acrescentou: 'Trabalhas de mais, esgotas-te no trabalho'. E eu não disse nada. Penso que ele deve ter razão. De facto, este meu trabalho actual é esgotante. Mas, se calhar, sou eu que faço tudo tão intensamente, querendo resultados imediatos, querendo alcançar a meta para logo traçar outra, que não consigo trabalhar (e viver) de outra maneira.

Deste que me levantei até há pouco estive a trabalhar apenas com um breve intervalo para uma curta caminhada e um rápido almoço. Confesso que nem consegui tomar o pequeno-almoço pois, quando ia fazê-lo, recebi uma chamada que se prolongou até me deixar apenas tempo para colocar uns brinquinhos, prender o cabelo com um travessão e sentar-me, airosamente, em frente do computador para a primeira de várias reuniões. 

Por isso, se aqui estou não é que esteja descansada e precise de me entreter ou que me sinta inspirada ou porque tenha que aqui estar a pagar alguma promessa: é mesmo só porque me descansa a cabeça. E porque, também, faço o gosto aos dedos que gostam de se portar como inconsequentes bailarinos, saltitando sobre o teclado, indiferentes a cansaços, motivos ou descasos. O espírito espairece, os dedos brincam.

Já o contei muitas vezes: em tempos idos fazia tricot (camisolas, mantas), crochet (toalhas de renda), bordados (quadrinhos bordados a ponto pé de flor), tapetes de arraiolos, pinturas, colares e pulseiras. Pelo meio, durante uns tempos escrevi um livro (que se evaporou). Tudo noite adentro. Agora, e desde há uns anos, escrevo aqui, palavras que solto ao vento, sem fazer ideia do paradeiro que escolhem mal se soltam de mim. Mas penso que o motivo é sempre o mesmo motivo: arejar a cabeça, libertar as mãos.

Claro que, se fosse só distrair a mente, poderia deixar-me ficar a olhar para o líquido colorido ou o pó dourado escorrendo pelas ampulhetas ou pelas clepsidras que tenho aqui em casa mas não me dá muito para isso. Gosto imenso destes belos e delicados objectos mas vejo, viro, vejo e está visto. Também gosto de dar corda às duas caixinhas de música: ouço, vejo o mecanismo a rodar, gosto mas, quando a corda chega ao fim, está feito. Mas falta-me qualquer coisa: a minha interacção, as minhas mãos em acção.

Contudo, lembro-me do fascínio que alguns objectos de movimento infinito com imaginativo design me despertaram quando, na companhia de um casal amante de design, visitei galerias e lojas em Amesterdão. Quanta imaginação, quanta arte e engenho. Que surpresa eu sentia perante cada um.

Hoje descobri no The Guardian outro fantástico designer: Andreas Wannerstedt.

E leio: 

‘It can be quite meditative’

Scrolling through Andreas Wannerstedt’s Instagram is the digital equivalent of walking into a spa. There are soothing soundscapes and pastel tiles. It’s a curated escape from the mess and stress of the outside world.

This is all deliberate. The Swedish artist posts each animation – from a slowly twisting velvet rope to two halves of a brass ball clicking into place – with hashtags like #relax #calm, #satisfying and #sleep. He has nine volumes of a series called Oddly Satisfying, which fans lovingly describe as “soothing”, “hypnotising” and “extremely fucking satisfying”.

Vejam, por favor, o vídeo e, se quiserem ler o artigo completo, é só clicar no link: Hypnotic loops and self-soothing sounds: the rise of #OddlySatisfying and visual ASMR


The Swedish artist creating oddly satisfying visual ASMR



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Imagens das peças de Andreas Wannerstedt ao som de Mari Samuelsen a interpretar Fragment de  Max Richter

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Um dia feliz

quinta-feira, novembro 28, 2019

Cores, perfumes, sentidos, burnouts, pedras em equilíbrio, banho no gelo, coisas assim


by Tim Wlaker


No outro dia uma menina do escritório cruzou-se comigo, apressada, e eu também apressada, de entrada para uma reunião, e disse-me: a Cláudia tem uma pergunta para lhe fazer. De passagem pela secretária da Cláudia, abrandei o passo e perguntei-lhe o que era. Estava sentada mas rodou na minha direcção, chegando-se à frente para me segurar nos braços e perguntar: 'Cheira sempre tão bem... Mas ontem, então, deixou um cheirinho tão bom... Mesmo. Quando entrei na sala onde tinha estado, senti aquele cheirinho que pensei logo que tinha que ganhar coragem para lhe perguntar qual era o perfume'. Pensei um bocado e disse-lhe. Pela expressão, vi que nunca de tal tinha ouvido falar. De facto, é pouco divulgado.

Sou incapaz de sair de casa para o trabalho sem me perfumar. Que me lembre, nunca me esqueço. Dos brincos já me esqueci. Ainda no outro dia. Estava carregada de coisas e, ainda por cima, com sombrinha. Tinha umas calças pretas e uma camisa também preta com flores azuis. Levava uma écharpe também preta e também com flores azuis mas num azul mais forte que o da camisa. Olhei para mim no elevador e reparei que me tinha esquecido dos brincos. Olhei para o relógio. Ficaria apertado se voltasse a casa. Consolei-me: não tenho brincos mas tenho o piercing, sempre dá um ar de sua graça, e, além disso, o contraste das flores azuis sobre fundo preto talvez seja motivo suficiente para disfarçar. Quando cheguei à rua, ao fazer o movimento de passar o casaco de um braço para o outro, on the fly (como soi dizer-se), reparei que o colar que tinha posto puxava para o turquesa e não para o alfazema como o azul das flores da camisa. Foi um sobressalto. Impossível ir assim. Se há coisa a que sou excessivamente sensível é à harmonia cromática. Furiosa, dei meia volta e voltei a casa. A luz artificial é traiçoeira para estas nuances. A correr, mudei de colar e, claro está, aproveitei para resolver a outra lacuna: coloquei uns brinquinhos mínimos, duas bolinhas de azulinho transparente.

Coisas que acontecem. Pode parecer que são coisas que não interessam para nada mas é ilusão: interessam e muito. Se vou com alguma coisa que não me parece bem, é razão suficiente para ficar a tender para o indisposto e, com isso, o dia pode ficar irreversivelmente toldado e, lá está, pode até haver o risco de, com a minha indisposição, toldar o dia a quem não tem nada a ver com o assunto. É, em ponto pequeno, aquilo da borboleta que espirra na China e o gato no Chile, sem saber por quê, ficar com o pelo eriçado. 


E também escolho o perfume em função do dia, de como vai ser o programa de festas, da roupa que visto, da disposição que antecipo: o perfume é uma peça relevante do cenário que monto em mim. 

Aos poucos, tenho-me vindo a transformar. Depois da extrema lealdade, agora vario completamente. O Nº 5 continua o ser o special one até porque, em mim, se transforma de uma maneira que me agrada muito. Não é pesado, não é quente, não é cansativo. Pelo contrário, é leve, subtil, íntimo. Tenho lido muito sobre perfumes e sei que os perfumes são diferentes, ou melhor, evoluem diferentemente ao longo do dia, consoante a pele em que pousam. Mas a partir do momento em que comecei a ousar, primeiro dentro dos Chanel, depois com um que consumi com o maior prazer e que infelizmente deixou de ser comercializado (pelo menos nas perfumarias que costumo frequentar), o She Wood da DSquared2, fui-me libertando.

for Bulgari

Creio que já contei: no outro dia, deixei-me tentar por um da Elizabeth Arden: figo e chá verde. Uma coisa... Invulgar e, no entanto, de tal maneira cativante... 

Reza assim a sua descrição: 
Inspired by the lusciously sweet fruit, Elizabeth Arden Green Tea Fig takes you to a rustic countryside full of sparkle, warmth and laughter. A burst of Clementine, Green Tea Accord, Kadota Fig, Violet Leaf and Musk wrap you in the refreshing simplicity of this musky fruity floral. Green Tea Fig. Delight your senses.
E só estas palavras já contêm, em si, o perfume de todo um bouquet de emoções. Isto dos perfumes é uma arte. Cada vez mais acho isso.
Penso que é por descender dos bichos do interior da terra que tenho os sentidos todos muito activos. 
Nunca me deu para me doutorar e acho que nunca dará. Não teria paciência para perseguir um tema, um único tema, e aprofundá-lo, dissecá-lo, mumificá-lo, transpô-lo para um texto encavalitado por números e deitado sobre um rodapé sempre pejado de anotações que não são senão a ferramentaria transformada em bibelot. Coisa boa para gente paciente e muito dada ao intelecto, coisa que duplamente não sou. Eu é mais sentidos. Os seis.
© Gabriella for Vogue IT

Há bocado vi um artigo que pensei que me ia interessar: Il rapporto fra profumi, libri e letteratura. Mas não, nada do que eu pensaria. Estabelecer uma relação entre literatura e perfumes parece-me uma boa ideia mas uma coisa mais na base de um quizz. A gente dizia os livros de que gosta e um algoritmo adivinhava qual a fragrância que melhor nos assenta. Fiz agora uma pesquisa e há vários quizz para identificar a fragrância que melhor nos assenta mas tudo na base da banalidade, nada na base das preferências literárias. Portanto, o artigo desiludiu-me: é chato e não me traz dicas interessantes. 

Um blog que gosto de espreitar é o Bois de Jasmin. Tudo ali é de bom gosto. E depois há muita gente a comentar, com conversas curiosas, todo um mundo. 

Há muitos mundos paralelos. A todo o momento me apercebo disto. Habitamos o mesmo planeta, um planeta em exaustão, mas, sabe-se lá como, ainda assim conseguimos habitar mundos diferentes, mundos que se ignoram e que, na maior parte das vezes, se excluem mutuamente. Eu não sei bem qual o meu mundo. Talvez um limbo resultante da intersecção de vários outros mundos. 

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Hoje estou assim, sem energia. Durante estes dias, muita gente enervada à minha volta,  embora alguns negando-o, dizendo que estão tranquilos,  um ou outro provavelmente naquilo que dantes se dizia que era esgotamento -- e que agora se internacionalizou para burnout -- a chorar compulsivamente à minha frente, e, em cima disso, muita decisão para tomar, muitas vezes ter que fechar os olhos para não arranjar chatice e bola para a frente, e, ao mesmo tempo, em alguns aspectos, muita indefinição, muita procrastinação -- ou seja, alguma canseira. 

by Tim Wlaker

E, para ajudar à festa, um mau jeito que me traz dores. Ontem à noite, ao preparar-me para sair do carro, já a segurar na tralha que ia transportar, toca-me o telefone. E que é dele? Estiquei-me para o lado, para baixo e para o lado, para trás, em diagonal, toda esticada a apalpar até onde o braço atingia. Até que o telefone se calou. Felizmente, a seguir veio nova chamada e baixando-me mais, para perceber de onde vinha o toque, lá o descobri. A seguir a esses alongamentos forçados, foi vir carregada para casa. Conclusão: algum dos músculos que se esticou não gostou da ginástica. 

Vou tomar um ben-u-ron e vou dormir a ver se, durante o sono, os músculos de desensarilham. Hoje não estou nos meus dias. Que me desculpem os autores dos comentários mas hoje não vai dar. Logo hoje que são tantos e tão bons, tão sumarentos. Mas, para mal dos meus pecados, hoje não dá mesmo.

Mas, para que não sintam que aqui vieram para nada, permitam que partilhe convosco dois vídeos de Jonna Jinton, aquela jovem que vive uma vida que deve ser uma maravilha, num lugar fantástico. Este de colocar as pedras (que me faz lembrar aquele senhor que está ali no Terreiro do Paço, à beira de água) dá-me vontade de, lá in heaven, ir experimentar. Parece-me uma coisa muito interessante.



E este do banho no gelo também me parece uma boa coisa, bonito, embora não me imagine a ter tal coragem. Fogo...

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E é isto. Peace and love, minha gente.

sexta-feira, novembro 22, 2019

Segreda à chuva, ao jardim em flor, o meu cicio de amor





Estas semanas não andam a facilitar-me a vida. Escasseia-me o tempo e sobram-me os afazeres. Talvez pudesse ser melhor acomodável se fosse espremido, ou seja, se não tivesse que fazer tantos quilómetros por dia, grande parte deles em percursos sempre atrapalhados, desperdiçando anos de vida no trânsito. Consequentemente, nos últimos dias tenho adormecido aqui no sofá nem conseguindo responder a comentários ou a  mails. Uma lástima.

Acontece que, a noite passada, o meu marido, que ia levantar-se muito de madrugada, conseguiu acordar ainda mais cedo do que o necessário e foi buscar o telemóvel para o pé da cama. Então, quando o despertador tocou, pegou nele, na cama, e, em vão, tentou desligá-lo. Por razões que me transcendem, não conseguiu à primeira tentativa, à segunda e por aí fora. Ou seja, precisada de sono como sempre ando, acordei a meio da noite com um despertador a tocar, sem parar, ao lado da minha cabeça. Claro que ele achou que isso não era nada de especial, que me virasse para o outro lado e voltasse a adormecer. Como se isso fosse possível, furiosa como estava. Ou seja, essas duas horas de sono sonegadas também não ajudaram nada. E daqui a nada tenho que estar a pé pois é a minha vez de ir passar o dia fora. Portanto, atalhando: é esta a história da minha vida.

Mas isto como intróito a despropósito pois o que que quero mesmo dizer é que, quando ia no carro, para almoçar, e tendo apanhado o enésimo incidente na estrada, num daqueles infernais pára-arranca que me roubam qualidade de vida, me pus a espreitar os blogs da galeria do lado. Note-se: isto nos momentos em que estava parada que eu sou muito respeitadora das regras (de trânsito). E um deles foi o do Eduardo Pitta. E, aí chegada, foi uma epifania. Um novo livro de John Williams, o Augustus. Quem não seja dado a emoções esfuziantes perante casos desta natureza talvez não compreenda o que digo, talvez ache que estou a exagerar. Não estou. Uma alegria, uma adrenalina, uma vontade de tê-lo já, de pegar nele, de o conhecer, de começar já a desfrutar. Já aqui o referi e não me canso de o repetir: o Stoner ou o Butcher's Crossing foram daqueles livros que me agarraram do princípio ao fim e que, em minha opinião, ilustram o que é literatura. Verdadeira literatura. Saber que, afinal, havia outro foi para mim uma superlativa alegria. Portanto, tomada por um entusiasmo trepidante, decidi que ia arranjar um bocado para ir buscá-lo. E assim foi.


Ao contrário das últimas vezes, em que entro na livraria de freio nos dentes, à rédea curta e praticamente com uma venda nos olhos, desta vez entrei com um espírito vitorioso. E, portanto, desencabrestada de alto a baixo, foi para a desgraça. Foi esse e outros que me saltaram para as mãos. Tanto livro bom, senhores, tanto livro bom, tão grande, tão incontornável a tentação.

Hoje não vou aqui enumerá-los pois, como qualquer viciado, até tenho vergonha de confessar uma tão grande recaída. Mas, de entre eles, vou falar em sete livros, da mesma colecção, a que não resisti. 'A casa de quem faz as casas'. Livrinhos sobre as casas de arquitectos. Carrilho da Graça, Gonçalo Byrne, Manuel Graça Dias, etc. Eu que gosto de casas, que gosto de livros de arquitectura, que gosto de ler entrevistas a arquitectos, que gosto de decoração, não podia resistir. Acresce que cada livro custa cinco euros. Um achado. Que vontade até tenho de dar um pontapé para o alto no blog e me pôr aqui a desfolhar estes livros. E isto já para não falar nos outros. O Augustus fica para o fim de semana porque os grandes prazeres têm que ser degustados com tempo, com entrega total.

Vim da livraria ajoujada sob um daqueles big sacos que lá vendem e que pus ao ombro, carregadinho como um tesouro pejado de preciosidades. E de tal forma estava pesado que temi que tamanha desconformidade me provocasse uma tendinite no ombro ou me desse cabo dos joelhos pois, quando ando com grandes carregos, os joelhos por vezes parece que ficam com vontade de dar de si. 


Agora à noite, depois de termos ido fazer a nossa caminhada diária, fui ao carro e tentei passar despercebida, tirando de lá o saco como se fosse coisa ligeira. Mas não consegui. Então o cavalheiro foi-se a ele. E ficou passado. Recordou-me a minha determinação em não encher a casa de livros e mostrou a sua estupefacção com o peso do saco. Não tentei desculpar-me. Pequei e como boa pecadora devo assumir a minha culpa. 

Agora tenho-os aqui ao meu lado: livros tão bons. Pecado mais bom de ver. E melhor será de saborear.

Entretanto, tenho estado a ler os comentários sobre mindfulness e lembrei-me que seria uma ideia engraçada sentarmo-nos confortavelmente, eu e os caríssimos comentadores, a conversar sobre o assunto. Penso que seria uma tertúlia animada.


Não podendo, vou dizer uma coisa aqui sobre isso: eu sou uma pessoa que quando se embrenha num assunto estou totalmente nele. Quando aqui estou a escrever, o meu marido volta e meia fala comigo e eu não respondo logo. Eu ouço-o mas é como se fosse uma voz de um outro filme, de um filme que me fosse externo. Ouço-o e sei que tenho que responder mas primeiro tenho que sair do mundo em que estou. O meu marido diz que estou em modo blog. Ou quando me ponho a ler ou a fazer tapetes de Arraiolos ou a pintar: toda eu estou naquilo. Ou quando ando, num comprimento de onda muito meu, a fotografar in heaven (e leia-se com um sotaque british para o Francisco não achar que também me baldeei para o lado dos amaricanos). Posso não ser capaz de explicar ou pode ser coisa tão inacreditável que ninguém me leve a sério mas o que sinto nessas ocasiões é que sou bicho, animal saído de dentro da terra, entregue ao prazer de descobrir flores, pedras, a luz através das folhas, a cor de tudo, os cheiros, os sons, e toda eu, inteira, estou ali, parte do todo (justamente, JV, e nem preciso de fazer Ooooonmmmm). E sinto-me tão tranquila, tão bem, tão em paz que acredito que é assim que se sentem as pessoas que fazem meditação. Agora uma coisa é certa: não ando a questionar-me nem procuro encontrar o sentido do que penso ou do que faço pelo que se o dito mindfulness passa por aí então isso não é comigo. Espero nunca chegar ao ponto de não ter outros motivos de interesse que não o que penso ou digo. Gosto de me desconhecer pelo não tenho qualquer curiosidade em interpretar os meus actos ou os meus pensamentos. E isto não que seja assumidamente anfibológica (thanks, bicho-mau, por mais uma palavra nova) mas a ambiguidade, a abstracção e a gradação de cores entre os extremos do espectro são-me atraentes (qual preto e branco, ó ~CC~? Toda eu jorro cores).

Quanto ao ioga, juro que gostava de saber fazer -- mas mais pelos alongamentos e pela elasticidade do corpo -- e o flutuário, bolas, deve ser fantástico -- mas desde que não me fechem dentro daquela cápsula. Se puder flutuar no azul, em silêncio, e sem estar fechada, juro que vou pedir de presente pelo Natal.


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E agora, pedindo desculpa por incluir um poema tão lindo no meio do salsifré que é este post, vou transcrever o que o anfibológico bicho mucho mau, a quem muito agradeço, me deixou num comentário lá mais abaixo. Para ler em silêncio.

Pena não poder ser lido de olhos fechados. Ou escutado como quem escuta um lento murmúrio.

Cicio de Amor

Aonde, oh aonde te apressas, tão célere assim?
O arbusto do deserto ao vento suplica.

Triste me sinto aqui.
Não anseias também tu por ir-te,
para longe desta poeira jornadear?

Pleno de desejo sim, mas ai de mim,
por estes pés sojugado.
Aonde, oh aonde, tão célere assim?

Aonde quer que fique meu lar,
longe, longe deste lugar.

Que Deus te guie e proteja,
mas peço-te, por amor de Deus,
cedo p'ra lá deste ermo estejas, a salvo deste grã temor,
segreda à chuva, ao jardim em flor, o meu cicio de amor.


Mohammad Reza Shafii Kadkani
(a partir da tradução inglesa por Pari Azarm Motamedi)


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As fotografias referem-se à campanha Rodarte Outono/Inverno 2019 e só estão aqui porque gosto delas. O mesmo acontece com a música que escolhi, Kate Wolf a interpretar Green Eyes: estava a ouvir o Whisper of love e, quando chegou ao fim, passou sozinho para esta que não conhecia e que me soou bem. 

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E a todos uma bela sexta-feira. 

quinta-feira, novembro 21, 2019

Bikram Choudhury: ioguim, guru, predador
[E, a propósito: alguém me explica se essa coisa do mindfulness é coisa que faça sentido ou pura treta ?]



No outro dia, um colega tinha um livro de Mindfulness em cima da secretária. Fiquei beige, como diz a Beatriz Gosta.

Beige. 'Mindfulness? What? O que é isto...?! Conte-me tudo!, mostrei eu a minha perplexidade.
Ele, todo fresco e fofo, tipo nem aí, limpou-se logo: 'Foi ali o nosso colega que me ofereceu' e apontou.
Ainda mais pasma fiquei: 'Jura? Mas quê? Ele acha que você tem que se encontrar...?'
E ele: 'Sei lá, você sabe bem que ele não é bom da cabeça.'
Não engoli. 'Mas ele já tentou a coisa, deu-se bem e recomenda? É isso?'
E ele: 'Acha...!? Se o efeito é o que se lhe vê, melhor nem começar a ler'
Não facilitei: 'Mi engana qui eu gosto. Então eu não tou a ver que tão aí uns quantos post-its? Já leu e achou tão impactante que marcou... e agora não assume... Lindo'. 
Ele não desarmou: 'Foi ele. A sério. Assinalou passagens e diz que eu tenho mesmo que ler.'
E eu 'Ui. E já leu alguma?'. 
'Eu não, mas leia, leia, e depois conte-me'.
E eu: 'Ná, não sou de fiar, sabe bem disso. Se eu ler, reprocesso e conto-lhe uma história toda ao contrário'. 

E assim continuámos, ele sem se descoser e eu sem me aventurar, ou seja, ele a fazer de conta que mindfulness era coisa do maluco ali do lado e não dele e eu a duvidar daquela conversa toda e a querer perceber o racional da coisa. Mas bicha que é bicha sabe fechar-se em copas. Resutado: não pesquei nada, fiquei na mesma. 

Dias depois foi uma amiga, mulher com idade já para ter juízo, que me disse que fez o percurso todo, oito semanas, mindfulness de a a z. E contou como lhe tinha feito bem e como já tinha recomendado a amigos e colegas. Tentei perceber o percurso da cabeça dela e, quanto mais ela falava, mais eu me apiedava. Mas disfarcei: as pessoas tendem a confundir cepticismo com arrogância. Mostrei-me, pois, interessada até porque, de facto, queria mesmo saber de que se trata: filosofia, teologia, terapia, mezinha, remédio para olho gordo, coisada em três actos, espécie de protecção de santo? Mas não consegui perceber.

Já contei: no outro dia, apanhei uma jovem atilada que me falou de como a meditação lhe faz bem. Tentei outra vez a minha sorte: mas é o quê? não pensar em nada? apenas estar atenta à respiração? actua como? desliga os neurónios quase todos e a pessoa fica como se tivesse dormido? 

E pensei logo naquilo de me ter deixado dormir na primeira vez que tentei e de ter quase desmaiado na segunda. A mim estas coisas fazem-me, mas é, ficar esvaída. Tipo purga.

Na volta, isto é bom para quem vive stressado e não para pessoas que têm é falta de dormir mais, como eu. 
Mas sou como a minha avó que a cada médico que ia queixava-se de tudo, mesmo que fosse de outra especialidade e mesmo que já estivesse a tratar-se. Tinha esperança que cada novo médico a quem falava das suas cenas lhe dissesse que não era nada daquilo, que tinha era que tomar outra coisa e que, com um médico subitamente por ela descoberto como milagreiro, teria a vida eterna garantida. 
Eu também: a cada um que me diga que já fez mindfulness, ioga ou meditação, eu quero saber o que é, para que serve, não vá estar ali a solução para manter a eterna juventude e para a minha perene felicidade. Mas preciso de saber exactamente o que é, como funciona.
  • Conhecer o inner self? Dispenso. Tenho mais que fazer. 
  • Dormir de olhos acordados? Se for isso, estou nessa. 
  • Relaxar a mente e o corpo, namely a pele do rosto? Tira as rugas? É para já.
Mas ainda não descobri. Só me falam em coisas etéreas -- pensamento guiado, coisas assim -- nada que eu perceba em concreto.

Até que hoje assisti a um guru em acção. E fiquei varada.

A sério...!? É isto...?!

Courtesy of Netflix

Os professores de ioga vão numa destas? Aparece-lhes um maluco encartado destes, uma macacada sem ponta por onde se lhe pegue, um narcisista tarado, um abusador, e entregam-se ao que ele quer? 

Vêem-se aquelas centenas de pessoas a monte, uma carneirada, um calor dos diabos, todos a fazerem as coisas que aquele alarve ali as manda fazer, todos a acatarem. Acefalamente, submissamente.

Courtesy of Netflix

São estes os professores que depois vão espalhar a mensagem da mindfulness como se de uma religião se tratasse?

A sério. Se é, vou ali e já volto.

Bikram Choudhury: ioguim, guru, predador (e podre de rico)



Ou, para se perceber melhor, um vídeo sobre a criatura mas na Dickipedia, a comprehensive wiki of dicks


E se quem está a ler isto acha que estou sob o efeito de cogumelos colhidos in heaven, pois que leia o artigo publicado no Guardian:

'He got away with it': how the founder of Bikram yoga built an empire on abuse


In recent years, there’s been a growing discourse on intense fitness classes – Crossfit, SoulCycle – as the new secular religion. But if there was one branch that pushed the envelope from religion to near-fanatic cultishness, it’s Bikram yoga, the 90-minute routine of 26 postures performed in a room heated to 120 degrees founded by Bikram Choudhury. Clad in his signature tiny black Speedo and tight ponytail, Choudhury lorded over an empire built on sweat, devotion and $10k a pop teacher trainings – and, as explained in a new Netflix documentary, sexual harassment, rape and maniacal control. (...)
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Estou beige com isto tudo. Beige.

terça-feira, janeiro 29, 2019

Saber viver


Há Leitores que me dizem que vêm aqui pelo que escrevo e não pelos vídeos que partilho. Algumas pessoas vêem o blog no trabalho e não lhes dá jeito estarem a fazer barulho ou receiam dar nas vistas. Mas acredito que alguns conseguirão oportunidade para os verem e, por isso, na senda do post de ontem, partilho hoje um outro vídeo do mesmo género. Não será tanto pela casa (embora também o seja) mas pela tranquilidade que se desprende do modo de viver que se percebe vendo a sua dona, uma serena senhora com 76 anos.

Atrai-me muito este vagar de gestos, a forma como toca os tecidos, esta curiosidade dela em sair, ao frio, para fotografar, o preparar de uma refeição para os amigos. E gosto de ver os objectos, a casa, o conforto simples. Não admira que pessoas assim vivam para além dos cem anos: a paz de espírito é saudável. 

Eu, que receio a forma desregulada como a inteligência artificial parece tender a evoluir, como as redes sociais proporcionam todo o tipo de devassa e manipulação, e todas essas coisas, tenho que reconhecer as imensas vantagens da internet e de plataformas como o youtube sem os quais jamais poderíamos conhecer tantas coisas tão distantes e tão simples como esta forma de viver que aqui podemos observar.


sexta-feira, novembro 09, 2018

O novo ioga.
[Este pratico eu com uma perna às costas]




Pois vos digo que se me vou um bocado abaixo e quase aterro -- ou por cansaço, excesso de trabalho, embrulhadas profissionais, preocupações familiares ou o que seja -- a verdade é que o meu organismo tem umas formas curiosas de dar a volta. E falo no meu organismo e não na cabeça porque a coisa não resulta de elucubrações ou mise en place de estratégias de qualquer espécie. É completamente involuntário. Simplesmente parece que viro a página e entro num filme diferente. 

Nesta recente revoada de virada de página para a qual arrastei o meu marido, reorganizámos os livros, reorganizámos a zona de escritório, trouxemos uma poltrona para a zona que agora é exclusivamente de leitura, rependurámos quadros, espelhos, reposicionei bibelots. A casa agora está diferente e uma das salinhas pequenas in heaven também. E ando entusiasmada como se me tivesse mudado para uma casa nova.

[E calma: não estou, com isto, a dizer que sou especial por ser assim. Isto pode apenas significar que não sou boa da cabeça.]


No outro dia, vi na Area 8 uma espécie de pequena árvore, só uns estilizados troncos com luzinhas nas pontas.  Está a ser vendida como enfeite de Natal. E eu tenho uma igual. O meu marido diz que a comprei lá o ano passado. E eu tenho a certeza que não, que a comprei num chinês por um terço do valor. Não interessa, o que interessa é que andei à procura dela e, depois de a encontrar, coloquei-a em cima de uma das estantes baixas aqui da sala para servir de candeeiro. O meu marido refilou quando me viu a andar nisto. Disse que era uma palhaçada pôr um enfeite de Natal a servir de candeeiro. Mas, quando o viu aceso e constatou o bom ambiente que traz à sala, já não disse nada. Tão bonito e agradável que fica.

Também fiz outra coisa: no que era o quarto da minha filha, tinha um candeeiro de pé, todo xpto, Pensei que ficava bem ao lado da poltrona de leitura. Carreguei com ele para lá. Tem leds na pontinha de cada arabesco. Infelizmente só três é que acendem. Mas fica mesmo bem ali. Temos que substituir os que não acendem. Mas o candeeiro fica mesmo bem. Tomara que, com leds novos, todas as pontinhas acendam.

E estou cheia de vontade de, também aqui, na cidade, durante a semana, voltar a fazer arraiolos. Só que a carpete que cá tenho a meio não apenas é enorme como é daquelas com desenhos do piorio (do género destes dois que aqui vos mostro, um dos quais está aqui sob os meus pés, e que fiz tempos atrás). Para além disso vai trazer-me um apontamento de desarrumação a esta sala que agora anda tão linda. E, last but not the least, vai impedir-me de estar tanto tempo de volta do blog (e de leituras diversas). Esta que tenho para acabar está arrumada num lugar muito alto, terá que ser o meu marido a ir lá buscá-la e ele não tem estado muito para isso. Hoje, por exemplo, com o jogo do Sporting, não quer que eu o distraia por nada desta vida. 

Mas isto veio a (des)propósito de um artigo que li sobre a tricoterapia (Relaxation, confiance en soi et anti-stress : comment la tricothérapie nous fait du bien). Há até um livro que diz que o tricot é o novo ioga.

Já no outro dia eu aqui me tinha interrogado sobre se a leveza de espírito que sinto quando faço tapetes (ou quando escrevo; mas também se fizer tricot ou pintar ou fotografar) não será uma forma de meditar. Fico de tal forma alheada de tudo o resto, tão focada naquilo, que esqueço tudo o que me possa preocupar.

Não sou, por natureza, dada a stresses, a estados de afeliação (isto é, a curtir o fel próprio). Sou muito primária -- esqueço-me rapidamente do que me chateia, desligo-me facilmente de maçadas, ponho para trás das costas aquilo que me desagrada, e parto para outra -- pelo que, que me aperceba, não procuro estas actividades para esquecer agruras ou para me descontrair mas apenas porque sim, pelo simples prazer de as executar. Mas a verdade é que, enquanto estou absorta nisto, as minhas mãos andando sozinhas, a cabeça desligadamente observando as mãos, me sinto como a mais inocente, livre e despreocupada das criaturas.


Existem escolas de tricot que são espaços de convívio e bem estar, existem manuais, vídeos. Etc. E há o autodidactismo que, na verdade, é a minha onda.

O artigo fala no bem estar que é estar a fazer uma coisa destas, confortavelmente, com uma mantinha quente, uma caneca de chá para ir bebericando, num espaço confortável. É assim que, quando está frio, gosto de estar. In heaven, junto a isto o calorzinho da salamandra ou da lareira.

Por algum motivo que desconheço, parece que, por cá, estas actividades caíram em desuso. Nenhuma das minhas amigas, familiares ou conhecidas se dedica a isto -- com excepção da minha mãe que é devota praticante (está, neste momento, com uma encomenda em mãos: duas camisolas e dois casacos para quatro dos cinco bisnetos. Para o bebé nada foi pedido pois herda tanta roupa que raramente precisa de mais). Comentei com ela isto de dizerem que o tricot é o novo ioga e ela concordou, diz que estes trabalhos manuais (tricot, crochet, costura) é o que a tem ajudado a superar tão bem as agruras da sua vida tão complicada. Isso e ler. E eu acredito que sim.


Note-se: Apesar de toda esta apologia deste tipo de trabalhos manuais e apesar de admitir que o mais certo é o ioga não ser para mim, ainda não desisti de o ir experimentar. Mas tudo naquilo me faz hesitar: para começar acho que algumas daquelas posições parecem esteticamente muito interessantes mas se e só se a pessoa estiver bem ginasticada, sem um grama a mais -- assim como esta menina aqui em cima. Agora se a pessoa não for capaz de se virar do avesso com as pernas ao alto, presumo que seja sobretudo um bom motivo de galhofa, incluindo para o próprio.

Mas adiante.

sábado, outubro 06, 2018

Num dia feliz, qual a lógica de falar de ataques de pânico?
[O exemplo de Gisele Bündchen]




Vim de véspera e passei o dia bem longe de celebrações, televisões ou informação de qualquer tipo. A casa esteve cheia de brincadeiras, conversas boas, sorrisos. Claro que, em off, esteve sempre a preocupação com o meu pai, constipado, debilitado, e com a minha mãe que está a sair de uma virose ou lá o que foi que a deitou um bocado abaixo. Ela não quer sair de perto dele, ele não sai da cama e isto, claro, custa-me bastante, e custa-me sempre e ainda mais quando não estão bem. Vou telefonando,  vou dando todo o apoio remoto, vou lá sempre que posso mas não há verdadeiramente muito mais que se possa fazer. Qualquer sugestão que lhe faça não lhe agrada, acaba por optar ficar em casa com ele. Portanto, sempre que consigo, tento abstrair-me e gozar o momento, especialmente quando estou com a minha querida descendência.

Gostam imenso de estar no campo. Vieram com bicicletas e pedalam com alegria pelos caminhos habitualmente habitados por animais silenciosos e por pássaros que cantam em liberdade e que, nestes dias, com os meninos, se enchem de risos, zangas, descobertas.

A menina arrelia-se com o irmão, mais novo, que é veloz na bicicleta e a ultrapassa fazendo manobras que a assustam e quase a fazem despistar. Depois, já é só o medo: quando o ouve a aproximar a grande velocidade já ela fica com medo, zanga-se, grita-lhe, amua, choraminga. E ele, malandreco, nega, diz que não está a fazer nada de mal, que ela é que tem medo mas que disso ele não tem culpa.


E eu revejo, na memória, momentos iguais, iguaizinhos, a minha filha a andar de bicicleta e o irmão, também mais novo, a fazer a mesma coisa, a arreliá-la, ela furiosa a gritar com ele e ele, feito inocente, a não lhe ligar patavina e a fazer outra vez e outra vez a mesma coisa.

Hoje chamei o menino. Falei-lhe na noção de fair play, no necessãrio respeito pelos companheiros de brincadeiras e de jogos, que quem se porta mal ou assusta os outros não tem fair play e deve ser desclassificado. Ouviu atentamente. A partir daí, quando passava a acelerar rente à irmã ia cantarolando 'eu tenho fair play e por isso não posso ser desclassificado'. Não vale a pena. Está-lhes na massa do sangue. Gostam de pregar partidas, de arreliar os outros. Têm coração de ouro. O meu filho nunca fez mal à irmã, só cenas destas, defendia-a quando eu me zangava com ela, na verdade sempre tentou protegê-la e, se sabe que ela tem algum problema, fica logo preocupado. Claro que agora que é adulto já não lhe azucrina o juízo, agora azucrina o dos filhos. Agora é o filho do meio que faz à irmã o mesmo que ele fazia. Portanto é sempre uma animação. E o bebé também é fresco. Voluntarioso, traquinas, destemido. Espertíssimo, divertidíssimo. Gozo com ele e ele faz um sorriso intencional, malandro. Outras vezes, não retém a ironia e desata a rir-se. 

Uma alegria, portanto.


Depois, à noite, fomos petiscar numa tasquinha à beira da estrada. O bebé a dormir, os manos mais crescidos sempre com aquele apetitezão. Comeram como gente grande. Melhor: como lobinhos esfaimados. No fim, quando estavam a levantar-se, perguntaram o que era o jantar. A mãe, surpreendida, respondeu que tinham acabado de o fazer. Protestaram, disseram que queriam jantar. Poços sem fundo. Comem que dá gosto. 

Depois seguiram para casa e nós dois regressámos aqui. Telefonei outra vez à minha mãe, o meu pai parece que estava melhor, ela mais descansada. Descansei também. Depois ligou a minha filha, estivemos na conversa, quis saber como tinha sido, o que tinham feito. Contei-lhe das travessuras e diabruras, contei-lhe das brincadeiras. A seguir, mudei de roupa, estendi-me no sofá e pimbas, tiro e queda. Apaguei. 


Agora acordei, retemperada. O meu marido, entretanto, já se foi deitar. Levantou-se muito cedo e esteve a cerrar madeira, em parte, ajudado pelo filho. Também estava cansado. 

E eu pus-me aqui a passar os olhos pelo YouTube. E fui dar ao vídeo que aqui partilho convosco. Fez-me muita impressão pois fala de um tema de que pouco se fala: os ataques de pânico.

Convivi de perto com uma pessoa que, numa fase mais difícil da sua vida, começou a ter ataques de pânico. Sentia-se mal, sentia um aperto no peito, ficava sem conseguir respirar. Achava que era uma coisa física e não emocional, assustava-se, receava estar a ter um problema de coração. Por vezes, ligava-me a chorar, com medo, aflita. Fez muitos exames médicos e não tinha nada. Tinha ansiedade e uma carga emocional pesada em cima dela. Não queria ter, queria estar bem e chorava também por isso. Começou a ter medo de conduzir ou de estar em reuniões com medo de ter crises daquelas. Eu dizia para ela respirar fundo, para beber água, para ir apanhar ar fresco, para descontrair. Mas não lhe era fácil. Felizmente ultrapassou essa fase e nunca mais teve tal coisa.


No outro dia, outra amiga minha, pessoa equilibradíssima, muito bem disposta, com um sentido de humor apuradíssimo, contou-me que, dias antes, lhe tinha acontecido uma coisa horrível. Estava no avião (e anda de avião duas ou três vezes por mês, sem qualquer problema) quando começou a sentir o coração a acelerar, depois ficou com falta de ar, como se tivesse asma, e com as mãos transpiradas. A seguir, diz que lhe aconteceu uma coisa ainda mais inesperada e disparatada: desatou a chorar. Não queria dar uma barraquinha daquelas mas não conseguiu impedi-lo. Quando chegou a casa, já tarde, voltou a desatar a chorar. O marido, preocupado, só lhe perguntava: 'Mas o que te aconteceu? A reunião correu mal? Alguém te tratou mal?' e ela dizia que não, que estava tudo bem, mas não conseguia parar de chorar. No dia seguinte foi ao médico. Ataque de pânico. Vida agitada, pouco descanso, muita pressão. Eu disse-lhe: 'Não vale a pena. Tudo se ultrapassa. Não podemos deixar que a vida nos esmague'. Ela disse: 'Pois é'. Mas não é fácil.

O peso das circunstâncias, o desatino que por vezes faz rodopiar o mundo em volta da vida das pessoas, tudo isso parece que, por vezes, causa um desequilíbrio no seu corpo, como se os fluidos entrassem em desestabilização e a energia que move o corpo também entrasse em tumulto.

Quando as pessoas se vêem assim, querem, sobretudo, ver-se livres dessa ansiedade, desse medo, da possibilidade de voltar a ter novas crises dessas, tão aterradoras.


Gisele Bündchen conta que passou por isso. Fumava muito, bebia, dormia pouco, trabalhava muito. E entrou em descompensação. Até que um dia a ideia de se atirar da janela assomou à sua mente. E, nessa altura, percebeu que tinha que abrandar. Parou, decidiu não se curar através de medicamentos mas de ioga e de meditação. No vídeo abaixo a bela Gisele emociona-se ao relembrar esses maus momentos.



E este mostra-a, serena, em comunhão com a natureza.



Dias felizes para vocês, meus Caros Leitores.