quarta-feira, junho 30, 2021

Solitude. The Loneliness of Grief. A Quiet Connection

 


A fotografia de pessoas, quando o fotografado sabe que está a ser fotografado, não é fácil. Se se quer a naturalidade, pode ser difícil o fotografado despir-se da teatralidade encenada que tende a surgir quando se tem pela frente a câmara tal como pode difícil, ao fotógrafo, persistir o tempo suficiente até que o instante se desenhe, perfeito, quase autêntico. Se, pelo contrário, não se quer a naturalidade tem que se ter a inteligência e o bom gosto de obter o ângulo menos óbvio ou a estética depurada que permita chegar à essência da pessoa fotografada.

Não sou fotógrafa, sou uma mera diletante acidental. Mas, desde muito cedo, comecei a fotografar. Penso que é, na minha cabeça, uma forma de tentar captar o momento, registando os vestígios do tempo que passa. Como em tudo em que sou amadora, não gosto de me preparar ou de usar o tempo a disfarçar a artificialidade, prefiro a naturalidade ou a imperfeição que não é ensaiada. Ou seja, não gosto mesmo de fazer retratos preparados, prefiro a espontaneidade. Mas, como geralmente me acontece, admiro o que me é oposto. Neste caso, gosto de ver o retrato estudado.

Do auto-retrato nem falo. Não consigo fotografar-me. Quanto muito, fotografo a minha sombra. Gostava de ser conhecida por não mais do que as a shadow, aquela que é conhecida pelo rasto que deixa e não pelo que é. Um rasto esquivo, efémero, quase inexistente. 

Mas, também aqui, admiro as pessoas que fazem do seu rosto o seu projecto estético. Jorge Molder é um caso muito próximo. Fotógrafos que se auto-retratam têm a tarefa mais difícil de todas: desvendam-se, investigam-se, desafiam-se, revelam-se. Ou não: ou ocultam-se, mascaram-se, disfarçam-se. Seja como for, a sua persistência, minúcia e despojamento são, de modo geral, fantásticos. 

Forough Yavari é australiana, tem um rosto que é uma página em branco sobre a qual ela própria pode escrever mil histórias -- e tem recebido diversos prémios pelo seu trabalho. 

A fotografia lá mesmo em cima, Solitude, a todos os títulos uma extraordinária fotografia, foi a vencedora absoluta do 2021 International Portrait Photographer of the Year. Os muitos rostos da solidão. Uma mulher sozinha, cercada pelas suas personas. Todas e nenhuma. A solidão sem remissão.

E foi também para ela o segundo prémio da categoria portrait story com a igualmente fantástica fotografia The Loneliness of Grief. A solidão do luto. A tristeza a céu aberto. A lamúria a cercar uma mulher que vive para além da morte que testemunhou. 


Já o terceiro lugar da categoria family sitting foi para Nancy Flammea e é a encenação de uma pintura viva: A Quiet Connection, fotografia que eu gostava que alguém tivesse feito comigo e com os meus filhos ou que eu gostaria de fazer com a minha filha ou com a minha nora e os respectivos filhos. A intimidade e o amor incondicional entre mãe e filho aparece aqui amorosamente retratada.




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Mulheres fotógrafas. Mulheres fotografadas. 
O eterno mistério, a total intimidade.
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Junho está a chegar o fim. Meio ano dobrado. Que a metade que se segue seja melhor do que a anterior.
Mas vamos com calma: um dia de cada vez. 
Desejo-vos um dia feliz. 

terça-feira, junho 29, 2021

O amola-tesouras, o teletrabalho, o ritmo da vida

 



Íamos a fazer a nossa caminhada, agora mais breve que antes, quando passou um senhor a pé, com a sua bicicleta ao lado. Depois puxou da sua pequena harmónica e fez aquele toque que é chamamento e que, antes, diziam que prenunciava a chuva. Fiquei quase tão admirada como se tivesse visto um ET. Aqui? Um amola-tesouras? 

Havia um senhor, recordo que mantinha a distância, um desconhecido que passava de vez em quando no bairro onde moravam as minhas avós ou, raramente, na rua onde morava com os meus pais. Não sei se seria o mesmo. A ideia que tenho é que era uma pessoa esquiva. Mas isso foi num outro mundo, nuns outros tempos.

Agora... aqui...? Ao fim de tanto tempo, ainda se afiam facas, tesouras ou restauram chapéus de chuva? Há instrumentos de afiar a baixo custo por todo o lado. E, por defeito ou por definição, os chapéus de chuva não se deitam fora quando se partem? 

Fiquei intrigada. Por vezes acontecem umas coisas que parecem vindas de outra galáxias, pessoas que respiram de outra maneira e vivem num outro comprimento de onda. Tendo a imaginar que serão pessoas especiais, com muitas histórias de vida, algumas capazes de andar com um cortejo de borboletas atrás ou com mil livros na cabeça. Mas se calhar é romantismo meu. 

Também ando intrigada com os passarinhos que por aqui andam. Aproximam-se cada vez mais. De manhã, gosto de abrir a porta da cozinha e ficar ali, junto ao pequeno terraço onde está o estendal e um estreito canteiro. Do outro lado da vedação há dois arbustos altos que tombam para aqui e que pertencem à casa dos vizinhos. De vez em quando o meu marido apara-os pois diz que fazem muita porcaria. Não me incomoda aquilo a que ele chama porcaria pois, na verdade, são florzinhas que caem. Varro-as para o canteiro. Mas ele diz que não está para andar curvado para não bater com a cabeça nas hastes carregadas de flores. Mais do que flores, são florzinhas e bagas e são uma tentação para os pássaros. Por vezes ficam no ar, parados, a bater as asas, enquanto decidem o que vão fazer. Depois mergulham rapidamente para logo depois saírem com umas baguinhas no bico. Não se importam que eu esteja ali mesmo ao lado. E eu fico fascinada a ver aqueles bailados aéreos. 

E cantam muito. Uns trinados de dar gosto. Verdadeiros concertos. Nós ali e eles cantando na maior liberdade e alegria.

No domingo, eu a mostrar à minha mãe o vasinho da hortênsia, vimos um passarinho a saltitar por ali, depois pousado no beiral do vasinho. Nós tão perto e ele ali, a brincar. Sentem-nos como inofensivos, apenas uns seres de uma qualquer outra raça que não os incomoda.

Tenho conseguido, agora, descansar mais e dosear melhor a carga horária do meu trabalho. 

Leio que o mundo laboral não vai voltar a ser o que era antes da Covid. Espero bem que sim. Mas ainda há muitos velhos do restelo em lugares de poder, gente incapaz de perceber que as coisas podem mesmo mudar. Nem todas as profissões se prestam ao teletrabalho mas aquelas em que é indiferente o local em que a pessoa está deveriam favorecê-lo bastante, sempre que as pessoas assim o desejem. Pode acontecer que as pessoas não tenham condições e prefiram deslocar-se diariamente. Se assim for, deverá ser possível. O que isto significa é que terá que haver flexibilidade. O teletrabalho a cem por cento não me parece absolutamente bom pois algum contacto físico, de vez em quando, será sempre saudável -- mas em conjunto entre o trabalhador e o empregador deverá ser possível chegar a um bom compromisso para ambas as partes. A vida profissional não deve sugar a vida pessoal. Conseguir equilibrar o trabalho com a vida familiar e pessoal parece-me ser um dos grandes desígnios a prosseguir nos próximos tempos. Só espero que gestores retrógrados e sindicatos anquilosados consigam ver um pouco mais além e perceber que uma sociedade feliz é melhor para todos. 

Mas se a vida pessoal deve ganhar o destaque que merece, ao mesmo tempo, a vida profissional não deve ser desvalorizada, subalternizada. Não deve ser apenas uma forma de garantir a subsistência: deverá ser uma fonte de motivação e superação. E, se não é, deve encontrar-se maneira de ser.

E, ao dizer isto, só me ocorre que bem prega Frei Tomás. Ainda no outro dia a anterior proprietária desta casa voltou a desafiar-me para cursar jardinagem. E o que eu gostaria. Mas expliquei o que sempre explico: não consigo acomodar outra actividade. 

Mas devia. 

Jardinar, fotografar, ler, preguiçar, passear, conviver, ler todos os livros adiados. 


E devia ser capaz, ainda, de outra coisa: aprender a não esperar pela noite para escrever. Coisas assim. Coisas simples.

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Rhythm of Life

Life is like a dance, sometimes we know the steps and sometimes we make them up. Sometimes we follow the music and sometimes we make up our own tune. Sometimes we get our toes stepped on and sometimes we step on others toes. Sometimes you dance with a partner, and sometimes you dance alone. There are even times when we decide to sit out for a dance or two.  But the good thing about life is that we can always join the dance again when we are ready.

And it doesn’t matter if we know the steps or not, we can make them up as we go along. 

Perhaps it is time to try a few new steps?

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As ilustrações são de Lisa Aisato que, aqui, se faz acompanhar por Max Richter que interpreta Storybook

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Desejo-vos um dia feliz
Saúde. Alegria. Força.

segunda-feira, junho 28, 2021

Um Blue Prince a acompanhar de alto uma bela sardinhada

 


A Bromélia branca, que eu achava tão bonita, começou a ficar branca demais. Até as folhas começaram a passar de verdes a esbranquiçadas. Fui informar-me. Em tempos consultava livros de jardinagem. Agora googlo. As bromélias daquele tipo não gostam de muita luz directa e eu tinha-a posto no lugar com mais luz do jardim. 

Tirei-a de lá. Passei-a para o vaso sem história mas bonitinho que trouxe na sexta-feira. Está numa zona mais resguardada, no degrau acima daquele em que pus o vasinho verde onde coloquei a hortênsia, entretanto renascida.

No vaso exposto ao sol coloquei uma echeveria perle von nurnberg. Os nomes das flores são todo um programa. Não estou certa de que este seja o melhor sítio para a ter mas vale a pena tentar.

E arranjei outra floreira, uma rectangular, onde juntei uma blue prince e restinhos e estacazinhas de outras. O prazer que isso me dá talvez não seja fácil de perceber por quem me lê. Até para mim isto é novidade.

Antes, eu vivia num apartamento no alto de um prédio e tinha o rio na minha janela. Não sentia vontade de ter plantas aprisionadas. Não tinha vasos. Preferia, ao fim de semana ou nas férias, dedicar-me às árvores e aos arbustos do campo. Tinha, desde sempre, um sonho: inventar um bosque, criá-lo do nada, fazê-lo nascer num lugar em que parecia impossível, ver as árvores crescer, caminhar à sua sombra. 

Agora, nesta casa, mantendo o jardim que aqui encontrei e que é fruto de anos de dedicação e amor por parte dos anteriores proprietários e que, por isso mesmo e porque me identifico perfeitamente com a estética e o romantismo do lugar, tento introduzir o meu cunho mas sem desvirtuar o equilíbrio que aqui reina.

E, de repente, eu que era toda azinheiras, cedros, aroeiras, orégãos, rosmaninho e alecrim, descubro-me curiosa por toda a espécie de flores, com vontade de conhecê-las, de saber como se cuidam. Sempre me tinha visto como não tendo especial sensibilidade para as subtilezas das flores. Receava que me morressem sem que eu percebesse porquê. As flores eram para mim assim como os gatos: se não interagem nem mostram que percebem as nossas dúvidas ou vontades, como lidar com eles?  Mas, afinal, descubro, com algum alívio, que as flores que cá estavam têm mostrado que se dão bem comigo e que as que tenho plantado têm vingado e estão bonitas. Só uma begónia soçobrou, não sei porquê. Mas como foi só uma não me senti desmoralizada. 

Ando, pois, muito contente com as minhas flores. Aquelas onde a mangueira chega são regadas todos os dias, um chuveirinho ligeiro. As outras, as que têm que ser regadas a regador, são mais problemáticas pois não arrisco o regador dos dez litros, não vá dar para aqui algum mau jeito e, então, vai uma quantidadezinha mais leve que me obriga a várias idas e vindas. Mas é de gosto. O meu marido zanga-se, que é um disparate tanto vaso, ter que andar sempre a regar. Digo-lhe que também ele come todos os dias e não me ouve protestar contra isso. Acha a comparação um disparate mas eu digo-lhe: 'olha que não... olha que não...'

Tirando isso, poderia falar da festa que houve na casa aqui ao lado. Mas não vou entrar em pormenores, e isso por vários motivos.

Estava, no sábado, lá fora, a ler os contos da Silvina Ocampo e a ouvi-los, divertidos, bem comidos e, creio, melhor bebidos. Um dia conto, mais tarde, para que não se perceba que é deles que estou a falar. 

Por vezes parece que voltei aos tempos da minha infância e adolescência. Vivíamos numa moradia, aquela em que a minha mãe ainda vive. Chamamos quintal ao jardim das traseiras, onde chegámos a ter uma pequena horta mas que depois foi relvado e tem um limoeiro, duas laranjeiras e flores, e jardim ao da frente, o que sempre teve flores. Da casa vêem-se os outros quintais e jardins e, se as pessoas falarem mais alto e estiverem na rua e nós também, ouve-se o que dizem.

Na cidade, o apartamento era sonoramente estanque e morávamos no último piso. Não se ouvia nada de nada dos outros apartamentos. E no campo é como se estivermos no céu.  Estava, portanto, habituada a não ouvir nada da vivência dos vizinhos. Aliás, mal os conhecia. Aqui não. Aqui, quando se está no jardim, ouve-se o que dizem nos jardins adjacentes. É uma coisa bizarra. Mas aqui ninguém se importa com nada disso. É normal ver pessoas em fato de banho, a apanharem banhos de sol, e nós irmos a fazer a nossa caminhada e passarmos muito perto -- e tudo tranquilo. 

Adiante.

O meu marido andava a dizer-me que não arranjasse nenhum programa para este domingo. Queria ver o futebol descansado. Isto apesar do jogo ser às oito. Mas diz que já sabe como é e, portanto, que me abstivesse de combinações. 

Contudo, o meu filho sugeriu uma sardinhada e pareceu-me uma ideia simpática: andava mesmo com vontade de umas belas sardinhas, gordas e boas. Além do mais, o programa pareceu-me compatível. O meu marido, quando soube, ficou logo impaciente e pôs como condição que acabasse às seis para irmos levar a minha mãe, e poder, no regresso, instalar-se sem stress, com tempo, com calma, disponível para ver o jogo desde o início. Tem sempre receio de apanhar trânsito ou qualquer outra contrariedade que o impeça de estar postos bem antes do apito de arranque.

Fomos buscar a minha mãe antes de almoço. O meu filho trouxe as sardinhas, douradas e carvão biológico e assou tudo, eu cozi as batatas de pele vermelha conforme ele pediu, fiz salada de tomate maduro com orégãos. Ele assou também pimento. A minha mãe trouxe cerejas e bolo de chocolate, a minha filha trouxe queijadas vindas dos Açores.

Um peixinho bom, uma bela almoçarada, cada grupo em sua mesa mas as mesas perto umas das outras, sempre na rua, a animação habitual. A trupe do meu filho, pelo sim, pelo não, ainda fez o teste rápido na farmácia antes de vir. E, sempre que andamos a circular por entre o pessoal, andamos de máscara. Não se pode facilitar já que apenas a minha mãe tem as duas doses. O meu marido ainda só tem uma e eu não digo enquanto não estiver esclarecido se o que me aconteceu teve a ver com o estupor da vacina ou não. De resto, ainda mais ninguém está vacinado.

De tarde, a rapaziada foi andar de bicicleta e eu fiquei a maquilhar e a pentear a minha princesinha mais linda. Fiz-lhe um penteado à Frida, com buganvílias e tudo. 

Depois houve vólei, houve lutas, houve brincadeiras sobre um sofá insuflado que, em vez de ser para relax como era suposto -- e cujo enchimento foi um complicado desafio apenas transposto pela menina mais engenhocas da família -- foi mais uma fonte de brincadeira. 

E depois lanche e, quando parte já tinha ido, ainda espaço para massagem ao rapazinho que pouco antes andava a voar a atirar-se ao tio como se fosse um ninja, depois uma massagem mais breve ao mano mais crescido e... depois... às seis lá fomos levar a minha mãe. 

E conseguimos estar cá mais do que a tempo e horas e... foi com tristeza que vimos que Portugal ficou pelo caminho. Sei a expectativa com que os meninos estavam e imagino a desilusão. Mas faz parte da aprendizagem perceber que há sonhos que são curtinhos mas que isso não tem mal pois todos os dias nascem sonhos novos.


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Uma boa semana feliz a começar já por esta segunda-feira

domingo, junho 27, 2021

Olha... o ministro, esse poor man, demitiu-se...
Diz que não pode pedir distanciamento social aos outros e, ao mesmo tempo, andar a beijar e a apalpar o rabo da assessora...
Ora bolas para o corona que já nem deixa a malta pular a cerca à vontade...
Mas a qu
estão não é essa, a questão é outra. E não tem nada a ver com o corona.

 

Há uma coisa que me causa espanto: onde estava a câmara que apanhou o ministro naquele ângulo? No próprio gabinete não deveria estar senão eles teriam tido cuidado. Li que foram as câmaras de vigilância que os apanharam e que alguém as 'sacou' e, ou para sacanear o ministro ou para ganhar algum dinheiro, as fez chegar ao Sun. A sensação de que há sempre, algures, um Big Brother a espiar toda a gente deve estar bem presente não apenas neles e em quem trabalha em locais vigiados como, progressivamente, em cada um de nós.

Partilho aqui o vídeo pois não apenas eu partilhar ou não partilhar é mais do que irrelevante como isto é também mais do que público. Mas este vídeo é uma daquelas devassas que não sei como daqui pode não se partir para uma queixa contra quem permitiu esta absoluta invasão de privacidade. É certo que são figuras públicas em locais de trabalho mas é inadmissível que alguém julgando estar a actuar em privado, ainda por cima, em momento de grande intimidade, se veja exposto desta maneira.

Claro que, pelos contornos do que se passou, poderá fazer-se de conta que é outra coisa e vir dizer-se que se expôs um momento de contradição entre as regras públicas e as práticas privadas mas dizer isso é de uma insuportável hipocrisia pois sabe-se bem que o que se pretende é expor o momento de infidelidade entre Matt e Gina. A humilhação a que o jovem ministro e a sua assessora foram expostos é brutal.


Ainda há poucos dias a Rainha se referia a Matt Hancock como 'poor man'. E, na realidade, ele como todos os outros ministros da Saúde que tenham apanhado com a batata quente da covid são merecedores do nosso apreço... e compaixão. Não se deseja a ninguém que esteja no governo na altura em que rebenta uma pandemia. A pressão, a preocupação, a total disponibilidade, a incompreensão alheia, o cansaço, o receio de falhar, a responsabilidade sem rede -- tudo coisas que não têm preço e que jamais agradeceremos o suficiente.

Mas, se Matt Hancock estava nos títulos dos jornais ingleses pela forma carinhosa e condoída com que a Rainha o tratava, logo a seguir veio a bomba largada pelo Sun. E, a seguir, veio a graça de ele vir desculpar-se por... ter infringido as regras de distanciamento social que ele próprio propôs e muito intensamente defendeu.

E eis que, um dia depois, se demite. A comunicação de saída vai no mesmo comprimento de onda -- e bem -- desviando o foco do affair, que é matéria privada, para aquilo que tem a ver com os outros: a quebra do distanciamento social.

Entretanto, Gina Coladangelo também já se demitiu. Obviamente. Era assessora de um ministro que já não é pelo que o lugar quase que automaticamente se extinguiu.


Do que li, Matt e Gina foram colegas de universidade e são amigos de longa data. Quanto ao resto, nomeadamente ao que se passa em casa deles é outra conversa. Estará, certamente, em curso um terramoto nas suas vidas. Já transpirou para a comunicação social que Matt já disse à mulher que se separa dela. 

É uma história igual a milhares de outras histórias.

Para já, Matt sai e um outro entra para Health Secretary: Sajid Javid. 

E mais um tablóide britânico mostrou como o respeito pela dignidade alheia é assunto para que não está nem aí. Tomara que o Correio da Manhã nunca desça tão baixo e que não apareça um dia algum pasquim que venha a servir o que de mais baixo a sociedade produz.

sábado, junho 26, 2021

Um ministro com sentido de humor
[E outras cenas cá minhas]

 



No outro dia contei que quando fui ao supermercado trouxe um little vasinho com uma hortênsia? Acho que sim. Tinha ideia de pô-la num vasinho ma escadinha da frente, perto do vaso bonito onde está a suculenta jeitosa. Mas não sabia onde arranjá-lo. Hoje, de manhã, quando dei por ela estava a florzinha toda murcha. Não as folhas mas a flor em si. Fiquei aborrecida. Peguei no vasinho e pu-lo no lava-louça, debaixo da torneira. E resolvi que tinha que arranjar o vaso. Sem saber onde desencantar vasinhos lindos, pensei que, nem que fosse de cimento ou terracota, haveria de ter onde instalar a hortênsia.

Ora é sabido que é o tipo de coisa que tira o meu marido do sério: acha que não são precisas nem mais flores nem, claro está, mais vasos. Não quer ir comprá-los, não quer que eu vá aumentando o parque de vasos a regar. Mas eu disse que, sem problema, ia sozinha. Ficou ainda mais irritado, acha que eu dizer isso é uma forma de pressão. Mas não é. Resumindo: contrariado, à hora de almoço, avisando que era 'para despachar', lá fomos à loja dos vasos. 

Ao chegar lá, mal estacionou, repetiu: 'É para despachar'. Nesse comprimento de onda, ao chegar lá, olhei em volta e inclinei-me para um em forma de cálice. em cimento. Perguntei-lhe o que achava. Seco: 'Não gosto. Parece coisa de igreja'. Pedi que escolhesse ele. Disse que não, que pegasse num qualquer, que por ele qualquer um servia. Isto depois de ter rejeitado a minha primeira opção. Apontei outros. Disse que sim. Trouxe um simples, sem história.

Quando íamos para a caixa, vi no corredor, no chão, um vasinho de cerâmica esmaltada, bonito. Fui perguntar à empregada se era para venda. Nem sabia do que estava a falar. Descrevi-o. Disse que havia vasos de louça ao fundo da loja. Fui ver e, apesar de não encontrar nada das belezuras que gostava de trazer, descobri um verde, simples, discreto e bonito. Perguntei ao meu marido se gostava. Já estava farto, queria ir-se embora, pelo que a resposta foi curta: 'Não sei'. Eu disse que achava bonito. Ele: 'Faz o que quiseres. 

Trouxemos.

Depois de termos chegado da faena dos vasos e quando estávamos a almoçar, já perto das duas, o meu marido piurço porque já era tarde e tinha muito que fazer, chegou a minha filha com os seus rapazes. Três dias de férias que teve a sorte de gozar com um fantástico tempo de verão. Estiveram ali um bocado, à fresca no jardim, até que se fez horas de irem para a praia. Andarem a espantar formigas e a tirar a casca a pinhões. O mais crescido já me ultrapassou. Parece mentira mas é verdade. A voz já começa a dar sinais de querer mudar e, quando se veste e despe já tem vergonha que lhe vejamos a pilosidade que começa a despontar com força. Ainda há tão pouco tempo me fez pregar um susto dos valentes ao avô. Já contei mas gosto de recordar esse dia inaugural. O meu marido foi trabalhar mas eu não. Estava na clínica. Uma pilha de nervos. Quando soubemos que tinha nascido, que estavam os dois bem e quando a vi a sair na maca sorrindo, feliz, feliz e quando vi o bebé pequenino, fofo, querido, fiquei tão avassaladoramente emocionada que logo quis dar a novidade ao meu marido mas, quando quis falar, não consegui. Queria dizer-lhe: já és avô. Mas só chorava. E nem bem isso. A voz embargada, um solução prendendo as palavras. Do outro lado, ele assustado: Que é que aconteceu? E eu, querendo falar e sem conseguir. O que foi? O que aconteceu? e eu a perceber que estava a assustá-lo mas sem conseguir falar. Até que, com muito esforço, lá consegui. Uma felicidade imensa. Um novo serzinho nas nossas vidas e a minha filha também tão feliz.

E agora, meia dúzia de dias depois, já me põe o braço pelos ombros, encosta a sua cabeça à minha, uma ternura, um menino muito querido. E já mais alto que eu.

A tarde foi tranquila e concentrei no fim da tarde as tarefas que requeriam mais atenção. Depois fui buscar terra e transplantei o meu vasinho pequenino para o vaso novo. Acho que fica ali bem. Não é a mesma coisa que o outro mas acho que não desmerece.

E fui regar os outros vasos. 

Também tive uma visita ao fim da tarde. Uma conversa animada, cheia de revelações e risos, com um lanche apalavrado. 

Tirando isto, o que tenho a dizer é que o sentido de humor britânico do ministro da Saúde me parece delicioso. Tendo o The Sun publicado fotografias dele, no seu gabinete de trabalho, aos beijos na boca e com a mão no rabo de Gina Coladangelo, sua assessora, ambos casados e com filhos mas cada um com seus respectivos cônjuges, eis que Matt Hancock veio publicamente assumir e lamentar que tenha quebrado o distanciamento social. Igualmente divertido a reacção de Boris Johnson: accepts Matt Hancock’s  apology for breaching social distancing rules and ‘considers matter closed’.


E eu, para além de achar que, depois da barracada e do susto que é ter a sua fotografia no tablóide, Matt Hancock revelou um sentido de humor fantástico, só me ocorreu a sorte que ainda temos por a imprensa em Portugal ainda não ter chegado ao despudor de apontar objectivas de longo alcance para dentro dos gabinetes de muito boa gente. É que, há uma regra sagrada: o que se passa da porta para dentro supostamente fica da porta para dentro. Mas não no Reino Unido. Uma pouca vergonha. 

Mas imagine-se a chicana que por cá não seria -- as puritanas as rasgarem as vestes e os diáconos a lamberem-se pelos cantos -- se o Correio da Manhã apanhasse um ministro, sei lá, talvez o da Defesa (acho que o Cravinho tem uma certa pinta), aos beijinhos e abraços com uma sargenta, fosse num quartel, fosse no seu gabinete. Mas isso seria o expectável. Pinta, pinta, teria o ministro se, perante a cegada e o drama doméstico incontornável, fizesse o mesmo: pedisse desculpa por ter quebrado a regra do distanciamento social. 

Enfim.

E, por agora, é isto. Já é sábado. Fim de semana. Bem bom. A ver se o tempinho de verão se aguenta para ver se eu faço de conta que estou de férias. 

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Os quadrinhos mostram a criatividade de Ali Beckman que diz coisas recorrendo ao nome dos insectos (fly, bee). 

Arpi Alto interpreta Moon River.

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Um dia feliz e luminoso

sexta-feira, junho 25, 2021

A verdade é que sobre tudo isto não há muito a dizer

 



Pouco a dizer. Manhã muito atarefada. Tarde atípica, fora de casa, com algumas decepções pelo meio e alguma improdutividade indesejada. Chegámos a casa lá para as dez e meia da noite. 

Banho. Para jantar o que apanhámos pelo caminho. 

Depois pus-me a ver televisão, nomeadamente o House. Sempre aquela máquina de desconcerto, sarcasmo e inteligência. 

Agora, abri o computador à espera de uma informação que, afinal, não está cá. E não tenho novidades para partilhar ou notícias para comentar. Para além da grande Lisboa continuar a marcar passo, Lisboa propriamente dita retrocedeu. 

Não sei se isto é por tanta gente já se portar como se não houvesse covid ou se por o teletrabalho ter abrandado e muita gente estar de volta aos escritórios, ou seja, a espaços fechados. Espaços não ventilados são ratoeiras. E, se muita gente volta a espaços fechados, mais gente anda de transportes e mais gente vai a restaurantes (espaços também mais ou menos fechados com pessoas sem máscara). Não sei. O que sei é que esta não estava no programa. Sempre imaginei que com tanta gente já a ter estado infectada e tanta gente vacinada, com a vida a poder ser feita ao ar livro ou de janelas abertas, esta droga tivesse esmorecido. Afinal não.

Continuamos sem estatísticas sobre como e onde as pessoas estão a ser infectadas e acho que, sem essa informação, não se conseguem ter medidas dirigidas e eficazes.

Também ouvi, no carro, alguma polémica em torno do entusiasmo futebolístico do Ferro Rodrigues e da suposta divergência entre o Marcelo e o Costa sobre a gravidade da situação. Nada disso me interessa muito. Poeira. Mais chato é que este vírus seja diabólico, se transmute, troque as voltas a toda a gente, deixe sequelas, dê cabo da vida a muita gente. Isso, sim, é trágico e incontrolável. Quem abriu a caixa de pandora talvez não tenha percebido o que ia acontecer. E até acredito que a não tenha aberto de propósito. Coisas assim acontecem. Deus gosta de brincar aos dados, não é? 

Chato também que, fruto desta tragédia, toda a gente seja forçada a aceitar coisas que, em situações normais, não aceitaria. Só prova que somos vulneráveis e que valemos zero. 

No outro dia, está a fazer três semanas, pude viver na primeira pessoa a prova provada de que a nossa vontade vale zero, o nosso suposto controlo sobre as situações que nos envolvem e sobre o nosso corpo vale zero. Não temos voz activa para coisa alguma quando as circunstâncias nos tiram o tapete. 

Bem podem mil filósofos desde a antiguidade até aos dias de hoje ou uma legião de gregos antigos ter inventado a pólvora e todas as tragédias do mundo muito antes de alguém ter sonhado na nossa existência que nada disso contribui para a nossa segurança ou felicidade.

Quando chega a hora, só nos acontece uma coisa -- olhar para dentro de nós e para o que nos rodeia e pensarmos: mas que raio nos está a acontecer?

Li que as últimas palavras da Princesa Diana, pouco antes de morrer, quando estava no carro, aparentemente sem ferimentos de maior mas, efectivamente, prestes a entrar em paragem cardíaca, terão sido Oh my God, what's happened? Também ela, perante o acidente e perante quem, perto dela, já se tinha ido, mostrou a estupefacção de quem não percebe o que lhe está a acontecer.

Mas, enfim, nada de novo. Tudo é um acaso. E a única coisa ajuizada é festejar a vida enquanto ela parece estar à nossa disposição. Tudo o resto, maldizer os outros ou a vida, acusar este ou aquele, arranjar tricas sobre futilidades ou desperdiçar um minuto que seja da nossa vida é uma estupidez sem explicação.


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Nos últimos tempos, um post que escrevi em janeiro de 2015 tem recebido diariamente um número inusitado de visitas. Trata-se de um post que escrevi com a alegria possível quando o meu pai teve alta depois de umas semanas complicadas. Depois disso, voltou a estar hospitalizado mais algumas vezes. Sofreu bastante, sobretudo por assistir ao declínio do seu corpo, da sua independência, do seu orgulho. Já fez um ano que se foi. E faria hoje anos. Todos os anos festejávamos o seu aniversário mesmo quando, acamado, já não participava nos festejos nem tinha grande consciência de que lá estávamos a festejar que estivesse vivo. 

Faz-me um bocado impressão constatar como o tempo passa de uma forma tão inexorável. O seu bisneto mais novo não chegou a ter consciência da sua existência. E qualquer dia os outros acabarão por se esquecer daquele bivô ausente, entubado, que não os via e mal falava. A vida da gente esvai-se de nós e, com o tempo, esvai-se da memória dos que nos conheceram. E é assim mesmo, nada a fazer. 

E isto só é mais uma razão para aproveitarmos enquanto podemos. Tirando isso, batatas.

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As fotografias cheias de surrealidades são da autoria de Ellen Sheidlin
E June Tabor faz-nos companhia com Love Will Tear Us Apart

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Dias felizes.
Saúde

quinta-feira, junho 24, 2021

Coisas deste e do outro mundo

 



Às vezes dá-se às coisas o nome de quem as faz mesmo antes de saber se as coisas vão ser especialmente bem sucedidas. Pode acontecer que, depois, as coisas ganhem vida própria e o nome das coisas passe a existir por si só, esquecidas de quem as fez e de quem lhes deu nome.

Sucedeu hoje que, ao ver a notícia de que uma certa pessoa tinha sido encontrada sem vida na sua cela de prisão, não tenha prestado atenção: nem o nome nem a cara me diziam nada.

Agora, ao rever os sucedidos do dia, percebi quem tinha sido a pessoa: o autor do antivírus McAfee

John McAfee. Nunca me tinha ocorrido que o nome do antivírus era o nome do seu criador. O produto mantém-se vivo, vai tendo novas versões, e, enquanto isso, o seu criador é preso por fuga ao fisco. E, agora, ao saber que ia ser extraditado e que arriscava uma pena de dezenas de anos, não terá aguentado mais. E assim acaba a vida de uma pessoa que um dia desenvolveu uma aplicação que se tornou internacionalmente célebre e com a qual certamente ficou mais do que multimilionário. 

Nestas coisas, volta e meia, as pessoas pensam que são eternas, que viverão milhares de anos, e que, para tal, precisam de aferrolhar muitos milhões, se necessário for fugindo ao fisco para ficarem com ainda mais. Até que a coisa dá para o torto e o homem eterno e muito rico acaba, morto, numa cela num país estrangeiro. 

Mais uma história triste que só prova uma coisa: os humanos são frouxos das ideias.

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O meu dia foi tranquilo apesar de activo. Estou a tentar o equilíbrio, coisa que me é um pouco estranha. Pouco antes das sete da tarde, antes de ir fazer arroz de tomate para acompanhar os filetes, o meu marido apanhou-me a escrever um mail. Ele não sabia mas deveria ser o décimo no espaço de pouco tempo. Escrevo razoavelmente depressa. Disse-me: 'Olha para isso, a escrever compulsivamente há não sei quanto tempo. Estás a voltar ao mesmo, não consegues, está-te no sangue...'. Disse-o com ar censor mas acho que tem razão. Depois de uns dias em que tentei travar às quatro rodas, aos poucos vou reatando o meu normal. As ideias surgem-me e, com elas, a vontade de fazer, de fazer acontecer. Pode alguém ser quem não é?

De tarde, fiquei sozinha. Preocupam-se que eu fique sozinha em casa. Eu não. Então, para reduzir o tempo em que estava sozinha em casa, o meu marido sugeriu que eu fosse ao supermercado comprar fruta. Achei absurdo. Ideia mais sem jeito.

Contudo, quando acabei de almoçar, apeteceu-me mesmo ir dar um giro. A ideia do supermercado pareceu-me tentadora. Ao que eu cheguei. 

Meti-me no carro e fui. Comprei pêssegos normais, pêssegos do paraguai, morangos, maçãs, laranjas. Gosto muito de fruta. Gosto de comer, gosto de comprar, gosto de sentir o perfume da fruta quando estou na cozinha. 

Lavo-a toda e coloco-a em taças para estarem sempre disponíveis para serem comidas. Assim é que deve ser. E não venham com isso da língua portuguesa ser muito traiçoeira que eu não vou nessa.

Aproveitei e comprei uma loção corporal. Para avaliar qual delas, se a da tampa amarela se a da tampa lilás, levantei um pouco a máscara para sentir o perfume. Mais agradável a amarela. Trouxe, imaginando-me cheirosa como uma taça de frutas.

Trouxe também um vasinho com uma hortênsia cor-de-rosa. Agora terei que arranjar um vaso bonito para a pôr e, claro, um lugar bem pensado para pôr o vaso. Estas coisas nunca se ficam só pela primeira derivada. E aqui não é uma questão de língua portuguesa mas de cálculo diferencial.

Bem.

Era para lavar a cabeça esta quinta-feira de manhã mas afinal pediram-me para antecipar uma reunião que tinha convocado para o início da manhã. Vai ter que ser muito cedo. Para não ter que me levantar ainda mais de madrugada e depois estar com o cabelo a pingar, lavei-o de tarde. Depois do banho, com o corpo ainda húmido, apliquei a loção. Fiquei a sentir-me mesmo bem, frutada. 

Ah, e mais: confirmo que, quando vou sozinha ao supermercado, consigo cirandar por onde habitualmente passo a correr e descobrir coisas impensáveis, deveras tentadoras. Assumo: trouxe uma máscara regeneradora. Imagine-se. 

Depois do banho, tirei a dita da embalagem e apliquei-a. Olhei-me ao espelho e pensei que deveria fazer uma selfie. Uma legítima múmia. Deitei-me no sofá e por pouco não adormeci, apesar da coisa molhada na cara. 

Quando a tirei, fui observar-me ao espelho e, para dizer a verdade, não descobri nada de diferente. Se calhar, não faz efeito à primeira. Também não se pode esperar que uma coisa que custa um euro e picos produza o mesmo efeito que o botox. Se calhar, tenho que reincidir. A ver se me informo qual a periodicidade aconselhada para me mascarar.

Portanto, a tarde foi boa. Claro que trabalhei mas teve estes motivos extra de interesse.

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[Registo supostamente verdadeiro]


E, por falar em extras, uma que é deveras extra.

Agora à noite, quando fui conferir as notícias, vi uma que me animou mesmo. Os astrónomos pensam que talvez existam 29 planetas habitados por seres que podem observar-nos e captar todas as nossas comunicações. Isto é um pouco perturbador mas, por acaso, a ser verdade, acharia o máximo. 

[Imagem de brincadeirinha --- claro...]


Acredito que não são verdes nem parecidos connosco. Podem ser transparentes, podem ser raios de luz, pode ser qualquer coisa que não se nos assemelhe de maneira nenhuma. Mas pode haver inteligência mas talvez seja uma outra forma de inteligência. Andamos mortos por pôr o pé em Marte sem nos ocorrer que o mesmo pode estar a passar-se com seres de outros planetas em relação a nós. Mais: quem nos garante que não estejam já entre nós? Partículas inteligentes a ouvirem-nos, a rirem que nem umas perdidas com a nossa totozice.

Não tarda, vai ser divulgado pelo Pentágono um relatório sobre ovnis e acontecimentos relacionados com actividade extraterrestres e aí é que vamos todos ficar com a pulga atrás da orelha. A pulga ou um alien -- nunca se sabe. Um alien atrás da orelha, isso é que era, a ouvir tanto como nós, a conhecer todos os nossos segredos, a fofocarem uns com os outros com as coisas que vão ouvindo aqui e ali. 

E, aliás, levantando um pouco o véu... quem vos garante que esta que vos escreve não é uma alien? 

Alguém me está a ver? 

Alguém tem provas de que sou humana?

Vou...!

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Mas, antes de ir, informo que os frutos são obra de Frida Kahlo e as hortênsias de Svetlana Lileeva

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Mas, antes de ir, desejo-vos um dia feliz

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quarta-feira, junho 23, 2021

A casa de Cara -- e uma certa passagem secreta

 



Trabalhei num sítio. Era um edifício que, por fora, quase parecia normal. Mas não era. A primeira vez que lá fui, foi para ir a uma entrevista. Tinha respondido a um anúncio. O meu pai, num fim de semana, tinha-me levado um recorte do Diário de Notícias. Foi a primeira vez que respondi a um anúncio. Escrevi uma carta à mão e nessa carta devo ter escrito que era professora e que estava a acabar a licenciatura. Devo ter escrito as minhas notas pois pouco mais tinha a dizer. Na volta recebi uma carta a convocar-me para a entrevista. Lá fui. Jeans, blusinha de verão, sandálias, sacola de palhinha, descontração. 

Ao entrar no edifício, fiquei impressionada. Um átrio enorme, enorme, todo em pedra que reluzia, um pé de direito gigante, esculturas e grandes pinturas. Não imaginava que uma empresa pudesse ter uma entrada assim.

Fui seleccionada. No primeiro dia em que fui trabalhar, mandaram-me apresentar num outro sítio, no posto médico e depois no serviço de Pessoal. Aí coloquei todas as questões que, antes, na entrevista e quando me comunicaram que tinha sido seleccionada, nem me tinha ocorrido perguntar.

Mais tarde, contaram-me, a rir, que tinham ficado espantados com as perguntas daquela miúda que se tinha apresentado ao trabalho sem saber se ia como efectiva ou a prazo ou outras questões do género. Nem sei se sabia quanto ia ganhar. E perguntei-o nesse dia pois ia recomendada para não me esquecer pois, quando amigos ou família me faziam perguntas, não sabia nada desses 'pormenores'.

Na altura não fui trabalhar para esse grande edifício. Antes de lá chegar trabalhei em dois outros sítios, qualquer deles marcantes. De qualquer deles guardo gratas memórias. Um dia conto.

Se não estou em erro, foi ao fim de uns sete anos que me mudei para lá. E não fui logo para a ala onde viria a trabalhar durante mais anos, uma ala ampla, um largo corredor todo em mármore, primeiro num gabinete, depois num outro que teria uma área que era cerca do triplo do anterior. De qualquer deles via-se o largo rio. Uma maravilha. Tempos gloriosos. E saudosos.

Nesse edifício havia zonas restritas. Uma delas parecia ser composta por um conjunto de apartamentos, cada apartamento composto por gabinete, sala de reuniões, casa de banho completa, incluindo banheira e duche, sala de espera, gabinete da Secretária e antecâmara.

Outra zona, igualmente restrita mas não tanto, era composta por sala de reuniões with a beautiful view, restaurante, dizia-se que o melhor de Lisboa, biblioteca, sala de estar.

Nessa biblioteca, toda composta por obras de referência, algumas raras, todas preciosamente encadernadas em pele e letras douradas, havia uma estante, igual a todas as outras, que escondia uma porta secreta. Um dia, em segredo, mostraram-me. Passando por essa porta secreta ia dar-se a um compartimento que parecia apenas um compartimento. Mas não era. De lá havia uma outra porta secreta. E dali havia saída quer para o telhado quer para uma escada privativa que, por sua vez, ia dar a uma saída para a rua num sítio absolutamente insuspeito.

De vez em quando passo lá à porta. Tem agora outros donos e outra finalidade. Não faço ideia como estará o seu interior e se esses caminhos secretos se mantêm. Há lugares a que gostaria de um dia poder voltar, e esse seria seguramente um deles.

E lembrei-me disto ao ver o vídeo abaixo. 

Acho um piadão a Cara Delevingne. Já aqui a tive várias vezes e, certamente, mais vezes cá voltará. Tem 28 anos, é modelo, actriz (e canta). Sexualmente fluida, já se lhe conheceram alguns amores de ambos os sexos. Cara não cabe em nenhuma caixa. 

Fisicamente é também um ser em evolução. Os seus cabelos já foram louros, quase brancos, escuros, ruivos, castanhos, compridos, curtos. Já se mostrou sexy, desportiva, bad girl, clássica. Ela diverte-se e não conhece limites. Mas já passou pelo tormento da depressão e já publicamente, de forma aberta e descomplexada, falou disso.

A sua casa é obviamente a sua cara -- e isto não é um trocadilho. Irreverente, louca, sexy, provocante, romântica, divertida: assim é ela, assim é a sua casa. 

Cara é inglesa mas a casa que aqui nos mostra não é propriamente british style. Pelo contrário, é ousada, teatral, cinéfila, bem L.A. 

A passagem secreta de sua casa -- em que se entra por uma vagina e se sai por uma máquina de lavar -- é das coisas mais loucas e divertidas que já vi. Aliás, a sua extraordinária casa é toda ela um excesso, uma alegria, uma casa que é, ela própria, uma companhia para quem lá habita.


Está para fazer dois anos que já aqui tinha mostrado a casa em que, então, ela morava com a mana Poppy. Agora encontramos algumas peças e arranjos que já se viam no outro vídeo, tal como voltamos a ver os seus amorosos cãezinhos. Só não encontramos a irmã. Não sei se a casa ainda é a casa das duas ou se agora vive sozinha. Aliás, ela queixa-se de que agora passa muito tempo sozinha e percebe-se que tem a ver com a pandemia, mas também fala no plural e não sei se se refere apenas a ela, a Leo e a Alfie. A casa não parece ser casa para uma só pessoa pois o que parece destinado à celebração pode virar quase uma provocação se for assombrada pela solidão. Mas, enfim, disso não sei pelo que não vale a pena especular. 

Vale a pena, sim, ver o que é uma casa que mais parece uma homenagem à criatividade mais desbragada e ao espírito livre de quem parece destinado a ser eternamente jovem.

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Inside
Cara Delevingne's Fantastical L.A. Home | Open Door | Architectural Digest


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Desejo-vos um dia feliz