Fiquei satisfeita com a eleição de Assunção Esteves para Presidente da Assembleia da República pois creio que é competente, acredito que vai desempenhar bem a sua função. O seu discurso foi uma coisa e tanto, uma peça que ficará na história daquela casa. Liberdade, Democracia, Justiça, Entrega, foram palavras que ela usou com mestria e com emoção e a que deu invulgar grandeza.
Felizmente acabou por se arranjar uma saída airosa para o vexame de
ontem.
Ora hoje
Eduardo Pitta refere a questão maçónica para enquadrar o assunto Fernando Nobre - e estas
liaisons, que me causam alguma alergia, fizeram-me recordar um assunto que passo a relatar.
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Quando eu andava a estudar, embora não fosse dada a grandes sessões de estudo e fosse fisicamente incapaz de ‘marrar’, tinhas notas relativamente altas e isso acontecia de forma consistente. Era também pessoa de convicções e, já nessa altura, tão assertiva como sou hoje (ou seja, de acordo com testes efectuados por profissionais, quase 100% assertiva).
Talvez por isso, na faculdade fui contactada, desafiada, convidada, etc, para aderir a todas as juventudes partidárias activas na época. Mas a minha cabeça sempre foi livre demais para poder comprometer-me com partidos, clubes, religiões e, reiteradamente, declinei. Por mais que tentassem aliciar-me, nunca nenhum argumento me convenceu.
Entretanto, quando estava no 3º da faculdade tive que mudar de alojamento e, enquanto andava à procura de alternativa, uma colega de curso com quem me dava medianamente, veio dizer-me que conhecia um sítio óptimo: uma professora universitária que tinha uma espécie de residência, uma moradia num local muito bom, com jardins, óptimos acessos, perto da faculdade, o melhor bairro de Lisboa. Uma maravilha.
Fui lá ver (acompanhada do meu namorado) e a dita professora estava à minha espera, já sabia algumas coisas de mim, muito simpática, tentando cativar-me. A casa era, de facto, muito boa e o preço uma agradável surpresa. Quando relatei em casa o achado, os meus pais acharam que ‘quando a esmola é grande, o pobre deve desconfiar’, e colocaram muitas reticências. Alguma coisa não batia certo, pelo que, à partida, sem mais, a decisão era negativa. Mas tanto insisti que, pelo sim, pelo não, a minha mãe lá se deslocou a Lisboa para vir avaliar, ela própria, a situação.
Lá estava, de novo, a referida dona da casa à nossa espera, muito atenciosa. Mostrou a casa de alto a baixo, tal como na vez anterior, até uma capelinha tinha (o que, de certa forma, tranquilizou a minha mãe), e uns óptimos quartos, com grandes janelas para o jardim, e uma cozinha que podíamos usar à vontade, e sala à disposição, uma localização que não podia ser melhor, podia ir a pé para a faculdade e, não menos importante, embora intrigante, um preço imbatível. A frequência, para além da professora, era constituída por umas quantas estudantes universitárias, talvez uma meia dúzia, não me lembro bem, e a minha mãe viu algumas, vieram cumprimentá-la, muito simpáticas, e a minha mãe ficou bem impressionada por ver, a meio da tarde, as raparigas em casa, na sala, a estudarem e todas muito gentis, muito bem educadas. Uma cena de filme.
Quando chegou a casa, a minha mãe conferenciou com o meu pai e depois comunicou-me: ‘Pois, sendo assim, de facto, não se vê nada de mal, parece bom demais para ser verdade mas, se é, então, está bem, podes mudar-te para lá’. E lá fui.
Havia regras, que me tinham sido comunicadas antes, do género aos dias de semana ter que se entrar até à meia-noite, o namorado não poder entrar senão para a sala e apenas até determinadas horas, coisas normais para a época.
E, de facto, eu estava ali muito melhor do que no sítio anterior. Só via vantagens.
De vez em quando diziam-me que ia lá jantar um padre amigo e convidavam-me a ficar a jantar lá ou, não querendo, a ir depois de jantar para a conversa que era giríssima, um padre desempoeirado, e um dia a conversa era sobre o aborto, outro sobre já não me lembro o quê, mas sei que a coisa era temática (o que me intrigava um pouco) mas eu declinava sempre porque, na altura, namorava intensamente e não desperdiçava um minuto que fosse, nem sequer a matutar nas coisas. Depois percebi que, afinal, o padre ia lá fazer a missa, que era habitué da casa e muito amigo da professora. Um dia veio ter comigo, que então eu é que era a tal menina fugidia, que andava desejando de me conhecer, que gostava de ter poder ter oportunidade para falar comigo. E eu sem perceber bem os sorrisos delas todas, como se fossem todos muito íntimos, como se antes o tema já tivesse sido objecto de conversa. Lembro-me que registei mas não pensei mais no assunto.
Outras vezes, iam todas passar o fim de semana a um sítio muito giro e queriam que eu fosse. Depois começaram a falar-me em retiros, em sítios lindos, e que eu ia adorar e eu, na maior inocência, perguntava se o meu namorado podia ir e, claro, não podia e eu, que então nem pensar.
Depois, aos poucos, comecei a reparar que parece que só eu é que namorava e que, a nível de vestuário, as minhas vizinhas de quartos, seguiam um padrão muito homogéneo. Saias pelo joelho, camisas ou blusas pelo pescoço. Eu concluia que era gente muito bem comportadinha, beatas, marronas, coisa assim, nada demais e, quando as descrevia, ao falar com amigos ou família, imitava-as, a vozinha singela, as blusas sem decote, descrevendo os convites que me faziam para ficar a jantar com o padre ou para ir meditar ao fim de semana. Pensava que, por coincidência, as últimas representantes de uma realidade rural do século anterior, tinham desaguado ali. Nunca me ocorreu algo mais.
Passados talvez uns dois ou três meses, não me lembro, estava eu já eu a deitar-me, ouvi tocar à campainha.
Reacção dentro da casa: nenhuma.
A campainha tocava cada vez mais insistentemente e eu não ouvia a professora, nem ninguém, a ir abrir a porta. Abri a porta do quarto, espreitei. Ninguém, silêncio. Fui bater à porta do lado. A rapariga que lá estava, abriu a porta e disse que era a A., uma colega de quaro, que estava a chegar atrasada mas que as ordens eram rigorosas, ninguém podia entrar depois da meia-noite. Eu argumentei que não se ia deixar a nossa colega no meio da rua àquela hora, quase 1 da manhã e a outra, friamente, respondeu que ordens são ordens e fechou-se no quarto.
Subi as escadas, fui ter com a professora. Estava de roupão e disse-me a mesma coisa.
Entretanto, lá fora, a outra, coitada, tocava e tocava, já quase em contínuo. Já inquieta com aquilo, eu disse à professora, ‘Se não lhe abre a porta, abro eu’. Seca, a professora respondeu-me ‘Está proibida de o fazer’. Tentei convencê-la ‘Abra-lhe a porta, peça-lhe explicações, avise-a de que não haverá segunda vez, o que quiser, mas não a deixe ficar na rua, é desumano, é absurdo’. Seca, fria, respondeu-me ‘ Já disse que ninguém lhe abre a porta, para ela aprender’ e, com uma agressividade que eu não lhe conhecia, disse-me em tom ameaçador ‘Livre-se de lhe ir abrir a porta’. E virou-me as costas.
Desci as escadas, furiosa, as outras todas fechadas nos respectivos quartos - por dentro eu ia pensando, revoltada, ‘Olhem-me estas estúpidas, tão boazinhas que são e agora não se importam de deixar a amiga na rua, de noite’ - e, como é óbvio, fui abrir a porta à minha colega.
Ela estava a chorar, agradeceu-me muito e avisou-me ‘Estás feita’. Descansei-a, ‘Ah, não estou, não, está descansada’.
Depois voltei para o quarto, fiz a mala e fui dormir.
No dia seguinte, quando me levantei já a professora tinha saído, dava aulas cedo e, além disso, a faculdade dela era do outro lado da cidade. Deixei-lhe um papel lacónico, dinheiro e as chaves e nunca mais lá pus os pés.
Decorrido algum tempo, falei no nome desse professora e alguém exclamou, ‘Essa?! Então, mas essa é a chefe das mulheres da Opus Dei em Portugal. Tem uma casa de raparigas da Opus Dei na L.’.
Fiquei passada. Não queria acreditar. E essa pessoa continuou, ‘São muito selectivos, recrutam jovens entre os melhores alunos universitários, quase que lhes fazem lavagem ao cérebro com retiros, encontros com padres, missas lá em casa, coisas do género’. Eu perplexa.
Fui confirmar com pessoas mais ou menos ligadas ao meio e assim era, toda a gente sabia, pelos vistos toda a gente menos eu.
E ainda é. Googlei antes de escrever isto e lá me aparece ainda tudo.
Opus Dei
Ou seja, fui arregimentada sem saber e, durante algum tempo, vivi sem saber numa moradia da Opus Dei - e ainda hoje me interrogo porque agiram desta forma, sem me dizerem nada, que planos é que teriam para mim.
Organizações assim, coisas meio secretas, tudo isso me causa estranheza, me causa aversão.
Opus Dei ou Maçonaria não entendo a justificação nos tempos de hoje, em sociedades livres, não entendo como se sujeitam a essas práticas e rituais, não entendo.
Vejo na net os nomes ligados à maçonaria e fico incrédula, concentram-se à volta do PS e do PSD, mas não só: António Costa (que não por acaso disse que, se fosse deputado, votava em Fernando Nobre), Emidío Rangel, Henrique Monteiro (cuja crónica no Expresso, esta semana, não por acaso, era um elogio e um apelo ao voto em a Fernando Nobre), e José Nuno Martins, António Nunes, os famosos Miguel Relvas e Isaltino Morais, João Soares, etc, etc, e custa-me a imaginá-los de avental, de cabeça tapada, em ridículos rituais.
Porquê? Alguém consegue explicar-me?
Para agirem como grupos de pressão, grupos de influência? Mas, para isso, tem que haver secretismo, rituais?
Não percebo.