É notável o dom de palavra, a acutilância, a coragem e a paixão desta miúda. Tem 16 anos mas atreve-se a enfrentar quem lhe apareça pela frente com conversa mole, com desculpas esfarrapadas, com ignorância estampada na cara.
Com uma determinação ímpar e palavras fortes e certeiras como murros, Greta tem conseguido a proeza de mobilizar o mundo e fazer com que os 'poderosos' deste mundo a ouçam.
E, se pararmos para pensar, temos que aceitar que é extraordinário que este movimento que tem trazido milhões de pessoas para a rua tenha nascido da revolta de uma miúda que percebeu que o tempo se está a extinguir e que, corajosamente, resolveu tentar agarrar o assunto com as suas próprias mãos e, dessa forma, tentar travar essa perigosa tendência. E é extraordinário que sejam maioritariamente crianças, crianças inspiradas por ela, a puxar pela consciência da população. É extraordinário e comovente.
A forma enfurecida e emocionada como hoje falou na Cimeira do Clima em Nova Iorque tem corrido mundo e é deveras impressionante.
'You have stolen my dreams and my childhood with your empty words,' climate activist Greta Thunberg has told world leaders at the 2019 UN climate action summit in New York. In an emotionally charged speech, she accused them of ignoring the science behind the climate crisis, saying: 'We are in the beginning of a mass extinction and all you can talk about it money and fairy tales of eternal economic growth - how dare you?'
E, abaixo, a miúda franzina no seu canto enquanto o grande e todo-poderoso Trump e a sua entourage chegam às Nações Unidas
Greta Thunberg briefly crossed paths with Donald Trump at the United Nations in New York on Monday. Thunberg, the Swedish climate activist, fixed Trump with a steady stare as he arrived at the UN to attend a meeting on religious freedom. The US president decided to snub a major UN climate summit, held on the same day
O semblante enraivecido (e enojado?) de Greta fala por si.
Depois de almoço e num dia de recolhimento in heaven durante o qual tento recuperar de um resfriado ou gripe ou faringite ou virose ou sei lá o quê (na volta, apenas a revolta do organismo face ao regresso ao trabalho e ao trânsito), vejo as notícias no computador enquanto na televisão passa o Fama Show.
E o que me chega dali, do lado da televisão, é uma coisa inenarrável. É canal aberto à futilidade, ao exibicionismo, à parvoíce encartada, aos sorrisos enxertados na cara e às respostas parvas a perguntas parvas, a patrocínios disfarçados de encontros de amigos durante os quais cada um exibe o mais puro pechisbeque. O pastiche do pastiche do pastiche. Parece que acham que aquilo é glamour e ninguém quer ficar atrás do outro mas, na verdade, aquilo a que assisto é o mais puro atentado à inteligência, uma total distorção de valores.
Nem digo mais nada pois posso estar a não usar as palavras mais adequadas. É que temo estar a dar importância a mais a um mero programa de entretenimento. Aparentemente, aquela parvoíce será inócua.
Mas, na realidade, temo que não o seja tanto quanto isso pois os programas mais vistos, os blogs mais vistos, as páginas de Facebook ou os instagrams mais populares são os que se ocupam desta espuma, desta macacada, e são, justamente, da autoria desta gente que ocupa o palco e vive dos media e da social media que tudo invade como uma vulgar infestante. Dá ideia que grande parte da população prefere seguir a 'opinião' destas nulidades do que a opinião de quem fala de assuntos relevantes.
A alienação em estado puro. O que dizem é de bradar aos céus, tão grande o vazio que parece habitá-los. E sorriem e exibem-se e dizem criancices em catadupa. Pasmo.
Entretanto, acabou e eu estou a tentar relativizar o que vi e ouvi. Mas tenho dificuldade. O mundo tornou-se mesmo um lugar estranho. Num mundo normal, seria dado palco a quem tivesse alguma coisa de relevante a dizer e não a pessoas que não têm literalmente nada que dizer.
E é por terem tanta necessidade de estarem sempre lindos, glamourosos, sorridentes e em boa forma que acontecem desgraças como a do outro rapaz que se injectou com testosterona aparentemente janada, quase destruindo a sua vida, ou que há tantos casos de droga, de alcoolismo, de depressões ou de outras situações complicadas. Lindo mundo, este.
Entretanto, sabendo do meu interesse e preocupação sobre temas como a desregulação da inteligência artificial ou das cada vez mais preocupantes alterações climáticas, o algoritmo do YouTube sugere-me alguns vídeos e eu, rendida, dou-lhe razão: vejo-os, interessam-me de facto.
E eu, que temo o efeito dos poderes 'sobre-humanos' destes algoritmos, percebo o paradoxo. Em coerência, deveria mandar bugiar o YouTube ou o Google (ou, mesmo, o Blogger) e, no entanto, dependente deste mundo de conexões imediatas e infinitas, aqui estou.
Tento convencer-me que sei distinguir as oportunidades dos riscos... mas sei lá se consigo.
Seja como for, depois de ontem à noite ter voltado ao tema (ou melhor, não ontem à noite mas hoje de madrugada), peço de novo a vossa atenção para o discurso simples mas poderoso desta miúda que não usa roupa oferecida por costureiros glamourosos, que não se maquilha, que não faz poses para o boneco e que fala de temas pouco sexy e que, ainda por cima, não se ensaia nada de desafiar e ameaçar quem quer que seja.
The young climate activist Greta Thunberg has been awarded the "Special Prize Climate Protection" during Germany's Media awards show GOLDENE KAMERA 2019. She used her speech to call on media celebrities to raised their voices and spread the message on climate change.
Na quarta-feira deitei-me tarde demais e levantei-me cedo, como sempre. Hoje estou, como é bom de ver, cansada e com muito sono. Estive a ler os comentários, com muita vontade de reagir. Um por um. Mas estou incapacitada. Adormeço a cada minuto. Acresce que esta semana o trânsito tem estado péssimo. Isso e a minha agenda sobrecarregada, pois acumularam-se compromissos à espera do meu regresso de férias. E esta conjugação é suficiente para, em mim, a acumulação de contrariedades se transformar em impaciência. Acresce ainda que, zen como estive nas férias, afeiçoada à calmaria, agora toda a macacada, desorbitagem, injustiça ou quadradice me deixa em pulgas. Portanto, neste curto espaço de tempo já coleccionei quatro conversas complicadas e tensas (mas tensas para quem teve que me aturar porque eu, felizmente, mantive-me tranquila, segura das minhas razões).
E não vem ao caso mas é uma constatação que acho que devo partilhar convosco. Já o contei: os testes à minha personalidade dão que sou absolutamente assertiva, quase 100%. Nada passiva, quase nada manipuladora e, de vez em quando, pontualmente e em situações bem identificadas, um pouco agressiva. Mas, de forma quase limite, sou assertiva em toda a linha. Portanto, não é com esforço ou por encenação que defendo as minhas convicções com confiança. Ou seja, é natural em mim chegar-me à frente e defender acerrimamente o que penso. E nunca me dei mal com isso. Mas uma coisa é propor novas soluções ou criticar decisões tomadas e outra, diferente, é dizer a uma pessoa ao meu nível ou superior, cara a cara, que é ela que não está a dar conta do recado ou que está a prejudicar as empresas, ou seja, que a solução para os problemas não passará por ela.
Isso ou uma outra em que estou a tornar-me exímia: quererem que eu me responsabilize por uma 'cena' daquelas a que, numa empresa, se sabe que o não é inadmissível -- pois implicará uma auto-demissão ou, se não, um vexante encostanço -- e, ainda assim, perante seja quem for, dizer: não estou disponível. Ou dizer: Não me sento à mesma mesa que esse fulano porque esse fulano é um ordinário. E, apesar de ver o ar estarrecido do meu interlocutor, incapaz de reagir, certamente sem saber como lidar com uma situação destas, manter-me segura e determinada. É que, nos meios que frequento, coisas destas não se dizem, muito menos se fazem. E, no entanto, eu faço e ninguém me bate. E penso que é importante partilhar isto: digo o que tenho a dizer, faço o que acho que devo fazer e ninguém me bate.
Contudo, de uma coisa estou certa: tudo isto é treta. Questiúnculas. Toda a gente tem que lidar com elas. Lidar com gente insensível, quadrada, de vistas e mente curta é uma chatice mas não deve haver quem nunca tenha sido sujeito a isso. Portanto, mais ou menos vitória, destas pequenas vitórias, tanto faz. Banal. Irrelevante. Podem não ser irrelevantes para as pessoas que são directa ou indirectamente beneficiadas ou prejudicadas mas, para o mundo, a relevância é zero.
E depois há as decisões mais macro, as que afectam grupos de pessoas: os que ganham mais, os que ganham menos, os desempregados, os proprietários, os empresários, os profissionais liberais, etc, etc. E aí entram as orientações políticas: umas pessoas acham que se devem penalizar os trabalhadores, outras que se devem esmifrar é as empresas, outras que se deve é apostar na investigação científica. Etc.
Mas depois há -- ou devia haver -- aqueles temas que não são individuais ou grupais, que não devem ter a ver com sensibilidades pessoas ou orientações políticas. Questões supra-partidárias. E, até, questões supra-nacionais.
Podia falar de várias -- garantir a total igual oportunidade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres, garantir o máximo de escolaridade a toda a população, regular a utilização das poderosas plataformas tecnológicas, das redes sociais ou da utilização de inteligência artificial, etc, etc, etc, muitas, muitas -- mas vou falar das alterações climáticas, da escassez de água (actual em algumas zonas do mundo e futura em muitas outras).
Faz muitos anos, certamente mais de mil, um amigo meu foi a Marrocos. Era a primeira vez que eu falava com alguém que tinha passado umas semanas em Marrocos. Encalorada como sou, o que mais me impressionou foi o calor. Dizia ele: Uns quarenta graus. Não imagina. Tínhamos que andar sempre a beber água. Ar seco, seco. Eu nem conseguia imaginar.
E, no entanto, já aí estamos. Quarentas e tais já cá os temos. Terras a serem abastecidas de água por cisterna também.
E isto se, provincianamente, pensarmos apenas no nosso pequeno rectângulo. Mas, se pensarmos a uma escala europeia e percebermos que o aumento das temperatura, o degelo, a desertificação de algumas terras e a escassez de água já afecta partes significativas de vários países, percebemos que, o que haja a fazer, mais vale que o seja, de forma articulada, a nível europeu.
E, depois, subindo um pouco mais o patamar de observação, temos o mundo, com zonas a serem devoradas pelas águas, outras a escaldar, a terra gretada, os animais a morrer, as pessoas a lutarem por uma gota de água.
Estamos a falar de um tema muito sério. Não é tema que, na ligeirinha, se possa usar sobretudo para fazer slogans, para fazer títulos de notícias, para querelas partidárias, para medidas absurdas de tão pacóvias. É tema sério. Tem que envolver cientistas de muitas ciências, tem que envolver gente séria, ponderada. É tema para mentes brilhantes e não para espertezas saloias. É tema transversal, a ser tratado com elevação, com os pés na terra e com a cabeça no espaço (e, um dia destes explico a que propósito vem agora esta do espaço).
Há quem embirre com a jovem Greta, achando que há ali vedetismo, quem ache que há oportunismo nos pais. Eu não acho isso. Foco-me na mensagem mais do que no mensageiro. E a mensagem é certa. E é bom que, graças a Greta, tenha vindo para a agenda mundial. Pense-se, por exemplo, em Al Gore. Há quantos anos anda ele a tentar vender a ideia? Nem sei. Há quantos anos, por exemplo, estive eu num almoço com ele no Estoril? Nem sei. E alguma das suas conferências, entrevistas ou livros conseguiu o impacto global com carácter de urgência que Greta Thunberg conseguiu em tão pouco tempo? Não, nem pensar. Foi o percursor, tem sido incansável, não o nego. Mas não conseguiu incendiar o mundo com a centelha de urgência que ela conseguiu. Portanto, não se lhe desvalorize o mérito. Preocupemo-nos antes em fazer tudo o que está ao nosso alcance. Façamo-lo.
Devo dizer que não engraço especialmente com miúdos com conversas de adultos, muito espevitados, muito sabichões. Também não acho grande piada à mediatização de talentos infantis. Por isso, quando comecei a ouvir falar na pequena Greta, não me interessei muito.
Até olhar mais atentamente e perceber que não existe ali vedetismo, não existe pose, não existe narcisismo. Greta não se arranja de uma forma apelativa, não se esforça para ser uma influencer ao estilo fashionistyoutuber, apesar de muito solicitada não faz vida de selfies e likes, não se mostra deslumbrada com o palco que lhe dão nem com a adesão por parte de jovens um pouco por toda a parte do mundo dito desenvolvido.
Ouço-a e não há ali cedências ao facilitismo, não desloca a sua preocupação nem um milímetro da sua causa para si própria. Ela preocupa-se genuinamente com o que os adultos estão a fazer ao planeta. É uma lutadora implacável.
Frágil, uma menina. E, no entanto, a força da sua convicção está a agitar consciências e a despertar o mundo para a urgência na conservação do planeta.
É, na actualidade, um dos líderes mais carismáticos do mundo.
Peço que vejam o vídeo abaixo. Nele Greta diz, com desarmante naturalidade que convive com o síndrome de Asperger e que talvez seja por isso que se entrega de uma forma tão intensa à causa do clima e do ambiente em geral.
A síndrome de Asperger é uma perturbação do desenvolvimento que afeta as capacidades de comunicação e relacionamento.
As crianças com esta síndrome exibem dificuldades no relacionamento com terceiros e interessam-se de um modo intenso por matérias muito específicas.
Quantas vezes se encara o futuro das crianças com Asperger com ansiedade, como se fossem incapazes de socializar ou de virem a afirmar-se por si próprias. Basta pôr os olhos em Greta para se perceber que não é bem assim.
Mas, independentemente dessa sua condição, há que pensar no que Greta diz. Poluição de qualquer tipo, falta de cuidado com os rios, com a qualidade do ar, falta de atenção à sustentabilidade dos recursos --- de tudo isto se fez o desenvolvimento industrial e o crescimento económico de muitos países. E tudo isto ainda acontece em muitos países, nomeadamente nos maiores, sem qualquer consciência, sem qualquer cuidado pelas gerações vindouras.
Por isso, muito gostaria que os jovens de todo o mundo obrigassem os adultos a reflectir e a mudar as suas más práticas, Com carácter de urgência. Como se a casa estivesse a arder.
How a 16-Year-Old Is Leading a Global Climate Movement
For hundreds of thousands of young people around the world, Greta Thunberg is an icon. In August 2018, dismayed by adults’ lack of action on the global climate crisis, the teenager sat herself down in front of the Swedish Parliament, pledging to strike from school every Friday until Sweden aligned its policies with the Paris Agreement. Greta’s actions have earned her a Nobel Peace Prize nomination and speaking engagements at the World Economic Forum and COP24—but most importantly, they’ve encouraged students from all over the globe to stand up for Earth and their futures.
E agora vejam, por favor, o emotivo e potente discurso de Greta aos líderes da União Europeia
Greta Thunberg's emotional speech to EU leaders
A sometimes tearful Greta Thunberg criticised EU leaders in Strasbourg for not taking the threat posed by climate change seriously enough. The 16-year-old activist said: 'If our house was falling apart our leaders wouldn’t go on like we do today ... if our house was falling apart you wouldn’t hold three emergency Brexit summits and no emergency summit regarding the breakdown of the climate and the environment.'