Desde que a descobri passou a ser companhia sempre presente na minha vida. Adélia Prado é daquelas pessoas luminosas de quem se pode dizer que é 'do bem'. Sorrindo, fala coisas sensatas, sábias, simples. Não é daquelas que se 'acha', não enrola a conversa em prosa armada. É daquelas pessoas com quem se aprende, com quem se ganham anos de vida, com quem apetece estar.
E o Bial é outro que tal. Todo ele cativa: sabe ouvir, sabe falar, sabe olhar. As entrevistas conduzidas por ele são conversas sempre gostosas.
Por isso, uma conversa entre os dois é maravilha pura. Conversam de tudo com aquela leveza, aquelas gargalhadas, aquele desassossego que alegra e rejuvenesce. Pode a conversa fluir em torno da morte, da vida, de sexo, de religião que as palavras não fogem nem se espantam. Adélia fala e Bial, embevecido, deixa-se ficar a ouvir. De vez em quando, parece que gostaria de ficar em silêncio, a pensar no que ela diz. Mas a entrevista tem que prosseguir e, então, lá vem mais uma questão. Outras vezes leem poesia e o prazer é redobrado: ambos parecem submersos nas palavras.
Esquecemo-nos da idade de Adélia, os seus 90 anos não pesam, não desgastam, não cansam: aqueles tantos anos luzem com graça e inocência, como as luzinhas do cenário em que se encontram.
Adélia Prado em "Conversa com Bial"
Adélia Prado, maior poetisa viva do Brasil e recém ganhadora dupla dos prêmios Camões e Machado de Assis, maiores honrarias prestadas a escritores de língua portuguesa pelo conjunto de sua obra, concedeu entrevista ao Pedro Bial, no programa "Conversa com Bial".
Prestes a completar 90 anos, a autora aclamada que publicou o primeiro livro aos 40 fala de suas experiências, de sua voz poética, de diferentes momentos da vida.
Fisicamente, Eduardo Giannetti é praticamente igual a um colega meu. Divertidíssimo, diziam-no pouco amigo de trabalhar mas, embora não o achasse um excepcional proactivo, dele nunca tive razões de queixa. Tinha como hobbies a fotografia e o cinema, participava em concursos e, em dias de evento, já sabíamos que podíamos contar com ele para registar o momento. E, ao pé dele, era forçoso que estivéssemos sempre todos muito bem dispostos.
Não conheci a sua primeira mulher, por quem era apaixonadíssimo, sua comparsa nas fotografias e filmagens. Não tendo filhos, a disponibilidade de ambos para passeios e aventuras era permanente.
Até que um dia ela adoeceu. Para ele, foi um sofrimento terrível. Acompanhou-a incansavelmente.
Quando ela morreu, teve um grande desgosto.
Fui ao velório. Como já contei, tenho pavor de mortos, é uma fobia que vem de quando era pequena. Nem entro na capela se a urna estiver aberta.
Mas tendo feito centenas de quilómetros para lhe dar um abraço e estar com ele, seria estúpido não entrar. Só que a urna estava aberta. Portanto, não entrei mesmo. Saiu ele. E foi chamar a mãe para me apresentar, muito simpáticos. E começaram a contar-me os últimos dias dela, tudo envolto em ternura e tristeza. E, então, diz-me ele assim: 'Não quer ir ali vê-la? Está tão bonita. Está muito serena. E o cabelo... tão bonito...'. Quase me senti desfalecer. Pedi desculpa, disse que não conseguia, que me fazia muita impressão. Mas vi que ele ficou com pena que eu não fosse ver a defunta.
Pouco tempo depois fui ter uma reunião com ele. Estava outro. Rejuvenescido, risonho, outra vez muito brincalhão. Tinham-me dito: 'Não me pergunte como é possível, mas é: o nosso colega já anda de namoro, todo in love.'. Fiquei estupefacta. Perguntei se era alguém conhecido. Não, nada. É que, se fosse colega, ainda me pareceria possível que, tão pouco tempo depois, já ele estivesse de namoro. Agora, em tão pouco tempo, desencantar uma desconhecida... Mas, então, fui ter ao gabinete dele. Em cima da secretária, numa moldura, uma fotografia de uma senhora toda desportiva, toda sorridente. Perguntei: 'Já soube da novidade e, pelo que ouvi dizer e pelo que aqui vejo, a coisa vai de vento em popa, já aqui tem a fotografia da namorada...'. Ele riu: 'Pois, não a quis ver lá na capela, não a conheceu... Esta não é a namorada, esta é a falecida...'. Fiquei sem saber o que dizer.
Mas isto só vem ao caso pois, ao ver o convidado do Bial, parecia mesmo estar a ver aquele meu colega bacano. Todo ele: o rosto, o cabelo, o corpo, os óculos, a forma como se veste. Iguais. Como é possível?
Mas vejam a entrevista, é outra daquelas conversas que nos deixam a pensar. Interessantes perspectivas.
É possível se tornar IMORTAL? Com Eduardo Giannetti | Conversa Com Bial | GNT
O economista e professor Eduardo Giannetti - e também autor do livro "Imortalidades" - vai ao #ConversaComBial para falar dos tipos de imortalidades sobre as quais escreveu. Aborda a pequenez dos seres humanos diante do desconhecido e como a crença na vida após a morte vai muito além da ciência, das tecnologias e da religião.
As coisas vêm ter comigo. É aquilo de ir na rua e alguém, que não conheço, chegar ao pé de mim e começar a contar-me a sua vida. Ou estou com uma em mente, abro o youtube e, sem que antes tenha feito pesquisas (porque 'ele', o algoritmo google, poderia migrar informação do motor de busca genérico para o motor de busca do youtube), aparece-me um vídeo que tem tudo a ver com aquilo em que ando a pensar. Não sei porque é que isso acontece. Mas acontece. Coincidência ou coisa do caraças, eu não sei.
Sei que ando numa onda zen (o que V. poderão já ter testemunhado pelo que vou divagando por aqui e que os vídeos que tenho estado a publicar no instagram também demonstram) mas, quando abro o youtube, não vou à procura de nada. Limito-me a ver o que 'ele' tem para me mostrar. Gosto de ser surpreendida.
E abaixo já verão qual o vídeo que hoje estava em posição de destaque e que estive a ver até agora.
Chegámos a casa perto das dez da noite. Depois de nos instalarmos, pusemos a reportagem sobre o Sócrates. Falarei disso depois pois tenho que deixar assentar. A seguir abri, então, o Youtube.
Hoje tive mais um dia calmo, com arrumações domésticas, com caminhadas, com um passeio bom, e, pelo meio, com mais uma tentativa de prosseguir a leitura da biografia do Herberto Helder -- mas a achar aquele tijolo um repositório ora excessivamente detalhado ora desnecessariamente ficcionado --, a espreitar 'O outro lado dos livros', Memórias de um editor, Manuel Alberto Valente, e a achá-lo um bocado 'seco' (seco ou seca?), e, pelo meio, a olhar as árvores, a sentir o perfume das flores, a ouvir os passarinhos, a olhar o céu.
Fui buscar uma espreguiçadeira e levei-a para um sítio onde não costumo estar, debaixo de uma árvore onde antes nunca tinha estado a preguiçar.
E foi uma maravilha, um encantamento, uma sensação de que eu poderia ser uma folha, um fruto a ganhar forma, um dos passarinhos que passarinha por aqui, uma pétala de rosa. Por acaso, sou esta que agora aqui escreve e que dá conta da perplexidade agradecida que sente por estar viva, por poder presenciar tanta beleza, tanta harmonia entre todos os elementos.
E, com este estado de espírito, abro o youtube e dou com uma conversa entre o Bial e Marcelo Gleiser, um físico que me deixou fascinada a ouvi-lo.
Apetecia-me transcrever várias coisas que ele disse e que correspondem ipsis verbis ao que penso (ou que me deixam a pensar), coisas como estas duas aqui abaixo que podem não ser a última coca-cola do deserto mas que são grandes verdades (pelo menos a mim tocam-me bastante pois é destas evidências que parece que meio mundo anda esquecido):
Celebrar o privilégio de estar vivo neste mundo
Cara, acorda, você é feito de estrelas!
Somos feitos da mesma matéria que as estrelas, da mesma matéria que as árvores, há átomos de outras coisas e de outras pessoas dentro de nós. Somos magia, um acaso que, por milagre, se materializou em nós.
O vídeo é um bocadinho longo mas acreditem que é interessante do princípio ao fim. Espero que gostem.
ESTRELAS, ÁTOMOS e mais com o físico Marcelo Gleiser | Conversa Com Bial | GNT
Um bate-papo que mistura ÁTOMOS, ESTRELAS, NATUREZA e o "mundo sobrenatural": o físico e astrônomo Marcelo Gleiser chega no #ConversaComBial para uma entrevista de expandir mentes.
Gosto agora muito de me sentar no jardim ou no campo, em especial à tardinha, a olhar para o ar, para o céu, para as árvores.
No jardim há agora um perfume novo, creio que a mistura de várias flores. É um perfume floral, isso sem dúvida, mas, ao mesmo tempo, doce e íntimo. Os pássaros também gostam. Descem e vêm passear perto de mim, entretendo-se a debicar o que encontram na terra.
Se estou sob as árvores gosto de as admirar, vendo-as de baixo. Não existiam e foram-se tornando a maravilha que são. E gosto de ver as flores através da luz. Ou a luz através das flores. Parece o mesmo mas não é.
As nuvens também me cativam. São efémeras como uma aragem. Não têm a noção do tempo nem do espaço, são livres como uma partícula elementar, como uma palavra solta ao vento, como espíritos vogando por aí.
Isto é um deus, e creio que daqueles que não são particularmente santos (honi soit qui mal y pense).
Muitas vezes tenho um livro comigo mas, se o livro não tem nada que me impressione (e impressionar no sentido em que a luz impressiona a película, nela gravando imagens, sombras, movimentos), fecho-o e deixo-me estar.
Isto é um milagre. Inexplicável. Fruto da inspiração de uma inexistente divindade
Tenho saudades de fotografar com as minhas máquinas fotográficas. Foram-se estragando e, depois, para quê continuar?, já tinha milhares de fotografias. Faz sentido continuar a acumular fotografias? Não vou voltar a vê-las. O que gosto é do momento em que capto a imagem. A partir daí já não me interessam. Agora uso o telemóvel. E vou apagando pois estou sempre a precisar de mais espaço.
Isto é uma obra de arte. Fortuita. Com a vantagem de não ser um Miró
Já contei muitas vezes que, quando fazemos as nossas caminhadas nestes dias de calor, mal transpomos e entrada do nosso jardim, sentimos a frescura que nele se acolhe. A temperatura está uns graus abaixo da temperatura fora dele. São as árvores, as trepadeiras, as flores, é o carinho que retêm.
In heaven a mesma coisa. Vou andar lá em baixo e, no meio das árvores, é outra a geografia.
Em qualquer dos casos, o tempo suspende-se.
Hoje estava sentada no meio das flores, o cão deitado, os passarinhos a cantar. Pensei que poderia ficar assim saecula saeculorum. Talvez bastasse não me mexer. O mundo à minha volta a girar e eu ali, parte do tempo, imóvel como o tempo, uma partícula imaterial suspensa na infinitude do espaço.
E para que não protestem com o teor da conversa, para quem prefere temas mais concretos, aqui está um vídeo que poderia muito bem servir de inspiração a quem tem a responsabilidade de melhorar os espaços públicos.
THE MINI FOREST - Rewilding using the Miyawaki Method
Terrell Wong is about to plant 100 trees in her small Toronto backyard, a dense mini forest based on the Miyawaki Method. What at first seems like a simple act soon evolves into a complex story about dirt, lawns, fungus, wildlife, native species, and finally the human brain. An anti-lawn anthem from director David Hartman, The Mini Forest explores this innovative form of afforestation and the importance of restoring the native woodlands that once covered so much of Canada and the World.
De vez em quando durmo até vir a mulher da fava rica. Este sábado de manhã foi o meu marido que me acordou, o que sempre me arrelia soberanamente. Mas, quando ia irritar-me com ele por estar a impedir-me de dormir, vi as horas e arrepiei caminho. E, apesar de sentir que dormia mais, claro que me levantei. Adoro dormir assim, de um só sono, descansada, sem sonhos stressantes daqueles em que não sei onde deixei o carro ou em que tenho que apanhar o avião e não me despacho porque estou carregada de malas e porque os miúdos não se despacham ou em que estou num hotel e tenho que ir para uma reunião mas não encontro o sítio onde se servem as refeições e quando finalmente o descubro já não há nada para comer e tenho que me ir embora em jejum para não chegar atrasada. Esta noite não, um relax total, o soninho dos justos.
Depois de almoço, estive a apanhar banhos de sol enquanto lia o 'Louvor da Terra' de Byung-Chul Han. Abro ao calhar e leio. Nem me importo de ler o que li na véspera. Até fiz dois vídeos que publiquei no instagram. Já antes o tinha feito. Aquelas palavras simples sobre flores, sobre a terra, sobre o silêncio agradam-me imenso. É o que sinto. Estou ali a ouvir os passarinhos, a ver a aragem a fazer dançar as elegantes hastes do jasmim amarelo, o cão deitado ao sol, ao meu lado, e penso que estes são dias de tranquilidade e felicidade. O contacto directo com a natureza deixa-me zen, zen, zen.
Ontem o meu marido chamou-me, disse que estava um pássaro morto ao pé da porta, eu que lá ficasse a tomar conta enquanto ele ia buscar a pá, não fosse o nosso cãomaluco querer pegar-lhe. Ainda fui, mas recuei logo. Um passarinho morto é muito triste, não suporto. Estava debaixo do ninho que está lá em cima. Era um ninho de andorinhas mas nunca mais vimos nenhuma. O ninho foi, pois, ocupado por outros. No outro dia, o meu marido disse que viu um passarinho pequeno no chão, disse que devia ter caído do ninho. Mas nunca o vi. Não sei se foi esse que morreu. A natureza tem destas coisas. A morte faz parte dos ciclos da vida. Talvez a alma do passarinho tenha voado para outras paragens. E digo isto por dizer pois há mistérios sobre os quais não ouso pronunciar-me.
Mas, para ser sincera, no outro dia vi um vídeo que me deixou a pensar. Partilho convosco. Não conhecendo nós senão menos do que um cagagésimo do que há para saber, por vezes dou por mim com pensamentos que são, certamente, irracionais. Nada a ver com religião. Apenas desconhecimento do que a ciência ainda tem por descobrir.
Dois bebés conversam no útero
Adiante.
Sendo dia de derby, os benfiquistas ficaram-se por um lado com a sua turma de aficcionados, os sportinguistas por outra, identicamente em grupo, e o meu marido, nestes dias, de tão ansioso que fica, recusou-se a ver. Acho que é superstição. Tenho ideia de que toda a gente, por mais racional que seja, quando a coisa se refere a um amor especial, fica com a mente toldada. Por isso, de tarde, fomos passear para a praia.
E a seguir fomos comprar um frango assado a uma churrasqueira de que ouvimos dizer que tem um tempero especial. Vi que tinham lá chamuças e, como gosto imenso, trouxe também quatro.
Quando chegámos a casa, vinha com aquele cheirinho bom do frango e das chamuças e, feita gulosa e lambona, peguei logo numa... e pimbas, uma baita dentada, um bocadão. E o que vos posso dizer é que não disparei, na vertical, em direcção ao tecto porque abalei a correr em direcção à torneira para apagar o fogo com um copo de água. Nunca tinha visto coisa assim. Quem é que se lembra de que uma chamuça pode ser picante, picante, picante? Caraças. Saborosa mas... vai lá, vai. Ao jantar, já avisado, o meu marido foi com calma. Só uma trinca numa ponta. E, mesmo assim, teve que atacar logo com cerveja. Quanto ao frango, parece que a propaganda do tempero era um pouco exagerada.
Entretanto, os meninos que já estavam todos feitos para irem para o Marquês com o pai tiveram que adiar o festejo. E os benfiquistas, durante grande parte do tempo, estiveram a sofrer e também ficaram em stand by. O meu marido ficou contente. Tão contente ficou que o cão até ficou espantado, desatando a fazer disparates de roda dele.
Apesar de nunca me ter sentido próxima, a verdade é que me sinto cada vez mais distante da Igreja Católica. Tudo ali me incomoda: o fausto, os preceitos e preconceitos, a inutilidade em termos práticos e a vocação para a formatação de mentes, o reaccionarismo, o machismo na prática, o hábito de encobrimento de crimes praticados no seu seio, pelos seus agentes -- tudo me causa até repulsa.
Ver todos aqueles cardeais, todos homens (agonia-me que as mulheres estejam excluídas de toda a sua hierarquia -- e agoniar é mesmo o verbo que melhor define o que sinto), lustrosos, paramentados, com fitas e dobras e dobrões, ornamentados a ouro, tudo aquilo me incomoda soberanamente. Apetece-me chamar-lhes parasitas, pimpões, seres anafados, instalados.
A meu ver, a fazer sentido haver uma igreja, seria para ser um local de inclusão, de ajuda a quem precisa, local despojado, apenas com o essencial, guardando tudo o que haja para distribuir pelos pobres, pelos desprotegidos, para ajudá-los a reerguer-se, a desenvolver-se. E sempre sem juízos, sem catecismos, sem aqueles moralismos que tresandam a beatice.
Simpatizava com Francisco, como pessoa, apesar de me incomodar que não fosse tão explícito quanto devia para afastar a beatagem que continua a penalizar as mulheres que praticam aborto ou a olhar de lado para os homossexuais. Mas, apesar das peias, era uma mente aberta, era bondoso, era empático e próximo.
E o facto de rejeitar aqueles ornamentos cagões em sedas encarnadas e douradas e o facto de usar uma cruz simples e não uma pesada cruz em ouro agradava-me.
Nada sei de Robert Francis nem tenho nada a dizer sobre ter escolhido ser conhecido por Leão. Olho para ele e acho que tem um sorriso simpático. Mas não gosto de tanto ornamento. E nem é não gostar, é mesmo desagradar-me.
De resto, apenas gostaria que fosse um homem corajoso que rompesse com tudo o que me desagrada... mas, não sei porquê (ou talvez saiba), acho que isso não vai acontecer.
Por isso, estou a escrever isto e o fumo que estou a deitar não é propriamente muito branco.
Se nunca estive ligada à Igreja a verdade é que, cada vez mais -- à medida que vou assistindo a histórias continuadas de abusos, encobrimentos e meias palavras --, me incomodam demais todos os luxos, rituais, ortodoxias, hipocrisias, manipulações a partir da psicologia de massas, alienação de consciências que todos os agentes da igreja perpetuam.
Não obstante, e apesar de também tenha achado que Francisco, o Papa, vacilou quando deveria ter sido firme ou compactuou quando nada tinha a perder e podia ter cortado a direito ou usou palavras elíticas quando se exigiam palavras inequívocas, a verdade é que simpatizava com Jorge Bergoglio e reconheço que foi melhor que os antecessores.
Mas, neste momento de comoção quase colectiva -- em que parece que não se fala de outra coisa senão nas memórias pessoais que cada um tem com ele ou das suas virtudes ou do que ele disse ou fez --, o que penso é no homem idoso, doente, de saúde débil, certamente muito limitado na sua autonomia, tendo que ser lavado, com fraldas, medicado até mais não poder, com dificuldades respiratórias, que, apesar de tudo, conseguiu arranjar forças para ir desejar boa Páscoa à multidão.
Quando o vi, ainda antes de ser internado com a pneumonia bilaterial, pensei: está tão inchado, provavelmente já a fazer retenção de líquidos, se calhar os rins já a começarem a falhar. Depois achei que não devia ser tão pessimista e pensei que talvez fosse apenas cortisona para tratar a bronquite. Pode parecer parvoíce mas depois de ter acompanhado a situação do meu pai e, mais recentemente, a da minha mãe, eu ainda não consegui desligar-me deste hábito de vigiar sintomas, de intuir (ou temer?) o significado do que vejo.
Quando o meu pai morreu, já está quase a fazer 5 anos, estávamos confinados, impossibilitados de circular, eu no campo, a trabalhar de manhã à noite em teletrabalho e sem poder meter-me à autoestrada para ir lá a casa (e, com receio de que, se fosse, pudesse contagiá-los, pois, aparentemente, isso tinha acontecido com o pai de uma pessoa que me era próxima). E, em simultâneo, eu inquietava-me diariamente, e não era pouco, com a situação do meu pai. Primeiro foi a minha mãe que, em pleno pico de covid, para não ferir a susceptibilidade de fisioterapeuta, continuou a recebê-la apesar de ser totalmente desaconselhado. Depois, tendo mesmo que receber a senhora que ia fazer a higiene ao meu pai e dar-lhe a comida através da sonda nasogástrica, não lhe pedia que se descalçasse e, até muito tarde, tinha vergonha de lhe pedir que usasse máscara. Eu passava-me com a minha mãe por continuar a achar que só acontecia aos outros e parecia preferir correr riscos para não melindrar as duas, não fossem elas levar a mal se ela e suspendesse os serviços de uma e pedisse à outra para andar de máscara e calçasse outra coisa quando entrasse lá em casa. Isto, no início, quando não se sabia como é que o vírus se propagava e as notícias nos traziam diariamente um número crescente de mortos e de ventilados.
Mas o pior foi quando começou a achar que o meu pai estava inchado. Nessa altura, já tinha passado para o polo oposto, já tinha terror de tudo. Telefona-me cheia de medos de tudo, chorava. Muito a medo ligou para o INEM, pois recava que eles próprios fossem fonte de contágio. Mas lá o fez e eles lá foram a casa. Disseram que o meu pai estava a fazer retenção de líquidos e teria que ir para o hospital. Mas como estava a oxigénio, teria que ir para a ala covid. E aí a minha mãe não quis. E então ligou-me outra vez, a chorar, aflita, a dizer que não queria, senão ele apanhava covid. Depois pôs-me a falar com os do INEM. Coitados, que poderiam dizer? Não poderiam isolá-lo pois o hospital, na ala covid, estava cheio. Faltavam os meios. E não poderiam levá-lo para o hospital contra a vontade da família. E a minha mãe chorava, não queria que ele fosse. Recomendaram, então, que se chamasse médico a casa pois certamente receitaria Lasix. Assim se fez. E o médico, mostrando que a situação o preocupava, foi o que receitou. E o meu pai melhorou.
Mas, ao fim de algum tempo, a minha mãe voltou a dizer que ia voltar a chamar o INEM pois o meu pai estava outra vez inchado. Chorava, chorava. Insisti para que confiasse que ele não ia apanhar covid e o deixasse ir para o hospital pois a situação poderia ser grave. Tive um mau pressentimento. Morreu poucas horas depois.
Com a minha mãe, que foi aquela situação de que aqui falei, uma situação rápida, complicada, em que tudo se agravou abuptamente, senti um aperto no peito quando vi como tinha um braço todo inchado, a mão toda inchada. A médica e as enfermeiras diziam que era do cateter, do soro, da mão imobilizada, sei lá. Mas aquele inchaço assustou-me como se fosse mais uma confirmação da sentença de morte.
Até ao fim, a minha mãe parecia preocupar-se com pequenas coisas, como se quisesse ignorar o que era verdadeiramente preocupante. Por exemplo, queixava-se que tinha as unhas daquela mão grandes. Dizia-me que, antes de ter sido internada, tinha conseguido cortar as da outra mão mas não tinha conseguido cortar as da mão direita. Como aquilo parecesse afligi-la sobremaneira, pedi à enfermeira se poderiam fazer isso, mas disseram-me que não tinham serviço de manicura. No dia seguinte, levei corta-unhas. E foi para mim um momento muito angustiante. Por um lado, era a situação de diminuição da minha mãe, até tão pouco tempo antes tão autónoma e, naquele momento, a já não ser capaz de cortar as próprias unhas e a querer que eu lhas cortasse. Por outro, a situação anacrónica de estar em situação terminal e, no entanto, tão preocupada com as unhas. Mas, o pior de tudo foi que mal se conseguiam cortar pois a mão quase parecia um balão e não havia espaço entre a unha e a pele do dedo para eu poder encaixar o corta-unhas. Tentei que ela não percebesse a minha angústia. Fingi que estava a cortar sem dificuldade, disse-lhe que já estavam bem. Mas o meu coração estava apertado, apertado.
E depois já não era só aquele braço inchado. Era apenas o mais inchado. Eu vigiava, tentando fazer de conta que não via, mas o ânimo fugia. Um dia, estava ela no cadeirão, com as pernas sobre o sofá. Vi que as pernas também estavam inchadas. Senti um tremendo pavor. O coração dela quase não funcionava, a taxa de ejecção estava reduzida a quase nada, os rins também já não conseguiam funcionar bem. Isto já para não falar que, no peito, o tumor lhe crescia todos os dias. A morte a avançar diariamente, a invadir o seu corpo.
Jorge Bergoglio felizmente não tinha nenhum tumor a devorá-lo mas tinha também insuficiência cardíaca e respiratória. Chega a uma altura em que o corpo atinge o seu limite. Por mais que se tente, que se trate, por mais que se faça de tudo, o corpo já não consegue assegurar o seu cabal funcionamento. Nessas alturas, o sacrifício que o corpo faz para se manter vivo é inglório, já é apenas sofrimento.
Jorge Bergoglio morreu. O seu corpo humano não conseguiu mais mantê-lo vivo.
Apesar de tudo, recordá-lo-ei com simpatia.
E só espero que o próximo Papa seja bondoso, corajoso, simpático, humanista, inclusivo, justo, aberto, valente.
Depois de influencers que não existem -- e que, não obstante, têm seguidores e rendimentos --, depois de vídeos falsos em que pessoas conhecidas, com a sua voz, aparecem a dizer coisas que não disseram, e depois de vermos um avanço progressivo da IA nos mais diversos domínios (tornando-se quase demoniacamente descontrolada quando energizada pelas redes sociais), eis que o impensável acontece: Jesus, ele mesmo, substitui-se aos padres e fala directamente aos crentes... ainda, por cima, em 100 línguas. Isto, claro, através de um algoritmo de inteligência artificial.
O assunto é tão extraordinário que tomo a liberdade de aqui transcrever na íntegra o artigo do Guardian da autoria de Ashifa Kassam (tradução directa via Translate da Google):
A pequena igreja sem adornos é há muito considerada a mais antiga da cidade suíça de Lucerna. Mas a capela de Pedro tornou-se sinónimo de tudo o que há de novo depois de se ter instalado um Jesus com inteligência artificial capaz de dialogar em 100 línguas diferentes.
“Foi realmente uma experiência”, disse Marco Schmid, teólogo da Igreja. “Queríamos ver e perceber como as pessoas reagem a um Jesus AI. Sobre o que falariam com ele? Haveria interesse em falar com ele? Provavelmente somos pioneiros nisso.”
A instalação, conhecida como Deus in Machina, foi lançada em agosto como a mais recente iniciativa de uma colaboração de anos com um laboratório de investigação de uma universidade local sobre a realidade imersiva.
Depois de projetos que experimentaram a realidade virtual e aumentada, a igreja decidiu que o próximo passo seria instalar um avatar. Schmid disse: “Tivemos uma discussão sobre que tipo de avatar seria – um teólogo, uma pessoa ou um santo? Mas depois percebemos que a melhor figura seria o próprio Jesus.”
Com pouco espaço e procurando um local onde as pessoas pudessem ter conversas privadas com o avatar, a igreja trocou o padre para instalar um computador e cabos no confessionário. Depois de treinar o programa de IA em textos teológicos, os visitantes foram convidados a colocar questões a uma imagem de Jesus com cabelo comprido transmitida através de um ecrã de treliça. Respondeu em tempo real, oferecendo respostas geradas por inteligência artificial.
As pessoas foram aconselhadas a não divulgar qualquer informação pessoal e a confirmar que sabiam que estavam a interagir com o avatar por sua conta e risco. “Não é uma confissão”, disse Schmid. “Não pretendemos imitar uma confissão.”
Durante o período de dois meses da experiência, mais de 1.000 pessoas – incluindo muçulmanos e turistas vindos de lugares tão distantes como a China e o Vietname – aproveitaram a oportunidade para interagir com o avatar.
Embora os dados sobre a instalação sejam apresentados na próxima semana, o feedback de mais de 230 utilizadores sugeriu que dois terços deles consideraram que se tratava de uma “experiência espiritual”, disse Schmid. “Portanto, podemos dizer que tiveram um momento religiosamente positivo com este AI Jesus. Para mim, isso foi surpreendente.”
Outros foram mais negativos, com alguns a dizerem à igreja que achavam impossível falar com uma máquina. Um repórter local que experimentou o dispositivo descreveu as respostas como, por vezes, “banais, repetitivas e exalando uma sabedoria que lembra os clichés do calendário”.
O feedback sugeriu que houve uma grande disparidade nas respostas do avatar, disse Schmid. “Tenho a impressão de que, por vezes, ele era realmente muito bom e as pessoas ficavam incrivelmente felizes, surpreendidas e inspiradas”, disse. “E também houve momentos em que ele, de alguma forma, não foi tão bom, talvez mais superficial.”
A experiência também enfrentou críticas de alguns membros da comunidade eclesial, disse Schmid, com colegas católicos a protestarem contra o uso do confessionário, enquanto colegas protestantes aparentemente se sentiram ofendidos com o uso de imagens desta forma pela instalação.
O que mais impressionou Schmid, no entanto, foi o risco que a Igreja correu ao confiar que a IA não daria respostas ilegais, explícitas ou ofereceria interpretações ou conselhos espirituais que entrassem em conflito com os ensinamentos da Igreja.
Na esperança de mitigar este risco, a igreja realizou testes com 30 pessoas antes da instalação do avatar. Após o lançamento, garantiu que o suporte estava sempre por perto para os utilizadores.
“Nunca tivemos a impressão de que ele estivesse a dizer coisas estranhas”, disse Schmid. “Mas é claro que nunca poderíamos garantir que ele não dissesse nada de estranho.”
Em última análise, foi esta incerteza que o levou a decidir que era melhor deixar o avatar como uma experiência. “Para colocar um Jesus assim permanentemente, eu não faria isso. Porque a responsabilidade seria muito grande.”
Foi rápido, no entanto, a citar o potencial mais amplo da ideia. “É uma ferramenta realmente fácil e acessível, onde se pode falar sobre religião, sobre o cristianismo, sobre a fé cristã”, disse, pensando que poderia ser remodelado numa espécie de guia espiritual multilingue que pudesse responder a questões religiosas.
Para ele, a experiência – e o grande interesse que gerou – mostrou-lhe que as pessoas procuravam ir além da Bíblia, dos sacramentos e dos rituais.
Schmid disse: “Acho que há sede de falar com Jesus. As pessoas querem uma resposta: querem palavras e ouvir o que ele está a dizer. Acho que esse é um elemento disso. Portanto, é claro que há a curiosidade disso. Querem ver o que é isso.”
Eu não sei qual o culto em que esteve imersa Glenn Close, a grande Glenn Close (ainda há dias a vi na RTP 2 no excelente 'A mulher') desde a infância até atingir a idade adulta. Mas os testemunhos que tenho visto em que ela conta como a confissão permanente era, na realidade, um acto de humilhação sobre ela, um acto em que ela se sentia, ou a faziam sentir, diminuída, (no fundo, assediada) e como toda a sua vida afectiva foi prejudicada pelo mal que tudo aquilo lhe fez, deixam-me francamente incomodada.
Quantas pessoas, quantas, não conseguem ser autênticas, livres, genuínas, ao longo de toda a sua vida porque as condicionantes impostas pelos cultos religiosos as deixaram castradas? Quantas pessoas continuam, mesmo em adultas, a ter dificuldades nos seus relacionamentos, com medo de pecar, com medo de infringir algum mandamento, porque durante o período em que a sua personalidade se estava a formar, foram manietadas, manipuladas, porque o medo da culpa lhes ficou inscrita nos genes?
Quando vejo tantos jovens envolvidos em actividades promovidas pela igreja católica, completamente alienados -- cheios de boas intenções, é certo, mas tudo tão longe do que é a realidade em todas as suas diversas vertentes -- fico a pensar em que é que se tornarão, quando adultos?
Conheço vários católicos praticantes e dos que conheço como mais praticantes o que lhes vejo em comum é o estreitamento intelectual, parece que embrutecem, parece que se fecham ao mundo, parece que ficam a pensar que o mundo são eles. Teoricamente estão imbuídos dos melhores sentimentos mas tudo gira em volta deles, dos seus grupos que frequentam a missa, que frequentam retiros espirituais, que organizam peregrinações, e cada vez mais pensam e vivem em circuito fechado. E isso nunca pode ser bom.
Há uns quantos anos, íamos de carro a caminho de Lisboa quando nos aproximámos de um grupo que ia em sentido contrário, na direcção de Fátima, em peregrinação.
Nada de mais.
A questão é que o grupo, provavelmente auto-designado grupeta, tinha um ar super bem (leia-se, supébem). Todos vestidos de igual como é normal nestas andanças, tshirt colorida e boné igual, um com uma bandeira na mão, também igual. Iam a cantar, com ar empolgado. Nitidamente iam motivados e, provavelmente, sentiam-se orgulhosos pelo seu feito.
Quando nos cruzámos, vi -- sem grande surpresa -- que o líder do grupo era um bem conhecido meu, católico até dizer chega, daqueles que andam sempre metidos nestas cenas ou a organizar grupos de reflexão, retiros, ou coisas assim. Tenho quase a certeza que pertence à Opus Dei. E é daqueles que ocupam lugares de topo nas empresas sem serem nenhuns craques mas por serem uns fofos, sempre a espalhar o bem e sorrisos, com crucifixo em cima da secretária.
Fiz-lhe adeus e ele respondeu, todo santificado, mas sem ver quem eu era, estava naquela de cantar e de ir feliz a acenar a toda a gente, como se a sua fé e a alegria de a ter devesse ser disponibilizada a quem quisesse deixar-se contagiar.
Não é um dos nomes que figura na capa do livro, mas a mulher lá está. A ela não a conheço pessoalmente. Mas deve ser como todos os outros que conheço e lá estão e como outros que são assim mas que não foram respingados pelo Láparo.
As generalizações são perigosas e eu evito fazê-las. Há lá um, pelo menos um, que é culto, inteligente, espírito aberto. Destoa ali. Não devia ali estar. Mas, tirando esse, do que conheço, de forma geral, os betos beatos são gente pouco culta, gente que não faz ideia do que é a vida, do que é o mundo, gente que não lê. Gente que, para dizer a verdade, em contexto profissional ou mesmo social, não apenas são um bocado limitados como até não são muito de fiar. Mas, com os fracos recursos intelectuais de que dispõem, acham que sabem muito e que são superiores aos outros, em especial aos incréus. Por isso, organizam coisas com forte componente católica para a qual convidam todos, convencidos que vão catequizar os outros mesmo que seja quase à força, olhando de lado para quem não adere, como se nem percebessem o que passa pela cabeça dos que pensam de maneira diferente.
Por isso, se tiverem poder, são até um bocado perigosos.
Pela parte que me toca, sempre me mantive a milhas. Digamos que sempre consegui ter estatuto de excêntrica, de marginal. Não fui convidada nem frequentei alguns inner circles em que estaria inevitavelmente metida caso fosse na cantiga. Mas como esses inner circles sempre me cansaram até à exaustão e, no balanço do deve e haver, sempre achei que o que perdia era muito inferior ao saudável sentimento de liberdade e limpeza de espírito, a minha opção sempre foi a de guardar distância.
Por mim, prefiro ver a peregrinação aqui abaixo. Uma coisa que parodia bem o que são estes betinhos beatinhos.
Como geralmente acontece, o Dia de Ano Novo foi vivido cá em casa. Só por isso já é, para mim, um dia feliz e a melhor maneira de começar o ano. E o meu desejo é que seja também um dia feliz para todos os que aqui partilham o dia.
Claro que, enquanto isso, fui fazendo um esforço para não deixar que a nuvem sombria que paira sobre mim não transparecesse e não ensombrasse também os demais.
Agora estou com as unhas pintadas de azul claro e, em algumas, há desenhos em cor de rosa, em branco e em dourado. Foi a minha menina que as pintou, de tarde, tal como pintou as da tia. E a tia pintou as dela.
E o meu menino mais novo, sempre reguila e esquivo, hoje estava mais meiguinho, deixou-se abraçar e beijar sem protestar. E todos aceitaram juntar-se na escada para uma fotografia em família que ficou muito bem.
Momentos sempre bons, vividos em harmonia e doçura.
Para não me pôr para aqui com mais votos ou com ladainhas, avanço já para o lado prático da questão.
Para o almoço fiz duas saladas, um rolo de salmão, arroz de carnes e salada de frutas
Vou contar como fiz.
Para picar:
Queijos, rolinhos de presunto e tostinhas com trufas trazidas pela minha filha, azeitonas.
Para começar:
Salada de salmão
Coloco alface iceberg no fundo (do ponto de vista vitamínico, acho que esta alface é a mais fraca. Mas é do agrado de todos, pelo que aposto nela para todos comerem salada, nomeadamente os miúdos). Era para ter posto abacates mas esqueci-me. Dois queijos mozzarellas frescos desfiados. Salmão fumado. Tempero com azeite, um pouco de sumo de lima e orégãos.
Salada de ovo
Numa tigela de vidro, coloco alface iceberg em baixo. À parte misturo maionese, ketchup e três ovos cozidos, um quarto de cebola branca (doce) migada, umas quantas azeitonas pretas sem caroço migadas. Coloco essa papa sobre a alface e envolvo. Por cima, migo dois ovos cozidos e mais umas quantas azeitonas pretas descaroçadas picadas. Passo um leve fio de azeite e uns quantos orégãos.
Para continuar:
Rolo de salmão
Numa frigideira, fritei, em azeite, uma cebola branca bem picada. Juntei salsa picada. Quando a cebola estava bem mole, juntei uma maçã cortada em cubinhos minúsculos. Temperei com sal. Deixei que quase se desfizessem. Depois juntei duas embalagens de espinafres frescos. Tapei a frigideira e deixei que os espinafres amolecessem. Misturei.
Temperei os lombos de salmão com um pouco de sal, abundante sumo de lima e cebolinho picado.
Estendi uma folha de papel de ir ao forno. Em cima coloquei um rectângulo de massa folhada fresca. Na parte central da massa, longitudinalmente falando, coloquei a cama de espinafres (e cebola e maçã). Por cima os lombos de salmão temperados. Cobri com abundante, mas ponham abundante nisso, mozzarela ralado. Fechei o rolo, puxando a massa para cobrir o dito recheio. Para dar graça, fiz-lhe suaves golpes em diagonal. Antes tinha batido um ovo inteiro (ia lá desperdiçar a clara...) com o qual pincelei o rolo.
Peguei no papel sobre o qual o rolo tinha sido montado e enfiei-o numa forma de bolo inglês. Ensinou-me isso o meu filho: o rolo fica aconchegado, não se corre o risco de abrir e desmanchar-se.
Por acaso, não fiz um: fiz dois rolos. O outro foi igualzinho só que, por cima, depois de pincelar com ovo, espalhei-lhe em cima sementes variadas, incluindo de abóbora, e ainda orégãos.
Antes tinha posto o forno a aquecer a 200º. Quando lá enfiei as formas com os rolos de salmão baixei para 170º. Não vi o tempo, talvez uns 40 ou 50 minutos, não sei. Sei que a meio quando me pareceu que corria o risco de tostar rapidamente demais, reduzi para uns 150º.
Arroz de carnes
Num panelão coloquei azeite, duas grandes cebolonas picadas, um bom ramo de salsa picada, dois tomates bem maduros cortados aos pedaços, louro, dentes de alho, três grandes cenouras cortadas aos cubinhos, uma mini (sim, mini: cerveja), rojões de porco e moelas bem lavadas e cortadas aos bocadinhos. Passado um bocado juntei coxas de frango do campo ao qual tirei previamente a pele. Apenas para dar um certo leve apontamento de sabor e graça, juntei um niquinho de bacon aos bocadinhos e um outro de chouriço de carne, de boa qualidade, também aos bocadinhos.
Enquanto cozinhava retirei um pouco de caldo para outro tacho. Aí coloquei carne cortada em strogonoff de novilho dos Açores. Depois de levantar fervura, um ou dois minutos e desliguei. Acho que assim fica mais macia.
Quando as outras carnes estavam macias, desossei as coxas de frango. Juntei água a ferver para ficar quase o dobro da quantidade de caldo relativamente à quantidade de arroz. Quase porque depois ia chegar mais caldo. Ajustei o tempero de sal. Quando levantou fervura, juntei o arroz basmati. Quando estava quase, juntei a carne de novilho e o tal respectivo caldo. Antes que estivesse o caldo todo absorvido, vazei tudo para um tabuleiro de forno.
Enfeitei com tirinhas de bacon e rodelas do tal chouriço. Foi ao forno para acabar de cozinhar, para secar e dourar as carnes enfeitantes da superfície.
Para terminar
Doces
Usei os bolos que sobraram do Natal e que descongelei, um bocado de tarte de amêndoa que a minha nora trouxe e que tinha sobrado da véspera, um doce de limão merengado que comprei e bombons.
Salada de frutas gelatinada
Numa tigela, coloquei duas maçãs cortadas aos cubinhos, quatro nectarinas aos cubinhos, vários bagos de uva sem grainha. Juntei uma embalagem de kefir de morango e umas quantas de gelatina de morango. Tudo sem açúcar. Misturei. Cobri de mirtilos.
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Temo-nos revezado nas visitas à minha mãe. Durante a semana fui eu, no fim de semana, os meus filhos. Quando regressaram, contaram que, apesar de tudo, estava menos queixosa. Menos mal, portanto.
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Saíram de cá, depois do lanche, já era noite, já os meninos tinham brincado, já quase todos tinham jogado a um jogo de cartas (claro que o 'quase todos' não me inclui, não consigo jogar a estas coisas, não tenho paciência para aprender regras).
Consegui que levassem alguns restos (porque, já se sabe, sempre com medo que falte, faço invariavelmente comida a mais).
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Quando aqui me sentei adormeci logo. Depois, primeiro que conseguisse energia para escrever isto foi difícil. Durante esse processo, de despertar, estive a vir alguns vídeos, por vezes adormecendo pelo meio, dos quais partilho estes três.
Anderson Cooper on freeing yourself from the burden of grief
The World Ahead 2024: five stories to watch out for
Why the world is going crazy—and how to win back our minds | Jamie Wheal | Big Think
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Nota: No dia de Natal de manhã, andando eu a lamentar não termos enfeitado a casa, o meu marido, madrugador, foi apanhar musgo e, sobre um tabuleiro, montou um presépio feito com presepiozinhos que gosto de coleccionar e com duas figurinhas que eram de quando ele era pequeno. Face à gripe da minha filha, como contei, o Natal foi em casa dela pelo que só hoje puderam ver o presépio feito de vários presépios. Por ter sido iniciativa do meu marido, gostei imenso. Direi mesmo que fiquei sensibilizada.
A fotografia não ficou famosa, reconheço..., mas a esta hora não me apetece ir fazer outra. Mas acho que dá para ficarem com uma ideia, não dá?
No outro dia já aqui tinha aludido e, foi já depois de o ter feito, ao pôr a box a andar para trás, para espreitar o Eixo do Mal, que vi que no fim aparecia Christopher Hitchens a dizer basicamente o mesmo que eu andava a ver como abordar sem que me caísse a casa em cima.
E vinha andando a dizer ao meu marido. Ele diz que não vê que tenha solução. Eu também não.
Mas quando a coisa está mal feita, mesmo que a gente não veja solução, há uma premissa que tem que se ter em mente: se assim não está bem, e não está bem de raiz, alguma outra solução há-de haver. Mal como está é que não pode ficar.
E uma coisa é agora estar mal, conjunturalmente mal. Outra é estar mal desde sempre, estruturalmente mal.
E há uma observação que deve ser feita. E é a seguinte: os israelitas têm tanto direito a habitar território palestiniano como os palestinianos. Isto porque há registo deles por lá andarem desde o início, tal como todos os outros.
A questão não é essa, A questão é que fundar um país com base numa religião é um disparate. Não pode dar certo. Um país é um lugar que não pode ser traçado a régua e esquadro no meio de uma outra terra e dizer que aquele polígono inventado e desenhado é um país novo, um país para judeus.
Não faz sentido. Não poderia nunca correr bem.
Os judeus, os católicos, os muçulmanos, os budistas, os agnósticos e os ateus devem poder viver onde quiserem. Religião não pode ser sinónimo ou base de uma nação desenhada de propósito.
De propósito fazem-se, e se calhar mal, os canis para meter os cães. Ou os currais para meter o gado.
Não se faz um país para meter os católicos. Outro para os ateus.
Vamos imaginar que havia uma perseguição insana aos agnósticos, que tinham que fugir, e alguém se lembrava de desenhar um país no meio de Portugal e dizer: aqui agora é um país novo, para os agnósticos.
Não faria sentido, não ia correr bem.
Os judeus poderiam viver e ser acolhidos em qualquer país, tal como já o fazem. Há judeus por todo o lado, e bem, e não apenas em Israel.
Não me faz sentido um país, Israel, ali enxertado no meio de um espaço todo ele habitado por gente dada a radicalismos, gente que não pode com judeus. É que não foi ceder um terreno para uma limitada comunidade (de agricultores, a viver em comunidade) se instalar... Foi criar um país com leis próprias, forças armadas próprias, etc.
Foi uma solução abstrusa, não sei se utópica se quê, uma solução artificial, fadada ao insucesso.
Só que aconteceu.
Israel é hoje um país próspero, desenvolvido, científica e tecnologicamente avançado. Não é coisa que com a 'ligeireza' com que foi concebida, agora se possa apagar.
Mas da mesma forma que acho um disparate o conceito de Israel ser um país baseado numa religião, acharei o mesmo de qualquer outro que também o seja. Dá forçosamente radicalismo, fanatismo, ditadura, desgraça. Por isso, por aquelas bandas, conceitos como liberdade, democracia, multirreligiosidade, inclusão, humanismo, etc, são quase miragens. Portanto, em cima de tudo, haver ali um país que tenta ser isso tudo só pode correr mal.
Claro que Israel, país habitado por gente acossada desde sempre, em especial durante o nazismo, tornou-se hiper-reactivo, hiper-defensivo. E, já se sabe, a melhor defesa é o ataque. E, portanto, tem sido a felga que se sabe.
Agora como pode ser resolvido isto?
Não faço ideia.
Para ser de novo traçado a régua e esquadro só mesmo numa região desabitada, terra de ninguém, coisa que não ferisse susceptibilidade alguma.
O lógico é que se dissesse: não há cá mais países que têm como matriz existencial uma religião. Portanto, acabou-se. E, pessoas como quaisquer outras, poderiam instalar-se em qualquer país, encontrando-se formas de os acolher.
Só que é possível desmembrar um país? Presumo que não. E, se fosse possível, não seria cruel fazê-lo? Presumo que sim.
Se a Palestina fosse um espaço multicultural, multi-religião, democrático, humanista, poder-se-ia dizer encontrar uma solução inteligente, racional. Mas, tantas as feridas, tantos os massacrantes antecedentes, não creio que seja possível.
Mas alguma solução há-de existir. Algum futuro em paz, naquela zona, há-de ser possível.
Mas eu não sei nada de política externa, não sei de geografia política, não sei nada de diplomacia, não sei de nada disto. Mas há quem saiba.
Penso, pois, que é chegado o tempo dos líderes, dos políticos, da gente humanista e com visão.
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De notar que não estou a desculpar a barbárie do Hamas nem nada que se pareça, nada, nada, nada.
E também penso que Israel se encontra numa situação dificílima, estão cercados, existencialmente ameaçados, com um inimigo que se acobarda, escondendo-se atrás ou sob civis inocentes. E que só isso pode justificar a violência e a brutalidade do que está a acontecer.
E, por tudo isto, ainda mais me convenço de que a solução para esta tragédia, para ser real e sustentável, tem que ser tão radical quanto foi, há décadas, a da criação de um novo país.
Sou absolutamente avessa a ajuntamentos. Ver muitos milhares de pessoas em cima umas das outras é algo que me perturba. Se calhar sou bicho do mato. Não digo que não.
À hora de almoço vi milhares de pessoas a passo de caracol, ao sol, ao monte, numa estrada a caminho do local junto ao Tejo. A impressão que aquilo me faz. Parece-me um rebanho insano. Qual o sentido, a utilidade, o propósito daquilo? Juro que não percebo.
Que, numa de fazer bem aos mais desfavorecidos, se tivesse arranjado maneira de aproveitar toda a boa vontade dos jovens e os pusessem a construir parques, casas, a plantar árvores, a fazer qualquer coisa de útil para os pobres ou para o país ou para o planeta, eu ainda percebia. Agora desaproveitar tanta energia para andarem apenas de um lugar para o outro, com cantiguinhas infantilizadas, com conversinhas pueris... acho uma oportunidade perdida. E todos os voluntários a mesma coisa. Acham-se úteis a fazer coisas e mais coisas em volta de uma grande inutilidade. Não sei como dizer isto sem parecer uma desmancha-prazeres perante pessoas que andam cansadas e felizes por fazerem o bem mas, na verdade, tudo me parece uma coisa frustantemente absurda.
Agora, à noite, quando ligámos a televisão, vimos uma multidão de jovens preparados para dormir ao relento. Felizes da vida, claro. O Sudoeste ou o Meco (mas em versão pia pois provavelmente não há charros nem sexo; e, pelo menos por esse lado, os pais podem estar descansados). Woodstock new age. Peace and love.
Que não se pense que acho mal os jovens estarem em acampamentos. Não acho. Acho piada a ver jovens juntos, a curtirem o convívio e a night, é bom. Mas a verdade é que para eles é capaz de ser uma experiência fantástica, muito convívio, muita hormona junta, noitadas ao relento sob as estrelas é do mais romântico e fixe que há. Mas, muito racionalmente falando, tirando isso, é conversa fiada. Milhõe$ gastos (em vez de serem gastos em obra social ou em acções a bem da natureza), horas de televisão à desgarrada (só aflorei, não vi). quando, na verdade, nada de concreto e útil se fez nem nada de especial há a dizer.
Claro que o Papa diz muita coisa acertada e apela à inclusão e ao amor e, é certo, ainda bem que não é um fanático, radical, fundamentalista. Mas, em concreto, tudo espremido, o que é que aqueles milhares de jovens vão fazer com o que ouviram? Bola. Sorriem com ar beatificado, é certo. Mas, de concreto, isso vale bola.
E que não se pense que quem participa nisto ou quem vai à missa é melhor que os outros. Melhor que eu, por exemplo, Dos maiores sacanas que conheço -- gente sectária, cínica, indiferente perante as dificuldades -- são católicos praticantes, beatos, todos de missas, retiros, peregrinações. Se calhar é coincidência mas é verdade.
Não quero dizer que são todos assim. Conheço outros que não são assim, que são simplesmente alienados, entretêm-se com cursos para casais e coisas do género, coisas completamente fúteis, banalidades ditas como se fossem grandes ensinamentos.
Portanto, tomara que os jovens, os portugueses e os de todo o mundo, se dediquem à aprendizagem, que gostem de ciência e de arte, que sejam humanistas, que sejam bondosos, que sejam inclusivos, que tenham a mente aberta, que lutem que nem doidos pela liberdade e pela democracia e pela defesa do planeta e que não se dispersem com coisas que servem apenas para fazer de conta.
O Presidente Marcelo consegue sempre surpreender-me e sempre pela negativa, o que voltou a acontecer nas JMJ.
A forma com o Presidente tem acompanhado a visita do Papa -- desde a tentativa que fez para "desconjuntar" Sua Santidade quando o cumprimentou pela primeira vez, passando pela presença contínua, com ar enlevado, nas diversas cerimónias e culminando hoje (veremos o que mais fará o Sr. Presidente até ao fim da visita Papal) com a subida a pé o Parque, dando autógrafos e tirando selfies -- revela um provincianismo e uma constante ânsia de protagonismo que ultrapassam o razoável.
Sendo Portugal um estado laico, parece-me impossível que estas manifestações de conluio com a Igreja Católica sejam feitas como Presidente da República; e, se são feitas a nível individual, como cidadão com opções religiosas legítimas, isso deve ser devidamente esclarecido e publicitado.
Não podemos nem devemos esquecer as mais do que infelizes declarações do Sr. Presidente sobre os abusos sexuais na Igreja numa tentativa, felizmente, frustrada, de tentar minimizar as responsabilidades da Igreja.
Se é verdade que o Papa tem algumas posições interessantes sobre vários temas e parece tentar combater o que de mais errado acontece no seio da Igreja, não é menos verdade que o Papa é o atual chefe da Igreja Católica, a qual cometeu inúmeros e gravíssimos erros que ocorreram continuamente ao longo de séculos, pelos quais é naturalmente corresponsável.
Ouvindo algumas frases dos discursos do Papa e verificando a presença constante do Sr. Presidente junto de Sua Santidade, resta a esperança de que o Sr. Presidente enverede por um caminho diferente, praticando o bem de forma virtuosa, respeitando a verdade e os outros, não se deixando cair na tentação da constante notoriedade, enfim, exercendo a Presidência de outra uma forma mais próxima dos ensinamentos de Cristo. Também é possível que Sr. Presidente, após a visita Papal, sinta um chamamento, o qual deverá seguir, escolhendo uma Ordem Religiosa que imponha o silêncio e o retiro espiritual.
Já agora a afirmação do Sr. Presidente de que as JMJ são o acontecimento mais importante do Portugal democrático é de gargalhada ou resulta de insolação. Basta, por exemplo, recordar a importância das primeiras eleições livres e comparar com o que representa a JMJ para o Povo Português.
... ... ...
PS: Na contabilidade feita pelo Presidente Marcelo enquanto subia o Parque e fazia selfies, referiu ele para a televisão que tinha encontrado gente de muitos países embora tivesse encontrado poucos italianos que, segundo ele, estavam em Portugal.
Posso sugerir uma ida à Costa Caparica onde encontrará certamente muitos peregrinos, quiçá alguns dos italianos em falta.
Estamos decididamente na silly season e, por isso, deslizo pelas notícias sem conseguir fixar-me em nenhuma. É verdade que as circunstâncias também não propiciam grande paciência para com futilidades ou coisas muito déjà vu. Um dos meninos tinha feito anos já vai para uma semana e, porque, nestas alturas, se acumulam aniversários com férias dos pais, ainda não tinha conseguido festejar com a família. Por isso, foi hoje e cá o tivemos a apagar as velas num belo bolo do Sporting.
Por isso, depois de ver as cabriolices que fazem em catadupa e que me deixam sempre apreensiva e com receio que se magoem pois um faz e os outros todos querem reproduzir, incluindo o mais novo, depois dos festejos e depois de uma bela tarde em família, obviamente não me dá para coisecas que não interessam nem ao menino jesus (no pun intended).
Mas, se não tenho pachorra para sillyzices, também tenho claro que temas mais complexos não são adequados a estas alturas em que o calor aperta e a saturação se instala.
Contudo, vi agora uns vídeos que me parecem deveras interessantes. Escolhi um deles para aqui partilhar pois, parecendo que não, se calhar até tem alguma oportunidade.
Aquilo que, segundo os crentes, é uma perspectiva animadora, a de que, quando se morre, se vai para um paraíso que é só leite e mel (isto se as portas se lhe abrirem, claro), a mim sempre me pareceu uma fantasia desprovida de sentido. Haver algures, nos confins do céu, um branco open space, cheio de finados que sorriem a todo o tempo numa de peace and love, parece-me delirante e, sobretudo, desprovido de qualquer razoabilidade lógica e científica. Claro que ficam na nossa memória, embalados pelo nosso afecto. Mas, do ponto de vista, físico, material, a conversa é outra.
Numa de que as partículas elementares de que somos feitos podem desagregar-se quando lhes faltar a energia que as mantém agregadas e, uma vez soltas, agregar-se de uma qualquer outra maneira, consigo conceber que, de certa forma, algo dos que morreram continua a pairar por aí.
Agora nunca me tinha lembrado que se pode olhar para este complexo e perturbante tema numa perspectiva de espaço-tempo. É que, segundo essa perspectiva, o tema adquire uma dimensão que, de certa forma, traz atemporalidade àquilo a que chamamos vida. E isso é extraordinário.
Apesar da física das partículas elementares ser fascinante para mim, a verdade é que o seu entendimento não me é linear, fácil. Deixo-me levar, neste domínio, confesso, mais pela intuição e pela poética do que pela matemática.
Por isso, não consigo pronunciar-me sobre o que aqui se diz, não consigo dizer se está certo ou se é provável. Consigo, apenas, dizer que me parece muito interessante.
Sabine Hossenfelder é uma física teórica e uma comunicadora. Fala sem rodriguinhos, sem deambulações por territórios metafísicos.
The “afterlife” according to Einstein’s special relativity | Sabine Hossenfelder
Sabine Hossenfelder investiga as grandes questões da vida através das lentes da física, particularmente a teoria da relatividade especial de Einstein. Ela destaca a relatividade da simultaneidade, que afirma que a noção de "agora" é subjetiva e dependente do observador. Isso leva ao conceito de universo de blocos, onde passado, presente e futuro existem simultaneamente, tornando o passado tão real quanto o presente.
Hossenfelder também enfatiza que as leis fundamentais da natureza preservam a informação em vez de destruí-la. Embora as informações sobre uma pessoa falecida se dispersem, elas permanecem parte integrante do universo. Essa ideia de existência atemporal, derivada do estudo da física fundamental, oferece percepções espirituais profundas que podem ser difíceis de internalizar na nossa vida quotidiana. Como resultado, Hossenfelder encoraja as pessoas a confiar no método científico e aceitar as profundas implicações dessas descobertas, que podem remodelar a nossa compreensão da vida e da existência.
Como físico, Hossenfelder confia no conhecimento adquirido por meio do método científico e reconhece o desafio de integrar essas percepções profundas nas nossas experiências diárias. Ao contemplar esses conceitos profundos, podemos potencialmente expandir a nossa compreensão da realidade e nosso lugar dentro dela.
Devo dizer que me incomodam grandemente as grandes concentrações por motivos religiosos. Ainda mais quando os participantes são jovens. Aceitarei razoavelmente se andarem nisto das Jornadas para aquilo que o Cardeal Américo das Multas Aguiar diz: para a borga e para farras. Mas custar-me-á a perceber se alguns vierem numa de beatice, todos muito pios, todos muito formatados, todos numa de virem contactar de perto com o espírito do Senhor, todos disponíveis para participar em sessões que, a mim, me parecem sinistras, coisa quase de seita espírita como uma que vi ontem na televisão em que um padre, creio que americano, dizia que estavam ali em penitência.
A juventude quer-se irreverente, polémica, questionadora, alegre. Haver jovens que acreditam que nasceram pecadores, que a vida é um calvário e que têm que sofrer penitências, parece-me preocupante, doentio.
Em vez da crendice em milagres, fenómenos paranormais ou a irracionalidade de se acharem melhores que os outros, os jovens devem, antes, ser estimulados a estudar, a investigar, a adquirir mais e melhor conhecimento científico, devem ser incentivados a duvidar, a pôr em causa, a ir mais longe.
E já nem falo na hipocrisia dos canalhas que, a coberto do manto da santidade, abusam de seres indefesos ou vivem à larga à custa de nada, ou seja, à custa do dinheiro ou dos bens que os devotos lhes dão.
Gastar 1 milhão de euros como a Câmara de Cascais vai gastar nos trapinhos que a padralhada vai vestir parece-me ofensivo, vergonhoso, inaceitável.
Gastar os milhões de que se ouve falar em palcos, em tretas de toda a espécie e feitio, para que um montão de gente ande na maior ociosidade, a cantar, a sorrir e a achar-se mais santos que os outros , parece-me absurdo, ridículo e contrário ao que supostamente apregoam.
Por isso, gostei de ver a passadeira da vergonha feita de 'notas' no palco principal da JMJ.
Sei que a fé é uma coisa pessoal e, como tal, não questionável. E eu nada tenho contra os crentes. Mas a fé verdadeira é uma coisa íntima. Não é coisa que se ostente ou transaccione. E a forma como a Igreja Católica promove a 'fé' é deformada, negacionista, irracional, doentia.
Quem por aqui me acompanha saberá que o meu lado racional não me permite acreditar na existência de entidades divinas, muito menos se antropomórficas, que zelam e punem, tantas vezes sem critério e sem justiça.
Contudo, considero-me uma pessoa não isenta de espiritualidade. E rendo-me à minha absoluta insignificância perante a inexplicável harmonia da natureza, perante a improvável conjugação de infinitos acasos que, incompreensivelmente, mantêm o mundo a funcionar garantindo a existência da vida. E vergo-me, humilde, perante a indecifrável beleza de tudo, incluindo a beleza antes inexistente e que nasce da criatividade dos que têm a dom da arte nas suas múltiplas formas. E, por tudo isso, sinto imensa admiração.
Se existe alguma coisa de omnipresente, intangível, e que está acima de todos e de tudo, aquilo que me parece minimamente concebível é que seja esse misterioso acaso que (des)regula, aleatório, arbitrário, indiferente, os acontecimentos, sejam eles quais forem e que, apesar de tudo, faz com que o mundo continue a existir, quase como que por milagre.
E se há coisa que me custa perceber e aceitar é que, em nome de uma divindade, seja ele o deus da igreja católica seja qualquer outro deus, se ergam catedrais luxuosas em que agentes dessas religiões se paramentem, tantas vezes também luxuosamente, para espalhar medos ou ameaças com base nos quais tantas vezes se incita à intolerância (e, tantas vezes, ao ódio), para espalhar restrições não baseadas na ciência ou para usar o poder do segredo para actuarem abusivamente sobre gente indefesa.
Algumas das pessoas inteligentes que conheço e que acreditam em deus justificam a sua crença pela redução ao absurdo: se não acreditassem, então qual o sentido da vida?
Parece-me um argumento factualmente fraco mas percebo que há quem precise de sentir o amparo de acreditar que há 'alguém' sempre pronto a zelar por eles ou à sua espera quando a fronteira entre a vida e a morte for franqueada. E, portanto, tudo bem, cada um é como é.
Dito isto, achei graça ao vídeo que mostra Ariano Suassuna a falar sobre Deus e, por isso, permitam-me que o partilhe.
Gostei, sobretudo, dos versos de Leandro Gomes de Barros que ele cita:
Mas o Papa não especificou. E, de resto, como é sabido, há Virgens para todos os gostos e a fazerem habilidades de toda a espécie e feitio.
Agora uma coisa é certa: a sermos honestos e realistas, a bem da verdade, Francisco -- que parece ser uma pessoa de bem (tanto quanto possível naquela casa complicada) --, a vontade que deve ter é de dizer, alto e bom som, "Nenhuma aparição da Virgem Maria é real".
Mas isto já se sabe, parece que há muitos crentes que têm um grande olho para o negócio e, quando a coisa pega, é difícil desmantelar uma máquina que se transformou no ganha pão de muita gente e numa fonte de receitas para a Santa Madre Igreja que põe a caixa das esmolas na cova de um dente.
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Eu sei que a fé é uma coisa para a qual não há grandes explicações do domínio do racional. Ou se tem fé ou não se tem. E nada a dizer.
Mas, há coisas que eu, com as minhas características e limitações, não atinjo. É que se ainda posso conceber que algumas pessoas acreditem que há uma ordem superior, sobrenatural, intangível e inexplicável, que paira acima de tudo, já tenho grandes dificuldades em que acreditem que a mãe de Jesus Cristo, senhora falecida há milénios, apareça em cima de azinheiras ou noutros locais bizarros ou que encarne em estátuas ou estatuetas para se pôr a chorar lágrimas de sangue.
E o que me ocorre pensar é que quando essas pessoas acreditam em fantasias desse calibre em que mais coisas inenarráveis são capazes de acreditar...?
E uma dúvida muito grande que também tenho é a seguinte: o que leva pessoas que têm a obrigação de ser objectivas, racionais e pragmáticas (porque exercem funções que a tal obrigam) a andarem por aí em peregrinações para irem visitar locais desses onde, a pretexto dessas fantasiosas aparições, se mercadeja tudo e mais alguma coisa?