Foi um domingo calmo, intercalando a leitura e os banhos de sol por períodos de alguma sonolência. Também andei a regar, pois se há coisa que gosto de fazer é de regar, de preferência descalça para sentir os pés molhados.
Não tive que cozinhar: comemos restos e mais um ou outro complemento.
Ao almoço ligámos a televisão, mas não suportámos as más notícias. Bem sei que nos alienamos se nos afastarmos do que se passa no mundo. Só que se passam milhões de coisas boas mas se, no meio desse milhão, vier uma rajada de vento que levante uma telha, é nisso que os jornalistas se vão focar esquecendo tudo o que de bom aconteceu. O noticiário estava a ser uma sucessão de infelicidades, uma colecção de acontecimentos nefastos -- desistimos.
Agora à noite, depois da nossa caminhada, o meu marido quis ver o futebol, era uma final, parece que tinha que ser nesta televisão. Fui para a outra sala. Posicionei-me nos Casados à Primeira Vista. E adormeci. Não sou capaz de dizer se vi alguma coisa pois, se vi, varreu-se-me instantaneamente.
De tarde pensei que hoje poderia escrever sobre o livro que estive a ler pois, lendo aquelas crónicas, uma opinião se vai formando sobre o que é a motivação, o móbil de vida de um editor, em particular aquele que ali vai desfiando memórias, Manuel Alberto Valente. Creio que o que dali depreendo explica muita coisa. Mas ando com um espírito que não sei se é vadio, se é veraneante, se é simplesmente preguiçoso... Por isso, deixo essa conversa para outro dia. E talvez seja mesmo melhor adentrar-me mais na leitura para não correr o risco de tirar conclusões precipitadas.
À noite, geralmente depois de escrever aqui, como escrever me obriga a estar de olhos abertos, aproveito para ver alguma coisa antes de ir dormir. Nos últimos dias tenho visto o Homem com H. Dado ser sempre tarde e dado estar com sono, tenho visto pouco de cada vez pelo que ainda me falta um bocado para acabar. Mas tenho estado a gostar de mais.
Ney Matogrosso é um personagem extraordinário. E quanto mais o tempo passa mais extraordinário o acho. Há uns anos, embora gostasse muito de o ouvir, havia ali qualquer coisa que era tão extravagante que eu não sabia se era totalmente genuíno ou um certo gosto em provocar e essa dúvida levava-me a não aderir a cem por cento. Gostava, ouvíamos bastante, mas parece que ficava sempre ali a pairar a questão: ele é mesmo assim, tão superlativo e tão fora da caixa, ou há ali uma encenação que exagera o que ele é? Mas, quando evoluí, fui percebendo que isso era de somenos e que a dúvida, que era minha, não podia levar-me a olhá-lo com alguma reserva. Tinha era que aceitar sem questionar.
Ney era um bicho, um bicho extraordinário, cantava maravilhosamente, tinha um reportório também fantástico -- e tudo isso tinha que ser suficiente para gostar dele sem qualquer reserva.
E escrevi que ele era, escrevi no passado, só mesmo por burrice, pois ele está vivo, bem vivo, em forma, jovem, ninguém diria tratar-se de um octogenário. Aliás, olha-se, ouve-se e não se acredita. Afinal tantos excessos não lhe causaram danos, parece que bem pelo contrário, deram-lhe foi saúde.
Mas o filme, que tenho visto na Netflix, misto de filme e de documentário, não apenas retrata a vida de Ney Matogrosso em todas as suas dimensões, não apenas a artística mas a pessoal -- e, neste domínio, a activa e algo louca vida sexual (como ele diz, marchava tudo) -- como tem um intérprete que é igualmente fabuloso.
Reproduz o Ney de uma forma perfeita, quase assustadora de tão perfeita. Segundo abaixo se verá, Jesuíta Barbosa perdeu 12 kg para reproduzir os 53 kg que Ney tinha nessa altura, estudou os seus trejeitos, os requebros, a forma de olhar e falar.
E há algo nele que parece estar desenhado para encarnar o espírito e a carnalidade de Ney.
Ver para crer.
A quem tenha a oportunidade de mergulhar no filme, muito vivamente o recomendo. E, para abrir o apetite, aqui fica a conversa de Bial com ambos, a cópia e o original, dois homens extraordinários. E botem h nisso.
Pedro Bial entrevista Ney Matogrosso com participação de Jesuíta Barbosa | Conversa com Bial
No último Conversa com Bial (24/04/2025), Pedro Bial recebeu o icônico cantor Ney Matogrosso e o talentoso ator Jesuíta Barbosa, protagonista do filme Homem com H, cinebiografia que retrata a trajetória de Ney.
Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Como tem sido hábito nestes últimos dias, o meu marido, depois de ter tomado o pequeno-almoço, foi para o campo com uma pequena pá e um balde apanhar cogumelos. Quando chegou, vinha a bufar, que estava farto da m.. dos cogumelos, que rebentam da noite para a manhã seguinte, que não se dá conta de tanto cogumelo.
Depois estava a chover e não pude ir andar por lá.
Quando fui, para onde deitava o olho, via um cogumelo. Acho que nascem de hora para hora.
Voltei para trás para buscar a pá e o balde e fui eu apanhá-los. O meu marido já me tinha dito: ao princípio, nos primeiros dias, apareceram os grandes cogumelos castanhos e os brancos, agora estão a aparecer cor-de-laranja e amarelos. Já ontem os mostrei. Pois, não imaginam. Hoje, quase só desses coloridos mas em tamanho pequeno. Uma gracinha de cogumelos. Parece que brotam a todo o instante.
Tirei uma fotografia a uns quantos já dentro do balde, a fotografia que está lá em cima. Não são tão lindinhos?
Na fotografia estão sujos pois quando enfio a pá, enterro um bocado para apanhar o pé e, portanto, depois trago também a terra, os musgos.
Tirando isso, posso dizer que o meu marido está contentíssimo com o resultado do Sporting. É obra.
Quanto às eleições nos Estados Unidos, espero mesmo que ganhe Kamala Harris e que ganhe por uma margem que não permita ao alarve-mor vir com as suas habituais e prometidas patranhas.
Neste compasso de espera, se me permitem, vou antes entreter-me a ver casas bonitas. E esta, aqui abaixo, é uma maravilha. Um apartamento amplo, luminoso, tranquilo, com móveis com um belo design.
Taís Araujo e Lázaro Ramos abrem o seu apartamento muito brasileiro
| CASA VOGUE
[Por defeito, acho que vem dobrado em inglês. Para falar com a voz deles é escolher o português, no audiotrack nas definições]
E que os próximos dias nos tragam e confirmem boas notícias
Eu acho que até sou uma mente aberta. Acho... Mas, às tantas, acho mal. Na volta, tenho o meu ladinho de conservadora...
Por exemplo, quase me parece que isto de haver tantas orientações sexuais já é fantasia... Qualquer coisinha agora dá origem a uma nova orientação. Por exemplo, se eu só me sentir atraída por homens que usam capachinho, quem me garante que um dia destes não chego à conclusão que me encaixo numa nova orientação sexual, a dos capachinhossexuais?
Eu pensava que era (relativamente) normal as pessoas só quererem ter relações sexuais quando se sente qualquer coisa, pode ser até coisinha, pela outra pessoa. Pensava eu. Afinal hoje fiquei a saber que isso são os demissexuais. Demi. A meio caminho da pessoa ser assexuada. Na volta, num extremo estão as pessoas-bonobo que saltam para cima de qualquer um que passe pela frente. Na outra ponta, os assexuados. E a meio, essa estranha casta das pessoas que só estão a fim de truca-truca quando sentem algum afecto pelo trucado.
Acho tudo isto uma coisa do além.
Mas, enfim, vejam com os vossos olhos e ouçam com os vossos ouvidos. O Bial é um charme e uma graça (para além de um belo homem) e o casal entrevistado é uma animação.
Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso falam sobre Surubaum, sexo, carreira e família | Conversa com Bial
Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso são uns dos casais mais falados da internet. No papo com Pedro Bial, o casal fala sobre o Surubaum, o novo programa comandado pelos dois, sexo, família e carreira! 😍
Nisto, só de falar em brasileiro já leva vantagem. Gosto.
Quase percebo porque é que nos concursos literários em Portugal praticamente só ganham brasileiros. Por um lado é certo que, a este nível, em Portugal somos uns perna-abertas. Para concorrer basta escrever em português. Nos outros países geralmente os concursos pedem que as pessoas sejam naturais do país do concurso. Aqui não. E depois há o lado económico: o mercado dos outros países, nomeadamente o brasileiro é de milhões. Aqui, neste rectângulozito que, a este nível, pouco mais é que uma baiuca, as vendas de livros não dão nem para aquecer quando comparadas com as dos outros. Portanto, percebe-se. E depois há isto: os brasucas têm uma graça, uma energia, um bom humor que a gente se ri só da forma sambada como falam e, mesmo sem querer, achega-se à próxima palavra à espera do que vai sair dali.
É como isto aqui abaixo.
A forma divertida de que se reveste a prosa, a piada de toda a narrativa... Do alto dos seus 1,97m, Pepita conta tudo. Tudo não. Quase tudo.
Pepita e a REVIRAVOLTA na história de amor adolescente! | Que História É Essa, Porchat?
A cantora Pepita relembra uma bela confusão com o seu primeiro amor adolescente que tem uma reviravolta maravilhosa no final.
As imagens que nos chegam do Brasil, Rio Grande do Sul, um mundo devorado pela água, são impressionantes demais. À data de hoje, mais de cem mortos, mais de cem desaparecidos, centenas de milhares desalojados. Casas destruídas, as águas a inundarem os primeiros andares das casas que resistem, as estradas desaparecidas. Um pouco por todo o lado (Afeganistão, Indonésia, China, etc) tempestades, inundações ou, no verão, o reverso, temperaturas insuportáveis, incêndios que não se conseguem apagar.
O cenário apocalítico que em tempos pensámos que seria algo a ameaçar apenas as gerações futuras já aí está, a bater-nos à porta.
O tema das cidades esponja, que não é remédio santo mas, ao que parece, uma boa ajuda, é algo de que provavelmente ouviremos falar com cada vez mais frequência. Pelo menos, assim o espero.
Mais do que resolver os desafios dos fenómenos extremos, peritos apontam soluções de adaptação que as zonas urbanas devem adotar para melhor gerir chuvas intensas e ondas de calor. Alterações climáticas intensificam os fenómenos, mas não devem servir como justificação para a falta de ordenamento.
"(...) o cenário de catástrofe provocado por fenómenos climáticos extremos vai repetir-se. E, apontam os especialistas, com uma intensidade e frequência cada vez maiores. Importa, por isso, alterar o comportamento reativo para uma atitude progressivamente mais preventiva. " José Carlos Ferreira, doutorado em Ambiente e Sustentabilidade.
Ultrapassadas as dificuldades do momento, o professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-Nova) afirma que facilmente "nos esquecemos que estes fenómenos existem e que se estão a intensificar".
(...) O coordenador do mestrado em Urbanismo Sustentável e Ordenamento do Território da FCT-Novaacredita que a resposta está na alteração do modelo de desenvolvimento das cidades e na concretização de soluções que "transformem o território, ocupando-o de forma ecológica". Este caminho passa, sobretudo, pela alteração dos planos diretores municipais (PDM), para que evitem a construção em zonas de perigo, como em leito de cheias, mas também que integrem estratégias relacionadas com o conceito de cidade-esponja.
O termo foi cunhado pelo arquiteto paisagista e urbanista chinês Kongjian Yu e refere-se, essencialmente, a cidades ambientalmente adaptáveis que apostam em planos de gestão integrada da água. As soluções adotadas variam consoante a realidade hidrográfica das zonas urbanas e a sua configuração, mas podem incluir pavimentos permeáveis, jardins biodiversos e edifícios com coberturas verdes. É uma forma de "incorporar, de forma plena e holística, o ciclo da água no ordenamento dos espaços urbanos", explica Rafael Marques Santos.
O professor e investigador da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa detalha que o urbanismo sustentável permite "intervenções cirúrgicas" em áreas com "grandes erros estruturais", sempre com o objetivo de reduzir os impactos, por exemplo, em cheias. Umas são mais fáceis, outras mais complexas e dispendiosas, como demolições pontuais em zonas particularmente perigosas.
"Não vamos conseguir retirar toda a urbanização de Alcântara ou de Algés", aponta. Mas a criação de elementos de contenção é uma opção, desde logo com bacias de retenção nos pontos mais altos das cidades que "atrasem" a chegada da água, a grande velocidade, às partes baixas. O essencial, esclarece, é "olhar de forma muito atenta para a água numa perspetiva de todo o ciclo" e implementar medidas que cumpram dois objetivos de uma só vez - prevenir os riscos de momentos em que existe água em excesso, assim como atenuar situações de seca.
"Os edifícios podem ter espaços de cisterna para acumulação de água que podem ser úteis", afiança. Se em tempo de chuva intensa os edifícios conseguem guardar alguma dessa água e evitar que seja escoada para a rua, noutros momentos esse recurso pode ser usado para regas, lavagens e outros fins.
O mesmo poderá ser feito em estruturas municipais e há bons exemplos de como isso pode ser feito. Em Roterdão, nos Países Baixos, a Waterplein Benthemplein é uma praça de betão usada durante todo o ano para atividades de lazer dos habitantes, mas é pensada para que em época de chuva intensa possa inundar e evitar a sobrecarga dos sistemas de escoamento da cidade.
Outra ferramenta complementar é a criação de jardins alagáveis, biodiversos e compostos por plantas com capacidade de absorção da água. Estes locais podem inundar e continuar a servir como espaço de recreio, bem como ajudar a refrescar as cidades durante o verão - exemplo disso são cidades como Taizhou, na China, ou Nova Iorque, nos EUA.
Em Setúbal, refere João Carlos Ferreira, o Parque Urbano da Várzea foi "muito eficaz nestas cheias", apesar de aquela cidade piscatória ter tido 30% mais chuva do que Lisboa. "Foi todo redesenhado para ser uma grande bacia de retenção e não inundar a Baixa de Setúbal. Esteve no limite, mas está a funcionar e a cumprir o seu propósito", atesta.
Ambientalistas, arquitetos e urbanistas concordam ser preciso agir, revendo os planos de ordenamento, criando estruturas verdes e multiusos nas cidades, mas, acima de tudo, implementando estratégias de longo prazo diversas e adaptadas à realidade de cada local. "Estes momentos de crise também servem para as adaptações necessárias", remata Rafael Marques Santos.
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How China is designing flood-resistant cities
These "sponge city" designs resist floods and increase biodiversity to help us adapt to a changing climate.
From rising sea levels in Mumbai to unbearable heat in Houston, cities around the world are feeling the effects of climate change. Unfortunately, they don’t always have the right infrastructure to handle its impacts — which is one reason why cities are beginning to reimagine urban design. One of these designs is a “sponge city.”
Although one city design certainly won’t save us from the effects of climate change, “sponge cities” can help with how we live with it.
Noite quente em Lisboa. 3 de Junho. Campo Pequeno. Cheio. Muita gente para ver, ouvir, cantar e aplaudir o Chico.
Às tantas, alguém gritou: "Viva o Prémio Camões!". Um breve silêncio, provavelmente a perceber o que se tinha ouvido, e depois um aplauso.
Chico. Sempre aquele charme, aquela voz de sedutor e de observador, aquela voz que canta e diz, um diseur com um sambinha gostoso na voz.
Mas há também Monica Salmaso. Não conhecia. Tem uma presença forte e uma voz encorpada que faz lembrar a de Bethania.
E uns cenários brilhantes.
A Praça do Campo Pequeno a aplaudir. Querido Chico.
Filmei o Tanto Mar tal como filmei trechos de outras mas os vídeos não ficaram famosos. Por isso, coloco um outro de há 5 anos que encontrei no Youtube.
Na altura das eleições no Brasil disse aqui que obviamente desejava que houvesse um grande não a Bolsonaro. Mas que o meu entusiasmo com o Lula era reservado. Na lógica do mal o menos, ok ao Lula. Mas com muita pena que não haja melhor no Brasil. Um país enorme e complexo como o Brasil para ser bem governado e para ser respeitado interna e externamente tem que ter um presidente bem capacitado, consistente, com uma visão modernista, humanista. Lula está longe disso.
Por exemplo, a posição do Brasil sobre a Rússia a propósito da invasão criminosa da Ucrânia não é apenas dúbia. É também cínica, hipócrita, incoerente. Não sei se estas flutuações de posições, ajeitadas consoante o interlocutor, se devem ao seu caráter pouco consistente ou se Lula é simplesmente uma pessoa pouco informada. Ou se é a lógica interesseira do videirinho que quer fazer negócio e disfarça a coisa com conversa da treta julgando que os outros são mais parvos que ele. Não sei. Seja como for não é uma boa coisa.
E o que sei também é que, por tudo isto, Lula não me merece grande respeito.
Continuo a dizer: entre Bolsonaro e Lula, Lula. Mas que o Lula está aquém, mas muito aquém, do que o Brasil precisa, isso parece-me uma evidência.
E se pensarmos que o Brasil deveria ser um aliado de peso para Portugal, o que me ocorre é esquecer os interesses diplomáticos (que são incontáveis) e mandar bugiar o Lula. Ter um aliado como Lula é pormo-nos a jeito para vários tiros nos pés. Mas porque o Brasil é mais, obviamente muito mais, do que quem o governa, pois que se feche um bocado os olhos ao nonsense em forma de gente que é o Lula.
(Num aparte, completamente aparte, também devo dizer que não percebo a que propósito é que anda em todo o lado, mesmo nos encontros institucionais, com a mulher a reboque).
Enfim, uma tristeza.
Mas haja esperança. Por entre o bafo quente da multidão que acarinha gente como Bolsonaro, num quadrante, ou Lula, num outro, pode ser que surja uma consciência, uma voz que se erga. Muda como a exactidão como a firmeza como a justiça. Brilhando indefectível.
Continuo presa à minha maleita e, escrevendo isto, constato que uma desconcertante e escusada transformação está a operar-se em mim. Antes sofria em silêncio, disfarçava, escrevia sobre o que calhasse mas nunca sobre o que me apoquentasse, fosse doença minha ou alheia, preocupação profissional ou outra e, mesmo, perda. Só falava, e era se falasse, quando tinha passado e o desfecho estava bem assimilado.
E agora estou nisto, a relatar dores e maleitas em tempo real. Talvez seja uma fase e espero bem que seja passageira pois falar das minhas agruras não faz o meu género.
E isto para dizer que dormi pessimamente, sem posição, com dores. Por isso, passei o dia reclinada e a perna elevada, sobre almofadas. E certifiquei-me que tomava mesmo o anti-inflamatório. E, de quando em quando, gelo.
[E agora, ao ler o comentário do Corvo, já fiquei na dúvida. Acho que o gelo não está a fazer-me bem. Aliás, quando o ponho, ficou com dores bem insuportáveis. Se calhar, amanhã vou reconsiderar].
Mas não sinto que esteja a ficar famosa. Não consigo assentar o pé no chão, não consigo dobrar a perna, tenho dores e o joelho está deveras inchado. Estive prestes a chamar o meu marido para me calçar a meia daquele lado. Não chamei mas fiz uma ginástica que só vista e que me encheu de dores. Mas foi ele que fez o jantar (e ficou óptimo). Detesto dar trabalho mas a verdade é que estou incapacitada. Tenho esperança que amanhã comece a melhorar.
Aproveitei para ler. Do sofá, deslizei até ao parapeito e peguei no livro em que a Sharon Stone fala da sua vida, incluindo do AVC que a ia matando e da reviravolta que a sua vida sofreu depois disso. Papei-o todo.
Quem anda deveras intrigado com o meu estado, em especial com a minha quase inexistente locomoção, de canadianas e a arrastar uma perna que não consegue endireitar-se, é o ursinho felpudo. Olha de alto a baixo e, quando vê que estou observá-lo ou quando lhe digo: 'não percebes o que se passa com a dona, não é?', desvia o olhar, põe-se a olhar para outro lado.
Há bocado queria levantar-me do sofá e não conseguia. Fiz diversas tentativas mas não conseguia. Frustrada, chamei o meu marido mas estava lá para dentro, não ouviu. Então disse ao meu cão de guarda, que me olhava com ar preocupado a tentar equilibrar-me e sem força para o fazer com esta perna inchada e dolorosa, 'vai chamar o dono, está bem?'. E ele, acto contínuo, foi e chegou à porta da divisão em que ele estava e deu um sonoro latido. Não foi ladrar, foi mesmo chamar. Fiquei espantada e comovida. Meu amiguinho.
Tirando isso, vi a entrevista do Costa mas, confesso, um bocado desatenta. Como quase não consegui dormir de noite, passei o dia a querer dormitar. Detesto estar assim, caraças.
Há bocado, dei uma circulada pelas notícias e nada me interessou a ponto de aqui querer comentar. A única coisa que me interessou foi ver esta casa maravilhosa aqui abaixo no meio da mais maravilhosa natureza. Mais do que a(s) casa(s) de uma família, é também uma bela pousada. O vídeo é muito bonito.
Qualidade de vida: A decisão de se mudar da cidade para o sítio da família
| Lar: Vida Interior
Vanda Ferraz teve a decisão que muitas pessoas sonham a vida inteira: sair do centro urbano e viver mais perto da natureza. O sítio de Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi o refugio para que esse sonho se realizasse! Para poder viver de forma mais tranquila e ainda conseguir obter uma renda, o sítio também virou pousada!
E para quem como eu anda mais por casa e não viajando, um vídeo que mostra lugares extraordinários. Começa logo com a nossa Madeira. E que imagens fabulosas ele nos mostra.
Parece que ao outro lá já passaram as dores de barriga. Dizem que nada de grave. Na volta era flato.
Pior foi mesmo o que os desinteligentes que o seguem fizeram por lá, por Brasília. Uma carneirada acéfala e desencabrestada. Faz impressão ver o estrago que fizeram. Gentinha mais bronca aquela.
Percebe-se, pois, a reacção do grande Major Peçanha. Diz ele que, com ele, nada daquilo teria acontecido. Ah pois.
ESPORRO NA PM DE BRASÍLIA
Por que não contrataram o Sargento-Tenente-Major Peçanha pra ser o interventor de Brasília?
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E queiram, por favor, descer e ver a mulher que se enfiou numa máquina de lavar e ficou com o rabo de fora
As televisões estão tomadas pela cena do Capitólio dos Pequeninos. Os bolsonaristas a brincar aos trampinhas.
Não sei no que vai dar mas, muito sinceramente, o meu organismo não aguenta mais overdoses.
Desde o defunto Santo Emérito que calçava Prada a ser borrifado e exibido durante dias e dias mais os cortejos do finado Pelé e mais o CR7 e família a serem apresentados à turbamulta e mais a mega suite em que se instalam, isto não falando nos nossos supersónicos secretários de estado que entram e saem à velocidade de estrelas cadentes, tudo à mistura com chuvas extremas, inundações e impermeabilizações, de tudo o vespeiro de comentadeiros nos tem impingido goela abaixo. E agora isto, dos doidos varridos dos bolsonaristas que se armaram em parvos. Que se armaram em parvos, não. Corrijo. Ainda em mais parvos.
Estou até aos gorgomilos. Quero ver um bocado de televisão e é isto. Uma saturação. Gente que diz as mesmas coisas sobre as mesmas imagens. Em todos os canais. A toda a hora. Não consigo.
Mais: não estou nem aí. Apetece-me algo.
Não sei bem. Talvez algo de diferente. De inusitado. De inexplicável. De louco. De arriscado. De belo. Com um toque de místico. Colorido. Corajoso.
Tive que me levantar muito cedo. Madrugar desconjunta-me para o resto dia. Faço por parecer que não mas, por dentro, o corpo dá-me sinais. Tento ignorá-los mas sinto que eles estão lá. Por isso, agora que é quase meia-noite, estou com um sono que não vos digo nem vos conto.
O dia também foi complicado. Parece que deixam para sexta-feira para despejar baldes cheios de problemas por cima da minha cabeça. Alimento sempre a esperança de que as sextas-feiras sejam neutras, como se já estivesse em regime de quatro dias. Mas há gente que parece que queria era voltar às semanas de sete dias e, não podendo, condensa. À sexta, dão à costa chatices que davam para três dias, tudo para infernizar a vida dos outros.
À hora de almoço, depois de mil chatices, um telefonema. Eu: poças para isto; que é que fazemos? E, do outro lado, ele: sei lá, talvez fugir. Rimo-nos. Para ambos a melhor solução seria mesmo essa: fugirmos. Mas devemos ter perna curta pois a verdade é que não vamos a lado nenhum.
Ao fim do dia, o meu marido quis ir, mais uma vez, fazer uma caminhada longa, à beira-mar. Não apenas diz que gosta como acha que é o que gasta mais energia ao nosso ursoto. Assim, estafado, à noite, aqui na sala, desejavelmente não fará aquelas mil tentativas para nos pôr a brincar com ele.
Mas estava frio e algum vento. Nós bem agasalhados e alguns surfistas nocturnos a saírem da água, a porem-se em tronco nu. Ou algumas jovens atletas de top desportivo, de alças, sem frio. Gente de outro planeta, cá para mim.
Mas, se calhar, isto de andarmos à noite com aquele frio e aquele vento contribuiu para moer ainda um pouco mais o meu corpo. Acresce que, para acompanhar o peixe assado do jantar, veio vinho branco e, talvez por andar um pouco desabituada, parece que bateu um pouco. Bem bom. Douro, fresquinho, frutado, civilizado. Por isso, estou aqui capaz de me encostar e deixar-me adormecer. Mas ainda vou dar um pouco mais de luta, ainda é cedo para dormir.
Claro que, com isto, não vi as notícias nem agora me apetece ir à procura.
Por acaso, há pouco ia para entrar num site e não sei que troca de mãos fiz que me apareceu o cmjornal, ou seja, o site do correio da manhã. Desastres, crimes. Fugi. Há vários mundos paralelos, disjuntos. Não gosto da maioria.
Agora, no zapping, uma vez mais passei pela 3 e uma vez mais lá está aquela dominatrix, encharcada em ideologia, insuportável, mal vestida, mal pintada, mal penteada. E não sei se é ignorante ou uma desenfreada demagoga. Diz parvoeiras que não lembram ao careca e tudo cuspido sem hesitação, com insuportável sobranceria. Não se aguenta. Coitados dos restantes paineleiros que há anos têm que aturar aquela verborreia arrogante e destemperada.
Agora, ao escrever o que escrevi, estava a falhar-me a palavra 'verborreia'. Só me ocorria 'gonorreia', mais propriamente, 'gonorreia falante'. Mas, entretanto, lembrei-me do que queria dizer: verborreia arrogante e não gonorreia falante.
[Há que manter o nível. Nem sempre uso as palavras que a minha mente me quer ditar. Imponho-me algum respeito, forço-me a arranjar sucedâneos socialmente melhor aceites.]
Bem.
Sei que vai por aí vai muito fuzuê com o maluco do Musk e com a baderna que está a arranjar no Twitter. Não quero saber, não me assiste. Não frequento. Passo muito bem sem. É chato que esteja a despedir a malta toda e que ainda não se perceba bem qual a dele. Mas, por mim, que tenha muitos meninos. Aliás, neste capítulo, já vai em oito e bem pode continuar a fazê-los pois ainda tem muito por onde improvisar em nomes. Tem uma a que deu o fofo nome de Exa Dark Sideræl e outro que se chama simplesmente X Æ A-12. Um excêntrico e perigoso exalouco, este Elon.
Mas, portanto, desisto. Hoje não quero saber de notícias para nada. Estou a modos que um bocado cansada, quer do sono quer da saturação que a maluquice circundante provoca em mim. I rest my case.
Com vossa licença, vou mas é ouvir musiquinhas boas, vou ver casas e jardins, vou alimentar o meu eu lírico e bucólico.
As romãs estão grandes, pesadas. Tenho que as ir apanhando apesar de a casca ainda não estar bem tingida. Como estão tão grandes e pesadas, a casca de algumas abre e vão caindo bagos. Outras tombam e rebentam na queda. Mas já estão boas. Levei outra vez à minha mãe. Disse que ia dar uma grande ao meu tio. Fui agora pesar uma delas para não escrever aqui uma coisa fora da realidade. Pesava 538gr.
De manhã, ao pequeno-almoço, junto bagos ao abacate, ao muesli e ao kefir. Ao almoço ou o jantar junto bagos à salada. Gosto bastante. Dão frescura e crocância. Comer só romã não tem muita graça, acho. Mas misturada é uma bela mais-valia.
As laranjas também vão caindo. Ainda pouco maduras, impossíveis de aproveitar. A casca também abre e caem deixando os gomos desfeitos no chão. Se calhar estão desabituadas de tanta água da chuva.
Com as limas a mesma coisa mas caem intactas. Uso-as para fazer chá e para temperar em vez do limão. Gosto muito de limas, são sumarentas, cítricas e com um toque a canela.
O jardim está muito verde, viçoso, húmido, e todos os dias temos que ir à socapa inspeccionar a aparição de mais cogumelos. Rebentam e crescem de um dia para outro. Há-os brancos, pequenos, pé filamentar, alguns mal se vêem, parecem pintinhas brancas, mas também os há castanhos, grandes, gordos. E há uns muito dissimulados, espessos como madeira, colados aos troncos. Temos sempre medo que o cãobeludo lhes chame um figo e não fazemos ideia do efeito que produziriam.
E hoje à tarde finalmente pusemos umas novas iluminações solares que, no outro dia, comprei.
Uma é uma grinalda com bolas brancas de papel que, quando se iluminam, ficam com uma cor quente, bonita. A outra é um projector com sensor. E a terceira, a mais controversa, é uma fita daquelas que se ilumina em pontinhos corridos.
O meu marido, se, em geral, tende a ter mente aberta, nestas coisas é assaz conservador. Conservador e minimalista. Isto de eu querer ter grinaldas ou fitas luminosas no jardim tira-o do sério. A mim não. Sou toda a favor de energias renováveis; e ter luzinhas que se acendem à noite depois de terem acumulado energia durante o dia parece-me muito bem. Acabei eu por colocar quase sozinha a grinalda e a fita pois ele teme que o jardim fique a dar-se ares de natal. Não gosta, é avesso a excessos, a pimpineirices, a gracinhas. Não gosta nada. Sobriedade é o seu nome do meio. Como não adoptei para mim nenhum dos seus nomes, sobriedade comigo não consta. Pelo menos, nestas coisas.
A grinalda ficou junto à vedação no terraço da cozinha. Assim há sempre luz. E acho que até fica com um ar bem bonito e acolhedor. O projector foi pacífico, ficou a apontar para a porta lateral e foi ele que o pôs. O que deu luta mais a sério foi a fita das luzinhas. Quando comprei, pensei que fossem luzinhas brancas e só quando cheguei a casa é que, vendo a embalagem, fiquei na dúvida se não serão luzinhas às cores. Resolvi ir trocar. Ele disse que não era preciso, que se poriam pelo natal. Mas eu acho que não, se não é para trocar, vamos esperar pelo natal porquê? No corredor lateral que dá acesso ao jardim das traseiras, perto da porta do lado, achei que se poderia colocar no muro, entre floreiras suspensas. Creio que nem se vê da rua. Nem assim ele queria pôr. Pus eu. Consideremos que está ali a título experimental. Se se vir da rua e for feio, retiro e logo se vê. Mas agora quero ver como fica. As outras, entretanto, já estão acesas. Presumo que o botão da fita não ficou ligado. Amanhã tratarei disso.
Tenho ainda a reportar que enquanto dava atenção ao francês que a minha menina linda estava a praticar, o mais novo foi para o meu computador. Disse que ia jogar ou ver vídeos. Deixei, claro. Passado um bocado vi-o a teclar furiosamente. Perguntei o que estava a fazer. A irmã disse: 'está a ver se descobre o teu código de acesso'. Fui ver. O teclado bloqueado. Tanto para mexeu e carregou que o teclado bloqueou, não tugia nem mugia. E foi ela, sozinha, que resolveu tudo. Apenas fui solicitada para escrever a password de desbloqueio de ecrã no teclado virtual que ela invocou, indo depois às definições de teclado.
Gera-se sempre uma tal dinâmica que cada um chama e mexe para seu lado. Quando damos por ela já fizeram das suas. O meu marido diz: deixa-los mexer em tudo, fazem o que querem, por isso não te admires. O mais novo, então, é exímio em deixar-nos às escuras. Já por duas vezes nos deixou sem conseguir ver televisão tal a jardinagem que fez nos comandos da box ou da televisão.
Em contrapartida, a irmã está cada vez mais decidida: ela põe a mesa, ela serve os pratos, ela arranja a comida ao irmão mais novo e, no fim, quer ser ela a lavar a louça. E lava tudo com rapidez e perícia, mesmo tachos e frigideiras. E acelera-me para eu ir limpando e arrumando ao ritmo a que ela lava. Ao lanche também quis ser ela a tratar de tudo e, quando resolveram querer ovos mexidos, quis ser ela a fazê-los. Batidos com água, conforme aprendeu com o pai.
Pelo meio, houve pinturas de halloween e não apenas fui a pintora como eu própria acabei com cara de bruxa. Os trabalhos de casa que eram para ser feitos e o estudo que era para ter acontecido ficaram um pouco comprometidos, claro. Não consigo arranjar determinação para os forçar ao que quer que seja. Já dei para esse peditório. Agora é a vez dos pais deles.
E este domingo de manhã, aproveitando a aberta do bom tempo, fomos passear e apanhar sol para a beira-mar com a minha mãe. Muita gente, muita vida. As pessoas começam a curtir o ar livre. Adoro isso. E a minha mãe, toda jovem e fresca, lesta na passada, conversadora e animada, também gosta.
Há bocado, ao fim da tarde, já hora nova, fui para o terraço onde habitualmente nos juntamos para tomar as refeições ao ar livre ou conversar. Fui ver anoitecer, ver as luzinhas solares (que ali estão desde o verão e que, na altura, também deram bastante luta) começarem a iluminar o espaço. Estava sozinha com o computador a ver se via o The Good Doctor. Mas distraí-me e não vi. Fiquei-me pela contemplação do momento. Um pássaro passou por ali. Silêncio. Anoiteceu. Soube-me tão bem estar ali, uma tranquilidade total. Pensei que me sinto bem, que os meus se sentem bem -- e que não peço muito mais que isso. Pensei também que, se um dia me der para tentar meditar, naquele momento em que é suposto pensarmos em situações ou lugares aprazíveis, vou pensar em instantes assim, instantes de serenidade e paz.
Tenho pena que o vídeo abaixo não tenha legendas em português. A experiência de vida de Lize Venter é impressionante e um exemplo. Depois de uma infância marcada por um sofrimento obscuro, violada por um irmão mais velho, eis que agora consegue o apaziguamento que lhe permite ter o coração feliz. Muito bonito.
Secret to a happy heart - Finding Wonderland
Trigger Warning - This film contains reference to sexual abuse, which may be triggering for some viewers. If you have been affected by a similar issue and you need someone to talk to, please reach out to an organisation or individual near you for help. Take care.
“The secret is to surround yourself with people who make your heart smile. It’s then, only then, that you’ll find Wonderland”
Our relationships teach us about so much more than the hearts of the ones we love - they teach us about ourselves. Relationships show us how to love and be loved, as well as who we want to be in life and who we don't.
Surround yourself with those who bring out the best in you. The ones who not only want to see you smile but also try to make you smile when you’re down. The ones who try to make your day brighter. The ones who know your value and your worth and remind you of it. The ones who help you bloom.
And have the courage to be a good friend to those who choose you.
Nota: Obviamente ficaria angustiada, desgostosa e preocupada se ganhasse o troglodita do Bolsonaro. É um Trump em versão ainda mais abestalhada e ainda mais ignorantão. Uma calamidade para o Brasil e para a humanidade. Foi, pois, com alívio que vi que foi derrotado. Que não volte. Que não faça estragos nem alimente ódios agora que se foi.
Mas tenho que ser sincera: não fico especialmente feliz com a vitória de Lula. Acho que o Brasil mereceria melhor. Não percebo como um país tão grande, tão incrível e diverso como o Brasil não consegue melhor do que um Lula para se posicionar contra o obscurantismo populista, violento, grosseiro e perigoso de um Bolsonaro.
Vê-se e mal se acredita. Aliás, só se acredita porque se tem assistido à trajectória tendo-se chegado já àquele ponto em que se admite que tudo é possível.
"Queria aproveitar o Gilson aqui. Sei que muitos programas de rádio tocam a 'Ave Maria' a esta hora. Queria então prestar uma homenagem a todos os que se foram vítimas do coronavírus e pedir para o Gilson tocar a 'Ave Maria'", disse o chefe de Estado.
Com os 1.141 mortos registados nas últimas 24 horas, o Brasil totaliza agora 54.971 vítimas mortais devido à covid-19, segundo o Ministério da Saúde do país. Em relação ao número de infetados, o Brasil contabilizou 39.483 novos casos, num total de 1.228.114 pessoas diagnosticadas com o novo coronavírus.
Escreve Élida Ramirez, sobre a primeira dama de Tamandaré, Sari Corte Real, que, no outro dia, tinha manicura em casa a fazer-lhe as nails e se impacientou com o menino Miguel que não parava de chamar pela mãe que, entretanto, tinha ido passear a cadela da patroa:
Tente se colocar no lugar da cearense Mirtes Renata, mãe de Miguel. Reforçarei os maus tratos óbvios porque ‘pensar perturba’ como disse Martin Luther King. Ainda mais sob a ótica do discurso do absurdo daqueles que governam atualmente o país. Cenário de pandemia de Coronavírus. Apenas serviços essenciais devem funcionar. Porém, a empregada doméstica Mirtes precisa trabalhar. Ela ‘poderia’ ficar em casa. A tal liberdade custaria o salário que não seria pago. Não tem com quem deixar o filho, Miguel Silva, de 5 anos. Com a autorização da patroa Sari Corte Real e do patrão e prefeito de Tamandaré, Sérgio Hacker, a mulher pobre e negra sai, diariamente, da segurança do isolamento social com uma criança. Pega dois ônibus lotados, espremida e em pé para dedicar seu dia ao conforto dos outros. Não usa máscara dentro de casa dos patrões. Precisa ter contato com entregadores que não param de chegar. Passeia na rua com o cachorro.
Sem o direito à proteção, Mirtes pega o novo Covid-19 do patrão. Passa para o filho e para a mãe idosa. Enquanto o os familiares abastados se recuperam na casa de campo — também mantida limpa por outros empregados — Mirtes segue na labuta se arriscando pelo pão. Todos sobrevivem. Ela lava, passa, cozinha e passeia com o pet, porque ‘bicho também é gente’. Final feliz?
Em um dia desses, Mirtes prefere não levar Miguel para a rua. Ele fica no apartamento com a patroa Corte Real enquanto a empregada cuida do animal, aparentemente sem nenhuma estimação. Daí, a criança quer atenção. O máximo que consegue é ser desovado, sozinho, em um elevador pela mulher do prefeito. Miguel é pequeno, se perde e cai do nono andar. Morre horas depois no hospital. Acidente?
Diz Eberth Vêncio, sofrendo com isto tudo:
Durante os meus exercícios diários de sobrevivência no caos interior, especulo que as relações interpessoais e a comunicação instantânea, globalizada, estão adoecendo a humanidade em patamares impensáveis. Insanidade mental é uma pandemia obscura. Ansiedade. Depressão. Pânico. Suicídio. Parece que o estilo de vida contemporâneo nos atropela com informações e velocidade. Por consequência, uma régua imaginária nivela, por baixo, a inteligência e a capacidade de discernimento e de indignação de muitos, frente às famigeradas mazelas cotidianas. Aprisionados em redes sociais da web, consumimos informações várias, às vezes relevantes, quase sempre supérfluas, inverídicas, cruéis, carregadas de intolerância e de falta de empatia.
Há um desconfortável fetichismo pelo mau gosto e pelo mórbido espetáculo de notícias escabrosas que nos chegam pelos telejornais, pelos canais da internet, pelos instrumentos viciantes de Mark Zuckerberg, que testam a nossa capacidade mental para amortecer as tragédias diárias que ribombam em todos os cantos do planeta. O filho da empregada que caiu do nono andar em Recife. O adolescente fuzilado, dentro de casa, por militares no Rio. A transmissão, on time, on demand, do sufocamento, até à morte, de um homem negro, por policiais de Minneapolis.
Nestes dias bons, quentes e alegres, não tenho conseguido ver noticiários. Às oito é hora de banhos, de pôr a mesa, de janta. A minha filha diz que os meninos são o meu consolo. Comem de dar gosto e eu gosto de mesa farta e de quem saiba apreciar o meu tempero e coma com vontade, sem ser de biquinho. Gostam da comida, têm um apetite de lobos, gostam de estar à mesa a descobrir sabores. O ar do campo dá-lhes boas cores, dá-lhes robustez, energia para dar e vender. Dá gosto. Faço tachadas de comida, uso os maiores tachos, penso que estou a fazer a dobrar. No fim, sobra coisa de nada.
Depois da cozinha arrumada, assentamos arraiais na sala da televisão, os meninos têm uma bocado licenciado para jogarem aquele jogo de que agora não me lembro o nome ou verem o Friends, série que descobriram e adoram, e nós papamos a nossa dose de Grace and Frankie. Quanto levantam a tenda para debandarem para o estúdio -- os meninos sempre pedindo para ficarem mais um bocadinho, que não têm sono, e a gente a ver-lhes o olho gordo, pálpebra já com vontade de cama, o sono já instalado, rostinhos rosados e fofos como bebés bem nutridos -- eu pego no computador e o meu marido começa a fazer zapping. Um pouco depois estamos os dois perdidos de sono. Por vezes tentamos a RTP 3 mas aparecem umas múmias comentadeiras e debandamos como se víssemos assombração. No nosso mundo actual já não entra gente que vende comentário a metro e diz treta reprocessada. No nosso mundo há é céu limpo e muito estrelado, bicho andando em liberdade, canto de pássaro a toda a hora, pé descalço sobre a caruma, sombra de figueira, orégãos ficando floridos.
Portanto, se eu quiser falar de notícia eu não sei. Apanho, atrasadas, algumas que já deram muitas voltas ao mundo.
Uma é aquela de um grupo de bandoleiros, chifrudos, macacos irracionais, trapaceiros, iletrados, gente sem eira nem beira sentados a fingirem que são ministros.
Ao meio do bando desclassificado, o pior de todos, um burro cagão, papalvo de meter nojo, sabujo e ordinário, bronco, palerma de dar dó.
Vi e ouvi e fiquei na mesma, sentada em cima da minha indiferença. Gente burra elegeu o mais burro de todos. Tenho pena é dos outros, dos que até devem ter vergonha de pôr o pé fora de porta e haver quem veja que são brasileiros, povo que tem dentro de si um little povãozinho que elegeu um lorpa sem explicação.
Resolvi, portanto, que não era tema com que interrompesse o meu sono. Mas hoje, os brothers da Porta dos Fundos, essa turminha maneira, convenceram-me.
Aqui vai. Com vossa licencinha, o Plantananã. Bom demais.
As imagens animadas, ali em cima, são de outras ocasiões em que o Jair também mostrou que é bom a valer.
Gente, morreu o Rubem e eu, que gosto de malandro e que não me asfixio com palavrão e, por isso, gostava muito dele, fiquei com pena grande. Aquilo era mau-mau de faca leve a saltar no punho, aquilo era polícia choldra de dar asco, aquilo era tareão de criar bicho, aquilo era puta marmaja fazendo e desfazendo, aquilo era coroa safado comendo bichinha. Um mundo de maus exemplos. Mas, céus, que prosa mais sarada, que verbo mais escorreito, que manuseio mais elegante da língua portuguesa. José. Homem mais insolente, mais vagabundo. Sentimento mais delicado.
De tarde, estava a falar com a minha filha, todo o dia temos sempre muita conversa para pôr em dia, e ela, sempre cheia de notificação, recebeu a notícia. Pensei que era covid. Mas ela a leu sobre o sucedido e não era covid, era desacerto de coração, coisa de homem com coração muito vivido.
Rubem era homem urbano. Os seus livros estão na cidade. Se tivesse aqui algum, ia buscar bocadinho para lembrar a sua prosa insurrecta. Mas não tenho, aqui é campo.
Fica aqui apenas isto, estas palavras que lembram a alegria com que sempre segurava livro novo, o desfrute que era ler aquelas frases tão cheias de ambiente malandro e de amor à língua que era dele e que é também minha.
Gosto de ouvir, na TSF, as escolhas musicais de pessoas convidadas. Creio que se chama 'A Playlist de...'. Muitas vezes fico surpreendida ao ouvir canções de que me tinha esquecido completamente e de que, afinal, tanto gosto. Penso que já aqui o disse antes: se eu tivesse que fazer uma selecção de músicas da minha vida, teria que andar meses a puxar pela cabeça, tentando ressuscitar o que se arrastou para a sub-sub-cave da minha memória. Sei que não tenho uma música da minha vida mas muitas mas, assim de repente, não seria capaz de escolher meia dúzia temendo deixar de fora as mais importantes.
Se eu fosse de fazer listas, saberia sempre de que é que gosto mais. Assim, nunca sei. Tenho muitas limitações e esta é apenas uma delas.
E tem outra: quando alguém escolhe músicas que eu provavelmente também escolheria, fico a pensar no significado de tal afinidade. Será que, em tudo o resto, aquela pessoa gosta sempre do que eu gosto? Não faço ideia. Os mistérios do cérebro fascinam-me.
Mas a Bethânia estaria lá, com certeza. Também gosto do Caetano, aliás gosto muito, mas a Bethânia tem aquela vozeirão que sabe ser reza, cântico, súplica, lamento, hino, celebração, onda rolando no mar, vela acesa no terreiro, chorinho atravessando o sertão, e isso não haverá, talvez, muito mais gente assim. Talvez a Nina Simone. Mas, na volta, se me puser a puxar pela cabeça, lembro-me de mais. Mais vale não me alongar para não deixar muitos expostas as minhas vulnerabilidades mentais.
Estive a ver a entrevista que a sobrinha Belô faz à tia e madrinha Bethânia. E dai parti para a entrevista a Cae, o seu tio Caetano. E gostei tanto que acho que devo aqui deixar registo.
Já aqui o contei e desculpem por me repetir. Lembro-me muitas vezes de quando a minha mãe -- numa altura em que deu aulas perto de um bairro de lata -- no regresso à escola depois das férias, chegou a casa impressionada com a resposta que recebeu de uma aluna à pergunta sobre os presentes de Natal. A menina, toda contente, disse que tinha recebido um plástico muito bonito para pôr por cima da cama para não chover. A minha mãe ficou muito comovida e eu, que era adolescente, também o fiquei. Tanto que essa imagem não mais me abandonou.
Lembro-me também de quando ia beber café a uma pastelaria perto de casa e me fazia muito impressão, no dia de Natal, perto da hora de almoço, ver pessoas a comer sozinhas, com ar apagado, olhar baixo, quase como se não suportassem a imagem alvoroçada dos sorridentes que ali iam beber café, comprar pão ou buscar bolos de última hora para apressadamente voltarem para casa, para junto da família.
Também me lembro de um colega que dizia que na noite de Natal jantava com a mãe, ia para casa cedo porque a mãe jantava muito cedo e, no dia, ia com ela comer um prego o que, para ela, era uma excentricidade, uma aventura especial. E ele contava esse seu programa de Natal como se quisesse disfarçar o que quase me parecia vergonha.
A minha véspera e o meu dia de Natal são festas em família, felizmente gente sempre animada. Temos tido problemas, e quem os não tem?, temos perdido pessoas que amamos, alguns têm estado doentes, sustos daqueles mesmo maus mas que, por sorte, têm sido ultrapassados, outros assistem ao lento declínio dos que lhes são mais próximos. Mas, talvez porque há sempre crianças e as crianças, com a sua graça e alegria, fazem ultrapassar qualquer sombra e mágoa, até agora e desde que me lembro, por sorte, os meus Natais têm sido sempre felizes.
Contudo, tempos houve em que, num lado da família herdada, algumas pessoas incompatibilizaram-se com outras e deixaram de passar os Natais juntos. Custava-me muito isso mas nada podia fazer. Nessa altura, eu, o meu marido e os meus filhos íamos ver esses que tinham sido banidos pelos outros. Tentávamos levar-lhe um pouco do calor familiar e de alegria. Quando a última dessas pessoas morreu e tivemos que 'desmanchar' a casa, encontrei os presentes que lhes deixávamos pelo Natal, muito estimados, com a data desse Natal escrita à mão.
Não é um dia diferente dos outros mas, em volta dele, a sociedade criou toda esta imagem de ilusão, de inclusão, prosperidade e afecto que, provavelmente, deixa um pouco desamparados os que não têm a possibilidade de viver o Natal dessa forma. Penso especialmente naqueles que perderam entes muito queridos e em que as circunstâncias da vida e o tempo ainda não não esbateram a dor. Penso em Leitores que, ao longo do tempo, me têm contado as suas perdas e os seus imensos desgostos. Lamento muito e gostava que, um dia, a memória suavizasse a perda, transformando-a sobretudo em saudade, em doce saudade.
Esta segunda feira vou ter um dia bem preenchido com todo o tanto que tenho que fazer mas penso que, antes de sair de casa para ir festejar a véspera de Natal junto de parte da família, ainda conseguirei vir aqui -- mas temo que seja muito a correr. Por isso, é agora que me alongo.
E o que agora me apetece dizer é que perdas e dores sempre acontecem, sempre, mas que a vida sempre continua.
E também que não é de agora que o mundo está cheio de infortúnios, de injustiças, de desigualdades, de pobreza e de solidão. Penso que o mundo nunca foi perfeito e nem valerá muito a pena encontrar culpados. Se hoje as disparidades são tão escandalosas, se há tanta gente a viver no limiar da miséria, a verdade é que não consigo apontar o dedo a um grupo de culpados em particular, especialmente quando são os mais desfavorecidos que elegem aqueles que mais os prejudicam e mais acentuam o fosso entre extremos opostos. Somos todos nós, globalmente, que plantamos as sementes do mal e que, dessa e de outras formas, nos afastamos da nossa humanidade.
A felicidade não é eterna, não é infinita, e também não tem receita, nem tem que ser igual à dos outros, e, claro, não se mede. Acredito que a felicidade pode ser um somatório de breves instantes, de coisas de nada, de coisas muito cá nossas. E, mesmo quando se perde, pode voltar a ser encontrada. Pode vir sob a forma de uma palavra, de um sorriso, de um gesto, de um vislumbre, de uma recordação.
Durante algum tempo eu gostava de, nesta altura, aqui referir o nome de todos os meus Leitores cujo nome, por me terem contactado, eu sabia. Mas são muitos e temo esquecer algum. Por isso, apesar de não o nomear agora aqui, querido Leitor ou Leitora, saiba que não esqueço quem um dia quis chegar até mim. Para si vai o meu afecto e, ainda que apenas desta forma tão limitada, vai também a minha companhia.
Abaixo mostro vídeos onde se podem ver as casas dos muito ricos em Nova Iorque, depois as inconcebíveis 'casotas' dos mais desfavorecidos em Hong Kong, depois o que é a vida nas favelas do Rio de Janeiro e, finalmente, o que é viver no deserto. São vídeos que acho muito interessantes e que fazem pensar. Este é o mundo em que nos foi dado viver e não sei se temos sido suficientemente inteligentes para o usarmos da melhor forma.
E talvez isto nem tenha muito a ver com o espírito natalício mas permitam que vos diga que acho que não há relação entre o valor das habitações e o nível de felicidade dos seus habitantes. Não há regras de três simples nestes casos. A felicidade não depende do número de presentes recebidos pelo Natal nem dos metros quadrados ou do conforto da nossa casa. A felicidade é outra coisa, uma coisa muito só nossa.