Mostrar mensagens com a etiqueta Museu Colecção Berardo. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Museu Colecção Berardo. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, junho 24, 2015

Marc Chagall, um imenso Pano de Cena no CCB -- e uma imensa emoção


Bom, agora que, no post abaixo, já me babei à vista de todos vou falar de outra coisa. A ver se consigo que não me parece nada fácil.







No outro dia, a seguir a um evento profissional, raspei-me para o Museu Colecção Berardo para ver a exposição O Olhar do Colecionador / The Collector's Eye. Ia sobretudo pelo Pano de Cena para A Flauta Mágica, de Mozart (2.º Acto, 3.ª Cena), 1965, de Chagall.

Fui indo pelos minimalistas, conceptualistas, etc, andando, andando, e já pensava que às tantas já tinham escondido o pano ou que, por artes mágicas, me tinha passado ao lado, ou que afinal estava dobrado e parecia pequenino e eu nem tinha dado por ele, e já desconsolada, pessimista, pus-me a tentar encontrar entusiasmo a ver as outras obras, quando, já sem nada esperar, me vejo numa sala enorme e, olhando para o fundo, tive uma das experiências mais avassaladoras de que tenho memória. Senti uma comoção que não sei traduzir por palavras. Quase tive vontade de cair de joelhos. Imaginam talvez que é um dos meus exageros. Não é, juro que não é. A minha vista não era capaz de abarcar uma beleza tão imensa, uma tal vastidão preenchida com as cores de Chagall.

Deixei-me estar ali, parada, a olhar de um lado a outro, de alto a baixo e, de repente, estava com lágrimas nos olhos, o peito apertado, numa comoção irreprimível. Soube depois que a isto Borges chama, creio, acto artístico. A obra a envolver quem a vê. Tive vontade de me sentar no chão e deixar-me ali ficar, tomada pela emoção de estar como que dentro do mundo mágico de Chagall.

Pelas circunstâncias, não tinha podido ir equipada com a minha máquina fotográfica. Por isso, deixei-me simplesmente estar. Quase como se estivesse em estado de adoração.

Depois, porque não podia ficar ali até ser noite, vim-me embora. Então lembrei-me que podia usar o telemóvel e voltei atrás e fotografei. Não ficou nada de jeito mas, ainda assim, aqui vos deixo com duas dessas fotografias.

Se puderem, não deixem de ir. Não se paga. E é daqueles momentos que nos convocam para o que há de mais espiritual dentro de nós. Ou dentro dos outros, não sei. Uma vontade de ser tolerante, generosa, infinitamente boa com os outros, com o mundo. Há ali uma inocência, uma luz, uma beleza, uma paz que parece apelar ao que de melhor temos dentro de nós. Não sei explicar. Não digo mais nada.

(Eu tinha dito que talvez não soubesse dizer o que tinha sentido)


O que aparece em primeiro plano não tem nada a ver com o imenso pano pintado por Chagall que está na parede do fundo

-----

Marc Chagall


...


Lá em cima é: Tölzer Knabench (Tölz Boys' Choir) Magic Flute, Mozart (Die Zauberflöte)

...

E desçam, por favor, até ao post seguinte para verem como fico, quando fico toda orgulhosa.

...

segunda-feira, outubro 14, 2013

"Logo vais ter as mãos suspensas no luar: a memória da tarde", "O vento suspende os pássaros no ar", e outras palavras longe do mundo


No post abaixo já falei do que achei do que ouvi a Paulo Portas na conferência de imprensa na qual nos apareceu a servir para o jantar um corte nas pensões de sobrevivência aos ricaços que ganham fortunas impensáveis, pipas de massa, coisa como 2.000 euros - que isto agora o objectivo é trazer toda a gente para o limiar da indigência.

Mas sobre isso falo a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra. É uma conversa boa, uma conversa feita de belas palavras.


Música por favor



...   &   ...




Dei por mim a transferir também para a net o prazer da deambulação, entregando-me ao acaso.

Um dia cliquei em chat room, e entrei.

A sala era mais ou menos enfumarada e velada como um prostíbulo.

Nela era suposto estarem casais disponíveis para a troca, ou adopção de homens e mulheres.

Fui casal, mulher, homem também, de acordo com o solicitado.



Era tudo uma questão de nick, e a ambiguidade do escolhido permitiu-me usufruir todos os sexos.

Mimetizei-me com o equívoco, e descobri as pessoas que poderia ser, se quisesse.

O pior que me podia acontecer, era o outro lado não assumir o jogo. 

Mesmo quando ambos já nos tínhamos apercebido da evidência do logro.


Sem dar por ela, apercebi-me que podia apaixonar-me, odiar e criar dependência.

Como da droga, da bebida ou do emprego. A que não concedi essa oportunidade.


...   &   ...



A mata era um dos espaços interditos da infância.

Hoje nada resta desse lençol ondulante das mimosas, acácias e austrálias, que separavam o jardim-escola, e nos aguardava como um passo irreversível na idade da razão.

No limiar da transgressão, habitada por uma moura no recato húmido de uma gruta, a mata incitava-nos ao crescimento, e era um dos melhores covis da minha imaginação.

A adolescência revelou-me outras matas, onde as estações do ano me ensinaram a decantar a folhagem e a luz da sombra, nas margens de um rio devorado por uma barragem.

Delas apenas conservo alguns ocasos, como uma memória esticada pelo arco de uma ponte romana, entretanto submersa pela secura do futuro.

De quase todas elas, porque a única mata que me resta resume-se a uma árvore, em Silves, ensinada pela moura que me dispensa a imaginação.

Ou a saudade.

...   &   ...





A casa extingue-se na tarde. 

Por momentos tenho a ilusão do silêncio,
e apenas o estalido dos salgueiros me lembra que estou vivo.

Que uma sombra me aguarda.

Quando tudo retoma o seu lugar, um trilho escoou-se sob os meus pés.



Tacteio o ar para esquecer a aridez do tempo.

Nos corredores ainda se ouvem as correrias e os gritos da infância,
mas tudo não passa de uma ilusão para adiar a noite.

Os telhados vibram como escamas ao sol, e a casa treme sob as pálpebras.


...   &   ...




No sábado de manhã fui de novo espreitar a pequena livraria que no outro dia descobri e que me encantou. Por ali andei como que numa urgência, estava mesmo com pressa, mas tenho sempre a esperança de descobrir uma peça única, um tesouro, uma raridade deixada, por engano, para trás.

E não é que descobri mesmo?

longe do mundo, Jorge Fallorca


(Eu não sabia...eu não sabia que o meu nome se pautava pela música de Falla, e um grito de Llorca.)


Peguei logo nele não fosse não ser verdade e desaparecer no instante seguinte.





Depois, quando cheguei a casa, para vos fazer dele prova de vida, fotografei-o em cima da minha mesa, ao pé das minhas cadeiras, tal como a capa do livro que mostra uma mesa e umas cadeiras longe do mundo, talvez aquelas onde Jorge Fallorca escreve palavras tão bonitas como aquelas que aqui vos mostrei.

É um livrinho (livrinho porque é de pequena dimensão) que nos prende.

Passei a tarde a lê-lo, encantada.

E agora aqui estou também com ele, uma bela companhia, palavras simples, verdadeiras como as árvores, as sombras e as memórias, o sabor das folhas de oliveira, uma curva na estrada, o mar, o sul, a noite, o cheiro das maçãs.


***

A música é Nocturno para Piano de Manuel de Falla. As duas primeiras fotografias são de obras expostas no Museu Berardo no CCB (estive lá este sábado com os pimentinhas para quem aquele espaço é um fantástico e imenso recinto, cheio de coisas imprevistas e engraçadas, onde gostam de correr de sala em sala, à descoberta - para aflição dos vigilantes, é claro). As duas fotografias seguintes mostram as minhas árvores e os meus recantos in heaven. As duas últimas mostram a preciosidade que em boa hora adquiri, da autoria de alguém que está bem ca puta da vida. O livro também tem desenhos de Ângelo de Sousa.


Os textos em itálico são excertos de textos contidos no livro. O primeiro excerto faz parte de um texto intitulado net e o segundo mata. Os outros foram extraídos um pouco ao acaso.

***

Muito gostaria ainda de vos convidar a darem uma espreitadela ao meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa. Hoje por lá tenho José Alberto Oliveira e, atrás das suas palavras, vão as minhas tentando recuperar o rasto daquele que o meu coração ama. Segue-se-lhes uma voz fantástica, Cecile McLorin Salvant. É o jazz de volta ao Ginjal.


Relembro que sobre a verdade sobre a TSU das Viúvas segundo o irrevogável Paulo Portas, é descerem, por favor, até ao post seguinte. Não é nada de muito esclarecedor mas também dali nunca veio nada que se possa escrever na pedra.

***

E já chega por hoje, não é? 
Desejo-vos, meus Caros leitores, uma bela semana a começar já por esta segunda feira.