Nunca sabemos quanto mais tempo vamos viver. Não conseguimos saber até onde o nosso corpo e a nossa mente aguentarão nem sabemos determinar até onde os acasos nos levarão. Nem sabemos se gostaremos de viver se vivermos para além do que seria necessário.
As múmias que reescrevem a sua própria história e abrem caminho por entre o esquecimento para imporem os seus próprios memoriais e flausinices, querendo ficar para a posteridade ungidos em patine dourada, apenas mostram como são fúteis e vãs.
Ou aqueles outros, pobres coitados, que inventaram ilusões para se desenharem aos olhos dos outros como inteligentes e hábeis executivos, tentando construir um património a partir do nada e depois escondendo-o, urdindo falsificações, e depois fugindo para a outra ponta do mundo para tentar comprar a imortalidade que lhe fugia por entre os dedos, acabam regressando a casa dentro de um caixão e sem amigos que amparem a queda num buraco de terra.
Ou aqueles e aquelas que se injectam e se cortam para repuxar a pele e eliminar os sinais do tempo querendo simular uma juventude eterna, em que eternidade acreditam? Com quantos anos se sentem quando se vêem no espelho? Tudo porque querem entrar gentilmente e de rosto liso e infantil na boa noite escura? Quantas inúteis quimeras.
Correr atrás de absurdos objectivos, acumular luxos, contabilizar likes, emojis, visualizações, seguidores, querer ter muitos amigos mesmo sabendo que são amigos virtuais, ostentar dias fantásticos esquecendo que isso é o mesmo que exibir medalhas de pechisbeque -- tudo coisas que, aos meus olhos, não fazem qualquer sentido.
Para mim, a vida é ir por um caminho e, a cada bifurcação, ir escolhendo por onde continuar, um passo depois do outro, um dia depois do outro, e, a cada dia, a cada passo, ir gostando do que se vê, do que se sente, do que se cheira e ouve, e ter sempre a motivação, a curiosidade, o encantamento de ir em frente.
Há por aqui casas fabulosas, de uma arquitectura extraordinária. De vez em quando, quando vamos a passar, abrem-se os portões e saem grandes carros. Começo a conhecer as casas mas não conheço quem lá vive.
Há uma casa que tem sempre as grandes portas de vidro abertas para o jardim. Nós passamos e conseguimos ver alguém reclinado num sofá, a ler, enquanto cá fora os cães brincam. Nunca consegui ver a cara das pessoas pois olho furtivamente.
Há uma outra casa que destoa um pouco: é muito grande, por fora é quase toda revestida a madeira, quase parece um conjunto de cabanas. As portadas estão quase todas fechadas. Mas, cá fora, numa mesa num recanto que mal se vê da rua, está às vezes um homem a trabalhar num computador. Acho estranho. Não sei se vive sozinho naquela casa tão grande e quase sempre toda fechada. O meu marido diz-me que sei lá eu se ele está a trabalhar. Penso, mas não digo, que pode estar a escrever um livro.
Numa outra casa que se percebe que é das mais antigas, vive um casal já de alguma idade. O jardim é mimoso e costumo vê-los, ambos de chapéu, debruçados sobre os canteiros, por vezes de joelhos, plantando amores-perfeitos, colocando pedrinhas em volta, com umas tesourinhas aparando indesejados rebentos, tratando dos vasinhos. Se os visse na rua não os reconheceria pois creio que nunca lhes vi o rosto.
Costumamos cruzar-nos com um senhor que agora anda de calções e com um chapéu. Anda a passear o seu pastor alemão. Cumprimenta-nos, o cão puxa e rosna, quer atirar-se ao nosso mas o senhor diz que é só aparência de mau. Consigo identificar o binómio cinotécnico mas, se o visse sozinho, acho que não conseguiria identificá-lo de per se.
Há também uma senhora que anda a passear a sua cadela. Não a leva pela trela. Diz-nos que ela não faz mal. Mas ela não lhe obedece e, em vão, a senhora farta-se de chamar e dar-lhe ordens. Há aquela dinâmica entre elas, ficando a ideia de que a cadela é que manda na senhora. Quando passamos por ela, a senhora ri-se, desculpa a cadela, 'É assim mas é só para brincar, não faz mal a ninguém'. A cadela permanece indiferente, a fazer das dela, não perde tempo a justificar a senhora.
E há um homem bonito que anda de bicicleta pelo caminho de fora e que leva um cão bonito pela trela, agarrada à bicicleta. O senhor sorri, cumprimenta-nos e diz bom dia mas, quando fala com o cão, não percebemos o que diz, ainda não conseguimos identificar aquela língua. Se o vir fora da bicicleta e sem o cão estou certa de que não o reconhecerei.
E eu, que sempre participei na elaboração de planos estratégicos e na definição de visões e outras coisas supostamente rigorosas e relevantes e que sempre tanto gostei de conhecer outras terras, museus, galerias, lojas e tudo o mais, agora sinto-me feliz com as coisas mais simples, viver um dia de cada vez, estar no meu jardim a ouvir os pássaros, estar com os meus, tratar da casa, caminhar por aqui, ver os jardins das outras casas, entrever o corpo de alguém que lê na sua sala, cruzar-me com pessoas que passeiam o cão e nos cumprimentam com um sorridente bom dia.
A propósito, deixem que partilhe um vídeo muito tranquilo, onde as palavras e os gestos são vagarosos, serenos e simples. Felizmente está legendado em português (do Brasil...). Traduzo (às três pancadas) o texto de apresentação no youtube.
A arte da vida
Como uma estrela em ascensão no campo da matemática abstrata, Michael Behrens descobriu que podia ver beleza e padrões onde outros não conseguiam. Mas o seu caminho não era estar dentro da academia, nem mesmo dentro da sociedade. Ele partiu numa grande aventura para unificar o seu budismo com sua capacidade de ter uma visão expandida da realidade. Ele criou beleza num lugar onde ninguém mais o faria, e fez amigos entre os golfinhos.
Zaya e Maurizio foram ao Havaí há alguns anos e, numa praia remota, conheceram Michael. Depois de um tempo, ficou claro que Michael não era um homem comum… Nós conversamos sobre física quântica, budismo, espiritualidade, arte e ele convidou-nos para a sua casa depois de se certificar de que tínhamos “sapatos suficientemente bons”
Logo depois de estacionarmos o carro numa estrada remota, entendemos o porquê…Michael mora no meio de uma selva densa, a 20 minutos da estrada num terreno que ele mesmo limpou. …à mão!!!
Ele levou todo o material aos ombros e construiu um jardim incrível baseado na geometria sagrada. Um lugar incrível dedicado à beleza e impraticabilidade...
A casa não tem água corrente no interior, apenas um chuveiro do lado de fora e sem eletricidade. Michael comprou recentemente um pequeno painel solar para poder continuar a sua pesquisa e comunicar através de seu computador com outros matemáticos e com o mundo. (...)
Sobre isto do Manuel Pinho tal como aquilo do Paulo Campos tal como deixarem fugir o Rendeiro ou tal como dezenas de outros casos e putativos casos, o que tenho a dizer é que a Justiça em Portugal é uma porca de má reputação, os jornalistas uns carneiros amestrados e grande parte dos frequentadores das redes sociais uns papagaios acéfalos. Um zoo de quinta categoria.
Com isto não quero dizer que, acima da carne seca, me eleve eu, a mais dotada e impoluta criatura que viu a luz do dia. Não sou. Talvez seja apenas velha. Aliás, talvez não: de certeza. Já vi muito, já conheci muito. Já não me excito facilmente. Tem que ser coisa credível, de boa qualidade. Foguetório, bocas, má-língua, suposições, diz-que-diz-que, ranço no canto da boca da vizinha azeda, regurgitado alheio - disso, lamento, disso eu não papo. Podem fazer de tudo, dar-me à boca a comer, mastigarem por mim... que disso não manjo eu.
Há gente a mais a opinar, há muitos canais de comunicação a disputar a atenção -- e a bitola está baixa: todos disputam o pódio, o pódio do ódio, e o drama é que todos alinham pela mediocridade mais rasteira.
Portanto -- entre factos criados, reprocessados, ressuscitados, temperados com ignorâncias múltiplas, frustrações, azias, invejas, hemorroidas irritadas, despeitos, ataques de caspa, narcisismos e unhas encravadas -- os meios de comunicação social e as redes sociais têm orgasmos requentados perante a espuma lamacenta que emerge das águas pantanosas da justiça.
Se há um flavour a 'poderoso', então, é certo e sabido que os noticiários, os comentadores e as redes sociais entram em orgia colectiva perante a morteirada disparada já nem se sabe por quem nem contra quem nem exactamente a propósito de quê. Saber de factos e raciocinar escorreitamente sobre factos é coisa que dá trabalho e é maçadora. Mais vale cascar e saltar em cima a pés juntos e de olhos fechados.
Pode a coisa de que alguém lançou suspeita ter acontecido há dez ou quinze ou vinte anos que basta que alguém incida o holofote sobre o facto velho que a canzoada logo desata a ladrar como se fosse facto novo e escandaloso.
Em contrapartida, enquanto uns ladram, outros uivam e outros rosnam, há uns quantos espertos que vão passando por entre os pingos da chuva, acabando por se escapar de fininho. Até que um dia um deles é preso de pijama... e aí vem a desarvorada cainça cuspir em cima. Onde andavam todos esses cães raivosos e descabelados abutres quando o ex-banqueiro exemplar fazia caminhadas no condomínio onde a sua bela moradia exibe esculturas no amplo jardim e a sua mulher brinca com as cadelinhas? Anos e anos a fio para tramar estratégias, anos e anos a fio para fazer cópias de obras de arte, anos e anos de vida boa à vista de todos... E agora que o espertalhão foi levantado da cama com a barba por fazer e olhar perdido é que os valentões desatam aos coices?
E os que cantam de galo com as notícias relativas a Paulo Campos e outros fazem sequer ideia do que estão a falar? São acusados exactamente de quê, eles? Há provas de alguma coisa? Alguma vez houve provas de alguma coisa? Não falo do que o Correio da Manhã, TVI/CNN/Sandra Felgueiras dizem e meio mundo papagueia, falo de factos concretos, provados. E, desde que a lama começou a ser lançada até aos dia de hoje, passou quanto tempo? Quantos anos...? Tanto tempo para investigar... e nada, não conseguiram sequer descobrir o rasto de um simples bando de gambozinos? Nem um? Têm que prender os supostos criminosos para ver se descobrem alguma coisa? A sério...? Juram...? E durante todos esses anos onde andaram os jornalistas, comentadores e frequentadores de redes sociais? Nenhum descobriu nada? Ou andaram esquecidos de tudo? Só se lembram quando alguém atira um osso para a rua? É isso... não é...?
Não há pachorra. A sério. Não há pachorra.
Por vezes tenho a impressão que deveriam cair por aí uns calhaus celestes para pregar um valente susto na malta a ver se acordavam para a realidade e começavam a pensar pelas próprias cabeças.
[Mas, a caírem meteoritos, que caíssem no deserto ou nas montureiras, quiçá abrindo buracos tão fundos que deles nascesse água limpa, transformando o nada em coisa boa e verdejante]
Não estou inteiramente segura de que venha muito a propósito mas, ainda assim (e nem que seja por tentativa de desfastio), apetece-me partilhar convosco este video da Green Renaissance
Presence of Being
“The trees do not hold on to dead leaves but lose them in order to create room for new ones. We can learn from this, by letting go of the past and focusing on the now. We cannot change the past but we can make the present and future brighter and better, not bitter.” ~ Kemi Sogunle
If you're going through a painful time in your life, know that it is never worthless. These tough times teach you to see possibilities that you would never have fathomed in the comfortable moments.
Let us refuse to be held back by pain or sorrow. Let us overcome. Let us learn to breathe life into ourselves again. Let us step into a way of living that is magical, so we can wake up each morning feeling grateful, generous and free.
Filmado em Suurbraak, África do Sul (lá onde Rendeiro escolheu estar), com Kent Steenekamp.
NB: Dado ser um vídeo muito recente, ainda não existe a tradução em Português