Já é dia feriado e ainda bem. Não sei se me aguentaria inteira se tivesse que aguentar mais um dia assim. Aliás, a semana veio em crescendo e esta quinta explodi umas quantas vezes e estive em vias disso outras tantas. Não foi fácil. Cheguei ao fim do dia exausta. Fazem-me muita impressão as situações que não percebo e relativamente às quais, quanto tento que me expliquem, fico na mesma. Por exemplo, envolvi-me tanto num assunto que é crítico, esforcei-me, entreguei-me, expliquei, sensibilizei tanta gente que, quando estava convencida que ia deixá-lo em boas mãos, vejo que não devem ter percebido nada pois o entregam a quem tem zero competências para tal. Custa-me imenso assistir (de perto) a situações incompreensíveis. Apetece-me dar dois pares de coices. Claro que situações estúpidas há em todo o lado e aberrações é o que não falta -- e uma pessoa vai adquirindo defesas para saber lidar com tudo. Mas pior é quando se trata de uma situação deveras crítica que requereria competências à prova de bala. Não um incompetente, não um desprovido. E a culpa não é dele, a culpa nunca é dos destituídos, a culpa é dos que, sabendo que é destituído, ainda assim o escolhem. Não se compreende. Ficou furiosa. Nem é bem furiosa. É desiludida. Descrente. Desinteressada.
Mas, tirando isso, foi todo o santo dia. Parece que, de repente, tudo entrou em roda livre.
Cansada. Dá ideia que, se uma pessoa se se distrai, é atropelada por uma manada desencabrestada.
Cansada. Dá ideia que, se uma pessoa se se distrai, é atropelada por uma manada desencabrestada.
Acontece que, em cima disso, há cada vez aquelas expressões que tudo o que é mente fraca usa e que a mim me deixam em polvorosa. Faço de conta que não ouço. Quem me veja dirá que não reparo. Mas só eu sei. Uma violência. E já nem sei se alguém, para além de mim, fica com brotoeja na alma. A coisa quando pega de estaca desenvolve-se com viço. Rebenta por todo o lado. Erva daninha. Uma pessoa sente-se sozinha, incompreendida, com vontade de hibernar, de recolher ao convento.
Explico-me. Gente que tem mais do que obrigação de saber falar, gente com formação na área das humanidades ou sei lá o quê, gente que andou nas melhores universidades e com toda a espécie de mestrados, mba's, pós-graduações e o escambau e, quando começa a falar, enfatuadamente diz: 'dizer que este período tem sido desafiante para todos' e, a cada pausa e recomeço, iniciam a frase da mesma enervante maneira, 'dizer que estou agradecido', 'expressar o reconhecimento por todos quantos', 'transmitir que o regresso não vai ser ao normal mas, sim, ao novo normal', 'isto não tem a haver com' 'mas tem a haver com'. E, ouvindo isto, eu sinto a crescer dentro de mim aquela impaciência que me faz ficar irrequieta na cadeira pois sei que tenho que aguentar e calar.
Faz-me ainda outra coisa: ter vontade de ganhar o euromilhões. Dou por mim a pensar: se me saísse o euromilhões, viria trabalhar só para sair em beleza. Deixá-los-ia falar e, quando acabassem, diria: 'não é assim que se fala, ó seus papagaios que nem ao menos sabem escolher o que papaguear. Vou-me embora, já dei demais para este peditório, já aguentei demais, e esta maneira de falar é a gota de água, deixá-los-ei com a vossa oca prosápia'. Claro que ficariam a olhar para mim incrédulos e, quando eu virasse costas, haveriam de ficar sem perceber o que se tinha passado, concluindo: 'mulheres...' Ou, então, diriam: 'Mas quem é que ela pensa que é? Nem falar sabe. Em vez de 'deixarei-os falar disse deixá-los-ei. Loura burra''.
Por vezes, quando a reunião é alargada e o tema não me diz directamente respeito ou não me é especialmente interessante, aproveito para ver mails. Sempre me poupa trabalho à noite e sempre desanuvio. Mas, então, estava eu nisto, a ver mails, dou com esta pérola: Se estiver de acordo, podia-mos deixar o outro assunto para depois para nos pudermos concentrar no problema que temos em mãos.
Fiquei a olhar para aquilo, a sentir-me besta. Quando recebo uma coisa assim, hesito sempre entre fazer de conta que não vejo, responder arranjando maneira de escrever aquelas palavras como deve ser ou responder, assinalando abaixo, a encarnado, os erros. Se fizer de conta que não vejo, fico a sentir-me incoerente, acomodada, acobardada. Se responder usando as palavras bem escritas, corro o risco de os broncos acharem que não sei escrever. Se assinalo os erros, vão dizer que sou mal educada, deselegante, má colega. Portanto, depois de ficar a olhar, resolvi fechar o mail e prestar atenção à reunião. O que me intriga nisto é que juraria que ele, dantes, não escrevia assim. Fiquei a pensar: terá sido o corrector automático que lhe pregou uma partida? ou estará a ficar demente? uma pandemia de bestalhice?
Santa paciência.
Bem. Não digo mais nada. Não estou nas melhores condições. Nem consigo responder aos comentários.
Tenho limpezas grandes para fazer durante este fim de semana alargado mas a ver se neste dia do trabalhador arranjo maneira de poder agradecer e responder a cada um. Não levem a mal.
Santa paciência.
Bem. Não digo mais nada. Não estou nas melhores condições. Nem consigo responder aos comentários.
Tenho limpezas grandes para fazer durante este fim de semana alargado mas a ver se neste dia do trabalhador arranjo maneira de poder agradecer e responder a cada um. Não levem a mal.
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Há poetas de que gosto muito. Há poemas de que gosto muito. Há pessoas que dizem poemas de que gosto de uma forma que me agrada muito. Por exemplo. Gosto dos poemas de Michael Ondaatje. Gosto de Tom O'Bedlam. A voz dele e as pausas são preciosas. E gosto deste poema, 'What we lost'. Partilho-o convosco não apenas porque estou a ouvi-lo mas, também, porque me custaria que aqui tivessem vindo e saíssem com a sensação de tempo perdido. Assim, talvez gostem de ouvir o poema.
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As imagens -- que acho lindas -- são de Christy Lee Rogers
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Um bom Dia do Trabalhador.
Saúde.