domingo, abril 30, 2023

Para ver se esclarecemos de vez os mistérios das notas do Galamba e das desnotas do Frederico, tal como antes, o mistério do desparecer do Medina e dos pareceres da Mariana e da Catarina, não sei se chega uma Mortágua. Não seria de arranjar uma Leninha para correr aquela malta toda à bofetada?
Pergunto.

 

Tenho a dizer que graças a um telefonema que recebemos perto das duas da manhã tivemos que sair de casa e, ala moços que se faz tarde, aí vão eles, feitos à estrada. 

Cumprida a missão, entrámos na cama perto das quatro, uma espertina do caraças. Portanto,  podem imaginar: o sono foi pouco, muito pouco.

Aproveitei para, em jejum, ir fazer umas análises que estavam prescritas e que estavam à espera do dia certo para serem feitas. Afinal, quando ia a sair de casa já com o frasco com a devida urina II, reparei que não eram para ser feitas agora mas sim daqui por uns cinco ou seis meses. Mas já não estive para me reorientar e fui na mesma. Que se lixe. A seguir fomos comprar o comprimido desparasitante para o cão.

Por acaso, de tarde, dormi um pouco. Mas nada que chegasse. 

Mas depois, porque hoje foi dia, fomos jantar fora. Pelo caminho perguntei ao meu marido se queria viver comigo outros tantos. Disse que não respondia porque a pergunta estava para lá de surreal. Não percebi porquê. 

A seguir ainda fomos buscar o urso cabeludo que tinha ficado em boa companhia.

Como é bom de ver, só quando, ao almoço, lá para as duas da tarde, ligámos a televisão é que vimos qualquer coisa. Mas o meu marido teve um acesso e desligou-a. Conclusão, não apenas não pude debruçar-me sobre o magno problema que absorve os neurónios de tutti quanti como, do que ouvi, não consegui extrair uma conclusão que fosse.

Primeiro: afinal para que é mesmo a comissão sobre a TAP? Não era para perceber quem é que aprovou aquela cena da indemnização da Alex Tomba-Todos? Isto, quiçá, para perceber que aquilo lá não é uma felga?

Ou não? 

Será que aquela Comissão é um daqueles exemplares topológicos sem contornos, a materialização daquilo a que se chama geometria variável? Será que os objectivos variam consoante?

NB: É mesmo assim. Consoante. Sem palavra a seguir porque é o que me parece que acontece na comissão. Se, um dia, um qualquer diz batatas fritas na sessão seguinte o tema é sobre batatas fritas. Se nessa um diz gatinho azul, na seguinte anda tudo às voltas de gatinhos azuis. Uma never ending Comissão em que começou na indemnização da Gand'Alex e já vai nas notas que um tomou numa reunião qualquer que me parece que não tem nada a ver com o caso.

Isto já para não falar que, para o tom inquisitório ser ainda mais apurado, só falta mesmo haver ali uma pide Leninha (*) para andar à bofatada (escrito assim mas soar mesmo a estaladão) com aquela malta toda.

E, de cada vez que algum inquirido se descosesse e dissesse que sim, senhor, bebeu água antes de ir para ali, primeiro soltavam a Leninha e só depois é que se chamavam os macacos avençados para saltarem para as televisões e para as rádios a macaquearem o que foi dito. Claro está que os macacos não fazem a mínima sobre o tema, este ou qualquer outro, estão ali só mesmo para se macaquearem uns aos outros. O facto de todos, encarniçadamente, se porem a debater o dislate que é beber água antes de entrar para a sala de audiências é apenas porque sim, porque são pagos para isso. E isto quando o tema é beber água. Porque pior ainda quando algum inquirido entra em contradição e diz que se esqueceu de lavar as mãos depois de ter feito chichi quando todos assistiram que afinal até as lavou três vezes e até trocaram whatsapps a comentar o caso, Aí, sim, aí cai o carmo, a trindade e a portugália, e, por isso, ie, por causa dos bifes, o Montenegro desata a formar governo (à sombra, não vá apanhar algum escaldão). 

Há dias andava o zoo comentadeiro às voltas com o parecer. Há ou não?, quem o tem? quem o escondeu? A malta toda a brincar ao lencinho queimado ou, na versão mais moderna, à caça ao ovinho da páscoa. E o Medina e as duas ministras não foram logo ali apedrejados, açoitados e alvejados com ovos podres porque não calhou. Mas foi por um triz.

Agora o tema são as notas. Há notas? Alguém escondeu as notas? Onde estão? Quem é que sabia das notas? E não há alho nem bugalho que não opine sobre as notas. E, uma vez mais, cinquenta vizinhas saltaram para a arena comentadeira, todas de língua e faca afiadas, tudo a clamar por justiça e só não cortaram ainda o pescoço ao Galamba porque parece que não apreciam arroz de cabidela. 

E eu pergunto: mas não é normal tirar apontamentos nas reuniões? Meio mundo o faz. O que não é normal é andarem a cheirar as notas uns dos outros quais cães a cheirarem o rabo uns aos outros.

Mas parece que é o que os neo politicos, os jornalistas, os comentadeiros e os tomateiros gostam de fazer: cheirar o cu uns dos outros.

Sim, leram bem, Os tomateiros. Toda a gente opina sobre as notas, desde os mais ilustres desconhecidos, até às descabeladas do costume, até a uns pobres coitados que foram arrebanhados na rua e, à falta de melhor, quando já não há cão nem gato para opinar, já nem os pobres tomateiros escapam.

E tudo para quê? Para fuçarem nuns apontamentos que uns quaisquer tomaram numa reunião que não interessa nem ao menino jesus.

Até ouvi, de passagem, uma qualquer a descobrir a pólvora: que a ex-CEO do magnífico nome tinha reunido com o Galamba. Estava exorbitante a desgrenhada e enlouquecida criatura com a descoberta que tinha feito. E quem a ouvia, um entrevistador com ar alucinado, não foi capaz de lhe perguntar se ela não sabia que isso era o que era suposto acontecer: a tutela reunir com os órgãos de gestão da empresa. Se o Galamba reuniu com a ex-CEO fez apenas o que tinha que fazer. Mas aquela alimária falava como se tivesse descoberto que a Christine andava a vender coca ao ministro. 

Parece que o país ensandeceu, de repente o espaço público transformado num filme cómico.

Não há pachorra.

Contudo.

Isto dito.

Tenho que perguntar ao Costa se ainda não percebeu que tem que ter cuidado com a marabunta que se acoita lá pelos ministérios. Quem é que selecciona e quem é que avaliza as competências daquela canalhada miúda que, sob o título de assessores e adjuntos (e recebendo como tal), se aboleta em lugares que deveriam estar reservados a gente de elevado calibre? O Costa ainda não percebeu que é tempo de chamar a brigada anti pragas? Ou tenho que ir lá levar desparasitantes de cão a ver se fazem fazem efeito também nessa tropa fandanga?

Pergunta a minha inocente ignorância: que conhecimentos e experiência de vida e da área em causa tem o jeitoso Frederico Pinheiro para ter sido Adjunto de um Ministro?

Li o CV do moço e nem para meu estagiário eu o quereria (isto quando eu ainda estava no activo, claro). Que credibilidade tem aquele rapaz para andar a coordenar reuniões, para acompanhar dossiers, para lidar com informação reservada? Alguém me diz?

Será que aquela rapaziada de quem dizem ser a gauche do PS, para agradar aos amigos da ex-geringonça, ainda acoitam maltinha dos Blocos, das Jotas e de sei lá onde mais?

E o nosso ubíquo Marcelo não consegue puxar pela sua iluminada cabeça e ver como se há-de (colectivamente) conseguir trazer para a vida pública gente capaz, competente, respeitável? Não consegue arranjar maneira de proibir a entrada a maltinha que pode ter muita graça a fazer teses de doutoramento (a expensas nossas) sobre temas que não interessam nem à carochinha ou a maltosa que gosta de fazer tricas laricas entre jotas mas que não tem a mínima competência ou respeitabilidade para assessor ou adjunto nem do raio que o parta, muito menos de um secretário de estado ou de um ministro?

Tempos houve em que os Ministros e Secretários de Estado eram a nata da sociedade, o melhor que o País tinha, O que se passa para gente dessa se recusar a ir agora para o Governo? Mas não vão nem que os banhem em ouro... E, se não há gente capaz que queira ir, depois é o que se vê. Só disto que agora se descobre que por lá anda.

Não pode ser.

Já agora: quem é que autoriza as bolsas para essa malta que para aí anda, eternamente, a fazer teses de mestrado e de doutoramento sobre bugigangas de assuntos, sobre tretas que não servem nem servirão nunca para nada que se aproveite? Andei eu anos e anos a trabalhar, de sol a sol, na economia real, como uma moira, deixando grande parte do meu ordenado em impostos, e ando agora a deixar parte da minha pensão de reforma, para andar a financiar o que me parece ser uma alegada trupe de imprestáveis que, em vez de trabalharem a sério, andam por aí entretidos a fazer merda respaldados pelas bolsas que recebem para fazer teses da treta? (Pardon my french)

Olhem, não há mesmo pachorra.

NOTA: Apesar de tudo, os indicadores económicos são fantásticos, a democracia funciona e, digam o que disserem, o PS ainda é a melhor alternativa para governar o País. Tem muito trabalhinho de casa para fazer? Oh se tem... Mas, enquanto não houver melhor, há que respeitar o voto dos portugueses e deixã-los continuar o trabalho que têm estado a fazer e que, por sinal, estão a fazer bem Que fique claro que o mecanismo fundamental nas democracias é o voto. E quem vota é o povo. Não é a comunicação social.  

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Olhem, se é para atirar pedra, que entrem os meus amigos da Porta dos Fundos

E, já agora, pedra por pedra, que entrem também os meus amigos Monty Phyton


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(*) Sobre a Pide Leninha recomendo o magnífico documentário da RTP

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Desejo-vos um bom dia de domingo
Saúde. Esperança. Paz.

sábado, abril 29, 2023

Depois da Alex, agora um Fred.
Da caixa de Pandora que a Tomba-Todos abriu, sai de tudo.
Até uma certa sereia bem nutrida que deu à costa em Puglia deve ter a ver com isto

 

A realidade anda destravada. Ninguém a segura. Ultrapassa a ficção e tudo o que é fake a toda a brida. Desde que se meteram com a Alex Tomba-Todos que a caixa de pandora foi escancarada. Saem monstros que ninguém controla. Caem Ministros, Secretários de Estado, Assessores e não há dano colateral que não ocorra.

Agora parece que até um Adjunto terá andado à trolha no ministério, depois terá fugido e, para a cena ser mais pythoniana, chegaram os chuis e tomaram conta da ocorrência. O jovem Fred, por sinal um rapaz bem parecido, que as verdades são para ser ditas, para além de um eclético e ongoing estudante, parece ser também um ágil candidato a actor de filme de suspense, acção e comédia.

Para que seja um full faca e alguidar falta ainda aparecer uma dose bem apimentada de adultério (e não digo quem com quem para não levantar a lebre), um gémeo desconhecido que aparece para surpresa do incumbente (pode, por exemplo, ser um gémeo separado à nascença do Medina), uma tia muito velha que deixa uma bruta herança que toda a malta no parlamento vai disputar à batatada, e um qualquer que, do nada, aparece vestido de mulher assumindo-se trans e pedindo para o tratarem por Cátia.

Tudo pode acontecer. No meio disto, para esfriar os ânimos e para ver se consegue fechar a caixa de pandora que a super-Alex abriu, acredito que o bom do Marcelo é menino para arranjar uma gala para sortear condecorações. 

No meio disto, faço notar que o grande e eterno Álvaro Amaro, em seu tempo, curiosa e conceituada figura cavaquista, ao fim de mil anos foi condenado a três anos e meio de pena suspensa. O cavaquismo tão bom que ele era. Quem também é boa é a Justiça. Já a gente nem se lembra das coisas quando elas têm desfecho.

No extremo oposto, o fantástico desempenho da economia portuguesa que passou a perna aos companheiros europeus. 

Pena é que, em vez de se falar disto, que isto, sim, era caso para estarmos todos felizes, andemos todos a descobrir as cegadas surreais com que os assessores e adjuntos andam por aí a entreter-se para gáudio do pagode. 

Ou isso, ou o que uns certos canalhas andam a tramar com fugas de informação e merdices que a toda a hora são lançadas para o ar, poluindo mais o ambiente do que as poeiras do deserto, as cinzas dos vulcões ou a bíblica praga de gafanhotos.

No meio disto, agora a notícia da inauguração de uma sereia que está a deixar meio mundo admirado, dizem que nunca viram sereia assim. 

“It looks like a mermaid with two silicone breasts and, above all, a huge arse never seen before on a mermaid. At least not any I know.”

Parece que as sereia que alegadamente costumam andar por aí a dar as caras são muito diferentes, todas meio delambidas, meio enfezadas. Cuzudas, mamalhudas como esta nunca se viu, atributos assim não parecem coisa de sereia. 

Adolfo Marciano, the headteacher of the Luigi Rosso art school, hailed the statue as a ‘tribute to the great majority of women who are curvy’. Photograph: Monopoli Times

Mas é o que é. O fim dos tempos. Cá para mim é mais uma aberração que se escapuliu da caixa de pandora que a insuspeita Alex destapou.

Nem sei se quero ver o que ainda está para vir...


Desejo-vos um bom sábado
Saúde. Pachorra. Paz.

sexta-feira, abril 28, 2023

Sobre o vídeo com Augusto Santos Silva, Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e outros: nada.
Prefiro os trabalhos de Gerhard Haderer

 

Mais uma vez tivemos um caso a preencher o dia. Todos os dias as televisões têm que ter casos para terem pretexto para nos enxamear os ecrãs com comentadores e toda uma chusma de opinadores que tanto opinam sobre finanças como sobre companhias de aviação como assuntos jurídicos ou sobre o preço das batatas. 

E, quando não há casos, a comunicação social cria-os. A seguir, cinicamente, vêm sugerir a dissolução da Assembleia por causa da sucessão de casos e casinhos. Claro que, a bem verdade, há que dizer que, a seguir, vem Marcelo também alimentar o tema 'dissolução'. Um círculo vicioso.

A divulgação do vídeo feito na Assembleia da República quando Augusto Santos Silva, Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e outras pessoas conversavam, entre eles, informalmente, é de uma imperdoável canalhice. 

Recuso-me a comentar uma conversa breve e inócua entre pessoas que se conhecem há muito tempo e acho uma coisa de vizinhas, de gente desocupada, tudo o que se diga em torno do que eles conversavam entre eles.

E concordo que se apurem as responsabilidades para se descobrir quem fez a pulhice de divulgar uma conversa cuja gravação e divulgada não foi autorizada.

Quanto às reacções do Chega e do IL são o que são, são aquilo a que nos vêm habituando, populismos exacerbados, palhaçadas, cegadas que poluem o espaço público, que visam minar a credibilidade da democracia. 

O que penso sobre isso já aqui o tenho vindo a dizer: não digo que se lhes corte o pio senão vão vitimizar-se. Digo apenas que, em minha opinião, pela vacuidade e pelo desrespeito que mostram pelas instituições democráticas, o pio deles merece desprezo e não palco.

A bem de uma respiração saudável no espaço público, os círculos viciosos têm que ser travados.

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O que me parece digno de realce são os trabalhos do caricaturista e cartoonista austríaco Gerhard Haderer. O mundo actual passa todo por aqui e melhor faríamos todos se parássemos para pensar um bocadinho no que andamos para aqui a fazer.











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Desejo-vos uma bela sexta-feira

Saúde. Cabeça fria. Olhos abertos. Paz.

quinta-feira, abril 27, 2023

Quando o que não pode fica preso onde não deve

 

Quem lida com casos médicos costuma contar as situações bizarras que aparentemente começam como uma brincadeira, como uma inofensiva ousadia ou como uma leviana experimentação e acabam nas urgências do hospital. Geralmente há alguma criatividade envolvida, com objectos inesperados introduzidos onde menos se espera e, azar dos azares, impossíveis de lá tirar.

Não vou referir casos ouvidos mas vou, antes, falar de uma outra situação que, apesar de envolver um objecto normal que foi enfiado no sítio devido, também acabou com intervenção médica.

Ela era minha colega de faculdade, grande amiga, e ele era o seu muito amado namorado. Ele vinha do Alentejo e ficava num quarto alugado. A dona da casa proibia 'poucas-vergonhas' lá em casa, não queria lá mulheres. 

Muito obediente, ele dizia que claro que sim mas claro que fazia de tudo para aproveitar qualquer pequena oportunidade. Por isso, numa das vezes em que a senhora não ia estar em casa durante um bocado, eis que a minha amiga é sorrateiramente introduzida em casa e, ala moça que se faz tarde, eis que, pouco depois, já estão os dois num animado truca-truca no quartinho dele.

Mas, claro, sempre com o ouvido alerta o que, como é bom de ver, aumenta a adrenalina.

E estão, portanto, os dois no maior chamego e agarração quando ouvem a senhora a meter as chaves à porta. Maldição. Desgraça. Como é que a minha amiga ia conseguir sair de casa sem a senhora a ver? Impossível. Ai...

E é então que acontece o pior. Ela grita em surdina: Sai! e ele grita igualmente em surdina: Deixa-me sair! e ali ficam os dois na maior aflição, presos um ao outro. Passado um bocado ele já gemia por se sentir apertado e ela já gemia sem saber como sair daquela vexante aflição. 

Manda a sapiência que, em situações de aperto, os envolvidos se mantenham calmos, respirem fundo, relaxem. Mas isso foi tudo o que os pombinhos não fizeram.

A partir daqui já não me lembro dos pormenores. Sei que tiveram que ser intervencionados, provavelmente algum relaxante adequado a uma crise de vaginismo.

Mas não ficaram traumatizados pois contavam o acidente na maior boa disposição. A bem da verdade, mais ele que ela pois ela contava que nunca se tinha imaginada a passar por um tal sufoco, tinha sido uma coisa verdadeiramente do cara...ças.

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O pai dele ficou preso na cadeira por uma parte do corpo... 
| Que História É Essa, Porchat? | GNT

O Fábio veio contar uma história pra lá de cabulosa! O pai dele estava usando duas cadeiras plásticas para tomar banho e uma parte beeeem dolorosa ficou presa entre elas. 😱 A mãe dele ligou pedindo ajuda e foi preciso uma engenharia pra desprender o... 👀

Um bom dia

Saúde. Bom humor. Paz.

quarta-feira, abril 26, 2023

As televisões, as rádios e os jornais podem fazer o favor de parar de dar palco ao Ventura, ao Chega e aos grunhos que odeiam a democracia?

 


Estive ocupada todo o dia e ainda não ouvi os discursos do 25 de Abril nem sei em que consistiram as comemorações oficiais. Mas vi imagens tristes de uns grunhos (em que gente acéfala ou ainda mais grunha que eles votou e que, por isso, agora estão na Assembleia da República). E ouvi o Santos Silva a dar-lhes uma merecida desanda. E vi o Lula a mostrar que já virou muitos frangos e já viu muitos destes arruaceiros armados em espertos.

Vi também imagens do chefe dos grunhos, o grunho-mor, cá fora a falar para as televisões.

E pensei aquilo que penso sempre que vejo estes atrasos de vida: mais do que a opinião livremente formada a partir do conhecimento dos programas eleitorais é a televisão que decide eleições, colocando a jeito, em destaque, aqueles em que o eleitorado mais influenciável vai votar.

E as televisões bem como as rádios andam sempre atrás do Ventura, dão-lhe palco de forma ininterrupta. Sabem que ele tem sem sempre bocas, tem sempre alguém para denegrir, tem acusações ou insidiosas insinuações para fazer, tem sempre pedras para atirar, tem sempre um vómito prestes a sair-lhe da boca. E a comunicação social aposta nisso, acredita que é isso que dá shares. E o drama é que dá shares e dá votos.

E esta comunicação social tem também esta característica: alimenta-se e alimenta a maledicência. Haja alguém a dizer mal de alguém e aí estão eles a pôr-lhes um microfone à frente das beiças e uma câmara apontada às trombas para lhes alimentar o ego. E, com um microfone e uma câmara a gravar-lhes as perfídias, esta malta sente-se importante. Vão aparecer na televisão a dizer mal, a deitar abaixo. Sentem-se os maiores. Bolsam ainda com mais entusiasmo. 

E a nossa comunicação social vive disto.

E, com esta informação, a comunicação social estimula o rebanho de grunhos que não sabe do que fala nem tem uma ideia sobre como fazer melhor mas que sabe enlamear os governantes, os deputados honestos, os políticos em geral. É uma cambada que só sabe dizer mal, uma cambada que vive de tentar minar a confiança  nas instituições democráticas.

É para estes que o Ventura fala, para os burros que gostam de deitar abaixo, que gostam de intriga, de injúria, de insultos. 

E é de toda esta tropa fandanga que a comunicação social se alimenta.

Se durante um ou dois meses de seguida a comunicação social não desse palco ao Ventura, ele cairia a pique nas sondagens. Porque o Ventura é um saco que lá dentro só tem ar e porcaria. Propostas construtivas zero. Tirem-no do ar e todo o bluff Ventura e Chega se esvaziará num ápice.

Marcelo faria bem em reunir as estações de rádio e televisão e os jornais e pô-los a discutir o seu papelinho (ou 'papelão, na expressão de Lula) no fomento do populismo e na ascenção de um partido de broncos, mal educados, populistas despudorados. E que eles pusessem a mão na consciência. E que decidam: ou vão continuar a alimentar a serpente que pode minar a saúde da democracia ou vão procurar informação e entretenimento com cabeça, com ética, com amor ao país e deixam de propagandear o Ventura e o Chega.

E, para já, é o que me apetece dizer.

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Entretanto estou a ver na RTP 3 (num programa que se chama Tudo é Economia) uma grande intervenção da ministra Mariana Vieira da Silva -- uma inteligente, lúcida, sóbria e competentíssima governante. Uma lufada de ar fresco. 

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A imagem lá em cima é Red Carnation As In A Stage da autoria de Eversofine

O Vitorino está aqui porque não quero pôr o vídeo com um dos meus netos a cantar a Queda do Império com uma voz e uma musicalidade que me emocionam 

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Um dia bom

Saúde. Paz.

Viva a democracia e viva o meu País

terça-feira, abril 25, 2023

O 25 a caminho dos 50

 

Não me apetece agora contar onde é que estava no 25 de Abril. Já o contei. Está contado. 

Se fosse hoje, curti-lo-ia com uma emoção bem mais acentuada. Mas, se fosse hoje significaria que teria passado grande parte da minha vida em ditadura e isso é daqueles pesadelos que ninguém merece. 

Devia haver nas escolas aulas de teatro em que se encenasse o que é a ditadura para que as crianças e os adolescentes percebessem bem o que é a ausência de liberdade. 

Seja de esquerda ou de direita, uma ditadura é uma ditadura é uma ditadura -- e qualquer ditadura deve ser abolida.

Não vou festejar este 25 na rua. Festejá-lo-ei em círculo mais restrito. 

Não vou ver pela televisão os discursos pois estarei ocupada com outras coisas. 

Mas espero que Marcelo puxe a conversa para o que interessa. 

  • Uma democracia saudável tem que ser vivida no respeito pelas regras e pelas instituições. Não se dissolvem assembleias nem se apeiam governos por dá cá esta palha nem isso deve ser banalizado como se fossem tremoços ao lado dos copos da cerveja. As coisas sérias não devem ser vulgarizadas, nem se deve falar disso como se fosse uma piadola sem consequências.
  • Também não é saudável que, para que as televisões e as rádios tenham matéria picante para comentar, discutir, polemizar, guerrear e, em suma, animar a malta e, de passagem, aumentar o share, se empole tudo o que é minudência e se transformem os governantes em sacos de pancada.
  • Não deve ser subestimado o perigo do populismo nem deve ser relevada a propaganda gratuita e permanente exposição que os meios de comunicação social proporcionam  a pessoas sem escrúpulos como o Ventura e seus apaniguados.

Em contrapartida, como fonte de motivação, inspiração e orgulho, deverá passar a ser dado realce permanente a:

  • A trabalhos de investigação, 
  • a conquistas tecnológicas, 
  • ao desenvolvimento de novos produtos e serviços, 
  • a novas metodologias de aprendizagem,
  • à criação artística
  • às belezas naturais e à história e hábitos de cada recanto do nosso país.

tal como deve prestada séria e urgente atenção a questões críticas como 

  • a necessidade de inverter a tendência demográfica do país
  • a necessidade de identificar profissões em que há falta de recursos, verificando ASAP como colmatá-las
  • a necessidade de regular e enquadrar a Inteligência Artificial
Identicamente deve ser dada grande atenção ao desenvolvimento do interior do país, criando focos de atração e fixação de pessoas, seja por:
  • acarinhar o teletrabalho, nacional e internacional,
  • por dinamizar o turismo cultural ou gastronómico, 
  • seja por criar novos modelos de negócio sustentável e de âmbito regional, que, por sua vez, suscitarão a criação de empregos nos domínios dos serviços. 

Resumindo: se o discurso de Marcelo se elevar e se situar num patamar de defesa do superior interesse do país numa lógica não apenas de curto mas também de médio e longo prazo talvez eu depois veja o discurso à noite.

Senão, não vale a pena. 

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Pinturas de Alfredo Luz

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E viva o 25 de Abril. 

Sempre.

segunda-feira, abril 24, 2023

As vacas e os bois correm para a ouvir cantar

 

Na caminhada da manhã apanhei um ramo de rosmaninho. Coloquei-o num vasinho com água dentro de outro vaso não furado, portanto, como se pusesse as flores dentro de água.

De tarde, estive a transcrever folhas na mesa que está debaixo do jasmim amarelo e da buganvília fúcsia e que tem a dita rosemary, na pseudo-jarra, em cima. O perfume de tudo é uma maravilha mas o perfume da rosa maria sobrepõe-se agradavelmente.

O cabeludo estava deitado aos meus pés. Um pássaro andava por ali a saltitar mas, como era pequeno, o cabeludo tomou-o por inofensivo e, portanto, nem se dignou mexer um pêlo.

Quando o meu marido veio lá de dentro, queixei-me que já me doía o braço, se calhar porque a mesa é alta demais para eu estar a escrever ao computador em cima dela. Para atenuar, sugeri que me preparasse uma bebida boa. Cavalheiro como é (e, certamente, com um certo peso na consciência por ter desistido de me ajudar na minha esforçada empreitada) veio de lá com um copo apetitoso só de olhar: sumo de laranja, um bongo, rum, nêsperas aos bocados e um bombom de gelado de chocolate preto e frutos vermelhos. Estava delicioso mas a única coisa que fez parar a dor no braço foi parar de escrever.

Tirando isso, posso dizer que hoje lavei as forras de almofadas aqui da sala e, por isso, agora que estou sentada no sofá, no meio delas, envolvem-me com um cheirinho fresco a sabão de marselha. 

Poderia ainda dizer que, ao fim deste tempo todo, eu e o meu marido continuamos sempre com vontade de dormir mas isso seria, para vocês, um déjà-lu. Mas, ainda assim digo: levantamo-nos com vontade de continuar a dormir, a seguir ao almoço, se pudermos, encostamo-nos onde calhar e dá-nos o sono e, mal nos sentamos aqui à noite, se não tivermos nada que nos impeça, fechamos os olhos e, passado um bocado, estamos a dormir. Tirando isso, parecemos normais.

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E talvez seja esta indolência que me faz desinteressar-me das tricas-laricas diárias. Ou, então, a covid não me trouxe apenas sono, trouxe-me também um filtro que criva as tretas e só deixa passar coisas como esta aqui abaixo que, sinceramente, acho o máximo. 

As vacas correm para ouvir a senhora a cantar. E canta bem, ela. Agora o que leva os animais a quererem tanto ouvi-la e a a ficarem, encostadas aos muros, para melhor a ouvirem? Bom ouvido? Sensibilidade apurada? Não sei e gostava de saber.

No meio das proezas e riscos da Inteligência Artificial, mudo de rota e deixo-me encantar com coisas assim.


Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Boas vibes. Paz.

domingo, abril 23, 2023

Entre o bafo quente da multidão

 

Na altura das eleições no Brasil disse aqui que obviamente desejava que houvesse um grande não a Bolsonaro. Mas que o meu entusiasmo com o Lula era reservado. Na lógica do mal o menos, ok ao Lula. Mas com muita pena que não haja melhor no Brasil. Um país enorme e complexo como o Brasil para ser bem governado e para ser respeitado interna e externamente tem que ter um presidente bem capacitado, consistente, com uma visão modernista, humanista. Lula está longe disso.

Por exemplo, a posição do Brasil sobre a Rússia a propósito da invasão criminosa da Ucrânia não é apenas dúbia. É também cínica, hipócrita, incoerente. Não sei se estas flutuações de posições, ajeitadas consoante o interlocutor, se devem ao seu caráter pouco consistente ou se Lula é simplesmente uma pessoa pouco informada. Ou se é a lógica interesseira do videirinho que quer fazer negócio e disfarça a coisa com conversa da treta julgando que os outros são mais parvos que ele. Não sei. Seja como for não é uma boa coisa.

E o que sei também é que, por tudo isto, Lula não me merece grande respeito.

Continuo a dizer: entre Bolsonaro e Lula, Lula. Mas que o Lula está aquém, mas muito aquém, do que o Brasil precisa, isso parece-me uma evidência.

E se pensarmos que o Brasil deveria ser um aliado de peso para Portugal, o que me ocorre é esquecer os interesses diplomáticos (que são incontáveis) e mandar bugiar o Lula. Ter um aliado como Lula é pormo-nos a jeito para vários tiros nos pés. Mas porque o Brasil é mais, obviamente muito mais, do que quem o governa, pois que se feche um bocado os olhos ao nonsense em forma de gente que é o Lula. 

(Num aparte, completamente aparte, também devo dizer que não percebo a que propósito é que anda em todo o lado, mesmo nos encontros institucionais, com a mulher a reboque). 

Enfim, uma tristeza.

Mas haja esperança. Por entre o bafo quente da multidão que acarinha gente como Bolsonaro, num quadrante, ou Lula, num outro, pode ser que surja uma consciência, uma voz que se erga. Muda como a exactidão   como a firmeza    como a justiça. Brilhando indefectível.

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Partilho um vídeo Cine Povero que me encanta, um remake de um anterior

Jorge de Sena :: Uma pequenina luz / Por Pedro Lamares


Desejo-vos um bom dia de domingo
Saúde. Ideias claras. Paz.

sábado, abril 22, 2023

Teimosia, determinação ou maluquice? Como se distinguem os defeitos das virtudes?

 




Nas entrevistas de emprego há ainda quem tenha o costume de fazer uma pergunta muito parva: 'qual é o seu maior defeito?'

Claro que a malta que se prepara ou que já está batida nestes números já tem a resposta engatilhada e sai-se com um defeito que, vendo bem as coisas, até pode ser uma virtude. Um muito usual é o da teimosia em que as pessoas tendiam a descrevê-lo como se fosse sinónimo de determinação.

Sempre detestei perguntas destas. Quando assistia a entrevistas, o que acontecia geralmente na recta final, deixava-os fazer as cenas que entendessem e, no fim, fazia eu perguntas que tinham a ver com o que tinha conseguido perceber da personalidade do candidato. Podia até perguntar como era para eles um bom fim de semana ou porque é que tinham trabalhado nisto ou naquilo no início da sua vida profissional. E ouvia-os com atenção e estabelecia uma conversação assente no que eles dizendo. Acima de tudo interessava-me perceber se era uma pessoa com bom trato, que percebia facilmente questões inesperadas ou como é que reagia quando não compreendia o que eu lhe dizia. 

Felizmente tenho ideia que nunca ninguém se lembrou de me perguntar tal coisa. Tenho tantos defeitos que não saberia eleger o pior. Claro que responderia de forma honesta e não trabalhada. Mas, a sério, não saberia mesmo o que dizer. Só se fosse, talvez, padecer de uma grande e indisfarçável impaciência perante gente burra. Este reconheço como um grande defeito pois, volta e meia, traz-me alguns constrangimentos, especialmente, porque é um defeito pouco discreto.

No entanto, a propósito do tal defeito que toda a gente não se importa de confessar, tenho que reconhecer que também sou teimosa. Mas é uma teimosia que não sei se é teimosia ou se é mesmo determinação. Por isso, não acho que a minha teimosia seja defeito. Mas não o digo com absoluta convicção.

Vou dar um exemplo para explicar.

Já aqui contei que o computador que usava foi à vida. Por isso, tenho andado a tentar recuperar o que posso mas, ao mesmo tempo, aproveitando para limpar inutilidades. E também já contei aquilo das disquettes e dos ficheiros em formatos ilegíveis. Mas agora vou falar num caso concreto.

Há mil anos já eu me punha, noite adentro, a escrever. Eram os meus filhos pequenos quando me deu para escrever um livro. Mas essa era uma altura em que, entre ocupar-me deles e trabalhar, pouco tempo me sobrava. Portanto, deixei que acabasse o programa de escrita que usava e deixei que acabassem as disquettes. E, ao longo de todos os anos, sempre dei o trabalho por perdido. 

Até que agora descobri um ficheiro com o dito livro mas num formato meio desconfigurado. Algures no tempo, há outros mil anos, devo ter tentado converter o ficheiro num ficheiro word e aquilo saiu todo descabelado, letras trocadas a torto e a direito. Quase não há uma palavra direita. E não dá para usar o corrector automático senão ainda seria pior. Assim, pelo menos, estão assinaladas. Mas, imaginem a palavra que aparece como 'pana'. É o quê: pata, pala...? Ou 'xeu'? É o quê: seu, meu, teu, leu...?

Mas nada que me tenha assustado. Ao longo de dias, horas a fio, revi o texto, puxei pela cabeça, resolvi as charadas. Até que, tendo conseguido perceber o que ali estava, cheguei à conclusão que aquilo era apenas meio livro. Fiquei passada. Tanto trabalho para afinal ser apenas metade...? Fiquei mesmo desconsolada.

Então, uma noite, a meio da noite, lembrei-me de uma coisa (não sei como me lembrei mas lembrei-me). Naquela longínqua altura, imprimi o texto para melhor o rever e corrigir. E, ao longo de toda a vida em que mudei de empresa e de instalações, transportei meia dúzia de tarecos, nada mais que meia dúzia de tarecos desimportantes, entre os quais o dossier com essas folhas, um dossier azul berrante. E, pelo meio, mudei de casa e, por fim, deixei de trabalhar. Portanto, ao acordar a meio da noite, ocorreu-me que, se encontrasse esse dossier, talvez conseguisse melhor recuperar o desgraçado do 'livro'. Puxei e puxei pela cabeça e não me lembrava. Temi que tivesse ido para o lixo, que lhe tivesse perdido o rumo, ou, na melhor das hipóteses, que estivesse nalgum dos caixotes que ainda está na garagem à espera de melhores dias. 

Pois, não sei como, não faço mesmo ideia, mal me levantei fui direitinha a uma estante, olhei para baixo e, no meio de dossiers da treta, lá estava aquele, o velhinho dossier azul. Abri-o num stress. Era mesmo ele. Folhas impressas, cheias de emendas a lápis, algumas folhas já coladas umas às outras.

Portanto, enchi-me de esperança. A partir dali daria para reconstituir. seria preciso 'dactilografar' as páginas que faltam no ficheiro janado que já emendei. 

Olhei e pensei que nunca mais. Lembrei-me então de pedir ajuda ao meu marido. Eu dactilografo umas e ele outras, eu muito mais que ele pois sou muito mais rápida que ele. 

Podem imaginar... protestou, protestou, protestou. Mas quando me viu, sozinha, atirada a tão ingrata tarefa resolveu fazer essa caridade. Agradecida, dei-lhe uma dúzia de folhas. 

Pois bem. Ao fim de um bocado disse-me que é um trabalho estúpido porque aquilo não vale nada. Uma história banal, muito palavroso. Uma xaropada.

Fiquei um bocado desmoralizada. Tanta trabalheira para recuperar... uma porcaria...?

Poderia desistir. Se calhar é o que faria sentido. 

Mas não desisto. É como se fosse uma prova de respeito por aquela que fui escrevendo até de madrugada, depois de tratar dos meus filhos, de pô-los a adormecer, e antes de me levantar cedo para ir trabalhar para outro dia repleto de canseiras. 

E penso que, depois de ter o texto inteiro, poderei revê-lo, eliminar adjectivações desnecessárias, limpá-lo de advérbios de modo sem os quais as ideias possam passar bem, dar um jeito.

Portanto, não sei se é teimosia, se é determinação ou se é, simplesmente, maluquice mas, caraças, hei-de voltar a ter o meu 'livro' de volta. Depois logo vejo o que fazer com ele.

Entretanto, ando a coser as pontas, os rasgões, a aplicar remendos, num trabalho de paciência e teimosia que não sei onde vai desaguar mas que, até lá, me ocupa os dias e os neurónios. 

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As pinturas são da autoria de Mimi Parent, pintora surrealista e acompanham Batzorig Vaanchig que canta os guturais cantares mongóis com a sua filha

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Desejo-vos um bom sábado

Saúde. Paciência. Paz.

sexta-feira, abril 21, 2023

Será que o que os faz a eles viverem melhor também se nos aplica?

 


Lidei profissionalmente com japoneses e confesso que não adorei. 

Claro que não se podem fazer generalizações. Não posso pensar que são todos como aqueles com quem me relacionei. Mas como são os que conheço, vou falar deles.

Para já eram ultra picuinhas. Tudo era analisado ao milímetro, tudo era esmiuçado até ao limite da nossa paciência, pelo menos da minha. Frequentemente tinha vontade de dar um basta pois nem percebia para que era aquela necessidade deles de perceberem cada ínfimo pormenor.

Eram muito simpáticos mas, para o meu gosto, um pouco demais. Começavam a dar apertos de mão e ficavam naquilo durante não sei quanto tempo, as mãos para cima e para baixo, a cabeça baixa, a sorrir. Não sou disso, tinha que fazer um esforço para me manter também sorridente, com a minha mão não sei quanto tempo no meio de uma mão alheia.

E já contei: a meio da negociação punham-se a falar japonês entre eles e eu e os outros portugueses que esperássemos. Ficava incomodada e mal disposta e mostrava a minha impaciência, mas eles nem aí.

E uma das piores, creio que também já aqui falada: imaginem uma reunião determinante e uma mesa cheia de gente. Tudo previamente acordado. Eles próprios, nos preparativos prévios, diziam quem queriam conhecer. Uma mesa cheia. E, para início de conversa, no início da reunião, tudo cheio de etiquetas, oferecem-me um presente, por sinal um lenço de seda pura, lindíssimo. Ainda o tenho, é uma maravilha. Mas imagine-se. Vamos começar a reunião e eles, com pompa e circunstância, aprontam uma destas. 

Tenho ideia que também tínhamos qualquer coisa para lhes oferecer mas não ali, à frente de toda a gente, em plena reunião e, sobretudo, nunca um presente apenas para um, deixando os outros a olhar. 

Porque o pior ainda foi isso: um presente para mim e nada para quem me acompanhava. Ainda por cima não era coisa que eu pudesse dividir com os outros. Ou seja, para mim, aquilo foi um gesto indelicado pois penso que ou se oferece a todos ou não se oferece a ninguém. Portanto, senti-me mesmo mal. Mas pior ainda que isso: com eles a sorrirem para mim, a escrutinarem a minha reacção, tive que agradecer e sorrir e sorrir e sorrir.

Depois queriam visitar tudo (tudo previamente combinado ao detalhe, claro) e lá andámos com eles. E faziam questão de ficar em fotografias comigo, todos sorridentes. 

Havia depois o jantar mas eu não apenas detestava jantares de serviço como já não aguentava tanta simpatia e tanto sorriso. Foi a que era o meu braço direito mais um de um outro departamento. Contou ela que veio de lá estafada. Imagino.

E a simpatia chegou ao ponto de quererem dar o meu nome a um produto que iam lançar, coisa que, na altura, me pareceu até quase infantil. Claro que achei uma certa graça mas já na altura pensei que era o tipo de coisas que só ocorriam a japoneses. Lidei com tanta gente de tantos países e simpatias deste tipo só mesmo com eles.

Note-se que, no que digo, não há crítica negativa mas apenas o reconhecimento de que a questão cultural é relevante quando se avaliam hábitos ou ideias de gentes de outras geografias, sobretudo de culturas milenares. Pode não nos fazer sentido mas não devemos rejeitar liminarmente pois o que acontece é que vivemos em comprimentos de onda diferentes.

Por circunstâncias diversas, algumas já aqui referidas, os meus dias agora têm ainda menos tempos livres do que antes. Por isso, durante o dia não vejo televisão nem sei de notícias, muito menos intrigas ou fofocas. Mas gosto de espreitar os vídeos que o YouTube tem para me mostrar. 

Hoje apareceu-me o vídeo abaixo. Fui ver com alguma curiosidade. Logo o primeiro hábito me pareceu uma certa bizarria. Nem sei qual a credibilidade do autor do vídeo. Mas, seja como for, vi até ao fim e fiquei a pensar que, se calhar, alguns até fazem algum sentido. Aqui fica, à vossa consideração.

8 hábitos simples que vão tornar a sua vida muito melhor

E bora lá limpar bem as casas de banho!

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Desejo-vos um dia bom

Saúde. Harmonia. Paz.

quinta-feira, abril 20, 2023

Eu, analógica, num mundo cada vez mais digital

 

De manhã fui com a minha mãe a uma clínica para ela fazer um exame sofisticado que só se faz ali, pelo menos que a gente tivesse descoberto. Não fui só eu, foi também o meu marido e, claro, o nosso companheiro de guarda.

Tirando a minha mãe que fica sempre meio baralhada no meio do trânsito, em especial quando anda nas vias mais frequentadas, dos outros só o urso não conhece a cidade. Contudo, o nosso conhecimento não nos salva. Quando não se conhece bem o pedaço para onde se vai, se não levamos um bom gps é certo e sabido que vamos andar às voltas sem atinar com a estrada onde virar. Portanto, salva-nos o Waze. E ainda assim, está bem, está... Por vezes é preciso tomar decisões na hora e, no meio de várias faixas preenchidas em contínuo, se a gente pensa que é para virar lá mais à frente e, afinal, é antes, quantas vezes já não conseguimos virar para lá...

Quando chegámos à clínica, tudo muito automatizado, desde a inscrição até à entrada para os gabinetes, pensei que a minha mãe sozinha não conseguiria orientar-se. Habituada a ser autónoma, está contudo muito virada para o mundo analógico. Ali, ou as pessoas já estão programadas para encarreirarem naquela lógica ou, então, vão sentir-se perdidas.

Mas as coisas começam logo antes. Ao entrarmos para o parque, o meu marido não viu o botão da via verde. Mas, às tantas estava à espera de um botão, e aquilo já está uns passos mais à frente e já não funciona com botão. Tirou um bilhete.

O pior foi para sair. Há que pagar antes de sair, como é óbvio. E, também como é óbvio, não se vê vivalma. Portanto, a primeira dificuldade foi descobrir a máquina. A segunda foi atinar com a dita. O meu marido foi tratar do assunto. Passado um bocado voltou ao carro, que eu fosse lá para ver se descobria onde enfiar o bilhete. Lá fui. Os dois a olharmos para a máquina, hermética, sem descobrirmos uma única ranhura viável. E digo viável pois vimos uma mas púnhamos lá o bilhete e não acontecia nada. Claro que o tempo a contar.

Lá vi, na big e prá frentex caixa negra, discreto, quase invisível, o símbolo de um telefone. Carreguei. Ao fim de um bocado, uma voz saiu da máquina. Perguntei onde é que enfiava o bilhete. A voz disse-me que se encostava ao sítio onde estava uma luz âmbar. O meu marido encostou e no visou apareceu uma verba. Lá conseguimos pagar e, com o bilhete pago, lá nos dirigimos para a saída.

Posso ainda contar um outro episódio.

Em mim, a mania de escrever já vem lá de trás. Nos idos do outro século escrevi umas coisas. Usava-se disquettes e eu, numa de querer preservar as coisas, temendo que os computadores se estragassem ou fossem substituídos, guardei essas obras em disquettes. E nunca mais me lembrei de tal coisa. Tal como me esqueci de converter os ficheiros de DW4 ou 5 em Word. Agora que ando numa de tentar recuperar coisas, tenho para ali tralha a que não consigo aceder nem por mais uma. Então tive a ideia de ver se há algum zingarelho que leia disquettes e permita passar os ficheiros idosos para dentro de computadores actuais. Pareceu-me que sim. Alegrei-me. Então passei pela Fnac e perguntei se tinha tal coisa. O rapaz ficou estupefacto, que já não há disquettes desde o tempo em que as galinhas viviam debaixo de água (não usou estas palavras mas vi que era em coisa assim que estava a pensar). Completou dizendo-me que tentasse online pois nas lojas físicas já não há disso. 

E eu pensei também que dito desta forma também dá que pensar: este mundo ainda é o mundo da minha mãe mas como poderá ele orientar-se se lhe faltarem as lojas físicas? 

E eu? Quanto tempo levarei até sentir-me obsoleta, incapaz de me encaixar no mundo virtual em que os humanos já só se manifestam a partir de máquinas e em que as lojas tendem a não ser físicas.

E hoje, ao ler A torneira, pensei que também já me aconteceu ver uma bela torneira, sem dúvida uma interessante peça de design, mas não fazer ideia de como manejá-la. No meu caso só me ocorria que devia haver um botão ou comando algures, mas, por razões estéticas, completamente oculto. A sensação de impotência e desadaptação bem vincadas...

Isso ou uma vez que estava num daqueles encontros em que há actividades em permanência não nos dando um minuto para desfrutar a excelência das instalações em que, à pressa para não chegar atrasada, entrei no elevador e não lhe vi um único botão. Sozinha numa caixa de vidro, totalmente transparente, a ignorância totalmente exposta, e incapaz de marcar o piso para onde queria ir. Tive que fazer o papel de saloia e ir à recepção pedir explicações. Claro que agora isso já se banalizou mas, há uns anos, era, para mim, absoluta novidade.

Outro exemplo: no outro dia, ao querer fazer uma qualquer coisa, um jovem disse-me que só dava via app. E estava admirado por eu ainda não ter a app.

Todo o mundo caminha aceleradamente para a digitalização, para a desmaterialização, para a sofisticação cada vez mais abstracta e vai deixando para trás os que não conseguem acompanhar o passo. 

Isso ou o que me aconteceu no outro dia. Deitei-me com o telemóvel carregado. De manhã estive a ver as mensagens e as notícias. Tranquilo. Nos noventa e tal por cento de bateria. E, de repente, desligou-se. Tentei ligá-lo e nada. Até que, na fracção de segundo entre tentar ligá-lo e ele desligar-se instantaneamente consegui ver que estava com 0% de bateria. Não encontro explicação. Só que, depois, não consegui carregá-lo pois o que tinha comigo era para carregá-lo via PC e o PC também se tinha avariado. Portanto, fiquei totalmente incomunicável e incapaz de interagir com imensas coisas. 

Numa situação destas, que pode acontecer a qualquer um, como é que um cidadão sobrevive neste mundo como o nosso?

E se esta conversa tem a ver com coisas comezinhas, imagine-se com a inteligência artificial. Como conseguiremos acompanhar o passo sem sermos cilindrados? Já não vai ser possível travar a força do mar com as mãos. Só vejo uma hipótese: hibernar. 

How to stop AI going rogue

Artificial intelligence is improving so fast that no one knows what it might be capable of. It brings huge opportunities, but also huge risks. Arjun Ramani, The Economist's global business and economics correspondent, explains what could go wrong.


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Um dia bom
Saúde. Paciência. Paz.

quarta-feira, abril 19, 2023

Pie Jesu

 


Por vezes tenho vontade de não escrever pois sinto que as minhas palavras podem poluir um ambiente que se quer puro, imaculado.

[Vou apenas abrir um parêntesis para dar uma explicação. Num dia em que várias coisas deixaram de funcionar, uma delas foi o computador. Fiquei com ele avariado, inacessível, com todos os transtornos e perdas que, como é fácil imaginar, daí advieram. 

Algumas coisas estavam salvaguardadas mas as mais recentes, talvez do último mês, não. É imperdoável e uma insensatez da minha parte, bem sei. Num dos dias, quando saí, deixei uma cópia a fazer e, quando cheguei, à noite, vi que tinha havido um problema qualquer mas, nas minhas múltiplas e por vezes sobrepostas actividades e com a canseira com que tenho andado, pensei que tinha que ver, depois, o que se tinha passado... e nunca mais de tal me lembrei. Mas, na minha cabeça, a coisa ficou como se tivesse feito a cópia.

Portanto, creio que há algum trabalho de escrita que pode ter ido à vida. Ainda vou ver se há salvação mas, se houver, só o saberei daqui por algum tempo.

Isso causou-me uma alteração substancial de planos.

Mas não dramatizo. No esforço de recuperação que tenho andado a fazer, descobri coisas que julgava perdidas e outras que nem me lembrava de ter feito. Geralmente há em tudo um lado positivo e pode muito bem ter acontecido que este tenha sido um mal que veio por bem. E já fiz a agulha e já estou a reorganizar-me dentro desta nova realidade.

Claro que tive que comprar um novo e começar a ajustá-lo a mim, passo a passo. Não será a mesma coisa que desbastar um cavalo, bem sei. Mas quase.

Até há muito pouco tempo não tinha que me preocupar com nada disto, havia sempre alguém que se ocupava do assunto. Agora, embora pudesse recorrer a ajudas, não quero. Tenho que me tornar autónoma em muitas coisas e esta é uma delas.

De qualquer forma, tenho perdido tempo e tempo e tempo. 

Enfim, coisas que acontecem. E bola para a frente]

Mas, dizia eu, que há situações em que devemos abster-nos de palavras, de palmas, quase até de respirar. Tudo em nome de respeitar o silêncio para nos podermos genuinamente encantar com o que nos é dado ver ou ouvir. A voz de Malakai Bayoh, de 13 anos, é de outro mundo. Belíssima, belíssima. Claro que recebeu um Golden Buzzer. Mas mais do que a chuva de papelinhos dourados é a expressão emocionada e são as lágrimas de quem o escuta que melhor definem o momento de excepção a que ali se assiste.

Malakai Bayoh interpreta de forma superlativa e muito comovente  'Pie Jesu'


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Quanto à belíssima fotografia lá em cima, vencedora do prémio Sony, saberão certamente que não é uma fotografia. Nem as duas mulheres são duas mulheres. Tudo não passa de fruto da Inteligência Artificial. Por isso, Boris Eldagsen, seu presumível autor não aceitou o prémio e lançou o tema para a discussão. Quais os limites? Ou não existem limites? 

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Desejo-vos um dia bom
Saúde. Lucidez. Harmonia. Paz.

terça-feira, abril 18, 2023

Cuidado com a língua quando se fala ao telefone...

 


Houve uma altura em que, no Grupo, se desenvolveu a ideia que, na altura, muitos tomaram por peregrina mas que veio a revelar-se estratégica, de uniformizar sistemas contabilísticos, sistemas de controlling e de planeamento entre todas as empresas.

Isso desencadeou sentimentos bairristas, territorialistas como se fosse questão de credo ou clube de futebol. Não apenas os mais conservadores mas também os que se julgavam revolucionários, todos eram contra. Todos queriam defender os seus sistemas e todos achavam péssimos todos os outros. O núcleo que defendia que se avançasse apesar de toda a oposição, em que eu me incluía, sofreu toda a espécie de destratamentos. A oposição era intensa e vinha de todos os lados. Ir para a guerra sem ter aliados é coisa suicida. Mas eu e mais uns dois ou três éramos assim: acreditávamos nas coisas e atirávamo-nos de cabeça.

O grande salão era pequeno para que todos os CEOs mais os respectivos Directores Financeiros e Directores de Planeamento, Estratégia e Controlling, entrincheirados e coordenados entre si, atirassem a matar sobre os pobres indefesos que queriam que eles abdicassem das suas idiossincrasias e passassem a falar a mesma linguagem.

Todas as semanas, uma vez por semana, havia uma tortura daquelas. As reuniões começavam às duas e acabavam quando acabassem, sempre muito tarde.

Um dos que estava do mesmo lado que eu passava-se. De rastilho curto, volta e meia enervava-se, ficava branco, gritava, quase espumava e nós todos ficámos à espera que ele acabasse estendido, vencido por uma apoplexia. 

Pessoa de muitas actividades, quer no meio empresarial quer no académico quer, ainda, no  político, em dias em que já não aguentava mais, inventava uma desculpa, um compromisso inadiável (embora inexistente) e pirava-se.

Sendo pessoa conhecida, vou mudar-lhe o nome. Digamos que se chama José Pires Oliveira. 

Um dos piores era um que nós dois achávamos intelectualmente um bocado limitado mas que falava pelos cotovelos, invocando argumentos sobre argumentos, cada um mais disparatado do que o outro. Víamo-nos aflitos para rebater as parvoíces que ele dizia, sempre com ar exaltado, como se estivesse a defender a pátria. Este tinha dois nomes em comum com o meu aliado. Digamos que se chama José Oliveira.

Num desses dias, o meu 'sócio', José Pires Oliveira chegou-se a mim e disse-me ao ouvido que ou matava o outro ou se raspava. Raspou-se.

No dia seguinte de manhã cedo, estava eu no trânsito, um trânsito congestionado, eu estafada da canseira da cena da véspera e estafada do trânsito, recebo uma chamada. (Estava em alta voz, claro). Vi José Oliveira. Ao meu 'sócio' eu tinha-o, nos contactos, como José P. Oliveira.

Era normal, quando se pirava, o José P. Oliveira ligar-me logo na manhã seguinte para saber como é que a coisa tinha acabado. Já estava à espera da chamada dele.

Portanto, mal atendi comecei logo a desbobinar: 'Olhe, fez bem em pirar-se. Não perdeu nada. Uma seca das valentes. O chato do José Oliveira sem se calar, só a dizer disparates, uma pessoa não consegue avançar um milímetro porque aquele atraso de vida não dança nem sai da pista, não faz ideia do que diz mas não se cala, e a gente que o ature. Não dá. Alguma coisa temos que fazer porque assim, com retrógrados destes, a gente não vai a lado nenhum'

Estranhei o silêncio pois, em situações normais, ele estaria a rir e a chamar burro ao ao outro. Mas nada. Silêncio. Então perguntei: 'Está? Está a ouvir?'

E então aconteceu o pior. O José Oliveira, o burro, respondeu: 'Estou, estou...'. 

Não sei se conseguem imaginar a aflição... Sem ter como escapar, enfiada no carro, por um momento fiquei siderada, congelada. Depois respirei fundo e assumi: 'Não leve a mal mas ontem saí de lá muito cansada, estou farta de reuniões que duram horas e em que não se consegue avançar. Tanta resistência por causa de uma coisa que todos deviam abraçar pois todos fazemos parte do mesmo Grupo. Mas, pronto, não vamos reatar a discussão de ontem. Ligou-me para...?'

Ele deve ter engolido em seco e conversou como se nada se tivesse passado. 

E nunca mais tocámos naquele triste episódio.

E hoje lembrei-me disto ao ver e ouvir o vídeo abaixo. Na altura, quando se percebe a gaffe, quem vive uma destas só quer enfiar-se por um buraco adentro. Mas, reconheçamos, visto de fora, é um pratinho daqueles...

Heloísa Périssé ligou para o ginecologista, mas... 

| Que História É Essa, Porchat? | GNT

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Fiz estas fotografias durante a caminhada da tarde

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Um dia bom

Saúde. Boa sorte. Paz.

segunda-feira, abril 17, 2023

Um domingo feliz

 

A minha mãe, sabendo que quando a maltinha está junta, é para durar, preferiu ficar a descansar temendo ter que enfrentar muitas horas seguidas de confusão. Mas os que veranearam por terras do White Lotus (segunda temporada) e redondezas regressaram no sábado à noite e a turminha que veraneou por outras bandas também tinha o domingo livre. E nós cá estamos sempre de braços abertos para os recebermos.

Por isso, foi com toda a alegria do mundo que cá os tive hoje em casa e os vi a brincar e a rir, todos desfrutando o calor de uma tarde que parecia de férias e verão.

Há pouco, quando aqui me sentei, vi o vídeo abaixo e fiquei a pensar que deve ser doloroso querer estar radiante com o nascimento de um filho e, estranhamente, sentir tristeza, incapacidade de amar e de estar feliz.

Por sorte, não me aconteceu isso. Talvez tenha a ver com a envolvência. Se uma mãe recente se sentir sozinha, sobrecarregada, cansada, acredito que sinta algum desamparo e abandono e talvez isso impeça a fruição do prazer de ter um filho. 

A mim, o mais perto disto que me aconteceu foi quando nasceu o meu filho. A minha filha ainda não tinha três anos e o meu marido estava a trabalhar há pouco tempo numa multinacional, tendo geralmente projectos com prazos apertados e responsabilidades alargadas. Nem havia licença de parentalidade.

O parto do meu filho, tal como o da minha filha, foi com fórceps. Por isso, eu tinha sido cortada e cosida. O meu filho era muito grande e sempre foi especialmente irrequieto. Mesmo na barriga, dava cambalhotas com tamanha força que me deixava incomodada, como se revolvesse todas as minhas vísceras.

Quando nasceu, mexia-se muito, nunca usou chucha, se eu tentava que se habituasse agoniava-se, e mamava sofregamente, engasgando-se. E, depois, de noite, chorava tanto que não me deixava dormir. Eu dava-lhe de mamar de duas em duas horas e, às tantas, estava tão cansada que não sabia se já lhe tinha dado de mamar ou se era isso que tinha que fazer. Por vezes, para ver se ele se calava, punha-o na minha cama mas tanto se mexia e tanto chorava e esperneava que, por vezes, bolsava-se todo, ficando a cama toda molhada e mal cheirosa. O meu marido, cansado que andava, por vezes chegado do norte às tantas da noite, conseguia dormir. Mas eu quase não dormia.

E de dia tinha que tratar dele e da minha filha que, obviamente, requeria todos os cuidados devidos a uma criança que nem três anos tinha e que, para agravar, era super vagarosa a comer. Eu preocupava-me muito com a comida dela, queria que ela comesse tudo o que era de lei e ela precisava de uma hora para comer devagarinho tudo o que estava no prato. E tinha que lhe dar à boca e distrai-la (coisa que hoje reconheço que era um disparate mas, na altura, eu temia que, se ela não comesse tudo aquilo, ficasse subnutrida). Isto com o outro a gritar por todo o lado, sempre com fome, sempre a querer colo e brincadeira.

Quando cheguei da clínica, os meus pais eram para lá ter ficado a ajudar. Mas a minha avó materna teve um problema qualquer de coração e foi internada, Por isso, a minha mãe entendeu que devia ir para junto da mãe. 

E eu, sem quase conseguir dar passo, quase sem me conseguir sentar, com o leite a subir (que é do pior que há), com o peito a encaroçar-se, quase febril, uma menina pequena a chorar porque queria o porta-bebés para a boneca, um bebé recém-nascido que não parava de chorar e que se agoniava com a chupeta, e vendo os meus pais a dizerem que não podiam ficar a ajudar-me, senti-me seriamente desamparada. Hoje o pai tem dias (ou melhor, tem pelo menos um mês) para ajudar nesta fase crítica. Mas, na altura, isso não existia.

Na altura não tínhamos empregada. E na altura ainda não havia fraldas descartáveis. E poucos supermercados havia. Não sei como conseguia ir às compras com o bebé no carrinho e uma menina pela mão, e eu quase sem me conseguir mexer. 

Mas consegui. Fiz das tripas coração, que remédio.

Uma outra vez de que me lembro pois foi mesmo muito má (e de que aqui já falei) foi quando andava a arranjar uns dentes e, para não perturbar muito a minha rotina de ir buscar um e outro e ir com eles para casa (sem carro), pedi para juntar duas ou três sessões, já não me lembro.

O dentista, familiar, desaconselhou. Mas era-me tão difícil ir do trabalho para a Avenida de Roma, de lá para a minha sogra, da minha sogra, com o bebé ao colo e nos transportes públicos, para a escola da minha filha e de lá, com os dois para casa, que lá me fez a vontade.

Anestesia para além da dose, portanto.

A meio do caminho senti-me meio zonza mas não havia telemóveis e não tinha como, na rua, pedir ajuda ao meu marido. Sobretudo, não podia deixar a minha filha à espera. Portanto, com dificuldade, lá consegui ir buscar um e outro e, com ambos, chegar a casa. Mas já ia feita num oito. Agoniada, uma dor de cabeça que não via nada. Pus o bebé na caminha dele e tentei que a minha filha brincasse. E deitei-me pois não me aguentava de pé. Não a descalcei. Então ela andava com os sapatos em cima da cama e eu sentia a cama a encher-se de areia. E foi para dentro da cama do bebé. Eu via aquilo e não conseguia impedir. E ele chorava como se não houvesse amanhã. E eu impotente, incapaz de cuidar deles. De vez em quando ia à casa de banho vomitar e de lá vinha fazendo um tremendo esforço para não desmaiar.

O meu marido chegou tarde e encontrou aquele panorama.

Mas foi um episódio. Foram fases. Apesar das dificuldades e do cansaço, sempre me senti muito feliz com eles. E arranjava maneira de os fotografar, encantada com eles, sentindo-me bem aventurada, abençoada por ser mãe de duas crianças tão amadas, cantava para eles, arranjava maneira de lhes dar atenção, de brincar com eles. 

São agora adultos, bem resolvidos, bonitos, bem dispostos, mãe e pai de família, com filhos felizes, cada vez mais crescidos. E eu, vendo-os assim, vendo a descendência toda reunida, penso que todos os momentos que vivi desde que os comecei a sentir dentro de mim até aos dias de hoje valeram completamente a pena. Tudo valerá sempre a pena. São momentos sempre abençoados e pelos quais me sentirei sempre infinitamente agradecida.

Mas, por ser assim, mais percebo a angústia de quem sente ou sentiu depressão pós-parto. São sofrimentos que deixam marcas para o resto da vida. Ainda por cima, no caso abaixo, ela não sabia que tinha uma depressão pós parto, pensava apenas que era uma mãe desnaturada, indigna de ser mãe. Sofria porque não conseguia estar feliz e estabelecer uma ligação com a bebé e sofria porque se recriminava por isso.

Não sabíamos

[Com legendas em português]

Jenny Jackson fala da sua experiência e da sua conversa com a sua filha


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Pintura de Berthe Morisot

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Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Alegria. Paz.