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sexta-feira, setembro 10, 2021

No glorioso reino dos memes, dos bazares chineses e dos casais à beira de um ataque de nervos





Por acaso tive um dia muito eclético. Para começar, recebi um mail determinante para o meu futuro próximo. Poderia ter procrastinado na resposta, debatido alternativas, estudado hipóteses. Mas sou mais o oposto disso: se tenho alguma destas pela frente, quero atirar-me logo ao assunto não vá a coisa esfriar. Além disso, em regra acredito que a melhor solução é a mais imediata, a mais simples, a mais intuitiva. Por isso, antes que a cabeça comece a dar nós, vou em frente. 

Ou seja, parte da manhã foi a elaborar a resposta. Comecei a escrever com uma ideia e, depois, aconteceu o que aqui acontece tantas vezes: as ideias tomaram o seu próprio rumo. Refiz o início do mail para que a coisa parecesse coerente.

A seguir fomos para a praia: maré vazia, espaço amplo, um tempo agradável. Uma bela caminhada. Pensei que era bom que as férias estivessem a começar e não, estranhamente, já a acabar.

Depois veio o almoço e, logo a seguir, chegou novo mail: a resposta ao meu. Para que ficasse tudo bem claro, enviei novo mail. Gosto das coisas inequívocas.

Depois fomos até à cidade para tratarmos de uma série de expedientes. Quando regressámos, fui varrer o jardim. Parece que o Outono já chegou. Tantas folhas secas. Pelo meio fui apanhando ameixas. Gordas e doces. O meu marido chamou-me a atenção: não deveria comer mais do que três peças de fruta por dia por causa do açúcar e onde é que as três já lá iam. Respondi que não sei se uma ameixa conta como uma peça de fruta. O meu marido disse que sim. Perguntei se um bago de uva também conta como uma peça. Respondeu com uma pergunta: achas que só um abacaxi é que conta como uma peça de fruta? Portanto, ficámos por ali quanto à dose diária de frutas. 


Entretanto, ele estava cheio de afazeres profissionais: telefonemas de seguida, mails para fazer. Aproveitei para varrer melhor. Fui buscar o ancinho e fui fazendo montes que depois apanhei e levei para o monte da compostagem.

Já passava das sete quando saímos. Passámos por um restaurante para trazer jantar e pusemo-nos a caminho do campo. Ou melhor, para ser completamente sincera, houve uma outra coisa. Reparei que perto do restaurante havia um big chinese bazar. Como tínhamos que fazer tempo para a comida estar pronta, fui lá. Ele ficou no carro a fazer e a receber os seus telefonemas e a ranger os dentes. Diz que estas férias, por razões que o transcendem,  estão a ser passadas maioritariamente em lojas chinesas e isso chateia-o. Gosta de exagerar, como se sabe. Mas, implicações e preconceitos dele à parte, trouxe de lá duas caixas de plástico de arrumação, para colocar no móvel debaixo do lavatório da casa de banho grande. Agora os pacotes de lenços de papel ou coisas assim andam por lá um pouco ad hoc. 
No século passado, o móvel foi construído à medida e, na altura, preocupei-me com o design e com os acabamentos, deixando a funcionalidade para enésimo plano. Hoje, obviamente, tudo se passaria de maneira bem diferente. 
Agora, com estas duas caixas, tudo ficará devidamente acondicionado. Mas ao meu marido tudo isto lhe passa ao lado e embirra é com as lojas dos chineses. Mas, se não fosse aos chineses, onde é que ia comprar as caixas? Só se fosse ao Leroy mas ele também embirra com ir ao Leroy... Portanto, o melhor é não dar muita importância aos seus remoques.

Para esta sexta é que temos pela frente uma tarefa que temo que seja deveras hercúlea: retirar o guarda-fatos antigo do nosso quarto e levá-lo para a arrecadação das máquinas que é longíssimo do quarto, do lado de lá do estúdio. Ele diz que é impossível, diz que para o tirar daqui só partindo-o. Não posso aceitar isso pois preciso dele para arrumar telas e outras coisas que não sei onde pôr. E diz também que, para ele caber na arrecadação, só tirando de lá várias coisas que não se sabe onde pôr.   Aliás, deviam lá ficar só que não devem caber. Ou seja, segundo ele, por todos os motivos, uma equação impossível.

E depois está lá uma coisa mastronça que não faz lá falta nenhuma e que ocupa muito espaço mas que está cheia de coisas como lençóis bordados das tias. São lençóis que são estreitinhos, só mesmo em camas individuais. Mas alguma vez vou deitar os miúdos em camas com lençóis cheios de rendas e bordados...? Passavam-se. 
A coisa mastronça é uma arca enorme em madeira perfumada, creio que sândalo. Mais do que perfumada, a madeira é trabalhada, esculpida. Uma obra de arte. Comprámo-la, eu e a minha mãe, quando eu era jovem adolescente. Deve ter sido ideia da minha mãe eu precisar de uma arca para ir colocando o meu enxoval. Só ideias ultrapassadas e disparatadas. Ainda hoje tenho toalhas, jogos turcos e lençóis desse infinito espólio. Já na casa dos meus pais, aquilo ocupava um espaço precioso e o meu pai, então, embirrava fortemente com ela.
Não me lembro se ainda cheguei a levar a arca do tesouro para alguma das minhas casas mas sei que acabou em casa de uma das minhas avós. Queixava-se que ocupava muito espaço mas, enfim, acabou por receber a indesejável hóspede. 
Quando morreu, nem os meus tios nem os meus primos quiseram nada do que quer que fosse. Deram muita coisa, deitaram fora outro tanto e eu é que fiquei com algumas recordações. E, claro, com o raio da arca já que tinha começado por ser minha. Veio numa leva de mudanças e foi parar à casinha das máquinas. 
E eu só vejo que a solução para aquela casinha passa por tirar de lá a dita cuja. Poderíamos levá-la e colocá-la na cave da outra casa. Mas acho que não deve caber no carro. E é pesada que ninguém imagina. O meu marido fuzila-me quando falo nestas coisas. Mas para lá colocar o guarda-fatos, supondo que ele não o desfaz antes, acho que não há outra solução. 

Só tenho coisas que me ralem, é o que é.


Portanto, como se vê, esta sexta-feira avizinha-se problemática. Vai ser daqueles dias em que mais vale exprimir-me por gestos ou, melhor ainda, estar calada, talvez mesmo fazer-me de morta. A ver vamos, como diz o ceguinho, se chego ao fim do dia ainda casada. 

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Estou precisada é de ioga. 
A ver se, inspirada aqui pelo meu velho amigo Larry, no regresso ao trabalho tenho uma vida mais tranquila e se arranjo tempo e disposição para ir fazer ioga. 

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As imagens de sarcasmo clássico são da autoria de Adnan Cirak que tem uma página cheia delas
Roaring 20s - Panic! At the Disco com Therese Curatolo & Jabu Graybeal
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Desejo-vos uma happy friday cheia de coisas boas
Força aí

sexta-feira, novembro 22, 2019

Segreda à chuva, ao jardim em flor, o meu cicio de amor





Estas semanas não andam a facilitar-me a vida. Escasseia-me o tempo e sobram-me os afazeres. Talvez pudesse ser melhor acomodável se fosse espremido, ou seja, se não tivesse que fazer tantos quilómetros por dia, grande parte deles em percursos sempre atrapalhados, desperdiçando anos de vida no trânsito. Consequentemente, nos últimos dias tenho adormecido aqui no sofá nem conseguindo responder a comentários ou a  mails. Uma lástima.

Acontece que, a noite passada, o meu marido, que ia levantar-se muito de madrugada, conseguiu acordar ainda mais cedo do que o necessário e foi buscar o telemóvel para o pé da cama. Então, quando o despertador tocou, pegou nele, na cama, e, em vão, tentou desligá-lo. Por razões que me transcendem, não conseguiu à primeira tentativa, à segunda e por aí fora. Ou seja, precisada de sono como sempre ando, acordei a meio da noite com um despertador a tocar, sem parar, ao lado da minha cabeça. Claro que ele achou que isso não era nada de especial, que me virasse para o outro lado e voltasse a adormecer. Como se isso fosse possível, furiosa como estava. Ou seja, essas duas horas de sono sonegadas também não ajudaram nada. E daqui a nada tenho que estar a pé pois é a minha vez de ir passar o dia fora. Portanto, atalhando: é esta a história da minha vida.

Mas isto como intróito a despropósito pois o que que quero mesmo dizer é que, quando ia no carro, para almoçar, e tendo apanhado o enésimo incidente na estrada, num daqueles infernais pára-arranca que me roubam qualidade de vida, me pus a espreitar os blogs da galeria do lado. Note-se: isto nos momentos em que estava parada que eu sou muito respeitadora das regras (de trânsito). E um deles foi o do Eduardo Pitta. E, aí chegada, foi uma epifania. Um novo livro de John Williams, o Augustus. Quem não seja dado a emoções esfuziantes perante casos desta natureza talvez não compreenda o que digo, talvez ache que estou a exagerar. Não estou. Uma alegria, uma adrenalina, uma vontade de tê-lo já, de pegar nele, de o conhecer, de começar já a desfrutar. Já aqui o referi e não me canso de o repetir: o Stoner ou o Butcher's Crossing foram daqueles livros que me agarraram do princípio ao fim e que, em minha opinião, ilustram o que é literatura. Verdadeira literatura. Saber que, afinal, havia outro foi para mim uma superlativa alegria. Portanto, tomada por um entusiasmo trepidante, decidi que ia arranjar um bocado para ir buscá-lo. E assim foi.


Ao contrário das últimas vezes, em que entro na livraria de freio nos dentes, à rédea curta e praticamente com uma venda nos olhos, desta vez entrei com um espírito vitorioso. E, portanto, desencabrestada de alto a baixo, foi para a desgraça. Foi esse e outros que me saltaram para as mãos. Tanto livro bom, senhores, tanto livro bom, tão grande, tão incontornável a tentação.

Hoje não vou aqui enumerá-los pois, como qualquer viciado, até tenho vergonha de confessar uma tão grande recaída. Mas, de entre eles, vou falar em sete livros, da mesma colecção, a que não resisti. 'A casa de quem faz as casas'. Livrinhos sobre as casas de arquitectos. Carrilho da Graça, Gonçalo Byrne, Manuel Graça Dias, etc. Eu que gosto de casas, que gosto de livros de arquitectura, que gosto de ler entrevistas a arquitectos, que gosto de decoração, não podia resistir. Acresce que cada livro custa cinco euros. Um achado. Que vontade até tenho de dar um pontapé para o alto no blog e me pôr aqui a desfolhar estes livros. E isto já para não falar nos outros. O Augustus fica para o fim de semana porque os grandes prazeres têm que ser degustados com tempo, com entrega total.

Vim da livraria ajoujada sob um daqueles big sacos que lá vendem e que pus ao ombro, carregadinho como um tesouro pejado de preciosidades. E de tal forma estava pesado que temi que tamanha desconformidade me provocasse uma tendinite no ombro ou me desse cabo dos joelhos pois, quando ando com grandes carregos, os joelhos por vezes parece que ficam com vontade de dar de si. 


Agora à noite, depois de termos ido fazer a nossa caminhada diária, fui ao carro e tentei passar despercebida, tirando de lá o saco como se fosse coisa ligeira. Mas não consegui. Então o cavalheiro foi-se a ele. E ficou passado. Recordou-me a minha determinação em não encher a casa de livros e mostrou a sua estupefacção com o peso do saco. Não tentei desculpar-me. Pequei e como boa pecadora devo assumir a minha culpa. 

Agora tenho-os aqui ao meu lado: livros tão bons. Pecado mais bom de ver. E melhor será de saborear.

Entretanto, tenho estado a ler os comentários sobre mindfulness e lembrei-me que seria uma ideia engraçada sentarmo-nos confortavelmente, eu e os caríssimos comentadores, a conversar sobre o assunto. Penso que seria uma tertúlia animada.


Não podendo, vou dizer uma coisa aqui sobre isso: eu sou uma pessoa que quando se embrenha num assunto estou totalmente nele. Quando aqui estou a escrever, o meu marido volta e meia fala comigo e eu não respondo logo. Eu ouço-o mas é como se fosse uma voz de um outro filme, de um filme que me fosse externo. Ouço-o e sei que tenho que responder mas primeiro tenho que sair do mundo em que estou. O meu marido diz que estou em modo blog. Ou quando me ponho a ler ou a fazer tapetes de Arraiolos ou a pintar: toda eu estou naquilo. Ou quando ando, num comprimento de onda muito meu, a fotografar in heaven (e leia-se com um sotaque british para o Francisco não achar que também me baldeei para o lado dos amaricanos). Posso não ser capaz de explicar ou pode ser coisa tão inacreditável que ninguém me leve a sério mas o que sinto nessas ocasiões é que sou bicho, animal saído de dentro da terra, entregue ao prazer de descobrir flores, pedras, a luz através das folhas, a cor de tudo, os cheiros, os sons, e toda eu, inteira, estou ali, parte do todo (justamente, JV, e nem preciso de fazer Ooooonmmmm). E sinto-me tão tranquila, tão bem, tão em paz que acredito que é assim que se sentem as pessoas que fazem meditação. Agora uma coisa é certa: não ando a questionar-me nem procuro encontrar o sentido do que penso ou do que faço pelo que se o dito mindfulness passa por aí então isso não é comigo. Espero nunca chegar ao ponto de não ter outros motivos de interesse que não o que penso ou digo. Gosto de me desconhecer pelo não tenho qualquer curiosidade em interpretar os meus actos ou os meus pensamentos. E isto não que seja assumidamente anfibológica (thanks, bicho-mau, por mais uma palavra nova) mas a ambiguidade, a abstracção e a gradação de cores entre os extremos do espectro são-me atraentes (qual preto e branco, ó ~CC~? Toda eu jorro cores).

Quanto ao ioga, juro que gostava de saber fazer -- mas mais pelos alongamentos e pela elasticidade do corpo -- e o flutuário, bolas, deve ser fantástico -- mas desde que não me fechem dentro daquela cápsula. Se puder flutuar no azul, em silêncio, e sem estar fechada, juro que vou pedir de presente pelo Natal.


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E agora, pedindo desculpa por incluir um poema tão lindo no meio do salsifré que é este post, vou transcrever o que o anfibológico bicho mucho mau, a quem muito agradeço, me deixou num comentário lá mais abaixo. Para ler em silêncio.

Pena não poder ser lido de olhos fechados. Ou escutado como quem escuta um lento murmúrio.

Cicio de Amor

Aonde, oh aonde te apressas, tão célere assim?
O arbusto do deserto ao vento suplica.

Triste me sinto aqui.
Não anseias também tu por ir-te,
para longe desta poeira jornadear?

Pleno de desejo sim, mas ai de mim,
por estes pés sojugado.
Aonde, oh aonde, tão célere assim?

Aonde quer que fique meu lar,
longe, longe deste lugar.

Que Deus te guie e proteja,
mas peço-te, por amor de Deus,
cedo p'ra lá deste ermo estejas, a salvo deste grã temor,
segreda à chuva, ao jardim em flor, o meu cicio de amor.


Mohammad Reza Shafii Kadkani
(a partir da tradução inglesa por Pari Azarm Motamedi)


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As fotografias referem-se à campanha Rodarte Outono/Inverno 2019 e só estão aqui porque gosto delas. O mesmo acontece com a música que escolhi, Kate Wolf a interpretar Green Eyes: estava a ouvir o Whisper of love e, quando chegou ao fim, passou sozinho para esta que não conhecia e que me soou bem. 

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E a todos uma bela sexta-feira. 

quinta-feira, novembro 21, 2019

Bikram Choudhury: ioguim, guru, predador
[E, a propósito: alguém me explica se essa coisa do mindfulness é coisa que faça sentido ou pura treta ?]



No outro dia, um colega tinha um livro de Mindfulness em cima da secretária. Fiquei beige, como diz a Beatriz Gosta.

Beige. 'Mindfulness? What? O que é isto...?! Conte-me tudo!, mostrei eu a minha perplexidade.
Ele, todo fresco e fofo, tipo nem aí, limpou-se logo: 'Foi ali o nosso colega que me ofereceu' e apontou.
Ainda mais pasma fiquei: 'Jura? Mas quê? Ele acha que você tem que se encontrar...?'
E ele: 'Sei lá, você sabe bem que ele não é bom da cabeça.'
Não engoli. 'Mas ele já tentou a coisa, deu-se bem e recomenda? É isso?'
E ele: 'Acha...!? Se o efeito é o que se lhe vê, melhor nem começar a ler'
Não facilitei: 'Mi engana qui eu gosto. Então eu não tou a ver que tão aí uns quantos post-its? Já leu e achou tão impactante que marcou... e agora não assume... Lindo'. 
Ele não desarmou: 'Foi ele. A sério. Assinalou passagens e diz que eu tenho mesmo que ler.'
E eu 'Ui. E já leu alguma?'. 
'Eu não, mas leia, leia, e depois conte-me'.
E eu: 'Ná, não sou de fiar, sabe bem disso. Se eu ler, reprocesso e conto-lhe uma história toda ao contrário'. 

E assim continuámos, ele sem se descoser e eu sem me aventurar, ou seja, ele a fazer de conta que mindfulness era coisa do maluco ali do lado e não dele e eu a duvidar daquela conversa toda e a querer perceber o racional da coisa. Mas bicha que é bicha sabe fechar-se em copas. Resutado: não pesquei nada, fiquei na mesma. 

Dias depois foi uma amiga, mulher com idade já para ter juízo, que me disse que fez o percurso todo, oito semanas, mindfulness de a a z. E contou como lhe tinha feito bem e como já tinha recomendado a amigos e colegas. Tentei perceber o percurso da cabeça dela e, quanto mais ela falava, mais eu me apiedava. Mas disfarcei: as pessoas tendem a confundir cepticismo com arrogância. Mostrei-me, pois, interessada até porque, de facto, queria mesmo saber de que se trata: filosofia, teologia, terapia, mezinha, remédio para olho gordo, coisada em três actos, espécie de protecção de santo? Mas não consegui perceber.

Já contei: no outro dia, apanhei uma jovem atilada que me falou de como a meditação lhe faz bem. Tentei outra vez a minha sorte: mas é o quê? não pensar em nada? apenas estar atenta à respiração? actua como? desliga os neurónios quase todos e a pessoa fica como se tivesse dormido? 

E pensei logo naquilo de me ter deixado dormir na primeira vez que tentei e de ter quase desmaiado na segunda. A mim estas coisas fazem-me, mas é, ficar esvaída. Tipo purga.

Na volta, isto é bom para quem vive stressado e não para pessoas que têm é falta de dormir mais, como eu. 
Mas sou como a minha avó que a cada médico que ia queixava-se de tudo, mesmo que fosse de outra especialidade e mesmo que já estivesse a tratar-se. Tinha esperança que cada novo médico a quem falava das suas cenas lhe dissesse que não era nada daquilo, que tinha era que tomar outra coisa e que, com um médico subitamente por ela descoberto como milagreiro, teria a vida eterna garantida. 
Eu também: a cada um que me diga que já fez mindfulness, ioga ou meditação, eu quero saber o que é, para que serve, não vá estar ali a solução para manter a eterna juventude e para a minha perene felicidade. Mas preciso de saber exactamente o que é, como funciona.
  • Conhecer o inner self? Dispenso. Tenho mais que fazer. 
  • Dormir de olhos acordados? Se for isso, estou nessa. 
  • Relaxar a mente e o corpo, namely a pele do rosto? Tira as rugas? É para já.
Mas ainda não descobri. Só me falam em coisas etéreas -- pensamento guiado, coisas assim -- nada que eu perceba em concreto.

Até que hoje assisti a um guru em acção. E fiquei varada.

A sério...!? É isto...?!

Courtesy of Netflix

Os professores de ioga vão numa destas? Aparece-lhes um maluco encartado destes, uma macacada sem ponta por onde se lhe pegue, um narcisista tarado, um abusador, e entregam-se ao que ele quer? 

Vêem-se aquelas centenas de pessoas a monte, uma carneirada, um calor dos diabos, todos a fazerem as coisas que aquele alarve ali as manda fazer, todos a acatarem. Acefalamente, submissamente.

Courtesy of Netflix

São estes os professores que depois vão espalhar a mensagem da mindfulness como se de uma religião se tratasse?

A sério. Se é, vou ali e já volto.

Bikram Choudhury: ioguim, guru, predador (e podre de rico)



Ou, para se perceber melhor, um vídeo sobre a criatura mas na Dickipedia, a comprehensive wiki of dicks


E se quem está a ler isto acha que estou sob o efeito de cogumelos colhidos in heaven, pois que leia o artigo publicado no Guardian:

'He got away with it': how the founder of Bikram yoga built an empire on abuse


In recent years, there’s been a growing discourse on intense fitness classes – Crossfit, SoulCycle – as the new secular religion. But if there was one branch that pushed the envelope from religion to near-fanatic cultishness, it’s Bikram yoga, the 90-minute routine of 26 postures performed in a room heated to 120 degrees founded by Bikram Choudhury. Clad in his signature tiny black Speedo and tight ponytail, Choudhury lorded over an empire built on sweat, devotion and $10k a pop teacher trainings – and, as explained in a new Netflix documentary, sexual harassment, rape and maniacal control. (...)
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Estou beige com isto tudo. Beige.

segunda-feira, agosto 12, 2019

Aula prática de ioga
(à beira-mar)





O meu marido diz que fica mais cansado nas caminhadas comigo do que, quando manhã cedo e sozinho, percorre muito maior distância em muito menos tempo.

As minhas paragens nas nossas caminhadas conjuntas quase o exasperam, E digo quase pois ele tem o auto-controlo suficiente para se conter. Explico-lhe que o exercício físico é apenas parte da equação porque o exercício de desfrutar o inesperado e contemplar a beleza faz bem à alma e, certamente, também bem ao coração. Portanto, aconselho-o a que diminua o biorritmo e programe os neurónios para, quando anda a baixa velocidade, ser capaz de contemplar o que o cerca. Por outro lado, faço também eu o esforço de andar de seguida, sem parar de metro a metro. Mas logo aparece novo motivo de interesse e os bons intuitos logo esmorecem. E este domingo foram muitas as razões para abrandar, quiçá mesmo parar - quando não mesmo ficar em stand by

Depois da capoeira, de crianças a brincar em contra luz, de duas reboludas com trancinhas, umas encarnadas e outras roxas, a passearem cãezinhos tão reboludos quanto as entrançadas e bem nutridas donas e de uma madame vestida em full white, um vestido produzido, toda ela como se fosse uma noiva a rebentar pelas costuras do vestido e, curiosamente, a andar de trotineta, e de gaivotas a meditar à beira de água ou a voar com as suas longas asas bem abertas, eis que aparece uma beldade a fazer ioga.

Pus-me a olhar: que elasticidade, que perfeição de movimentos. Pensei no que se passou no outro dia, nem há um mês, quando fui ter uma aula de ioga e ia desmaiando, a pressão arterial nos mínimos dos mínimos. E, no entanto, olhando a elegante e elástica mulher que, no areal, se dobrava e desdobrava, dava a ideia que era fácil. Cada um é para o que nasce.












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Escolhi fotografias em que não se vê bem o rosto da bela mulher -- mas com pena: é mesmo muito bela. Rosto sereno e belo, como elegante e belo é o seu corpo. 

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domingo, junho 23, 2019

Um dia invadido por mistérios -- e um quase desmaio


Árvore queimada em Monchique



Só para dizer que nem sempre uma grande ideia é, de facto, uma grande ideia. Pessoa cuja opinião prezo falou-me na qualidade, na arquitectura e decoração arte nova. Sugeri em casa. Pois que sim, podia ser. Pois bem, para todo o lado desses para que ligássemos, estava cheio. Na net pareceu-me que, por aqui, onde estamos, não, que haveria lugar. O meu marido: não será melhor ligares já? Deixa isso para mim e eu prefiro porque assim informo-me sobre a vista, tiro dúvidas. Ele não, quando liga é a despachar e depois não sabe responder a uma única das minhas questões. Então, como é manhoso, diz que ligo eu pois só assim fico totalmente esclarecida. Mas no dia feriado estive preguiçosa. Só liguei a confirmar na própria sexta. Hélàs, o último quarto fora-se. Incompreensível. Claro que o meu marido teve que se controlar muito para não dizer: 'bem te disse'. E então foi de cernelha: 'eu poderia dizer que bem te avisei que era melhor ligares... mas não vale a pena' ao que esclareci que, vendo-me sem vontade, poderia ele ter facilmente resolvido a questão. Se não quis, não se queixe.


Então tentei outro lugar, fora do complexo termal, moderno, recente, e ainda por cima bem mais caro. Tinha uma suite. Ficou esse, pronto.

Longe de mar, de rios, sem praia senão ao longe -- e, para vê-la, só com o zoom bem puxadinho. Serra. Serra pura. Serra recém-ardida, ainda ar de luto, aqui e ali em recuperação. 

E nós, a toda a hora, muito admirados: tão grande... como é possível estar cheio, ainda por cima numa sexta, dia útil?


Mas é possível: está cheio. E é enorme. Um exemplo de boa arquitectura. Apesar de tão grande, ajustado à orografia. E actividades de campo, caminhada, trilhos na serra, ioga, coisas assim. A garagem é enorme, tem dois pisos, e está sempre cheia. Tem lugares de estacionamento na rua mas também estranhamente cheios. Mas mais estranho ainda: jovens. Essencialmente jovens. Alemães, franceses, espanhóis. Alguns casais jovens com crianças, alguns casais com ar ecológico, outros com ar de artistas, mas a predominância são simplesmente jovens, jovenzinhos ou em casalinhos ou em grupos. O meu marido diz: crianças. Volta e meia, quando nos cruzamos com alguns, segreda-me: mas que idade terão? Uns dezasseis? Olho de soslaio. Talvez não quinze ou dezasseis mas muito pouco mais. Hoje, na esplanada onde jantámos, um casalinho que nos pareceu ser alemão, ao nosso lado, não teria mais que uns dezoito anos. E o hotel, sendo de cinco estrelas, não é nenhuma barateza. Mas cheio. Um mistério. Ao regressarmos agora ao quarto para virmos dormir, no corredor, três jovens, elas de vestido de alças, sem costas e até aos pés, perfumadas, ele um verdadeiro dandy. Riam, no maior divertimento, abraçavam-se. Uma cena digna de filme. Nestas ocasiões tenho pena de não poder fotografar.

E reparem: isto no meio da serra, de uma serra quase toda ardida.


De tarde, fomos passear até ao complexo termal, o tal em que nem um quarto. Muito bonito, muito bem arranjado.

No pátio, sob as árvores, uma boa música, jazz ou por aí. Fotografei antes da música e antes dos veraneantes se instalarem. Inúmeros jovens. Um casal que andaria pelas nossas idades quase destoava ali. Árvores gigantes, majestosas. Tão bonito, tão de sonho.

Pátio entre os hotéis na Estância Termal de Monchique

Andamos perplexos. Vêm lá das Europas para se virem enfiar aqui no meio da serra, ainda só agora o verão começou. Ocorreu-me: será isto do planeta?

O meu marido disse que só se for. O amor ao planeta, a vontade de viver de forma saudável, na natureza, um turismo diferente.

Seja o que for, penso que deve ter muito a ver com esta interculturalidade, esta liberdade de movimentos, esta via verde para os jovens estudarem em qualquer país da UE, para se deslocarem a baixo custo. Um mundo aberto, alegre, talvez mais consciente da finitude dos recursos à nossa disposição.

Rua em Monchique

E para nós é muito bom: o turismo cria postos de trabalho onde os não haveria não fossem estes hotéis bonitos e bons. E não apenas nas grandes cidades ou nas praias: também aqui, quase no meio do nada.

E para a economia também é bom: uma verdadeira alavanca de liquidez. E culturalmente é dos melhores antídotos contra o chauvinismo.


E eu, de manhã, estreei-me no ioga. Ao princípio, tudo bem, Claro que quando cruzo as pernas, os joelhos não tocam o chão, claro que, ao sentar-me de pernas bem esticadas e abertas, se me dobrar sobre elas, fico longe de conseguir chegar com as mãos aos pés. Claro que, ao fim de estar a fazer respirações, já não me lembro se a barriga enche na inspiração e esvazia na expiração ou se é o contrário, porque no ioga se respira com a barriga e não com o peito. E depois aquele ritmo. Lento. Lento. À socapa, abria os olhos à espera que houvesse algum movimento e, para meu desânimo, tudo muito compenetrado, de olhos fechados, ainda naquela disciplina da respiração. Muito em slow motion para o meu gosto. Sinto que preciso de desacelerar mas isto é tão, tão, tão paradinho. E então senti que estava a acontecer-me uma coisa.

Quando faço respiração funda baixa-se-me a tensão arterial. E foi isso que comecei a sentir ali na sala de ioga: aquela coisa de começar a ver tudo branco, a consciència a querer sumir, como que a começar a sentir aquele nem frio, nem quente, aquela quase transpiração na testa. E desidratada. É certo que antes de irmos para o ioga tínhamos andado a fazer caminhada e estava sol e calor e aquele sobe e desce puxa pelo corpo. Mas tinha bebido água. 
Levantei-me discretamente, fui ao fundo buscar a minha garafa, bebi, levei para o pé de mim como aliás, os outros, mais experientes, tinham feito. Mas, mal voltei a sentar-me, senti que estava quase a desmaiar. Segredei ao meu marido que ia sair mas que ele ficasse. E saí. E ele veio logo atrás. Bebi água mas tive que me deitar num sofá que, em boa hora, ali estava. Já não voltei à aula: regressei ao quarto, muito zonza. Portanto, também não fui ao ioga e aos alongamentos da tarde. Queria que o meu marido fosse mas não quis ir e deixar-me sozinha. 

Igreja em Monchique

Fomos passear à vila, vi a bonita igreja (e estava na hora da missa), andámos a ver artesanato, trouxémos um licor regional, mel da serra, biscoitinhos da fruta daqui. E, bem entendido, andei nas fotografias.

De volta, fui ler. Nas espreguiçadeiras da varanda, a ouvir passarinhos, a ouvir as crianças a brincarem lá em baixo e o livro a andar devagar, num lento exercício de degustação.

Convento em Monchique

De manhã, como eu temia, fui despertada bem cedo. Desculpou-se que eu é que tinha deixado os cortinados da sala abertos e que o sol, mal nasceu, entrou no quarto e o tinha acordado. E como, quando acorda, não é capaz de parar sossegado, acordou-me a mim. Ainda tentei adormecer mas, do duche, vinham cantigas (estava numa de José Afonso). E de dia, não deu para recuperar. Por isso, agora para aqui estou mais a dormir que acordada.

Ainda não é hoje que vou poder conversar com os Leitores a quem devo no mínimo um agradecimento ou uma rresposta. Estou mais off do que quando trabalho de sol a sol.


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As fotografias são deste sábado e o Devendra Banhart está aqui porque sim, porque gosto.

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E um belo dia de domingo para todos

sexta-feira, março 22, 2019

Gosto deste homem, o que é que hei-de fazer?


Estamos a viver tempos incríveis. Tudo tão inesperadamente caótico, tão imprevisível e fora de controlo que, quando a coisa parece que vai num determinado rumo, alguém lança uma cartada e vira o jogo tornando os prognósticos ainda mais impossíveis.

A Ana, Lady of Vaz con Cellos, dizia que até é difícil não ter pena de Theresa May, a patareca-mor, e eu concordo. Tudo lhe corre mal, todo o mundo dá patadas, não especificamente nela mas muitas acabam por acertar-lhe -- e sempre tudo à vista do mundo, a malta a rebolar de riso com tanta falta de jeito. E o P. Rufino tem razão, aquilo é uma democracia, aquilo ali é um lugar de gente com muita história e pedigree. Mas mais parecem daqueles aristocratas já com os genes muito ensarilhados, sem noção da realidade, ainda a viverem num comprimento de onda que já acabou no século anterior. 

O tempo está em contagem decrescente, a guilhotina a baixar devagarinho e todos incapazes de saberem onde está a saída do labirinto em que se enfiaram.

A pobrezita ali anda a bater a todas as portas e toda a gente a bater-lhe com a porta no nariz. Uma das fotografias do dia é deliciosa: ela e o outro tão patarata como ela. Ela com um corte de cabelo que não correu bem. Ele naquela sua postura sempre tem-te-não-caias. Ela a olhar para ele com ar de galinha desconfiada. Ele com ar de peru velho recosido em vinha de alhos.


O que é que pode sair de bom de um tal par de jarras?

E, no meio desta cegada, desta gente descomandada, continua a sobressair o Speaker. Despudoradamente despenteado, com gravadas criativas, John Bercow dá lições de democracia, de bom comportamento, de graça, de fluência vocabular e gramatical e de etiqueta. Acresce que tem um pulso naquela maltosa que dá gosto. Veja-se este vídeo aqui abaixo para se perceber porque é que gosto deste fantástico mariola (e, calma, mariola no bem sentido).

Bercow defends Parliament after Brexit delay: 'None of you is a traitor'


John Bercow has defended MPs against Theresa May’s accusation that they are frustrating the will of the people over Brexit. Addressing the House of Commons, the Speaker stood up for the right of parliamentarians to vote according to their principles, after the prime minister suggested their failure to back her agreement was responsible for delaying the UK’s departure from the EU.


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Já agora, para quem precisa de relaxar, distender ou meditar:

Aula de Yoga versão Brexit pelo Mestre Sammy J


Sammy J helps us flex our foreign muscles with a brand new flow straight out of Europe. 
Biting, bite-sized comedy as Sammy J tackles the big issues of the day, wrestles them to the ground, then submits them to a variety of yoga poses, sporting analogies, and craft activities.


Até já

sexta-feira, novembro 09, 2018

O novo ioga.
[Este pratico eu com uma perna às costas]




Pois vos digo que se me vou um bocado abaixo e quase aterro -- ou por cansaço, excesso de trabalho, embrulhadas profissionais, preocupações familiares ou o que seja -- a verdade é que o meu organismo tem umas formas curiosas de dar a volta. E falo no meu organismo e não na cabeça porque a coisa não resulta de elucubrações ou mise en place de estratégias de qualquer espécie. É completamente involuntário. Simplesmente parece que viro a página e entro num filme diferente. 

Nesta recente revoada de virada de página para a qual arrastei o meu marido, reorganizámos os livros, reorganizámos a zona de escritório, trouxemos uma poltrona para a zona que agora é exclusivamente de leitura, rependurámos quadros, espelhos, reposicionei bibelots. A casa agora está diferente e uma das salinhas pequenas in heaven também. E ando entusiasmada como se me tivesse mudado para uma casa nova.

[E calma: não estou, com isto, a dizer que sou especial por ser assim. Isto pode apenas significar que não sou boa da cabeça.]


No outro dia, vi na Area 8 uma espécie de pequena árvore, só uns estilizados troncos com luzinhas nas pontas.  Está a ser vendida como enfeite de Natal. E eu tenho uma igual. O meu marido diz que a comprei lá o ano passado. E eu tenho a certeza que não, que a comprei num chinês por um terço do valor. Não interessa, o que interessa é que andei à procura dela e, depois de a encontrar, coloquei-a em cima de uma das estantes baixas aqui da sala para servir de candeeiro. O meu marido refilou quando me viu a andar nisto. Disse que era uma palhaçada pôr um enfeite de Natal a servir de candeeiro. Mas, quando o viu aceso e constatou o bom ambiente que traz à sala, já não disse nada. Tão bonito e agradável que fica.

Também fiz outra coisa: no que era o quarto da minha filha, tinha um candeeiro de pé, todo xpto, Pensei que ficava bem ao lado da poltrona de leitura. Carreguei com ele para lá. Tem leds na pontinha de cada arabesco. Infelizmente só três é que acendem. Mas fica mesmo bem ali. Temos que substituir os que não acendem. Mas o candeeiro fica mesmo bem. Tomara que, com leds novos, todas as pontinhas acendam.

E estou cheia de vontade de, também aqui, na cidade, durante a semana, voltar a fazer arraiolos. Só que a carpete que cá tenho a meio não apenas é enorme como é daquelas com desenhos do piorio (do género destes dois que aqui vos mostro, um dos quais está aqui sob os meus pés, e que fiz tempos atrás). Para além disso vai trazer-me um apontamento de desarrumação a esta sala que agora anda tão linda. E, last but not the least, vai impedir-me de estar tanto tempo de volta do blog (e de leituras diversas). Esta que tenho para acabar está arrumada num lugar muito alto, terá que ser o meu marido a ir lá buscá-la e ele não tem estado muito para isso. Hoje, por exemplo, com o jogo do Sporting, não quer que eu o distraia por nada desta vida. 

Mas isto veio a (des)propósito de um artigo que li sobre a tricoterapia (Relaxation, confiance en soi et anti-stress : comment la tricothérapie nous fait du bien). Há até um livro que diz que o tricot é o novo ioga.

Já no outro dia eu aqui me tinha interrogado sobre se a leveza de espírito que sinto quando faço tapetes (ou quando escrevo; mas também se fizer tricot ou pintar ou fotografar) não será uma forma de meditar. Fico de tal forma alheada de tudo o resto, tão focada naquilo, que esqueço tudo o que me possa preocupar.

Não sou, por natureza, dada a stresses, a estados de afeliação (isto é, a curtir o fel próprio). Sou muito primária -- esqueço-me rapidamente do que me chateia, desligo-me facilmente de maçadas, ponho para trás das costas aquilo que me desagrada, e parto para outra -- pelo que, que me aperceba, não procuro estas actividades para esquecer agruras ou para me descontrair mas apenas porque sim, pelo simples prazer de as executar. Mas a verdade é que, enquanto estou absorta nisto, as minhas mãos andando sozinhas, a cabeça desligadamente observando as mãos, me sinto como a mais inocente, livre e despreocupada das criaturas.


Existem escolas de tricot que são espaços de convívio e bem estar, existem manuais, vídeos. Etc. E há o autodidactismo que, na verdade, é a minha onda.

O artigo fala no bem estar que é estar a fazer uma coisa destas, confortavelmente, com uma mantinha quente, uma caneca de chá para ir bebericando, num espaço confortável. É assim que, quando está frio, gosto de estar. In heaven, junto a isto o calorzinho da salamandra ou da lareira.

Por algum motivo que desconheço, parece que, por cá, estas actividades caíram em desuso. Nenhuma das minhas amigas, familiares ou conhecidas se dedica a isto -- com excepção da minha mãe que é devota praticante (está, neste momento, com uma encomenda em mãos: duas camisolas e dois casacos para quatro dos cinco bisnetos. Para o bebé nada foi pedido pois herda tanta roupa que raramente precisa de mais). Comentei com ela isto de dizerem que o tricot é o novo ioga e ela concordou, diz que estes trabalhos manuais (tricot, crochet, costura) é o que a tem ajudado a superar tão bem as agruras da sua vida tão complicada. Isso e ler. E eu acredito que sim.


Note-se: Apesar de toda esta apologia deste tipo de trabalhos manuais e apesar de admitir que o mais certo é o ioga não ser para mim, ainda não desisti de o ir experimentar. Mas tudo naquilo me faz hesitar: para começar acho que algumas daquelas posições parecem esteticamente muito interessantes mas se e só se a pessoa estiver bem ginasticada, sem um grama a mais -- assim como esta menina aqui em cima. Agora se a pessoa não for capaz de se virar do avesso com as pernas ao alto, presumo que seja sobretudo um bom motivo de galhofa, incluindo para o próprio.

Mas adiante.

terça-feira, outubro 23, 2018

Ioga a preceito: todos nus


Ia no carro e disse ao meu marido que, um dia que tenha tempo, gostava de ir fazer ioga. O meu marido disse que sim. Perguntei se ele queria ir comigo. Disse que podia ser. Depois perguntou: 'Sabes que aquilo é fazer posições, quieta?'. Assustei-me: 'Só isso?'. Riu-se e disse que sabia que bastava dizer que era para estar quieta que eu deixava logo de querer. Falou, então, em Body Balance, um misto de Pilates e de Ioga. Pareceu-me melhor.

Não quero coisa muito íntima, gente imóvel, ao lado uns dos outros, muito circunspectos. Acho que, quando me puser a fazer posições, seja ioga ou body balance, me hei-de desconjuntar, incapaz de fazer aquelas acrobacias, e, claro está, hei-de desatar a rir. E era o que me faltava se os outros me olhassem de lado, aborrecidos com o meu despropósito, como se ali não fosse lugar para risotas. E compreendo que, num ambiente daqueles, não haja lugar para desconchavos. Portanto, ioga já percebi que não é para mim.

Agora, como que adivinhando os meus pensamentos, o YouTube veio mostrar-me uma aula de ioga mas, sabendo-me danada para a brincadeira, com todos nus. E eu, que tinha estado a ver o Prós e Contras, só me ocorreu a ideia mais perversa e inconfessável de que há memória: é que só me metia numa aula daquelas se lá estivesse aquele professor escurinho da Nova. Não sei como se chama mas sei que tem muita pinta. Mas pronto, não devia estar aqui a confessar isto, ainda por cima depois de ouvir a monitora dizer que se algum praticante tiver uma ereção ninguém deve dizer nada porque é natural. Mas vá, não vou desenvolver mais estas ideias para não dar cabo da minha reputação. 

Limito-me a mostrar a aula para inspirar os meus Leitores.


Radical Beauty: Inside a Naked Yoga Class, Baring Is Caring

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sábado, outubro 06, 2018

Num dia feliz, qual a lógica de falar de ataques de pânico?
[O exemplo de Gisele Bündchen]




Vim de véspera e passei o dia bem longe de celebrações, televisões ou informação de qualquer tipo. A casa esteve cheia de brincadeiras, conversas boas, sorrisos. Claro que, em off, esteve sempre a preocupação com o meu pai, constipado, debilitado, e com a minha mãe que está a sair de uma virose ou lá o que foi que a deitou um bocado abaixo. Ela não quer sair de perto dele, ele não sai da cama e isto, claro, custa-me bastante, e custa-me sempre e ainda mais quando não estão bem. Vou telefonando,  vou dando todo o apoio remoto, vou lá sempre que posso mas não há verdadeiramente muito mais que se possa fazer. Qualquer sugestão que lhe faça não lhe agrada, acaba por optar ficar em casa com ele. Portanto, sempre que consigo, tento abstrair-me e gozar o momento, especialmente quando estou com a minha querida descendência.

Gostam imenso de estar no campo. Vieram com bicicletas e pedalam com alegria pelos caminhos habitualmente habitados por animais silenciosos e por pássaros que cantam em liberdade e que, nestes dias, com os meninos, se enchem de risos, zangas, descobertas.

A menina arrelia-se com o irmão, mais novo, que é veloz na bicicleta e a ultrapassa fazendo manobras que a assustam e quase a fazem despistar. Depois, já é só o medo: quando o ouve a aproximar a grande velocidade já ela fica com medo, zanga-se, grita-lhe, amua, choraminga. E ele, malandreco, nega, diz que não está a fazer nada de mal, que ela é que tem medo mas que disso ele não tem culpa.


E eu revejo, na memória, momentos iguais, iguaizinhos, a minha filha a andar de bicicleta e o irmão, também mais novo, a fazer a mesma coisa, a arreliá-la, ela furiosa a gritar com ele e ele, feito inocente, a não lhe ligar patavina e a fazer outra vez e outra vez a mesma coisa.

Hoje chamei o menino. Falei-lhe na noção de fair play, no necessãrio respeito pelos companheiros de brincadeiras e de jogos, que quem se porta mal ou assusta os outros não tem fair play e deve ser desclassificado. Ouviu atentamente. A partir daí, quando passava a acelerar rente à irmã ia cantarolando 'eu tenho fair play e por isso não posso ser desclassificado'. Não vale a pena. Está-lhes na massa do sangue. Gostam de pregar partidas, de arreliar os outros. Têm coração de ouro. O meu filho nunca fez mal à irmã, só cenas destas, defendia-a quando eu me zangava com ela, na verdade sempre tentou protegê-la e, se sabe que ela tem algum problema, fica logo preocupado. Claro que agora que é adulto já não lhe azucrina o juízo, agora azucrina o dos filhos. Agora é o filho do meio que faz à irmã o mesmo que ele fazia. Portanto é sempre uma animação. E o bebé também é fresco. Voluntarioso, traquinas, destemido. Espertíssimo, divertidíssimo. Gozo com ele e ele faz um sorriso intencional, malandro. Outras vezes, não retém a ironia e desata a rir-se. 

Uma alegria, portanto.


Depois, à noite, fomos petiscar numa tasquinha à beira da estrada. O bebé a dormir, os manos mais crescidos sempre com aquele apetitezão. Comeram como gente grande. Melhor: como lobinhos esfaimados. No fim, quando estavam a levantar-se, perguntaram o que era o jantar. A mãe, surpreendida, respondeu que tinham acabado de o fazer. Protestaram, disseram que queriam jantar. Poços sem fundo. Comem que dá gosto. 

Depois seguiram para casa e nós dois regressámos aqui. Telefonei outra vez à minha mãe, o meu pai parece que estava melhor, ela mais descansada. Descansei também. Depois ligou a minha filha, estivemos na conversa, quis saber como tinha sido, o que tinham feito. Contei-lhe das travessuras e diabruras, contei-lhe das brincadeiras. A seguir, mudei de roupa, estendi-me no sofá e pimbas, tiro e queda. Apaguei. 


Agora acordei, retemperada. O meu marido, entretanto, já se foi deitar. Levantou-se muito cedo e esteve a cerrar madeira, em parte, ajudado pelo filho. Também estava cansado. 

E eu pus-me aqui a passar os olhos pelo YouTube. E fui dar ao vídeo que aqui partilho convosco. Fez-me muita impressão pois fala de um tema de que pouco se fala: os ataques de pânico.

Convivi de perto com uma pessoa que, numa fase mais difícil da sua vida, começou a ter ataques de pânico. Sentia-se mal, sentia um aperto no peito, ficava sem conseguir respirar. Achava que era uma coisa física e não emocional, assustava-se, receava estar a ter um problema de coração. Por vezes, ligava-me a chorar, com medo, aflita. Fez muitos exames médicos e não tinha nada. Tinha ansiedade e uma carga emocional pesada em cima dela. Não queria ter, queria estar bem e chorava também por isso. Começou a ter medo de conduzir ou de estar em reuniões com medo de ter crises daquelas. Eu dizia para ela respirar fundo, para beber água, para ir apanhar ar fresco, para descontrair. Mas não lhe era fácil. Felizmente ultrapassou essa fase e nunca mais teve tal coisa.


No outro dia, outra amiga minha, pessoa equilibradíssima, muito bem disposta, com um sentido de humor apuradíssimo, contou-me que, dias antes, lhe tinha acontecido uma coisa horrível. Estava no avião (e anda de avião duas ou três vezes por mês, sem qualquer problema) quando começou a sentir o coração a acelerar, depois ficou com falta de ar, como se tivesse asma, e com as mãos transpiradas. A seguir, diz que lhe aconteceu uma coisa ainda mais inesperada e disparatada: desatou a chorar. Não queria dar uma barraquinha daquelas mas não conseguiu impedi-lo. Quando chegou a casa, já tarde, voltou a desatar a chorar. O marido, preocupado, só lhe perguntava: 'Mas o que te aconteceu? A reunião correu mal? Alguém te tratou mal?' e ela dizia que não, que estava tudo bem, mas não conseguia parar de chorar. No dia seguinte foi ao médico. Ataque de pânico. Vida agitada, pouco descanso, muita pressão. Eu disse-lhe: 'Não vale a pena. Tudo se ultrapassa. Não podemos deixar que a vida nos esmague'. Ela disse: 'Pois é'. Mas não é fácil.

O peso das circunstâncias, o desatino que por vezes faz rodopiar o mundo em volta da vida das pessoas, tudo isso parece que, por vezes, causa um desequilíbrio no seu corpo, como se os fluidos entrassem em desestabilização e a energia que move o corpo também entrasse em tumulto.

Quando as pessoas se vêem assim, querem, sobretudo, ver-se livres dessa ansiedade, desse medo, da possibilidade de voltar a ter novas crises dessas, tão aterradoras.


Gisele Bündchen conta que passou por isso. Fumava muito, bebia, dormia pouco, trabalhava muito. E entrou em descompensação. Até que um dia a ideia de se atirar da janela assomou à sua mente. E, nessa altura, percebeu que tinha que abrandar. Parou, decidiu não se curar através de medicamentos mas de ioga e de meditação. No vídeo abaixo a bela Gisele emociona-se ao relembrar esses maus momentos.



E este mostra-a, serena, em comunhão com a natureza.



Dias felizes para vocês, meus Caros Leitores.