Já aqui o digo desde o início: estávamos habituados a respeitar a profissão dos enfermeiros. Víamo-los como gente digna, dedicada a bem servir a vida humana, gente em quem podíamos confiar. Os verbos estão no passado: infelizmente, não mais o poderemos fazer.
Ana Rita Cavaco, essa sinistra criatura -- presumo que numa de fuga para a frente (e ela saberá porquê e não vou ser eu a dizer que as denúncias sobre a forma como exerce o cargo podem ter a ver com isso) -- destruíu (e quase me apetece dizer que o fez de forma criminosa) essa boa imagem.
Os sindicatos -- que parecem subjugados às orientações da passista Cavaco, PSD encartada -- encabeçados por criaturas que parecem igualmente sinistras, têm feito o resto.

Estou chocada com a frieza dos enfermeiros que afirmam com frieza que, se for preciso, se não os deixarem fazer a sua sinistra greve às cirurgias, faltam ao trabalho. Pelos vistos podem dar 5 dias seguidos de faltas injustificadas ou 10 interpolados sem que nada lhes aconteça. E sabendo-se que ninguém se submete a cirurgias no Serviço Nacional de Saúde por desporto mas por necessidade de saúde, não consigo imaginar o que é estar doente, mal, sem qualidade de vida, com medo, e ter que ver a vida adiada, à espera que os enfermeiros continuem a brincar com a saúde e a vida dos portugueses, em especial dos que não têm posses para ir a hospitais privados. Estou chocada por saber que, por não terem respeitado sequer os serviços mínimos, foram adiadas cirurgias a neoplasias graves, a crianças, etc. Fico chocada. Aliás, creio que todos os portugueses com um mínimo de humanismo e decência estão igualmente chocados. O que esta gente está a fazer é simplesmente imperdoável.
Querem reformar-se antes do resto da população, querem aumentos de 400 euros, querem sabe-se lá o quê que vão acrescentendo à medida que lhes apetece. Querem privilégios que exigem sob chantagem sobre os mais indefesos. É imperdoável. E, face a este imoral comportamento, será só a legitimidade que está em causa? Parece-me bem que não.
Quando está a vida das pessoas em jogo, actuar desta forma tão fria, gananciosa e sinistra (repetirei mil vezes a palavra sinistra, se necessário for), parece-me coisa criminosa. Ilegal.
E há aquela surpreendente verba que recolheram através de crowd funding, já acima de 780 mil euros, e através da qual os grevistas recebem um dinheiro que ainda não percebi se é limpinho de impostos. E há aquele mistério sobre quem são os generosos beneméritos que se prestam a financiar estes actos de malvadez.
É que uma greve é um movimento reinvindicativo contra a entidade patronal. Ora esta greve é exclusivamente contra doentes que necessitam de ser operados, gente que fica a sofrer, que se arrisca a morrer. Que movimento é este?
E, depois, tenho aquela dúvida de fundo já antes aqui formulada: os enfermeiros no sector privado ganham melhor do que no SNS? os enfermeiros nos hospitais privados têm uma carreira mais promissora? os enfermeiros nos hospitais privados têm melhores condições de trabalho? os enfermeiros nos hospitais privados não têm razões de queixa ou reivindicações?
Poderia dar já uma resposta que tornaria esta greve ainda mais intrigante. E revoltante.
Mas fico-me por aqui. Os jornalistas que divulguem.
Já começaram a fazê-lo mas ainda de forma muito incompleta. Escavem. Encontrem enfermeiros que trabalham simultaneamente nos dois sectores. Investiguem as condições num e noutro. E, quando digo as condições, digo as condições todas: condições de trabalho, ordenados, subsídios, garantias. Tudo. Percebam porque armam este escarcéu num lado e nem piam noutro. Investiguem. E os políticos acordem, façam o trabalho de casa.
É que só isso, arrisco eu a dizer, bastaria para desmascarar rapidamente esta sinistra ofensiva contra o SNS e contra o Governo -- e, infelizmente, contra os doentes.
Quase a terminar: até há uns dias, andava incomodada com o silêncio de Marcelo sobre esta escabrosa situação. Honra lhe seja feita: já falou e falou bem. Mais: já deixou claro que há instrumentos jurídicos para se actuar. Actue-se, pois. Rapidamente.
E, para acabar, um apelo à consciência dos enfermeiros: reflictam. Querem ser vistos como uma classe de gente irresponsável, desumana, um bando de anjos da morte? É que, se não querem, dêem um passo atrás, acabem com esta actuação sinistra, peçam desculpa aos portugueses e, em particular, aos doentes.
A sua honra profissional está maculada, muito maculada, mas mais vale parar já do que persistir e vir a carregar com uma série de crimes às costas.