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quinta-feira, agosto 10, 2017

Deixar-vos-ei palavras





Tenho estado a reler a entrevista que a Anabela Lopes Ribeiro fez, já lá vão uns cinco anos, ao meu querido mestre Alberto Vaz da Silva, pessoa encantadora.


Transcrevo um pouco:


Como é que um rapaz com o seu percurso intelectual, cultural e pessoal não tinha dúvidas?
É muito o meu temperamento e o meu carácter. Há uma grande predominância de fogo na minha textura psicológica.
Olhando para si achei que podia ser água. Porque tem uma leveza, como água que corre. Porquê fogo?
Porque sou um apaixonado, por temperamento. O apaixonado atira-se facilmente para as coisas com confiança, com certezas. Penso que sou uma pessoa modesta, não gosto de dar nas vistas. No entanto, na minha sombra, sempre fui muito seguro do que fiz. Sabia o que gostava, o que não gostava. Se fazia o que não gostava sabia porquê. Se fazia o que gostava ia até ao sétimo céu. Essa pergunta traz-me uma reflexão: tive muita sorte na vida. Muita coisa me foi dada, como a Helena. As coisas caíram-me em cima da cabeça, ou através de pessoas. No meu último livro, sobre a Sophia de Mello Breyner, pus em epígrafe Saint Martin, filósofo do século XVIII, que esteve na base da alquimia e de grandes conhecimentos esotéricos: “Houve certos seres através dos quais Deus me amou”. Aconteceu-me a vida inteira.
(...)
Por coincidência, antes de começarmos a gravar, perguntei-lhe o que é que significa a letra “f”, e disse-me que é a letra mais reveladora, mais importante.
É a mais sintetizadora. É sempre a primeira coisa de que se vai à procura, o “f” minúsculo. O “f” escolar tem um traço inicial, depois vai para cima (o espírito, a imaginação). Depois passa por uma linha (o real, a vida de todos os dias, a actividade). Vai para baixo (os instintos). Volta para cima (mostra como é que a pessoa dominou ou domina os instintos e volta aos outros). Outra vez a linha, agora para a direita. Percorre os quatro espaços da escrita, os quatro pontos cardeais. E também o passado, o presente e o futuro.
Há pessoas que escrevem “f” a mais. O inconsciente tem esta coisa espantosa de empregar despropositadamente uma determinada letra. Quando há “f” a mais é mau sinal: significa que a pessoa ainda não se encontrou. Quer desesperadamente encontrar-se, mas está a lutar contra moinhos de vento. Quando não há “f” é uma tragédia: a pessoa desistiu de si.

Sobre o f, que ele diz ser a letra mais reveladora, já aqui o contei mas repito-me. No fim da aula em que ele se referiu ao f, mostrei-lhe o meu. A sala estava na penumbra, ele rodeado das suas devotas, não me viu antes de observar a folha com a letra e de ter dito. Só depois olhou para mim e sorriu, dizendo-me que eu poderia saber se era ou não. Tinha dito: 'O f de uma sedutora'. Sim, sou. Mas só às vezes. E sei disfarçar.

[Um apontamento pessoal, irrelevante. Não consigo analisar a minha letra. Não quero, não me interessa]

Mas, de fez em quando, na blogosfera há quem mostre a sua forma de escrever. Mesmo sem querer, esboço logo uma opinião. A forma de escrever não engana e eu, que não sou dada a esoterismos de qualquer espécie, não olho isto como uma coisa do domínio da devinação. Somos a forma como nos manifestamos, incluindo através da escrita à mão, é a nossa impressão digital. Não me lembro de alguma vez me terem dito que a minha análise foi ao lado. Só me intimido um bocado quando me ponho a adentrar pelas miudezas das pessoas. Precisava de mais folhas escritas para poder ter a certeza de que não estou enganada e, geralmente, só tenho uma página. Não pode ser levianemente que se escreve que a pessoa é insegura, que disfarça e se arma importante porque receia que percebam o medo que tem que descubram que é frágil e pouco sabedora. Ou que a pessoa receia tomar decisões com medo de desagradar. E dizer isso a alguém que tem um poder enorme, incluindo o de me prejudicar. Neste caso, bastante tempo depois, esta pessoa ainda dizia, como se estivesse a brincar: 'Viu-me a escrita, deu cabo de mim'. E eu: 'Nada... Tanta coisa boa que vi' mas sabendo que o que lá vi o torna um erro de casting no que está a fazer e que, lamentando-o, tive que lho dizer, não explicitamente assim mas a bom entendedor... Ou a outro dizer que é como se fosse bipolar e que é mentiroso e que tem dúvidas quanto à sua sexualidade. Isto a um que encena ser um conquistador. Não é levianemente que se dizem coisas assim. Ou a alguém que parece muito bem disposta que tem que ter cuidado para não se deixar cair em depressão. É quase a medo que me arrisco a dizer. É que posso estar a ver mal...


Outras pessoas são solares. Uma escrita fluida, solta, arejada, bem estruturada na forma, no balanço, no andamento. Olha-se e vê-se ali uma pessoa motivada, realizada, boa companhia. Olha-se e vê-se que olha a direito, que sabe sorrir, que sabe amar, que sabe viver. 

Ver a escrita e a assinatura de Trump é ver tudo. O disparate completo, as contradições, as tentativas de disfarce. Não engana. Compará-la com a de Obama é comparar a noite com o dia.

Já recebi, por mail, digitalizações de páginas manuscritas de leitores. Na medida do possível e apesar de a amostra ser curta, tenho ousado dizer o que vejo da pessoa que escreve. É como um blind date: arrisca-se tudo às cegas, sem conhecer a pessoa e sem ter como aferir se a leitura está a sair correcta.


E, note-se, sendo eu devota das letras, sou, na verdade, uma pessoa sobretudo dos números. A minha formação académica e a minha vida profissional sempre se moveram mais sobre a racionalidade, ou seja, mais sobre a objectividade da análise dos números do que em volta de subjectividades, emoções, sentimentos ou crenças.

Portanto, é colocando toda a minha racionalidade na análise da escrita que digo o que vejo, face ao que aprendi. E o que aprendi nisto da grafologia foi, sobretudo, a ver, a estar atenta aos sinais.


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Mas, enfim. Não era sobre isto que eu vinha aqui falar. Porque hoje tinha uma reunião com um senhor vereador e a reunião foi marcada para uma hora que tornava absurdo voltar ao trabalho, acabei por ficar com tempo livre e, como se estivesse de férias ou em dia feriado, feliz da vida, meti-me ao caminho e desabalei-me para o meu lugar de perdição. Dia de vendaval. Mas quando se gosta de um lugar, gosta-se no matter what. O rio picado, um friozinho intrusivo. Eu de verão, toda frescuras e o vento a percorrer-me a pele. Um sol magnífico, aquele sol dourado do fim da tarde. E eu, sentindo-me turista, a fotografar tudo -- paquetes, veleiros, cargueiros, namorados, gaivotas, gente solitária, o azul das águas e do céu -- por ali andei, matando saudades. Há tanto tempo que não conseguia estar no meu Ginjal.

Talvez seja uma questão de auto-disciplina e imposição mental: forçar-me a colocar em plano de igualdade a minha necessidade de caminhar à beira do rio, de fotografar, de ter tempo de qualidade para mim ao longo da semana e a minha responsabilidade profissional.


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E agora?

(...) 
the tree outside doesn't know:
I watch it moving with the wind
in the late afternoon sun. 
there's nothing to declare here,
just a waiting.
each faces it alone. 
Oh, I was once young,
Oh, I was once unbelievably
young!

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O post talvez tenha acabado por ter um tom nostálgico mas foi por acaso, mesmo sem querer. Se estivesse com mais tempo, escolhia um outro poema. Aliás, tinha escolhido outro mas era de uma tal sensualidade que me pareceu não ter muito a ver com o texto. Então, retirei-o e já sem grande cabeça para puxar por ela, ficou este que é desalentado mas que fica apenas por ser bonito. A verdade é que conjugado com a letra da música que escolhi lá para cima, envolve isto num véu de melancolia e despedida e não é assim que me sinto, caraças, muito longe disso. Não se deixem contagiar, ouviram? Se não fossem duas da manhã refazia isto tudo. Assim, olhem, não liguem.

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As fotografias foram feitas ao cair do dia no Ginjal
Lá em cima Patrick Watson interpreta Je te laisserai des mots
O poema So Now? de Charles Bukowski é lido por Tom O'Bedlam

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E queiram continuar a descer, caso desejem ver o Jim Carrey a sublimar o seu mal de coeur através da pintura.

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quarta-feira, janeiro 18, 2017

As assinaturas dos 'parceiros' que, em sede de Concertação Social, fecharam o acordo que o Passos Coelho quer estourar ao lado do PCP e do BE
[E o quanto eu teria a dizer sobre cada um a partir do que ali vejo]


Num ano feliz, durante uns meses felizes, creio que uma vez por semana (à terça-feira?), eu saía do trabalho um pouco mais cedo -- tinha que contar que houvesse trânsito e, sobretudo, queria garantir que tinha tempo para dar uma voltinha no Chiado -- e ia ter aulas de Grafologia.

Já falei nisso várias vezes. Era no Centro Nacional de Cultura, edifício muito bonito, e o professor era o amoroso e fascinante Alberto Vaz da Silva. Aquelas aulas eram uma viagem pelas suas memórias, pelas suas opiniões e ia ensinando a interpretar a forma de escrita. Não tem a ver com a letra ser ou não bonita mas com a forma como se escreve (a pressão que se põe na escrita, os espaçamentos, a inclinação, as margens). 


Como ele ainda usava slides e um projector à antiga, a sala estava à meia luz. Todo o ambiente era fantástico.

Saía de lá às oito e tal da noite, passava pela Brasileira, encontrava o movimento do Chiado e depois vinha a conduzir pela noite lisboeta, geralmente ouvindo a Antena 2 e pensando no que ele tinha contado.

Do muito que aprendi com ele, registei que não se deve fazer uma análise só a partir de uma pequena amostra nem sequer só a partir da assinatura desligada do contexto pois o próprio sítio onde se escreve a assinatura, a comparação do tamanho da letra da assinatura em contraponto com o da letra do restante texto, tudo isso é fundamental.

Seja como for, mesmo que a análise possível seja curta, não deixa de ser possível.

Olho para a página com assinaturas que o ministro Vieira da Silva publicou noticiando que o acordo estava assinado, e o que vejo aqui é muito elucidativo. Porque não quero fazer análises públicas baseando-me em tua escassa amostragem, vou guardar o que vejo só para mim. Mas, digo-vos, está ali tanta coisa. Tanta.


A assinatura de Carlos Silva da UGT, então, é extraordinária. Sendo em tudo oposta, a de António Costa é também digna de registo. A de António Saraiva, à primeira vista, surpreendeu-me. Depois pensei melhor e deixou de me surpreender.



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Há quem não acredite em nada disto da Grafologia. Pensam que é discipina ao nível do tarot ou de outros esoterismos. Mas enganam-se. A Grafologia é do mais racional que há. Pode não ser possível demonstrar cientificamente o rigor das suas conclusões mas, se percebermos a raiz lógica das análises feitas, percebe-se o seu sentido. 

Já fiz inúmeras análises grafológicas e o que vos posso dizer é que não tenho ideia de algum dos analisados nao se ter revisto no que eu vi.

Volta e meia vejo coisas que me deixam completamente de pé atrás. Até um colega meu, pessoa racional e inteligente a toda a prova, volta e meia chama-se e pergunta-me: 'Olhe para isto. O que é que acha?' e eu olho e digo 'imaturo, gabarola e inconsistente'. E ele fica a olhar e diz 'bem me queria parecer'. Coisas assim. Ou 'mentiroso, não é de confiança, não interessa'. E ele, 'Pois, não me admira. Vou ter em consideração'.

(A assinatura do Marcelo...? Está lá tudo.)


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Para quem não teve o privilégio de o conhecer

Alberto Vaz Silva: decifrador de pessoas



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[Não estranhem, por favor, que eu não responda a comentários ou a mails. Por razões que agora não vêm ao caso, chego aqui à sala e, porque não quero agarrar-me ao computador, tento pôr-me no sofá a ver televisão. Só que, instantes depois, estou a dormir. A dormir a sono solto. Depois, quando acordo, ainda estou tão pedrada que já não dou uma para a caixa. A todos quantos podem pensar que é falta de educação ou de interesse, peço desculpa. Mas não me é possível fazer mais do que isto.]


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segunda-feira, junho 29, 2015

Saudades para Alberto Vaz da Silva - diz José Tolentino de Mendonça e digo eu, também. Houve certos seres através dos quais Deus nos amou. Talvez seja isso. Talvez todo o mistério comece por aí.






Há uns quantos anos, resolvi fazer um curso de grafologia. Já aqui falei disso algumas vezes e, inclusivamente, já fiz análise grafológica a uns dois ou três leitores que me enviaram textos manuscritos. Quando agora alguém escreve à mão ao pé de mim até, sem querer, corro o risco de passar por mal educada, dou por mim só a deitar o olho para o que escreveram, não pelo que está escrito mas, sim, pela forma da escrita em si. Não sei porquê mas tenho constatado que, de facto, a forma como uma pessoa escreve revela a sua natureza e o seu estado de espírito.

Por todos os motivos, guardo do tempo em que fiz esse curso as melhores recordações. Nesses dias, às terças-feiras, salvo erro, saía do trabalho um bocado mais cedo, deixava o carro no parque do Chiado e depois ia para o Centro Nacional de Cultura. Tentava sempre chegar um pouco antes para poder dar uma volta por aquelas ruas que tanto amo, em especial ao fim da tarde. Depois havia o lugar onde decorriam as aulas, aquele edifício tão bonito, aquele soalho, aquelas luzes, todo aquele ambiente. Mas, sobretudo, o professor, o querido e especial Dr. Alberto Vaz da Silva. Aquelas aulas, dadas ao lusco fusco, eram momentos extraordinários. Culto, amoroso, de uma delicadeza extrema, todo ele memórias, referências, gestos de afecto - ouvi-lo e vê-lo era um privilégio. Eu assistia maravilhada, tudo aquilo era bem mais do que eu esperava.



Hoje, ao ler a crónica de José Tolentino de Mendonça falando dele, senti a emoção de ter tido a sorte de ter conhecido, ao longo de meses, aquela pessoa tão especial.

Transcrevo alguns excertos:

(...) não é estranho que [Alberto Vaz Silva), sendo licenciado em Direito, ele se tenha tornado um poliédrico e colossal humanista; que tendo exercido advocacia, por mais de trinta anos, ele se tenha sentido renascer no encontro com Rosaline Crepy, sua iniciadora no saber da grafologia, e a partir daí mudado de vida; que tenha viajado pelo hemisfério sul (e por um sem-número de hemisférios interiores) para ver grupos de constelações, como outros viajam pelo interior de bibliotecas ou de árduos e fascinantes problemas matemáticos. 

Ele vislumbrou uma nova relação com o real, feita não já de oposições e distâncias, como se a vida não fosse um mistério único, mas sublinhando corajosamente os traços de união, os hífens inesperados, as continuidades. E assim nos mostra que não há pequeno ou grande, não há cósmico nem quotidiano, não há interno ou exterior: por todo o lado e em todas as coisas está, pelo contrário, latente a mesma espantosa proposta que a vida em si mesma é.

(...) O contributo dele é aproximar na mesma visão, numa nova sintaxe, aquilo que se avista de galáxias diferentes. O que o apaixona é o que ainda não existe ou o que começa a emergir sem que a maioria se dê conta.


(...) Para homens como Alberto Vaz da Silva, a italiana Cristina Campo reserva um nome: imperdoáveis. Isto é, aqueles que possuem e definem um estilo, os habitados por uma força profunda, por um carácter próprio, por uma sabedoria irremovível, aqueles que desenham com as suas vidas um mapa de tal forma original que se torna necessário à viagem dos outros. 

Há uma frase de Saint-Martin, que Alberto Vaz da Silva recorda muitas vezes: "Houve certos seres através dos quais Deus nos amou". 

Talvez seja isso. Talvez todo o mistério comece por aí.




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As pinturas são de António Palolo

Horowitz interpreta Schubert - Impromptu in G flat major D899 No.3

A referida crónica de José Tolentino de Mendonça veio publicada na revista E do Expresso deste sábado, dia 27 de Junho de 2015.


Para quem queira conhecer melhor Alberto Vaz da Silva, aqui fica o link para a entrevista que concedeu a Anabela Mota Ribeiro em 2012, entrevista essa que é referida na crónica de José Tolentino de Mendonça.

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E, se quiserem saber das ameixas, orégãos e outras coisas in heaven, aceitem o meu convite e desçam, por favor, até ao post já a seguir.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma fantástica semana a começar já por esta segunda-feira. 
Que a vossa vida vire para melhor. 

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