quarta-feira, julho 16, 2014

Dispa-me, pedi eu a um desconhecido, undress me. [Com vossa licença, uma história caliente numa noite de verão]






Num dia de tédio tomei uma decisão impensada. Não sei como fui parar a um site em que uma realizadora pedia pessoas para realizar um vídeo experimental, qualquer coisa para estudar comportamentos. Encontros entre pessoas cujas afinidades ou antagonismos seriam detectados por ela a partir de um questionário. que os candidatos preencheriam. Não me recordo exactamente do que lá se dizia mas tenho ideia de que, pela leitura, percebi que poderia estar perante uma situação desafiante. Preenchi o inquérito com inteira franqueza e, reconheço agora, com uma estranha leviandade.

Passaram semanas sem qualquer resposta. Pensei que era mais uma daquelas coisas que não dão em nada. Contudo, um dia recebi um mail dizendo que iria ser contactada a partir de um certo número para combinar o que se iria passar caso eu aceitasse participar. Tinha sido seleccionada sem saber exactamente para quê.

De facto, horas depois recebi um telefonema. A realizadora pareceu-me simpática e explicou-me a ideia. Achei muita temeridade mas, nem sei porquê, aceitei. Ela deu-me alguns conselhos a que eu achei alguma graça e pensar nas perspectivas excitava-me, não tenho como esconder.

No dia aprazado, lá fui. Quando ia na rua, vi um homem a entrar para o prédio.

Ele ia apressado e mal consegui perceber como era. Contudo, reparei que olhou também para mim, um breve relance. Disfarcei. De resto, não sabia se seria aquele.

A realizadora tinha-me dito que eu entraria para um quarto, sentar-me-ia na cama. Entraria um desconhecido ou uma desconhecida. No quarto estaríamos apenas os dois. Nós e as câmaras. As câmaras estariam a filmar. Deveríamos despir-nos mutuamente. Depois deveríamos deitar-nos e, a partir daí, faríamos o que entendêssemos, ou nada.

Estava nervosa, recordo-me bem. E se me aparecia uma mulher? Desconfortável. Ou se me aparecia um homem assustador? Ou se me aparecia um homem repugnante? E se me queria tocar? Um nervosismo crescia em mim.

E se, pelo contrário,... ?  Adrenalina.

Quando entrei no andar, fui recebida pela realizadora, uma mulher jovem e simpática. Tranquilizou-me. Não aconteceria nada de mal pois tudo estaria a ser filmado, em caso de algum desconforto, alguém interviria. Fui de novo à casa de banho. Nervosismo. Insegurança. Olhei-me no espelho. Sentia-me trémula. Respirei fundo.

Entrei. O quarto na penumbra. 

Tentei descontrair-me, respirar fundo. Impossível.

Então entrou ele. Era o que tinha visto na rua. Também vinha nervoso, percebi-o logo. Olhámo-nos, tentámos perceber-nos. Um sorriso tímido, um não saber o que dizer, o que fazer.

Ele disse, Chamo-me Tomás. E a voz era extraordinária. Poderia ter-lho dito, Tem sua voz e tanto, sempre era uma forma de quebrar o gelo. Mas não consegui dizer nada.

Com algum esforço, instantes depois, um fio de voz, disse, Chamo-me Sara. E conseguinacrescentar, Não sei porque me meti nisto.

Ele riu-se, Nem eu.

Silêncio.

Ele disse, Se quiser, estamos a tempo de desistir. As mãos abertas sobre as calças, mãos transpiradas certamente.

Estamos, respondi eu. Mas depois, tenho destas coisas, quando ele parecia ir virar-se para a saída, deitei-lhe a mão ao botão de cima da camisa.

Ele parou, olhou-me admirado.

Aproximei-me. É esta minha atracção pelo imprevisto. Senti o seu perfume. Acqua de Gio, pensei. Desapertei um segundo botão. Fechei os olhos, não queria ver, medo do abismo. Ele estava imóvel e eu sentia o seu coração a bater. O meu também batia descompassadamente. 

Às cegas, procurei o terceiro botão. Às cegas, senti as suas mãos a procurar a bainha da minha túnica branca.

Levantei os braços e aproximei-me um pouco mais para que ele mais facilmente me despisse. Abri os olhos. Olhou-me e o sorriso inseguro tinha dado lugar a um ar intrigado, como se me quisesse desvendar. Deixei que me olhasse, deixei que me despisse a blusa. Depois deixei que me tirasse as calças.


A seguir desabotoei os botões que faltavam da sua camisa, soltei-a das calças. Tirei-lhe o casaco, e ele ajudou a despir o que faltava da camisa enquanto me olhava, expectante. De tronco nu ali ao meu alcance, um cheiro forte, como se o nervosismo o fizesse transpirar ou tornasse o perfume mais intenso.

Vontade de sentir o toque da sua pele. Mas não. Limitei-me a imaginar.

Ficámos num impasse como se aquilo não fosse uma experiência, como se apenas subitamente  tivéssemos percebido que já tínhamos ido longe demais. Senti que o meu sorriso se estava a transformar numa timidez envergonhada. Tive vontade de lhe dizer, Isto não me costuma acontecer. Mas tive a lucidez de perceber que seria ridículo. Era apenas uma experiência, não uma aventura amorosa. Não sei o que pensava ele, calado, hesitante, como se sem saber como prosseguir.

Talvez estivesse apenas surpreendido com o que estava a ver, a minha lingerie era bonita, sensual, e talvez não estivesse habituado a uma coisa assim, ou, então, estava simplesmente apreensivo, sem saber como prosseguir. Quase me arrependi, talvez tivesse exagerado, ele veria certamente que eu tinha dado excessiva importância a este estranho blind date. Mas nestas ocasiões eu não penso.

Fui eu, de novo, que avancei. Segurei-lhe nas mãos e conduzi-as até às minhas costas. Ajudei-o a desapertar o corpete, depois soltei as alças com vagar, deixei que a minha sedução o envolvesse e, intimamente, comecei a desejar que o efeito nele fosse letal. As minhas mãos tocavam as dele enquanto o ajudava a deixar-me de igual para igual, frente a frente, em tronco nu tal como ele. Senti então que ele, sem querer, olhava os meus seios. Também sem querer, subi o peito para que os meus seios ficassem mais levantados. Sorri sem querer. Começava a apetecer-me desafiá-lo mas agora já não era sem querer. Queria, queria mesmo. Apeteceu-me pegar-lhe de novo nas mãos e conduzi-las pelo meu corpo mas não o fiz, contive-me.

As suas mãos, grandes e macias, estavam juntas, à frente do corpo. Ele não sabia o que fazer com elas. Então separei-as. Tirei-as da frente do corpo. Desapertei o cinto. Ele riu, e o ar já era malicioso. Pareceu-me que queria tirar-me o que ainda faltava e que já não era muito. Eu disse, Primeiro eu. Nestas alturas controlo bem a impaciência. Ele obedeceu.

Abri-lhe o botão das calças, desapertei o fecho. Olhei-o. Ele olhava para baixo, queria ver o que se ia passar. Como eu hesitasse, foi ele que, malicioso, disse, Então…? Perdeu a coragem…?

Sorri, maliciosa também. Por enquanto ainda não... ainda não vi nada que me metesse medo, respondi-lhe com voz lenta e a minha voz soou-me de seda, provocante. Ele deu uma gargalhada mas era uma gargalhada já com a impaciência rouca dos animais sedentos.

Comecei a puxar-lhe as calças para baixo, devagar, deixando os boxers à vista. Ele ajudou. Descalçou-se, ajudou-me a tirar-lhe as calças.

Nada mal.

O nervosismo já era outro. O meu. E o dele também.

Em momento algum me ocorreu quem seria ele, o que faria na vida, qual a sua história. Nada. Apenas um corpo habitado ali à minha frente, à frente do meu corpo habitado por mim.

Agora já pode, disse-lhe eu, e cheguei-me. E ele então baixou-se, tirou as minhas pequenas cuecas. Fiquei apenas com as meias e de saltos altos, olhando para ele. 

Tiro as minhas meias?, perguntou ele quase envergonhado.

Ri-me. Sim, ficará melhor sem meias. Ele tirou-as. E perguntou-me, Tiro as suas? E estava com a respiração contida e o perfume chegava até mim mais intenso.

Respondi, Como queira. Ele ia tirá-las mas depois disse, Não, deixe-se estar com as meias e com os sapatos.

Concordei. Depois, sem lhe pedir autorização, tirei-lhe eu os boxers. Apreciei o interesse que despertava nele mas fui discreta e ele também fingiu que não me tinha visto a ser indiscreta.

Então ele disse-me, Olhe ali ao canto: um sofá. Olhei, nem o tinha visto, apenas tinha visto a cama.

Ele disse em voz baixa e densa - e aquela sua voz era toda ela uma longa carícia - Deite-se no sofá, e deixe-me ficar a olhar para si. Afaste o cabelo da cara, deixe-me ver os seus olhos, deixe-me vê-la bem.

Assim fiz. Gosto de me sentir desejada. Mas, então, ocorreu-me uma coisa inesperada e disse, Fico aqui, sim, mas numa condição: apenas se disser poesia.

Ele riu ao de leve mas, estranhamente, não parecia surpreendido. Poesia? 

Sim, diga-a, em voz baixa.

Ele disse, Escute. Afterwards de Thomas Hardy.

E a sua voz era uma toada e as palavras que a sua voz modelava percorriam o meu corpo, a minha pele estava arrepiada, e eu quase me sentia tremer de desejo. Não sei porquê mas a seguir levantei-me e abracei-o. Talvez porque me sentisse agradecida pela sua voz percorrendo o meu corpo, ou quase aliviada por termos conseguido chegar ao fim da prova. Gostei de sentir o seu corpo contra o meu. Ele estreitou-me e eu senti que os meus seios se apertavam contra o seu peito amplo e gostoso. Gostei de sentir os seus braços nus em volta do meu corpo nu.

Então ele beijou-me o pescoço. Tombei a cabeça para o lado para que ele melhor o pudesse beijar. Cheira bem o seu cabelo, disse ele – e eu gostei de sentir que aspirava o perfume da minha nuca.

Quando ele me puxou para a beira da cama pareceu-me natural. Sentámo-nos nus, ao lado um do outro. Ele passou o braço pelos meus ombros, eu encostei a cabeça ao seu. Ele beijou-me a testa e eu, imprevidentemente, voltei a cara para ele e, sem pensar, fechei os olhos e beijei-o na boca.

Em momento algum pensei nas câmaras. Em momento algum pensei no que quer que fosse.

Sei que nos deitámos, sei que nos tapámos com um lençol, sei que os nossos corpos se estreitaram um contra o outro. Sei que, de vez em quando abria os olhos quase como a certificar-me que aquilo estava a acontecer ou talvez para ver qual a expressão do desconhecido que navegava dentro do meu corpo. Sei que foi bom, que foi libertador.

Não sei mais nada. Não trocámos telefones, nada. Nunca mais o vi. Nem sei se se chama mesmo Tomás já que eu também não me chamo Sara.

Mas penso muitas vezes nele. Não quero procurá-lo. Talvez receie que, se isso acontecer uma só vez mais que seja, não consiga voltar a deixá-lo sair de dentro de mim.


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UNDRESS ME




Vídeo publicado a 10/07/2014

Diz a autora do filme, Tatia PIlieva, que há algum tempo pediu a estranhos para se beijarem:  Pedi a estranhos que se despissem mutuamente e se deitassem. Mais nada. Sem regras.


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Lá em cima, a acompanhar a belíssima voz de Jeremy Irons a dizer o poema Afterwards de Thomas Hardy, está a música de Jon Lord (antes dos Deep Purple).


E, por hoje, por aqui me fico. 
Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quarta feira. 
E que nunca o amor falte na vossa vida. Nem a sedução.



5 comentários:

Anónimo disse...

Cara UJM:

Bela história de sedução e atração (poética).
Aprecio esta sua singular versatilidade, que cativa e entusiasma.

Um abraço com muita alegria, da
Leanor.

bob marley disse...

a câmara vai pedir aos lisboetas, ou ao resto do povo para fazer o mesmo - http://observador.pt/2014/07/16/camara-de-lisboa-cria-taxa-sobre-o-lixo-e-pede-ao-governo-receitas-iva/


mesmo que não queiram, já começa a ser difícil ter tesão neste país

bob marley disse...

2 meses nem tá mal - http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/relatorio_sobre_situacao_financeira_de_empresas_publicas_esta_dois_meses_atrasado.html


isto é que são preliminares

bob marley disse...

http://www.ionline.pt/artigos/portugal/dois-doentes-morrem-depois-hospital-esgotar-plafond-operacoes


como dizem os fdp, vivemos acima das nossas possiblidades

lino disse...

Música muito apropriada no dia em que passam 2 anos sobre a morte do Jon Lord.
Beijinho