terça-feira, outubro 11, 2022

Ser ou não ser fada do lar -- eis a questão

 


Não sou fada do lar nem tenho ambição de vir a ser. Sei dar conta de uma casa e fazer de tudo (acho eu) mas tudo na versão básica e acelerada. Durante muitos anos não tive empregada pelo que tive que aprender a despachar serviço.

Depois de anos de auto-suficiência, quando tive o meu filho reconheci que estava a ser um pouco de trabalho a demais. Com um bebé que dava trabalho que se fartava, com uma menina de três anos que levava horas a comer, nós dois a trabalhar e não era pouco, com trânsito entre a casa, a escola dela, a ama dele, ter que andar a levar e buscar um e outro e chegar a casa e ter roupa e comida para tratar e banhos e papas... era muito. Por essa altura o meu marido trabalhava numa multinacional tendo que se deslocar com alguma frequência, não apenas dentro como fora do país e, quando não, mesmo assim não conseguia chegar muito cedo. Era dureza.

Arranjámos, então, uma senhora para nos ajudar. Não se lhe percebia a idade, era de tipo matrona. Nunca simpatizei com ela, era sonsa e sombria. Mas não conhecíamos outra.

Ao fim de pouco tempo comecei a dar por falta de fraldas, de babygrows, de casaquinhos, falta de tudo. Não sou especialmente atenta pelo que não saberia validar que mais faltava. Dava por falta das coisas do bebé pois eram de uso diário. Devia ter algum filho da idade do meu, presumi. Nunca reconheceu que só poderia ser ela. Mandámo-la embora, bastante incomodados por termos uma ladra dentro de casa.

A seguir veio uma outra. Muito faladora, muito prestável. E simpática. Ofereceu-se para fazer sopas para me facilitar a vida -- e fazia sopa de maçãs, sopa de ovos. Eram sabores novos mas agradáveis. Não arrumava grande coisa mas, enfim, lá ia fazendo. O pior é que um dia não podia vir pois tinha uma prima no hospital e não podia deixar de ir vê-la, outro era um irmão que ia para fora e ela tinha que levá-lo, outro era a mãe doente e tinha que acompanhá-la. Faltava muito e não queria que eu descontasse pois dizia que compensava. Eu ia na conversa. Se eu mostrava aborrecimento com tanta ausência, era ela que aparecia doente, tinha que ir fazer exames. Uma vez calhou eu chegar mais cedo a casa. Vozes, risos. Entrei quase a medo, não percebia o que poderia estar a acontecer. Umas repimpadas nos sofás a ver televisão, ela na conversa com outras na cozinha. Eu com o menino ao colo e a menina pela mão e a casa cheia de gente desconhecida, usando-me a casa no maior dos à-vontades. Como se a casa fosse dela, informou-me que eram conhecidas que tinham resolvido fazer-lhe uma visita. Enchi-me de coragem e mandei-a embora.

Até que, não sei como, descobrimos uma senhora já não muito nova mas que nos pareceu uma escolha acertada. Pequenina, esperta como um alho, toda mexida. Trabalhou connosco uns bons anos. O meu filho já estava no mesmo colégio em que andava a irmã e, por isso, a logística já estava relativamente facilitada. Ela arrumava e limpava a casa, ia buscá-los, dava-lhes lanche se eles quisessem, por vezes levava-os à ginástica, ficava a tomar conta até que regressássemos. Não era especialmente 'apurada' na lida da casa nem cozinhava. Mas, a olho nu, a casa parecia minimamente arrumada e limpa, a roupa estava lavada e engomada e, sobretudo, era carinhosa e cuidadosa com os miúdos. 

Era também cheia de histórias. Ia no terceiro marido, viúva dos dois anteriores. Um morreu de doença, outro num acidente. Caiu ou atiraram-no de um grua, dizia ela. Falava deles com desapego. Do que morreu de acidente contou: "Trabalhava no estaleiro, ganhava bem, fazia muitas horas, mas uma vez descobri o que ele fazia para ganhar ainda mais. Quando fui lavar as cuecas, descobri". Não sei se eu já tinha trinta anos nessa altura mas sei que ainda sabia pouco dessas coisas. Não percebi. Ela esclareceu: 'Sujas de cocó na parte da frente'. Fiquei na mesma. Contrariada por ter que entrar em pormenores, esclareceu: 'Desculpe o que vou dizer mas, se não percebe, não há outra maneira de dizer: ia ao cu aos que chegavam nos barcos'. Eu ficava sempre perplexa com o que ela contava.

Mais tarde, o marido, o terceiro, adoeceu, não me lembro de quê. Começou a faltar muito pois ia vê-lo ao hospital ou, depois dele ir para casa, ou era o médico que lá ia ou era o marido que piorava e ela não queria deixá-lo sozinho ou outra coisa qualquer. Era muito complicado conciliar a nossa rotina doméstica com estas ausências mas, para ela não se ir embora, aceitávamos tudo. Não parecia especialmente preocupada com o marido, falava sempre de forma desprendida. Andava simplesmente mais atarefada. Começou a preparar-me para nos ir deixar. Pedi-lhe que aguentasse até os miúdos serem mais autónomos mas ela estava mais virada para a sua liberdade. Falava abertamente dos seus planos. Ia 'meter os papéis' para a reforma e, como o marido já não devia durar muito (falava assim, quando se referia ao marido), depois recebia também a pensão de viuvez e ficava bem, já não precisaria de trabalhar. Até que o marido morreu mesmo. Pareceu aliviada, ainda mais cheia de planos, ainda mais mexida do que o costume. Mal a reforma se concretizou, bye, bye, aí vai ela. Desapegadamente, foi-se embora. Nós preocupados, os miúdos a sentirem a falta dela e ela já toda ufana com o seu estado de viuvez. 

Perdi a vontade de ter outra pessoa em casa. Habituámo-nos. Distribuíamos tarefas entre os quatro. Melhor ou pior, um ficava com a limpeza do pó, outro com a aspiração, outro com casas de banho, o meu marido estendia a roupa, eu engomava, eu cozinhava, ele lavava a louça.  Os vidros ficavam para quando o rei fazia anos. Fomo-nos governando assim. 

Mas não era opção consensual. Pelo contrário, muito, muito pelo contrário. Os miúdos já não estavam para isso, o meu marido também não. Mas eu não me imaginava a ter uma outra mulher a partilhar o nosso espaço, talvez a roubar, talvez a levar gente para nossa casa, talvez a baldar-se a torto e a direito.

Até que há cerca de dez anos, ao ser submetida a artroscopia aos joelhos, tive que me render. Não podendo eu trabalhar, não seria justo deixar o trabalho todo para o meu marido. Por essa altura já éramos só os dois mas a casa era grande e nem pensar ficar eu de perna estendida e ele cheio de trabalho.

Por isso, a partir daí temos quem nos ajude. Vem apenas uma tarde por semana e mais do que chega. Mas agora já não nos imagino a ter que fazer tudo só por nós. Gosto de lavar o chão, de lavar casas de banho e cozinha, gosto de cozinhar, de tratar da roupa. Mas não tenho nem um bocadinho de pachorra para limpar o pó. E há os vidros -- muito menos. E todas essas coisas para as quais é preciso disciplina para fazer assiduamente. Nem sei de truques, daqueles que as fadas do lar sabem e têm orgulho em saber.

Mas, porque nunca é tarde para aprender, aqui ficam algumas dicas que podem ser bem úteis a quem queira fazer boa figura e surpreender amigos e familiares quando lá forem a casa.

Nobody Believes But It Really Works!!! 

9 Brilliant (2+ Free) Home Tricks That Work BETTER Than Magic


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Maria Bethânia interpreta a A Flor Encarnada. As fotografias mostram alguns lugares especiais ‘Somewhere I Would Like To Live’: 50 Awesome Places And Homes Around The World That Actually Exist

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Uma boa terça-feira
Saúde. Boas vibes. Paz.

2 comentários:

Pôr do Sol disse...

A chamada lida da casa é um trabalho inglório. Nunca está acabada ou dura pouco.

Enquanto se tem forças e vontade, o tempo para a realizar vai-se arranjando, depois precisamos de uma ajudinha.

Antigamente conseguíamos pessoas que se nos afeiçoavam e ate se tornavam melhor que familia. Hoje, de há uns vinte anos para cá, as vidas são mais exigentes mas tambem noto muito oportunismo.

Tive duas experiencias e depois desisti. Falavam muito, contavam a sua vida e às tantas estava eu preocupada com os seus problemas a ajudar a resolvê-los para pouco depois se verem de novo em dificuldades desnecessárias.

Saíram-me caro, entre ordenado, roupas, géneros e até um advogado paguei para resolver dividas que se tornaram recorrentes.

Optei por uma empresa, impessoal é certo , mas que funciona. Vêm duas vezes por mês, em equipa de duas ou tres, há quase sempre uma em formação. Bem brifadas, com tecnicas e tarefas coordenadas e produtos próprios.

São educadas, prestaveis, mas não se adiantam em conversas.

De vez em quando um supervisor liga a saber de satisfação ou queixas.

O dia a dia ou eu fazendo.

Um Jeito Manso disse...

Olá Pôr do Sol,

Durante os anos em que não tive empregada, também recorria pelo menos umas duas vezes por ano a uma empresa. Eram eficientes. Contratava-os para um dia inteiro. Eram duas ou três e eram umas máquinas. Também traziam tudo, aspiradores e tudo. Faziam uma limpeza geral, a preceito, e ficava tudo bem feito.

Aqui onde agora moro, vejo que vários vizinhos recorrem a essa solução. Se um dia esta senhora que aqui vem uma tarde por semana se for embora será a solução que voltarei a seguir pois é bastante eficiente.

Beijinho, Sol Nascente!